REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.11641008
Arthur Linhares Lima Ferro
Orientador: Professor Eder Raul Gomes de Sousa
RESUMO
De maneira geral, pelo mundo afora, a imposição da pena aos condenados ocorre, na atualidade, de maneira menos cruel se comparada aos primórdios da evolução humana, em respeito aos Direitos Humanos. Todavia, as condições de cumprimento da pena, impostas pelo atual sistema carcerário brasileiro ainda merecem evolução e aperfeiçoamento. As condições de superlotação dos presídios, a falta de policiais penais em números adequados e a deficiente prestação de serviços médicos aos presos têm sido problemas frequentes no sistema de execução penal brasileiro. Cabe aos profissionais do sistema penal brasileiro, bem como aos operadores do direito, o desafio de fazer valer os ditames da legislação brasileira, incluídos os de estatura de direitos humanos, à toda a população carcerária, como forma de garantir o papel educativo da pena, mas também a necessária tutela da dignidade da pessoa humana.
PALAVRAS-CHAVE: SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO. EXECUÇÃO PENAL. SISTEMA PRISIONAL. JUSTIÇA CRIMINAL. POLÍCIA PENAL.
ABSTRACT
Throughout the world, the imposition of punishment on convicts currently occurs in a less cruel manner compared to the beginnings of human evolution, with respect for Human Rights. However, the conditions for serving the sentence, imposed by the current Brazilian prison system, still deserve evolution and improvement. Overcrowded conditions in prisons, the lack of adequate numbers of criminal police officers and the poor provision of medical services to prisoners have been frequent problems in the Brazilian criminal justice system. It is up to professionals in the Brazilian penal system, as well as legal operators, to face the challenge of enforcing the dictates of Brazilian legislation, including those regarding human rights, to the entire prison population, as a way of guaranteeing the educational role of punishment, but also the necessary protection of the dignity of the human person.
KEYWORDS: BRAZILIAN PRISON SYSTEM. PENAL EXECUTION. PRISON SYSTEM. CRIMINAL JUSTICE. PENAL POLICE.
1. INTRODUÇÃO – TEMA E PROBLEMATIZAÇÃO
O sistema carcerário brasileiro enfrenta inúmeros desafios que afetam sua eficácia, humanidade e capacidade de ressocialização dos detentos. Este projeto de pesquisa visa investigar a realidade atual do sistema carcerário brasielro, identificar os principais desafios enfrentados e propor possíveis soluções para melhorar sua eficiência e promover a reintegração social dos indivíduos encarcerados.
1.1 JUSTIFICATIVA
O estudo do sistema carcerário brasileiro é de extrema importância devido à sua relevância social e aos graves problemas que enfrenta. A superlotação, a violência, a falta de condições dignas de vida e a incapacidade de promover ressocialização dos detentos são questões urgentes que exigem uma análise aprofundada e a proposição de soluções viáveis. .
1.2 OBJETIVOS
1. Analisar a estrutura e o funcionamento do sistema carcerário brasileiro.
2. Identificar a base legal do sistema prisional brasileiro.
3. Identificar os principais problemas enfrentados pelo sistema prisional brasileiro, como superlotação, violência, falta de infraestrutura e acesso precário a serviços básicos.
1.3 METODOLOGIA DA PESQUISA
Este estudo será realizado por meio da análise ampla sobre o tema, que incluirá livros, artigos científicos, dados e estatísticas, todos relacionados ao sistema carcerário brasileiro e algumas disposições de sistemas carcerários de outros países, a título comparativo. Espera-se que este projeto de pesquisa forneça uma análise aprofundada da realidade do sistema prisional brasileiro, identificando os principais desafios enfrentados e propondo recomendações concretas para sua melhoria. Os resultados obtidos poderão contribuir para o desenvolvimento de políticas públicas mais eficazes e humanitárias no campo da justiça criminal.
2.A ORIGEM DA VIOLÊNCIA
A origem da palavra violência é derivada do Latim VIOLENTIA, “veemência, impetuosidade”, de VIOLENTUS, “o que age pela força”, relacionada a VIOLARE, “tratar com brutalidade, desonrar, ultrajar”.
A violência encontra-se presente desde o início do mundo (Caim e Abel). Contudo, a partir do momento em que o homem passou a viver em sociedade houve a necessidade de gerenciar, de forma efetiva e controlada, inclusive, através de leis, o que, primariamente, era classificado como uma “agressividade instintiva”, proveniente da necessidade da sobrevivência do homem na natureza. Assim, a partir da organização das primeiras comunidades, tornou-se necessário um controle formal da agressividade natural da essência do homem (Souza, 2010).
3. SISTEMA PRISIONAL E SEUS PRIMORDIOS
Ao tratarmos do sistema prisional, constatamos que a própria Bíblia já fazia referências ao encarceramento.
O filho de Deus “Jesus” enfrentou a prisão antes de ser julgado e crucificado.
Sua prisão se deu pela ordem dos líderes religiosos e governadores romanos, devido a suas ações e ensinamentos considerados ameaçadores para o estabelecimento religioso e político da época (João 18:12-14; Mateus 27:1-2 e Lucas 23:6-12).
É sabido que Jesus foi condenado à morte e crucificado pelos líderes judeus e governadores romanos, por representar um “perigo” ao sistema religioso e político da época. Cumpre observar que nos tempos atuais ainda é possível constatar situações em que pessoas são submetidas a prisões ou penas de morte por expressarem suas opiniões políticas e/ou religiosas.
Obviamente, a prisão e a execução de jesus pela crucificação é, até os dias de hoje, considerado um dos eventos mais importantes da história cristã, e nele os seguidores de Cristo veem a sua ressurreição e sua ascensão ao céu para sentar a direita de Deus pai todo poderoso, cumprindo a missão de salvar a humanidade.
O apóstolo Pedro também foi preso por diversas vezes. Segundo passagens bíblicas, ele foi preso por ordem do sumo sacerdote e levado para a prisão, mas foi libertado pelo anjo do Senhor (Atos 12: 1-19). Foi preso novamente, desta vez por ordem do governador romano, e condenado a ser flagelado antes de ser libertado (Atos 16: 22-40).
Outro personagem bíblico que foi preso foi o apóstolo Paulo, sendo uma prisão em Jerusalém (Atos 21: 27-36), uma prisão em Cesareia (Atos 23: 23-35) e uma prisão em Roma (Atos 28: 16-31). Em todas essas ocasiões, Paulo usou sua prisão como uma oportunidade para compartilhar a mensagem do Evangelho com as pessoas ao seu redor, incluindo os carcereiros e os guardas.
Além desses dois apóstolos, existem outros personagens bíblicos que foram presos por suas crenças e ações. Um deles é José, o filho de Jacó, que foi vendido como escravo para os egípcios e acabou sendo preso injustamente (Gênesis 37-40).
Outro é Daniel, que foi preso por ordem do rei Nabucodonosor por sua fidelidade a Deus (Daniel 1-6).
A história ainda relata que váriossantos da igreja católica também enfrentaram a prisão.
Estes são alguns exemplos de personagens bíblicos que foram presos por suas crenças e ações. Eles nos ensinam a importância de permanecer fiéis a Deus mesmo em meio às dificuldades, e como Deus pode usar essas situações para realizar
Alguns nomes, posteriormente, santificados, também enfrentaram o encarceramento, tais como Santo Inácio de Antioquia, São João Fisher e São Tomás More que foram presos e condenados por se recusarem a reconhecer o rei Henrique VIII como reinante da igreja da Inglaterra
Assim, justificadamente ou não, desde os primórdios da humanidade, já havia, na vida em sociedade, o sistema prisional com suas regras pertinentes a cada período da história. Seguem, assim, alguns exemplos de antigos condenados.
São Maximiliano Kolbe – Polônia
São Maximiliano Kolbe foi preso pelos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial e enviado para o campo de concentração de Auschwitz.
Lá, ele se ofereceu para morrer em lugar de um companheiro de prisão e foi executado por injeção letal.
Santa Teresa Benedita da Cruz – Alemanha
Santa Teresa Benedita da Cruz era uma judia convertida ao catolicismo que se tornou freira carmelita.
Ela foi presa pelos nazistas e deportada para o campo de concentração de Auschwitz, onde foi morta na câmara de gás. São José Sánchez del Río – México
São José Sánchez del Río era um adolescente mexicano que se juntou à rebelião cristera contra a perseguição religiosa do governo mexicano na década de 1920. Ele foi capturado e brutalmente torturado, recusando-se a renunciar à sua fé. Ele foi executado por ter se recusado a renunciar a sua fé em Cristo.
São Vladislav Bukowinski – Ucrânia
São Vladislav Bukowinski era um padre ucraniano que se recusou a se juntar à igreja ortodoxa russa controlada pelo governo comunista soviético.
Ele foi preso e morreu em um campo de trabalho forçado.
São Pedro Calungsod – Filipinas
São Pedro Calungsod era um jovem catequista filipino que foi morto enquanto evangelizava em Guam.
Ele foi martirizado pelos indígenas locais que se opunham à evangelização cristã.
São Marcelo Callo – França
São Marcelo Callo era um jovem francês que se opôs à ideologia nazista que dominava a França durante a Segunda Guerra Mundial.
Ele foi preso e deportado para a Alemanha, onde morreu em um campo de trabalho forçado.
São Janos Brenner – Hungria
São Janos Brenner era um padre húngaro que se opôs ao regime comunista que governava seu país.
Ele foi sequestrado e morto a tiros.
Santa Anna Wang – China
Santa Anna Wang era uma freira chinesa que fundou uma congregação religiosa para ajudar os pobres e doentes.
Ela foi presa e torturada pelos comunistas chineses e acabou morrendo na prisão.
São Jerzy Popiełuszko – Polônia
São Jerzy Popiełuszko era um padre polonês que se opôs ao regime comunista que governava seu país.
Ele foi sequestrado e assassinado por agentes da polícia secreta em 1984. Seu corpo foi encontrado no rio Vístula, com marcas de tortura. Sua morte foi um choque para muitos poloneses, que se uniram em protesto contra a repressão do regime comunista.
Beata Maria Stella e Companheiros – Espanha
Beata Maria Stella e seus companheiros eram um grupo de freiras e leigos que foram executados durante a Guerra Civil Espanhola por milícias comunistas. Eles foram presos por suas crenças religiosas e mortos em Valência, em 1936.
“Esses santos nos mostram que a fé em Deus pode resistir à opressão e à violência dos regimes totalitários. Eles são um exemplo inspirador de coragem e perseverança em tempos difíceis. Que possamos seguir o seu exemplo em nossas próprias vidas, permanecendo firmes na fé mesmo diante da perseguição e da adversidade.”
Além dos personagens bíblicos mencionados anteriormente, há também diversos Santos da Igreja Católica que foram presos por suas crenças e ações. Um exemplo famoso é Joana D’Arc, que foi presa e condenada à morte por herege pelos ingleses e seus aliados franceses, devido à sua liderança na defesa da França.
Outros exemplos incluem:
– Santo Inácio de Antioquia: foi preso e condenado à morte por seu testemunho cristão no século II.
– São João Fisher e São Tomás More: foram presos e condenados à morte por se recusarem a reconhecer o rei Henrique VIII como cabeça da igreja da Inglaterra.
– São Maximiliano Maria Kolbe: foi preso e condenado à morte pelos nazistas por seu trabalho com judeus e outros perseguidos durante a Segunda Guerra Mundial.
– São José Vaz: foi preso e condenado à morte pelos holandeses na Ilha de Ceilão (atual Sri Lanka) por sua pregação do cristianismo.
Esses são apenas alguns exemplos de Santos da Igreja Católica que foram presos por suas crenças e ações. Eles nos ensinam a importância de permanecer fiéis a Deus mesmo em meio às dificuldades, e como Deus pode usar essas situações para realizar grandes coisas através de nós.
É importante notar que esses personagens bíblicos foram presos por suas crenças e ações, e não por serem bandidos ou criminosos. Eles foram presos por serem fiéis a Deus e seguirem sua vontade, mesmo diante da tristeza e opressão. Isso nos ensina que ser preso não é, necessariamente, um indicativo de má conduta ou falta de virtude, e que não devemos julgar as pessoas presas com base em estereótipos ou preconceitos.
Infelizmente, muitas vezes as pessoas usam discursos religiosos para julgar as pessoas presas, o que é totalmente incoerente com o ensinamento bíblico. A Bíblia nos ensina a amar e tolerar nossos inimigos, e não julgar as pessoas, mas sim a deixar que seja Deus quem julgue. Devemos lembrar que as pessoas presas também são criaturas de Deus e merecem respeito e compaixão, independentemente de suas ações passadas.
O objetivo é demonstrar que o fato de alguém ser preso não significa que essa pessoa seja moralmente inferior ou tenha uma índole ruim. Ao contrário, muitos desses personagens bíblicos foram injustamente presos por causa de sua fé e sua defesa da verdade.
Em todos esses casos, vemos que os personagens bíblicos presos não permitiram que sua prisão os impedisse de servir a Deus e compartilhar sua mensagem com os outros. Eles continuaram a ser fiéis mesmo nas circunstâncias mais difíceis e foram usados por Deus para realizar grandes coisas. Isso nos ensina a importância de manter a fé e a esperança, mesmo quando enfrentamos desafios e dificuldades, e confiamos que Deus está no controle, mesmo quando as coisas parecem estar fora de controle.
É importante não se prender ao preconceito com as pessoas encarceradas, levando em consideração a análise dos personagens bíblicos que foram presos.
É preciso entender que a prisão não define uma pessoa. A prisão é um castigo legal, e não uma sentença sobre a moral ou caráter de uma pessoa. A prisão é um mecanismo de controle social, e muitas vezes é usado para reprimir aqueles que desafiam as normas e estruturas sociais dominantes. A prisão é uma realidade, e muitas vezes é necessária, mas não devemos usar a prisão como uma forma de julgar a moralidade das pessoas.
Além disso, é importante lembrar que a prisão afeta não somente a pessoa presa, mas também sua família e sua comunidade. A prisão tem efeitos duradouros e pode causar danos irreparáveis. Portanto, é importante que sejam tomadas medidas para reduzir a necessidade de prisão e para garantir que as pessoas tenham acesso à justiça e à ressocialização.
Em suma, é preciso quebrar o preconceito com as pessoas encarceradas e entender que a prisão não define uma pessoa. É preciso lutar por mudanças ecológicas e sociais que possam melhorar a vida das pessoas presas e de suas comunidades, e garantir que as pessoas tenham acesso à justiça e à ressocialização.
Na Antiguidade, do que se tem notícia, de um primeiro e embrionário compendio legal, seria o Código de Hamurabi, do latim “talionis” que significa retaliação e era esse exatamente o intuito da Lei: estabelecer a reciprocidade entre o crime e a pena, como a conhecida expressão “olho por olho, dente por dente” – a Lei de Talião.
O Código de Hamurabi continha 282 (duzentos e oitenta e dois) artigos e estabelecia, de acordo com o entendimento do governador da Babilônia que deu nome ao diploma legal, a punição para crimes considerados mais comuns, que variavam desde questões processuais até relações familiares. (CHIAVERINI, 2009)
Já na Grécia antiga, Platão descrevia 3 (três) tipos de prisão que serviam: para prevenir delitos guardando as pessoas, para criminosos recuperáveis no intuito de corrigi-los e para total isolamento do criminoso do resto da sociedade, sendo perpétua. Estariam situadas, na casa de correção e no lugar mais deserto, respectivamente. (CHIAVERINI, 2009).
Em Roma os delitos eram divididos em crimes públicos e crimes privados. Os crimes públicos eram considerados de maior gravidade sendo, portanto, reprimidos pelo Estado, já os crimes privados eram chamados de crimes majestatis e eram punidos pelos próprios particulares. A prisão, na sociedade romana, era voltada mais para devedores domésticos e escravos rebeldes. (CHIAVERINI, 2009).
Carvalho Filho descreve que os locais utilizados para as prisões na Antiguidade eram sempre insalubres, sem iluminação, sem condições de higiene, como as masmorras. Tais condições tinham a intenção de que a prisão fosse um lugar ruim, tornando a prisão um acessório para punir o indivíduo com base no tormento físico, que ia muito além do encarceramento. (CARVALHO FILHO, 2002)
Na idade média, temos a temida Santa Inquisição que foi criada no século XIII, sob a administração e controle da Igreja Católica Romana que por intermédio de seus Tribunais, julgava a todos que eram considerados uma ameaça aos dogmas e valores defendidos pela cristandade. (MARQUES, 2008).
Esse período da história foi marcado por extrema crueldade, supressão de direitos e terror para aqueles que, por qualquer motivo, estavam sob a mira da Igreja Católica.
Naquele período qualquer denúncia anônima bastava para que uma pessoa fosse perseguida e condenada. As penas variavam entre prisão temporária, perpétua e pena de morte na fogueira em praça pública, além de todos os instrumentos de tortura utilizados. (CHIAVERINI, 2009)
Era uma época em que o processo de punição retirava os direitos do acusado – surgindo, dessas práticas, o conceito de processo inquisitivo – que não tinha o direito de saber sequer qual teria sido sua prática delituosa, nem quem havia o denunciado.
As investigações corriam em segredo, a confissão era considerada a maior das provas e a tortura era um meio altamente utilizado para chegar até ela. O que é visto atualmente como degradante e cruel era aplicado comumente no procedimento de investigação e punição instituído pela Igreja Católica.
Princípios da dignidade humana eram tidos como inexistentes em relação aos que cometiam infrações contra o Estado ou a Igreja. Nesse obscuro período, censuras foram realizadas contra qualquer concepção que fosse contrária aos princípios da doutrina cristã.
Essas ideias não se resumiam apenas no que diz respeito à conhecimentos bíblicos. Poderiam ser todos os tipos de pensamento que se diferenciasse do que a Igreja Católica entendia como verdade.
Assim, cientistas como Galileu Galilei, astrônomo que afirmou que a Terra girava em torno do sol, foram perseguidos simplesmente por discordarem, com base em métodos científicos, das crenças religiosas.
Sob o pálio de combater o diabo e as suas diversas manifestações, a Igreja operou um combate, não só aos maniqueístas, valdistas e cátaros, mas uma batalha irrestrita e intolerante à diversidade de opiniões e de crenças, enfim, às diferenças. Assim, imprimiu-se uma perseguição a judeus, moriscos, feiticeiras, pensadores livres e místicos.8 A palavra heresia, que em grego (αιρετικός) significa escolha, a partir da manipulação imposta pela Inquisição tornou-se um termo genérico e com conotação depreciativa a partir do qual incluíam Leila Gomes Gaya Revista Brasileira de História do Direito | e-ISSN: 2526-009X| Encontro Virtual | v. 9 | n. 1 | p. 01 – 23| Jan/Jul. 2023. 8 aleatoriamente quaisquer condutas que fossem consideradas contrárias, novas ou simplesmente diferentes do stablishment. O objetivo primordial não era a imposição da sanção ao suposto infrator. Na verdade, consistia em um instrumento com o qual, pelo medo generalizado, impunha uma forma única de visão de mundo, de estruturação dos poderes oficiais e de estratificação social, escoradas em argumentos religiosos. (PINTO, 2010)
A ideia dos líderes da Igreja Católica era criar uma sociedade cristã unificada e ordenada, de maneira que a integração preservasse a hierarquia já mencionada, disciplinando-se qualquer indivíduo que ousasse fugir da estrutura eclesiástica estabelecida. Esse pode ser dito como o principal objetivo, para além da punição por si, pois quando se tratavam de integrantes do clero, havia a aplicação de sistemas de absolvição que livravam os ditos importantes da sociedade de sofrerem as mesmas penitências. (IRVIN, 2004).
Por isso, conclui-se que a intenção da prisão durante o período da Idade Média e, principalmente, no que se diz respeito ao lapso temporal sob o qual a Igreja Católica exerceu seu domínio, intuía manter as camadas sociais da maneira que se encontravam, impedindo revoluções, silenciando ideais progressistas e perseguindo quem da ordem discordava.
Com as ideias do Renascimento, baseadas em sua maior parte, na razão e não mais em uma ordem divina superior que comandava todas as coisas, revolucionou os conceitos de punição e dos castigos.
Nesse sentido, Maquiavel apresenta as penas como forma de intimidação, com o intuito de preservar a monarquia absoluta – que detinha o poder – por meio do temor de que aquela punição fosse aplicada ao indivíduo que cometesse as ações ditas como proibidas. (MARQUES, 2008))
Outro pensador que demonstrou novas ideias relacionadas à concepção da pena foi Thomas More, que apresentou uma finalidade de reeducação e se importa com os motivos que teriam levado à prática daquele crime, no intuído de resolvê-los, tendo em vista que, para esse autor, “não há castigo que impeça a busca pela sobrevivência”. (CHIAVERINI, 2009) O mesmo autor condena a pena de morte, por entender que não se faz útil para a sociedade, demonstrando uma inclinação à escravidão como solução. Ademais, o conceito de direito premial aparece nos ensinamentos do teórico, que entende à recompensa como um atrativo convite à virtude para aqueles que cometiam os crimes.
Michel Foucault, em sua obra Vigiar e Punir, descreve o suplício de Damiens na execução de sua pena de morte. A pena foi executada no ano de 1757, em frente à Igreja de Paris, impondo enorme sofrimento ao condenado, que teria atentado contra a vida do rei da França, ao que lhe foi imputado o crime de parricídio.
No Brasil, pena semelhante teve, em 21 de abril de 1792, Joaquim José da Silva Xavier, apelidado de Tiradentes, que foi executado na forca por crime de “lesamajestade” e teve partes do seu corpo expostas na cidade de Vila Rica, hoje chamada de Ouro Preto.
Tanto a pena de Damiens quanto a pena de Tiradentes, ambas ocorridas no século XVIII, mostram que ao condenado eram impostos castigos desumanos e cruéis, e que a execução, com a exposição pública de pastes dos corpos mutilados, deveria chocar a sociedade, como forma de desestimular a prática delituosa.
4. SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO E AS SUAS LEGISLAÇÕES.
Podemos entender que o sistema carcerário brasileiro é um conjunto de instituições, leis e práticas que regulamentam a privação de liberdade em nosso País.
Nesse sistema, estão incluídas as cadeias, presídios e outras formas de detenção, tais como as leis e regulamentos que regem a conduta dos presos e dos funcionários responsáveis pela administração dessas instituições.
O objetivo principal do sistema carcerário é o de garantir a segurança da sociedade ao aplicar as sanções previstas em lei para aqueles que cometem crimes puníveis com a restrição da liberdade.
Contudo, é sempre importante ressaltar que o sistema carcerário transpassa a ideia da punição, e busca garantir a reabilitação e a ressocialização dos detentos, para que, após o seu egresso, possam ser reintegrados à sociedade da melhor forma possível.
Em termos de legislação, a nossa ConstituiçãoFederal elencou em seu art. 5º direitos fundamentais que devem ser respeitados pelo Estado ao exercer o seu poder punitivo, como exemplo podemos citar em seu inciso III, a vedação ao tratamento desumano ou degradante; e em seu inciso XLVII, a vedação as penas de morte, cruéis, banimento, de caráter perpétuo ou de trabalhos forçados.
A Lei de Execução Penal (LEP) tratou dos objetivos da pena, a reintegração social do condenado e a prevenção do crime (art. 1º). Para alcançar esses objetivos, a LEP prevê uma série de medidas, como o trabalho do preso, a educação e a assistência social (arts. 28 a 41).
Já o Código Penal (CP) também prevê algumas medidas que visam à ressocialização do condenado, como a suspensão condicional da pena e a livramento condicional (arts. 77 a 83).
A Lei 12.106, de 2 de dezembro de 2009, criou, no âmbito do Conselho Nacional de Justiça, o Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas e deu outras providências.
O art. 32 do CP, prevê as penas permitidas em nosso ordenamento jurídico brasileiro, a saber privativas de liberdade; restritivas de direitos e de multa. (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984)
As chamadas “penas restritivas de liberdade” podem ser divididas em dois tipos: reclusão e detenção e são reguladas pelo art. 33 ao 42 do Código Penal, além da legislação especial (Lei de Execução Penal – Lei 7.210/94).
Conforme prevê o art. 33 do CP, a pena de reclusão pode ser cumprida nos regimes: aberto, semiaberto e aberto, conforme o “quantum” da pena e as circunstâncias judiciais (art. 59 do CP).
A Lei nº 12.714/2012 que dispõe sobre o sistema de acompanhamento da execução das penas, da prisão cautelar e da medida de segurança aplicadas aos custodiados do sistema penal brasileiro (SISDEPEN).
A Constituição Federal Brasileira de 1988, determina, no inciso XLVII que não haverá penas, de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX; nem de caráter perpétuo; nem de trabalhos forçados; nem de banimento; nem cruéis.
5. SITUAÇÃO ATUAL DO SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO
Segundo informações da Secretaria Nacional de Políticas Penais (SENAPPEN), apresentadas no 15º Ciclo de Levantamento de Informações Penitenciárias do Sistema Nacional de Informações Penais (SISDEPEN), com dados referentes ao segundo semestre de 2023, o número total de custodiados no Brasil subiu para 650.822 (seiscentos e cinquenta mil oitocentos e vinte e dois custodiados) em celas físicas e 201.188 (duzentos e um mil cento e oitenta e oito custodiados) em prisão domiciliar, o que soma, aproximadamente, 850.000 (oitocentos e cinquenta mil) custodiados. Os presos em celas físicas são aqueles que, independentemente de saídas para trabalhar e estudar, dormem no estabelecimento prisional, além daqueles que estão nas carceragens das Polícias Civis, Polícias Militares, Corpos de Bombeiros Militares e Polícia Federal. Já os que estão em prisão domiciliar são os que cumprem pena nas suas residências.
Dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), publicados no ano de 2019, apontam que, naquele ano, o sistema carcerário brasileiro tinha, aproximadamente, 810.000 (oitocentos e dez mil) presos. Desta forma, percebe-se uma tendência do aumento anual da população carcerária no Brasil.
O mesmo estudo do CNJ apontou como principais problemas do sistema prisional brasileiro: superlotação dos presídios, problemas na infraestrutura e na manutenção dos estabelecimentos prisionais, falta de funcionários em número adequado e escassez de atendimento médico.
O Anuário Brasileiro de Segurança Pública (2022), já apontava que o sistema prisional brasileiro está em colapso. Segundo os dados divulgados, o País já enfrentava um grave problema de superencarceramento, com mais de 832 mil pessoas presas em um sistema que só comportava 596 mil. Isso significa um déficit de mais de 236 mil vagas, o que resulta em superlotação, condições precárias e violações de direitos humanos.
Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE – 2022), a população brasileira é composta por 56% de pessoas negras, realidade esta que reflete diretamente no sistema prisional. Todavia, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública publicou, em 2023, que 68,2% da população carcerária brasileira é composta por pessoas negras, o que chama a atenção para um possível racismo estrutural com impacto no sistema de justiça criminal brasileiro.
6. CONCLUSÃO
De maneira geral, pelo mundo afora, a imposição da pena aos condenados ocorre, na atualidade, de maneira menos cruel se comparada aos primórdios da evolução humana, em respeito aos Direitos Humanos.
Todavia, as condições de cumprimento da pena, impostas pelo atual sistema carcerário brasileiro ainda merecem evolução e aperfeiçoamento.
As condições de superlotação dos presídios, a falta de policiais penais em números adequados e a deficiente prestação de serviços médicos aos presos têm sido problemas frequentes no sistema de execução penal brasileiro.
Cabe aos profissionais do sistema penal brasileiro, bem como aos operadores do direito, o desafio de fazer valer os ditames da legislação brasileira, incluídos os de estatura de direitos humanos, à toda a população carcerária, como forma de garantir o papel educativo da pena, mas também a necessária tutela da dignidade da pessoa humana.
BIBLIOGRAFIA
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PALMA, Rodrigo Freitas. O Julgamento de Jesus Cristo: Aspectos Históricos e Jurídicos. 3. ed. Curitiba: Juruá, 2010.
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