SÍNDROME DE DOWN, PERCEPÇÕES E SABERES: ESTUDOS REALIZADOS NOS MUNICÍPIOS DE LANDANA E CABINDA.

DOWN SYNDROME PERCEPTIONS AND KNOWLEDGE: STUDIES CARRIED OUT IN THE MUNICIPALITIES OF CABINDA AND LANDANA.

PERCEPCIONES Y CONOCIMIENTOS SOBRE EL SÍNDROME DE DOWN: ESTUDIOS REALIZADOS EN LOS MUNICIPIOS DE CABINDA Y LANDANA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ar10202505031701


Deolinda Ângela Baca Ndala¹


Resumo

A Síndrome de Down é uma condição genética que requer atenção especial devido aos efeitos que produz no desenvolvimento intelectual e nas funcionalidades físicas, a que acrescem nalguns casos diferentes patologias associadas. A severidade é variável e determina o grau de autonomia e capacidade de aprendizagem. Neste sentido, e tendo como premissa os benefícios para a maioria dos casos da escola inclusiva, o presente artigo é fruto do trabalho desenvolvido com oito alunos do primeiro ciclo com Síndrome de Down, da interacção com os professores, escola e famílias. Não minimizando a participação de nenhum dos intervenientes no processo de aprendizagem o presente trabalho sublinha o papel fundamental da Psicologia da Educação, enquanto ferramenta de suporte para os professores, na medida em que os auxilia a entender e resolver os complexos fenómenos inerentes ao processo de ensino e aprendizagem de alunos com Síndrome de Down. A investigação processou-se numa lógico de pesquisa descritiva sobre o contributo da Psicologia da Educação tendo como preocupação a optimização da aprendizagem e bem-estar dos alunos. Em termos de resultados é inegável a necessidade do psicólogo na escola, bem como, a produção de um manual de apoio, e demais materiais e tecnologias, que permitam auxiliar o professor e o aluno com necessidades especiais, mas também, sensibilizar os alunos para que todos são partes integrantes de um caminho que precisa de todos, para ser para todos.

Palavras chaves: Necessidades Educativas Especiais; Psicologia Pedagógica, Síndrome de Down.

Summary

Down Syndrome is a genetic condition that requires special attention due to the effects it produces on intellectual development and physical functionalities, to which are added in some cases different associated pathologies. The severity is variable and determines the degree of autonomy and learning capacity. In this sense, and having as a premise the benefits for most cases of the inclusive school, this article is the result of the work developed with eight primary school students with Down Syndrome, the interaction with teachers, school and families. Not minimizing the participation of any of the participants in the learning process, the present work underlines the fundamental role of Educational Psychology, as a support tool for teachers, as it helps them to understand and solve the complex phenomena inherent to the teaching and learning process of students with Down Syndrome. The research was carried out in a logic of descriptive research on the contribution of Educational Psychology with the concern of optimizing learning and well-being of students. In terms of results, the need for the psychologist in school is undeniable, as well as the production of a support manual, and other materials and technologies, which allow to assist the teacher and the student with special needs, but also to sensitize students to the fact that everyone is an integral part of a path that needs everyone, to be for everyone.

Keywords: Special Educational Needs; Pedagogical Psychology, Down Syndrome.

Resumen

El Síndrome de Down es una condición genética que requiere especial atención debido a los efectos que produce sobre el desarrollo intelectual y las funcionalidades físicas, a lo que en algunos casos se suman diferentes patologías asociadas. La gravedad es variable y determina el grado de autonomía y capacidad de aprendizaje. En este sentido, y teniendo como premisa los beneficios para la mayoría de los casos de la escuela inclusiva, este artículo es el resultado del trabajo desarrollado con ocho estudiantes del primer ciclo con Síndrome de Down, de la interacción con docentes, escuela y familias. Sin minimizar la participación de ninguno de los participantes en el proceso de aprendizaje, el presente trabajo subraya el papel fundamental de la Psicología de la Educación, como herramienta de apoyo a los docentes, ya que les ayuda a comprender y resolver los complejos fenómenos inherentes al proceso de enseñanza y aprendizaje de los estudiantes con Síndrome de Down. La investigación se llevó a cabo en una lógica de investigación descriptiva sobre el aporte de la Psicología de la Educación con la preocupación de optimizar el aprendizaje y el bienestar de los estudiantes. En términos de resultados, es innegable la necesidad del psicólogo en la escuela, así como la producción de un manual de apoyo, y otros materiales y tecnologías, que permiten asistir al profesor y al estudiante con necesidades especiales, pero también sensibilizar a los estudiantes sobre el hecho de que todos son parte integral de un camino que necesita de todos, ser para todos.

Palabras clave: Necesidades Educativas Especiales; Psicología Pedagógica, Síndrome de Down.

1. Introdução

Todos os alunos têm o direito a uma educação adequada às suas necessidades, no entanto, a capacidade de responder às necessidades individuais de cada um, depende das práticas pedagógicas, das competências dos professores, mas também dos recursos multidisciplinares disponíveis (Morgado, 2009, Prado, 2017).

 Assim, a escola para todos está conceptualmente disponível para abraçar a diferença, independentemente da sua origem, salvaguardando, contudo, que se por um lado, as minorias devem encontrar respostas adequadas, não é plausível, não salvaguardar as respostas das maiorias (Ndala, 2019). Esta abordagem salvaguarda o respeito por todos e defende a importância dos Serviços de Psicologia da Educação (Borges, Luísa, & Martins, 2015).

A Psicologia da Educação é o ramo da Psicologia que tem como finalidade compreender e explicar os fenómenos de ordem psicológica que estão relacionados com os processos de desenvolvimento e aprendizagem do ser humano, independentemente da sua idade, ao grau de ensino (Alvarez, Simão, Ferreira, & Santos, 2020). A complexidade dos factores que interferem com a aprendizagem, representa um enorme desafio para todos os intervenientes, sendo cada vez mais consensual a pertinência e relevância crucial da contribuição dos psicólogos em contexto escolar (Adelman & Taylor, 2011).

Efectivamente a participação do psicólogo escolar na equipe multidisciplinar ao disponibilizar conhecimentos e experiências científicas acerca do processo de aprender, permite igualmente identificar e compreender possíveis causas e obstáculos que potenciam ou condicionam a aprendizagem e equacionar sugestões de melhoria ou de novas estratégias (Cassinsetal., 2007;Santos & Gonçalves, 2016).

Portanto, a Psicologia da Educação, deve ser considerada como um recurso fundamental e visa auxiliar a prática educacional nas vertentes: mecanismos de aprendizagem dos alunos; eficiência e eficácia das estratégias educacionais, e funcionamento da própria instituição (Prado, 2017).

O presente trabalho de investigação trata-se de um estudo descritivo. Optou-se por uma metodologia qualitativa, com a perspectiva de analisar o enquadramento de alunos com Síndrome de Down assim como o seu desenvolvimento escolas face as condições que as escolas oferecem, a disponibilidade de material didático, a capacitação dos professores face a realidade de inclusão escolar, a interação professor aluno com Síndrome de Down e este com a turma;

Compreender o grau de dificuldades sentidas pelos encarregados de educação dos alunos com Síndrome de Down, analisar o grau de dificuldade sentida pelos professores na interação com os alunos com a síndrome de Down no contexto prático de inclusão escolar.

Tendo em conta a literatura consultada (Correia, 2003; Fonseca, 2005) e as condições prévias desta temática, formulam-se alguns pressupostos para uma melhor estruturação do estudo. Organizou-se os mesmos, do seguinte modo a fundamentação teoria, a parte metodologia e por último as referências bibliográficas.

No que concerne a fundamentação teórica estão descritas a caracterização dos indivíduos com Síndrome de Down e suas especificidades, sem descorar o papel do psicólogo educacional assim como o seu contributo junto da escola e das famílias. A parte empírica do estudo com destaque a uma investigação descritiva, em cujo objetivo consiste na   obtenção de  respostas relativas às  atitudes dos professores do primeiro ciclo face aos alunos com Síndrome de Down, tais como : na visão do professor como é que a proposta de educação inclusiva para alunos com NEE com realce para alunos com Síndrome de Down nas salas do ensino regular, se as mesmas constituem um avanço ou retrocesso, no processo de ensino-aprendizagem, uma vez que a educação inclusiva tem como objetivo a oferta de uma educação de qualidade para todos.

Se as comunidades escolares (equipe gestão, coordenadores pedagógicos, professores, pais e alunos) têm conhecimento da politica nacional de educação Inclusiva, bem como os documentos Legais (declaração mundial Salamanca convenção de Guatemala) que inspiram os movimentos em favor da escola inclusiva; como é que o gestor percebe que as políticas públicas para inclusão de alunos com NEE em salas regulares garantem o acesso, permanência e favorecimento de aprendizagem de todos; em que medida o projeto politico pedagógico, de formação de professores e outras formações contribui para a especificidade ao atendimento aos alunos com NEE e em particular com Síndrome de Down e se existem discussões com a comunidade escolar para valorizar as praticas pedagógicas a formação docente e as adaptações curriculares estruturais da escola no sentido.

A Educação Especial e a inclusão escolar em Angola se encontra- ainda organizada de forma segregada, onde os alunos com Necessidades Educativas Especiais assistem as aulas em salas à parte, nas escolas de ensino regular e os alunos com NEE são agrupados de acordo com as suas deficiências (Ndala, 2019). Entende-se neste contexto que a integração é uma forma organizada dos sistemas de ensino, que prevê uma participação concedida de maneira parcial, em que o aluno integrado é obrigado a adaptar-se às condições oferecidas pela escola, em uma espécie de adequação individual  considerando as condições físicas e pedagógicas do meio.

2. Síndrome de Down

A Síndrome de Down (SD) consiste numa condição genética que apresenta um cromossomo número 21 a mais. Perante uma falha genética, dá-se uma alteração no par do cromossomo 21, em que, em vez de dois, há um terceiro cromossomo. Este excesso de material genético nas células do corpo consiste na principal causa de deficiência intelectual (Anjos etal., 2019). Na classificação internacional de Doenças (CID-10) a Síndrome de Down está classificada no capítulo Q-00 a Q-99, que engloba as malformações, deformidades e anomalias cromossómicas, tendo como código de referência Q-90.

 Existem três tipos principais de Trissomia 21, designadamente a homogénea, ou simples que representa a ocorrência mais frequente e estimada em 95%, a translocação que afecta 3 a 4% dos pacientes e o mosaicíssimo que afecta 1 a 2% dos pacientes (Veríssimo, 2021). Apesar do fenótipo no caso da Síndrome de Down poder ser expressado de forma variável, existem alguns sinais únicos e que se tornam fundamentais no diagnóstico clínico. Em relação à sintomatologia, não é necessário que todos os sinais estejam presentes.

 A figura 1, apresenta as características mais comuns, nomeadamente, uma face aplanada, com pregas palpebrais oblíquas para cima (1), a existência de uma prega cutânea no canto interno do olho (2), a união das sobrancelhas (sinófris) (3), uma base nasal plana (4), orelhas de implantação baixa e pavilhão auricular pequeno (5) cabelo fino (6), protusão lingual (7), excesso de tecido adiposo no dorso do pescoço (8). 

Figura 1 – Traços faciais mais comuns em crianças com Síndrome de Down

Fonte: Veríssimo, 2021, p.7

Como já referido não é necessário que todos os sinais estejam presentes para que o diagnóstico possa ser confirmado e por vezes, é possível existir alguns traços e isso pode não corresponder à presença da síndrome. Outra das características bastante comum é a existência de palato ogival alto (9) (figura 2).

Figura 2 – Característica do palato em crianças com Síndrome de Down

Fonte: Veríssimo, 2021, p.8

Igualmente as mãos e os pés têm traços característicos. No caso das mãos figura 3 verifica-se a existência de clinodactilia do quinto dedo da mão (dedo curvo) (10), de braquidactilia (dedos curtos) (11) e de uma prega simiesca (prega palmar única) (12). Relativamente aos pés figura 4 é comum o afastamento entre o primeiro e o segundo dedo (13) e o pé plano (14). A intensidade de cada de uma destas sintomatologia, varia de pessoa para pessoa e não existe relação entre as características físicas e um maior ou menor desenvolvimento intelectual. O desenvolvimento está intimamente ligado com os estímulos, com o ambiente familiar, social, económico, cultural e educacional onde estão inseridos.

Figura 3 – Traços características das mãos de crianças com Síndrome de Down

Fonte: Veríssimo, 2021, p.8

Figura 4 – Traços características das mãos de crianças com Síndrome de Down

Fonte: Veríssimo, 2021, p.8

Como mencionado anteriormente o Síndrome de Down recebe o código Q-90 na Classificação Internacional de Doenças (CID-10).

Esta classificação representa exclusivamente a patologia principal e associações, que compõem o diagnóstico clínico de uma pessoa, enquanto que, a Classificação Internacional Funcional, Incapacidade e Saúde (CIF) pertence à “família” das classificações internacionais desenvolvida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e descreve a saúde e os estados relacionados com a saúde, numa linguagem unificada e padronizada (OMS, 2004).Consiste numa ferramenta universal tanto na abordagem funcional e biopsicossocial como na forma como é descrita o funcionamento da deficiência. A classificação define os componentes da saúde e alguns componentes do bem-estar relacionados com a saúde, está dividida em duas partes e utiliza como critério de avaliação para a parte

1 – Funcionalidade e Incapacidade dois grandes dominós: (1) Funções e Estruturas do Corpo, e (2) Actividades e Participação. Estes domínios são descritos com base na perspectiva do corpo, do indivíduo e da sociedade. A Funcionalidade é um termo que abrange todas as funções do corpo, actividades e participação; analogamente, a incapacidade é um termo que inclui deficiências, limitação da actividade ou restrição na participação. Na parte 2 – Factores Contextuais, (tabela 1) a CIF relaciona os factores ambientais que interagem com todos estes constructos, e, por conseguinte, permite ao utilizador registar perfis úteis da funcionalidade, incapacidade e saúde dos indivíduos em vários domínios (OMS, 2004).

Tabela 1- Visão geral da CIF

Fonte: OMS, 2004, p.14

Relativamente aos factores ambientais externos, estes incluem as atitudes sociais, barreiras arquitectónicas, estruturas legais e até mesmo características climáticas e geográficas. Os factores pessoais internos incluem o género, a idade, o estilo de vida, a educação, a profissão, experiências vividas e tudo que pode influenciar a forma como uma pessoa lida com a sua própria incapacidade (OMS, 2004).

Em suma, a CID-10 e a CIF são ferramentas complementares, dado que, duas pessoas com a mesma doença podem ter níveis diferentes de funcionamento, e duas pessoas com o mesmo nível de funcionamento não têm forçosamente a mesma condição de saúde. Enquanto a CID-10 possibilita o diagnóstico de doenças, perturbações ou outras condições de saúde, a CIF permite informações adicionais sobre a funcionalidade.

Neste sentido, a utilização conjunta aumenta a qualidade da informação, o que se traduz numa imagem mais ampla e mais significativa da realidade da saúde e mais fidedigna, para suportar qualquer tomada de decisão, inclusive nas estratégias de aprendizagem. O desenvolvimento da criança com Síndrome de Down é um processo mais moroso e poderá ser agravada por outras patologias associadas, pelo que a identificação das reais necessidades se reveste de crucial importância.

3. Principais Patologias associadas à Síndrome de Down

Os indivíduos com síndrome de Down sofrem com uma variedade de patologias que influenciam significativamente o seu desenvolvimento e qualidade de vida, pelo que devem ser diagnosticadas de forma precoce (Alvarez &Marques, 2021). Os sistemas com maior prevalência de desenvolvimento de patologias são: o aparelho da visão, o aparelho auditivo, o sistema cardiovascular e o sistema locomotor o que impactam significativamente no desenvolvimento cognitivo e intelectual.

Devido a fragilidade do sistema imune e alterações nas vias respiratórias, tem também maior risco de pneumonia. Os problemas gastrointestinais também são frequentes, assim como, alterações da função da tiróide, alterações no sangue e diabetes (Alvarez &Marques, 2021; Veríssimo, 2021).

4. Inclusão de alunos com Síndrome de Down e a psicopedagogia

De acordo com Morgado (2009) o fundamento ideológico da inclusão tem como argumento principal os benefícios que,quer os alunos com necessidades de apoio especial, quer os restantes alunos vão ter pelo facto de aprenderemem conjunto. Independentemente da razão que justifica a necessita de cuidados educativos especiais, o efeito aglutinador e promotor de virtudes de sociabilização, interajuda e partilha conhecimento em ambiente escolar pode ser uma alavanca crucial para colmatar deficiências em contexto de individualismo e egoísmo, tão comuns nas idades escolares (Ndala, 2019).

No entanto, para fomentar o desenvolvimento de escolas mais inclusivas e com mais qualidade é necessário dotar os professores de ferramentas conceptuais e metodológicas capazes de corresponder às exigências da prática educativa em contexto de inclusão. A inclusão de alunos com síndrome de Down, face as suas necessidades e ritmo de aprendizagem implica que o professor disponha que conhecimentos pedagógicos e de psicologia, mas também de algum tipo de ajuda adicional.

A inclusão pressupõe que o professor e toda a comunidade escolar, assim como a família se envolvam neste processo e isso obriga muitas vezes a uma reestruturação da própria escola, de currículos e materiais de apoio (Ndala, 2019). O perfil de aprendizagem característico de alunos com síndrome de Down é mais lento, são frequentes as dificuldades de visão e audição, as dificuldades de comunicação oral e escrita, e a capacidade de concentração é mais reduzida, assim como, podem apresentar dificuldades na aquisição e consolidação de novos conhecimentos.

A identificação destas e outras dificuldades, é fundamental para adequar o estilo e ritmo de ensino aos estilos de aprendizagem. A diferenciação pedagógica é considerada como um meio de atenuar as dificuldades dos alunos com necessidades especiais, no entanto, como qualquer outro processo precisa de ser planeado, estruturado, gerido numa psicopedagógica. A psicopedagogia é considerada como a área do saber que estuda o processo de aprendizagem e seus eventuais bloqueios.

Bossa (2000) considera a estruturação da psicopedagogia como corpo do conhecimento assim com áreas de estudos interdisciplinar, um cujo foco central é a aprendizagem e suas patologias, socorrendo-se da necessidade da busca de soluções para problemas de aprendizagem. A elaboração de um diagnóstico psicopedagógico visa compreender a forma como o aluno aprende e os desvios que ocorrem nesse processo.

Para Weiss (2020) todo diagnóstico é, em si, uma investigação, é uma pesquisa, é o pilar para uma intervenção eficiente e tem como objectivo identificar os desvios e os obstáculos básicos de um modelo de aprendizagem. Este aspecto é fundamental na medida em que existem muitos factores que interferem no processo de aprendizagem.

Para melhor compreender o processo de ensino e aprendizagem Bossa (2000) afirma que a psicopedagogia deve estudar as características da aprendizagem humana preocupando-se com questões de como se aprende e como se produzem as alterações na aprendizagem como reconhecê-las, tratá-las e preveni-las.

Actualmente a psicopedagogia trabalha como uma concepção de aprendizagem segundo a qual participa desse processo um equipamento biológico com disposições afectivas e intelectuais que interferem na forma de relação de sujeito com o meio, e essas disposições influenciam e são influenciadas pelas condições socioculturais do sujeito e do seu meio. Fernandez (2001) e Bossa(2000) afirmam que aprender depende da articulação entre organismo-inteligência desejo e vinculo formado entre ensinante e aprendente, o qual tem sua matriz nas suas relações mãe e filho.

Para estes autores o fracasso na aprendizagem deve ser investigado a partir desse paralelo juntamente com a situação vinculada entre a sociedade e indivíduo. Assim, o diagnóstico em psicopedagogia não se limita a analisar e avaliar quem aprende, tem de se ter em consideração também quem ensina e todo o contexto, que inclui escola, família e sociedade.

5. Contributos do psicólogo perante um caso de Síndrome de Down

A Psicologia pode auxiliar no desenvolvimento da pessoa com Síndrome de Down em colaboração com a escola e com os professores, mas também, junto da família e da sociedade (Folly& Rodrigues, 2010). A família quando sabe que vai ganhar uma criança com Síndrome de Down pode passar por diversas sensações seja pela falta de informação seja pela quebra de expectativas, sentimentos de culpa ou medo.

Por isso o acompanhamento de um psicólogo mesmo ante do nascimento da criança será de grande importância até mesmo para reforçar os laços familiares. Com isso entre os diversos objectivos da terapia como intervenção comos pais é possível destacar:

(i) Identificar e treinar habilidades com os pais sobre como lidar com estes novos momentos,

(ii) Trabalhar o emocional da família com os pais sobre como lidar com este novo momento,

(iii) Trabalhar o emocional da família com informações correctas é possível lidar melhor com qualquer sentimento negativo que possa surgir,

(iv) Esclarecer o porque é importante criar regras de convivências e limites em casa,

(v) Trabalhar com a família no desenvolvimento da auto-estima da autonomia da criança para que ela realize com responsabilidade, compromisso as actividades domésticas.

Dentro do ambiente da escola, quando ouvimos falar em inclusão e necessário pensar sobre o que isso significa, a inclusão escolar é a forma de o espaço adaptar-se para as necessidades da pessoa com deficiência e não o contrário. Por isso, a partir do momento em que as crianças com Síndrome de Down já podem frequentar a escola é muito importante que o psicólogo também esteja presente.

O motivo disso não é apenas para auxiliar os pais, mas também para acompanhar o desenvolvimento da criança dentro do espaço escolar tanto na aprendizagem como no convívio social com as outras crianças. Aqui o profissional de psicologia terá que trabalhar, junto de professores e dos alunos um ambiente acolhedor para estes estudantes no qual deve ter o seu desenvolvimento de acordo com a sua possibilidade de aprendizagem. É importante sempre reforçar as regras de convivência para que haja respeito entre os alunos, nesse sentido melhora a comunicação entre eles e uma forma de incentivar que todos participem de brincadeiras e experiências educativas.

Relativamente ao ambiente corporativo, planos de carreira bem definidos além da possibilidade de crescimento e desenvolvimento de novas habilidades são apenas alguns dos factores que devem ser observados. Por isso o psicólogo além de auxiliar a realização dos processos selectivos de forma adequada ( de acordo com as capacidades da pessoa com Síndrome Down ) é importante em muito outros pontos que envolvam a inclusão como:

(i) Prepará-lo como novas capacidades e treinamentos que são importantes para a sua qualificação profissional,

(ii) Promover ações na empresa que aproximem os familiares dos empregados com a pessoa com Síndrome de Down para se familiarizar ainda mas com o ambiente,

(iii) Acompanhar o colaborador que em seu processo de evolução de trabalho oferecendo feedback adequado que possibilitem o aprendizado de novas funções e cargos mais altos com o passar do tempo.

Com os próprios indivíduos, independentemente da abordagem psicológica, o psicólogo em momento exclusivo com a pessoa com Síndrome de Down irá auxiliar o desenvolvimento emocional e comportamental do paciente.Com a terapia a pessoa irá compreender mais sobre o seu jeito de ser expandindo a autoconhecimento, que em um facto muito importante para ele se adaptar em várias situações do dia a dia.

 Durante o encontro será possível desenvolver a autonomia reconhecendo seus limites e a partir dai buscar ferramentas para evoluir. É possível também trabalhar a auto-estima e o autocontrole questões fundamentais para qualquer pessoa. É de considerar que a avaliação de um profissional, o atendimento pode ser efectuado de diversos modos conforme a disponibilidade de meios inclusive por meio de operadores de saúde facilitando a frequência das sessões e a continuidade do tratamento.

6. Metodológia utilizada

O presente trabalho foi desenvolvido no âmbito do acompanhamento do Departamento de Educação e Ensino na Área do Ensino Especial, tendo participado no estudo oito crianças com diagnóstico confirmado de Síndrome de Down, todas a frequentar o ensino primário e com idades compreendidas entre os 6 e 11 anos.

Dois alunos frequentam instituições de ensino primário regular no município de Landana e seis frequentam o ensino especial no complexo escolar Barão de Puna em Cabinda. Considerou-se como critérios de inclusão da pesquisatodas ascrianças alvo de acompanhamento no ano lectivo de 2021-2022, com diagnóstico de Síndrome de Down, independentemente do género, faixa etária, nível de classe.

 Tendo em consideração a pouca idade das crianças e a sua condição, optou-se por um estudo descritivo, com uma abordagem baseada na observação e na informação disponibilizadas pelos professores e familiares, através de entrevistas semiestruturadas. Relativamente aos professores foram realizadas cinco entrevistas, o que representa a totalidade dos professores dos alunos em estudo.

Em relação aos familiares, apenas seis mães aceitaram participar. As entrevistas aos professores foram focadas na identificação da percepção sobre as vantagens da inclusão de alunos com Síndrome de Down nas turmas regulares. As entrevistas com as mães centraram-se na percepção sobre o progresso de desenvolvimento dos filhos e identificação das principais dificuldades.

7. Discussão dos resultados

Participaram dessa pesquisa oito crianças com Síndrome de Down, com idade média de 9,5 anos, sendo a idade mínima de 8 anos e a máxima de 11 anos, acompanhadas por técnicos superiores do Departamento de Educação e Ensino na Área do Ensino Especial Em relação ao sexo: 75% (6) eram do sexo feminino e 25% (2), do masculino.

Com base na observação é plausível afirmar que a maioria das crianças com Síndrome de Down participantes desta pesquisa apresentaram doenças associadas, no entanto, em termos quantitativos sobre a informação recolhida 62,5% (5) manifestou problemas cardiovasculares, 50% (4) revelou distúrbios visuais e auditivos, 37,5% (3) dificuldades de comunicação oral e escrita e 25% (2) dificuldades de locomoção.

A presença de distúrbios e patologias associadas ocorre, frequentemente, devido às condições genéticas da síndrome (Veríssimo, 2021). A totalidade das crianças avaliadas não são acompanhadas em terapias multidisciplinares, no entanto, apenas 25% (2) são regularmente acompanhadas por psicólogo.

Das mães consultadas apresentam grande dificuldade de auxiliar os filhos por um lado a questão de inexperiência por outro a falta de incentivo da sociedade e família, alegadamente algumas mães foram abandonadas pelos parceiros, não sabendo ao certo o porque da deformidade dos seus filho alega-se como obra de divindades.

Na qualidade de Técnico do Ensino Especial há a exigência de procedimentos legal tais como, a  interacção constante com os pais e encarregados de educação  elaboração do teste da anamse no ato de matriculas os contactos dos pais ficam registados mantendo a possibilidade de interacção no caso de algum inconveniência ou assidente no decurso das aulas.

De acordo com os cuidadores e os professores, nem todas as crianças frequentam as terapias multidisciplinares com a regularidade adequada, por falta de serviços disponíveis, o que condiciona o seu desenvolvimento físico e intelectual. Em termos de cuidadores, e na sequência da recolha de informação junto das famílias o sentimento que prevalece é o  de desamparo quer da parte do Estado e da sociedade as mesmas sentem-se  sozinhas na luta do cuidar do parente com Síndrome de Down.

Reconhecem que os filhos têm necessidades que não estão a ser trabalhadas pela indisponibilidade de acesso a fisioterapia e terapias de fala. Nas mães que aceitaram a participação do  estudo é patente o  sentimento de impotência e desgosto por não terem mais conhecimento e possibilidades de aprendizagem para colaborar de uma forma mais assertiva no desenvolvimento físico e intelectual dos seus filhos.

Observou-se na maioria dos casos algum sentimento de frustração por parte das mães pela não inclusão na definição de objectivos de aprendizagem apesar de compreenderem as dificuldades vivenciadas pelos professores. É interessante destacar que a divergência de percepção sobre a escola inclusiva, nas mães que participaram no estudo, decorre não das vantagens inerentes e amplamente reconhecidas, mas dos receios dos efeitos negativos, num contexto de um sentimento de protecção por vezes demasiado condicionante.

Neste contexto, é obvio que são necessários planos de intervenção que ajudem e capacitem os cuidadores a potenciar o desenvolvimento dos alunos com Síndrome de Down, mas também é necessário um maior e melhor apoio das instituições de ensino no seu todo o que cruza as políticas públicas sobre a edução.

Relativamente aos professores curiosamente, quer no ensino regular, quer no ensino de alunos com necessidades especiais, existe um lamento comum o tamanho das turmas e assim como o numero de alunos.

Sobre a percepção sobre as vantagens da inclusão, todos são unânimes que as vantagens dependem da gravidade das patologias e que qualquer processo de inclusão tem de ser assegurado em termos de condições materiais e de recursos humanos.

8. Considerações finais

A Síndrome de Down é uma condição genética, definida por um cromossomo 21 extra nas células do corpo, conhecido também por trissomia do 21, e existem cada vez mais pessoas com a síndrome que têm uma vida considerada perfeitamente normal. No entanto, e para que isso seja uma realidade é fundamental uma aposta no desenvolvimento físico e intelectual, a qual deve ser iniciada nos primeiros anos.  Quanto mais precoce for a intervenção, maiores são as probabilidades de sucesso de um percurso de desenvolvimento. Uma educação adequada é um bem enorme que produz benefícios pessoais durante toda a vida.

Relativamente aos alunos em estudo, a sua condição e as patologias associadas são muito limitadoras a que acresce a escassez de oferta de serviços de terapia e fisicoterapia. Falar de inclusão de alunos com Síndrome de Down, pelas deficiências inerentes, mas também pelas patologias associadas obriga à criação de um olhar profundo e abrangente para responder às inúmeras necessidades de uma criança com Síndrome de Down, mas também aprender a valorizar as capacidades de uma entrega genuína, que desrespeita horários e se foca em resultados.

Conhecedores da entrega dos alunos com Síndrome de Down, os professores lamentam a falta de materiais apelativos e adequados aos alunos com necessidades especiais, assim como, de tecnologias que possibilitem percursos de aprendizagem mais interactivos. Os alunos e apesar das suas tenras idades evidenciaram ao longo do estudo uma capacidade de resiliência e perseverança notável, quer em ambiente de inclusão, quer nas turmas de necessidades educativas especiais.

As necessidades de modernização do país relativamente ao sistema educativo inclusivo, levantam inúmeras questões que vão desde a formação de professores, concepção de materiais didáticos, adaptação das instalações para que possam ser frequentadas por crianças com limitações no caso de Síndrome de Down e se é certo, que a comunidade educativa se encontra motivada para trabalhar de acordo com o novo paradigma, também é verdade que há necessidade de elencar as necessidades práticas, quantificá-las e elaborar um calendário credível para a sua concretização por etapas.

Não sendo uma tarefa fácil, o início da concretização deste projeto ambicioso começa inevitavelmente pela formação de professores, á elaboração de um Manual de Apoio para Professores e pela sua motivação para que se preparem para um tipo de escola mais adequada às necessidades de formação no séc. XXI, em que nenhum cidadão poderá ser excluído do processo de aprendizagem, só porque apresenta alguma incapacidade.

O trabalho pedagógico de sistematização das necessidades educativas especiais, representa igual desafio para a Escola e para a sociedade em geral, razão pela qual é necessário o envolvimento das entidades oficiais, dos professores, dos técnicos especializados em certas dificuldades específicas (terapia da fala, dislexia, etc.) que em conjunto contribuirão para a resolução do acesso da Escola para Todos.

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¹Professora Doutora em ciências da Educação na especialidade de NEE
Formada pela UNL( Universidade Nova de Lisboa) em parceria com ISPA- Lisboa.
Endereço: Angola- Cabinda
deolindandala@gmail.com
ORCID  https://orcid.org/000-0003-4216-2414