REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10798990
Marcella Murta de Matos[1]
Heloize da Cunha Charret[2]
1. INTRODUÇÃO
A educação, enquanto categoria teórica, tem seu núcleo na dinâmica da vida social, sendo um complexo constitutivo da sociedade que possui uma função importante nas formas de reprodução do ser social, uma vez que a sociedade está organizada a partir de contradições sociais, econômicas e diversidades, sejam elas culturais e/ou religiosas. Segundo Freire, o ambiente escolar “se revela não só nos conteúdos, livros e aulas, mas nas experiências informais que ocorrem nas salas de aula, no recreio, no pátio, em variados gestos dos alunos, do pessoal administrativo, do pessoal docente, que se cruzam cheios de significação”. (FREIRE, 1996, p.44)
Com acesso à educação, os cidadãos se apoderam de condições que colaboram para o desenvolvimento de um país, seja na área da saúde, ciência, segurança, justiça, tecnologia, desenvolvimento de pesquisas, entre outras.
Freire reforça que, “por meio da educação, os sujeitos podem se constituir senhores de suas vidas, autores de sua história”. (2000, p. 152)
Conforme Campos (2015) , no atual contexto social, político e pedagógico, que demanda por novos saberes e compreensão de relações sociais, palavras como, equidade, racismo, bullying, identidade de gênero, entre outras, são constantes nos debates públicos, e vem cada vez mais sendo levadas para o espaço escolar, no intuito da formação da cidadania, emancipação dos sujeitos sociais e inclusão social, com oportunidade de orientar os alunos para que se tornem mais consciente e com empoderamento da sua própria história, sendo portanto, fundamental o papel de uma equipe multidisciplinar para trabalhar essas expressões da sociedade com os alunos.
É em meio a este espaço de relações sociais diversificadas e fazendo parte da equipe multidisciplinar nas escolas, que o assistente social se insere, sendo chamado a mediar o conflito de interesse entre sociedade e Estado, sendo um profissional designado para prestar serviços sociais através de um apoio administrativo-burocrático nas instituições às quais está vinculado, exercendo junto ao usuário, ações de cunho educativo, moralizador e até mesmo disciplinador.
Conforme dados publicados no site do Conselho Federal de Serviço Social- CFESS, o reconhecimento sobre a necessidade do profissional de Serviço Social nas escolas desencadeou em meados dos anos 2000 um movimento histórico da categoria profissional, por meio das entidades organizativas da categoria, CFESS e Conselhos Regionais de Serviço Social- CRESS, aliados a organizações dos executivos estaduais, regionais e a setores da rede de educação, os quais promoveram uma luta em prol do Serviço Social na educação pública.
No entanto, mais especificamente no ano de 2006, o tema Serviço Social na educação passou a constar na agenda de fóruns, seminários e debates do conjunto CFESSS/CRESS, e posteriormente, nos anos de 2011 e 2012, repercutiu nas produções científicas: “Subsídios para o Debate sobre o Serviço Social na Educação (CFESS/CRESS,2011) e Subsídios para a atuação de Assistentes Sociais na Política de Educação (CFESS/CRESS,2012)”. Os dados publicados no site do CFESS registram que foram quase duas décadas para que o Projeto de Lei da Educação n.º 3688/2000, que dispunha sobre a introdução de assistente social no quadro de profissionais de educação na escola, virasse a Lei n.º 13.935/2019, publicada em 11 de dezembro de 2019, que dispõe sobre a prestação de serviços de psicólogos e assistente sociais nas redes públicas de educação básica, sendo essa “vitória”, resultado de uma árdua luta da categoria dos profissionais do Serviço Social e da Psicologia,
Segundo Amaro (2017), a atuação do assistente social e psicólogo, possibilitará conhecerem melhor a realidade das instituições de ensino empregadoras e apoiará os alunos, suas famílias e corpo docente das escolas, buscando articulação com as políticas públicas, a fim de oferecer melhor respostas às demandas apresentadas, para garantia do desenvolvimento escolar dos alunos, contribuindo por meio de suas estratégias de intervenção com o acesso e permanência dos alunos na escola pública.
Como resultado da publicação da Lei n.º 13.935/2019, Estados e Municípios começaram a se organizar, e contratar assistentes sociais e psicólogos para atuarem em escolas da educação básica, oportunidade de plena ascensão e ampliação deste espaço organizacional para tais profissionais.
Neste contexto de oportunidade para a inserção do assistente social na educação básica e frente as diversas expressões da questão social impostas no ambiente escolar, que traz fenômenos como vulnerabilidade social, racismo, homofobia, violências, evasão escolar, intolerância, fome, trabalho infantil, drogas, gravidez na adolescência, entre outros, se insere o assistente no contexto escolar do Colégio Militar de Salvador, atuando como profissional estratégico, na relação de mediação do tripé escola x aluno x e família, no intuito de contribuir com o desenvolvimento social e pedagógico dos alunos, em seu processo de formação como cidadãos.
Desta forma, no presente artigo tem como objetivo apresentar as ações profissionais desenvolvidas pelo assistente social no CMS, entre os anos de 2017 a 2021 e servir como subsidio para o direcionamento das ações profissionais da categoria no campo de educação da educação básica.
O documento está organizado da seguinte forma: com uma breve descrição dos marcos legais para atuação do assistente social na educação básica, discorrendo ainda sobre a inserção do trabalho do assistente social no Colégio Militar de Salvador, até a apresentação das ações desenvolvidas pelo assistente social junto a equipe multidisciplinar da Seção Psicopedagógica da Instituição. Na conclusão serão apresentados os apontamentos relativos à prática profissional e sua relevância.
2. MARCOS LEGAIS PARA ATUAÇÃO DO ASSISTENTE SOCIAL NA POLÍTICA DE EDUCAÇÃO
Nos anos de 1930, o Brasil passou por um processo de desenvolvimento econômico, social, e participação política, acompanhados de período de autoritarismo e crise econômica. Neste período ocorreu um crescimento econômico no país e elencado a isto, houve a participação social da população, exigindo melhores condições de vida, sobretudo do setor público, com prestação de serviços sociais, que exigiram do Estado, pensar políticas públicas no intuito de amenizar os movimentos da sociedade menos favorecida. Mas é importante ressaltar que este processo de evolução das políticas sociais foi lento e desigual, sem atender a necessidade da população que realmente necessitava.
É a partir do marco da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 1988) que fica mais visível o dever do Estado em promover de maneira universal os serviços sociais básicos, ofertados por meios de políticas sociais de saúde, previdência, assistente social e educação para o cidadão.
Ao se pensar sobre a política de educação, a Constituição Federal de 1988, no art. 205, define um padrão comum de políticas sociais cuja organização se dá por meio de um sistema unificado, da universalização de serviços, que provoca mudanças significativas do ponto de vista do planejamento das políticas sociais.
A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. (BRASIL, 1988)
A educação como direito, faz parte da proteção social, numa perspectiva de seguridade social mais ampliada. Ela fomenta a cooperação com a família, com as crianças e adolescentes atendidos na escola, além de poder contribuir com os profissionais e agentes de ensino que nela atuam. Segundo o autor Almeida, em sua participação na brochura do CFESS/CRESS: “Subsídios para o debate sobre Serviço Social na Educação” (CFESS/CRESS,2012), aponta que
[…] a educação, organizada sob a forma de política pública, se constituiu em uma das práticas sociais mais amplamente disseminadas de internalização dos valores hegemônicos na sociedade capitalista. A partir das lutas sociais, em especial da classe trabalhadora pelo reconhecimento de seus direitos sociais, tornou-se também condição importante nos processos de produção de uma consciência própria, autônoma, por parte desta própria classe e de suas frações. Um território disputado pelas classes sociais fundamentais, cujas lutas se expressam em diferentes contornos e processos que a política educacional assumiu ao longo da história. (CFESS/CRESS, 2012, p. 12)
Com acesso à educação, os cidadãos se apoderam de condições que colaboram para o desenvolvimento de um país, seja na área da saúde, ciência, segurança, justiça, tecnologia, desenvolvimento de pesquisas, entre outras.
Segundo Freire (2000, p. 152), “por meio da educação os sujeitos podem se constituir senhores de suas vidas, autores de sua história”.
A inserção do direito fundamental à educação no texto constitucional brasileiro é o resultado de um longo processo histórico marcado por avanços e retrocessos. A capacidade das ações do poder público voltadas para a inserção de todo o conjunto da população brasileira no contexto da educação formal, carece ainda de orientações normativas, pois se trata de direito fundamental do ser humano.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira- LDB (BRASIL, 1996), considerada como um dos principais instrumentos jurídicos norteadores da política educacional no Brasil, destaca entre seus objetivos, “proporcionar a população o direito a uma educação de qualidade, que contribua para emancipação/libertação dos sujeitos sociais”. No entanto, o viés excludente velado do sistema educacional público tem gerado profundos embates entre as classes sociais, com sua trajetória fortemente marcada pelas disputas sociais, que se imprimem nos diversos níveis e modalidades que constituem a política educacional, tanto na perspectiva de um direito social e humano, ainda não universalizado, quanto na sua subordinação à forma geral de mercadoria, que se expande por amplas dimensões da vida social.
Na política de educação, o assistente social na maioria das vezes se insere atuando em equipes multidisciplinares e “sua participação é útil no sentido interdisciplinar, e serve para subsidiar os demais atores escolares no enfrentamento de questões sociais sobre as quais, geralmente a escola não sabe de que maneira agir e intervir”. (AMARO, 1997, pág.15), exigindo do assistente social além de uma visão crítica e reflexiva, baseada na leitura da realidade vivenciada pelos usuários em seus aspectos na totalidade, mas também pensar sua atuação integrada a dimensão investigativa do trabalho profissional, utilizando a sistematização dos processos de trabalho para seu reconhecimento profissional e conquista de maior autonomia nos estabelecimentos de ensino onde atuam.
Apesar do trabalho do assistente social na educação não ser algo recente, a atuação do assistente social na educação básica tem seu marco regulatório no ano de 2019, com a Lei n.º 13.935 (BRASIL, 2019), que traz a exigência pela atuação do assistente social na educação básica, apresentando lacunas na legislação, devido ao pouco discorrer sobre a papel do assistente social na educação básica.
Art. 1º As redes públicas de educação básica contarão com serviços de psicologia e de serviço social para atender às necessidades e prioridades definidas pelas políticas de educação, por meio de equipes multiprofissionais.
§ 1º As equipes multiprofissionais deverão desenvolver ações para a melhoria da qualidade do processo de ensino-aprendizagem, com a participação da comunidade escolar, atuando na mediação das relações sociais e institucionais.
§ 2º O trabalho da equipe multiprofissional deverá considerar o projeto político-pedagógico das redes públicas de educação básica e dos seus estabelecimentos de ensino.
Art. 2º Os sistemas de ensino disporão de 1 (um) ano, a partir da data de publicação desta Lei, para tomar as providências necessárias ao cumprimento de suas disposições. (BRASIL, 2019)
Para identificar o modo como os assistentes sociais executam o seu exercício profissional, torna-se necessário reconhecer que o Serviço Social vem se constituindo como profissão, inscrito na divisão social e técnica do trabalho, regulamentada pela Lei nº 8662/93, de 07 de junho de 1993, com alterações determinadas pelas Resoluções CFESS nº 290/94 e nº 293/94, e balizada pelo Código de Ética Profissional, aprovado através da resolução CFESS nº 273/93, de 13 de março de 1993.
Os poucos apontamentos apresentados na lei n.º 13.935/2019 (BRASIL/2019), e sem definições sobre a atuação do assistente social nas escolas de educação básica contribuem para que ainda que timidamente, hoje os profissionais de Serviço Social na educação atuem muitas vezes, de maneira precária, sem definição de seu processo de trabalho, sendo “capaz de forjar certas rotinas e procedimentos de registro de suas atividades práticoinvestigativas” (ALMEIDA, 1997, p.1), não reconhecendo seu campo de trabalho e tendo que criar estratégias para levantamento de suas demandas.
Diante disto, nos subitens a seguir, como maneira de auxiliar outros assistentes sociais e demais leitores, será apresentado o trabalho do assistente social no CMS e suas principais atividades.
3. A INSERÇÃO DO TRABALHO DO ASSISTENTE SOCIAL NO COLÉGIO MILITAR DE SALVADOR
A educação por algum tempo já não é mais palco exclusivo para questões curriculares e pedagógicas. Como espaço que envolve diversos sujeitos, cada um carregando diversidades, histórias e mazelas sociais, faz com que este espaço dinâmico e dialético, apresente cada vez mais a necessidade da atuação de outros profissionais, para além de professores, dentre estes assistentes sociais.
A inserção do assistente social na educação básica do Colégio Militar de Salvador teve início no ano de 2014, por meio da contratação de uma assistente social civil, prestadora de serviço para Associação de Pais e Mestres-APM do Colégio Militar, atuando principalmente com a emissão de relatórios sociais de famílias dos alunos em situação de vulnerabilidade social, que informavam dificuldade financeira para pagamento da Quota Mensal Escolar – QME[3], auxiliando no embasamento de sindicâncias administrativas para dispensa do pagamento da QME.
No ano de 2017, o Colégio Militar de Salvador recebeu sua primeira assistente social militar, a qual passou a atuar com suas ações profissionais inseridas na equipe da Seção Psicopedagógica do CMS, conforme previsto nas Normas de Psicopedagogia Escolar da Educação Básica no Sistema Colégio Militar do Brasil- NPEEB/SCMB, publicada em 2016, a qual teve sua última versão atualizada pela Portaria – DECEx / C Ex Nº 68, de 23 de março de 2022, com a finalidade de “regular e fundamentar os diversos procedimentos e
atividades da Seção Psicopedagógica no âmbito do Sistema Colégio Militar do
Brasil (SCMB)”.
No art. 2º NPEEB/SCMB, apresenta em seus objetivos:
- – especificar as atribuições da Seção Psicopedagógica;
- – estabelecer as atividades a serem desenvolvidas na Seção Psicopedagógica;
- – orientar o planejamento e a execução das atividades relacionadas à Psicopedagogia Escolar, no âmbito do SCMB; e
- – alinhar-se à prática da gestão do ensino que orienta o planejamento anual dos estabelecimentos de ensino (Estb Ens) no âmbito do Departamento de Educação e Cultura do Exército (DECEx), em consonância com a legislação vigente referente à Educação Básica. ((MINISTÉRIO DA DEFESA,2022)
A Seção Psicopedagógica do CMS entre os anos de 2017 a 2021 estava composta por um chefe de seção (oficial superior, especialista em psicopedagogia), um psicólogo, duas pedagogas (orientadoras educacionais), uma assistente social e um agente administrativo.
Com competências e atribuições definidas, os profissionais das seções psicopedagógicas dos Colégios Militares do SCMB norteiam as suas ações, com base no Código de Ética Profissional e demais legislações que amparam cada categoria profissional, bem como nas competências de cada integrante da equipe especificadas na NPEEB/SCMB, a qual cita por exemplo que ao assistente social compete:
Art. 19. I – assessorar o Chefe da Seção Psicopedagógica, no que se refere à assistência social do corpo discente; II – levantar o perfil socioeconômico dos discentes;
III – levantar dentro do Estb Ens os alunos em situação de vulnerabilidade socioeconômica e risco social, e fazer o acompanhamento e encaminhamentos, se for o caso, objetivando seu melhor aproveitamento escolar;
IV – propor ao Chefe da Seção Psicopedagógica estratégias de intervenção para a proteção dos alunos em situação devulnerabilidade socioeconômica e risco social;
V – articular-se com a Rede de Assistência Social e Saúde, assim como com o Serviço de Assistência Social das Forças Armadas, para possíveis encaminhamentos;
VI – realizar visitas domiciliares e acompanhar as famílias dos alunos em situação de evasão escolar, alto índice de faltas, situação de risco ou vulnerabilidade social;
VII – realizar estudo social com elaboração de parecer social à redução da Quota Mensal Escolar (QME);
VIII- estabelecer contato com os Conselhos Tutelares para possíveis encaminhamentos e devidos acompanhamentos de alunos e/ou familiares;
IX– participar dos atendimentos realizados com os pais e responsáveis e alunos envolvidos em situações de conflitos familiares ou vulnerabilidade socioeconômica, em conjunto com os demais profissionais da Seção, realizando, inclusive, visita domiciliar, quando se fizer necessário; e
X- sensibilizar e promover ações, em parceria com a Equipe Multidisciplinar, sobre cidadania, ética, pluralidade cultural e outros aspectos inerentes às competências socioemocionais. (MINISTÉRIODA DEFESA,2022)
Assim, diante do leque de competências subscritas na norma, o assistente social define suas ações e realiza seus atendimentos aos usuários do sistema de ensino, tendo autonomia na decisão de suas atividades e intervenções.
3.1. AÇÕES DESENVOLVIDOS PELO ASSISTENTE SOCIAL JUNTO A SEÇÃO PSICOPEDAGÓGICA DO COLÉGIO MILITAR DE SALVADOR
ENTRE OS ANOS DE 2017 A 2021
No intuito de sistematização das ações e atendimentos realizados pelos profissionais da equipe multidisciplinar da sessão psicopedagógica do CMS, instrumentos como prontuário individual do aluno foram utilizados para registro das intervenções, respeitando os limites éticos de cada profissão, no compartilhamento das informações sobre os atendimentos entre os integrantes da seção.
Cada profissional também utilizava de instrumentos técnicos de registro profissional, individualizados, tais como diário de campo e relatórios, para detalhamento de suas intervenções e pareceres, para assessoramento ao Diretor de Ensino, e/ou outro profissional da Instituição, na tomada de decisões. Por esse artigo se tratar especificamente do trabalho desenvolvido pelo assistente social, serão apresentados no decorrer do documento, a seguir, os dados do trabalho desse profissional, no intuito de que as ações apresentadas possam auxiliar os colegas de profissão no exercício do trabalho junto às escolas de educação básica e assessoramento os demais leitores sobre o fazer profissional do assistente social neste campo de atuação.
A seguir estão destacados no quadro 1, os principais motivos que demandaram do assistente social do CMS, entre os anos de 2017 a 2021, seus atendimentos, conforme:
Quadro 1- Motivos dos atendimentos do assistente social
As questões de vulnerabilidade social dos alunos, sejam elas em caráter imediato e/ou temporário, foram assistidas pela assistente social no sentido de viabilização dos direitos dos alunos, visando condições de aprendizagem dignas, de forma que o impacto social vivenciado em seu seio familiar, afetem o mínimo possível seu desenvolvimento e desempenho escolar.
Para isso, foram realizados estudos sociais sobre a condição socioeconômica das famílias dos alunos que se enquadravam no perfil de vulnerabilidade social e/ou econômica, utilizando-se de instrumentos de coleta de dados como entrevista, questionário socioeconômico e visita domiciliar, quando necessário. Em alguns casos, além da dispensa da Quota Mensal Escolar, os alunos receberam por meio da Associação de Pais e Mestres, por intermédio do laudo social emitido pela assistente social, uniforme e material didático.
Os problemas sociais dos alunos, sejam eles de cunho familiar e/ou pessoal, tais como separação dos pais, problemas no relacionamento familiar, questões financeiras, ansiedade, depressão, problemas de autoimagem corporal, baixa auto-estima, entre outros, afetam diretamente, na maior parte das vezes, o processo de desenvolvimento pedagógico dos alunos. O assistente social, junto a equipe multidisciplinar, realiza intervenções junto à família e ao aluno, buscando identificar o problema, realizar orientações e em alguns casos, encaminhamentos para a rede de atendimento e apoio. O acionamento do conselho tutelar só foi realizado, após esgotar as possibilidades do CMS apoiar o aluno e sua família, ou verificar que se trata de uma violação dos direitos da criança e adolescente e de relevante impacto social.
Uma atividade importante realizada no CMS por todos os profissionais da equipe multidisciplinar da seção psicopedagógica foram as ações do Projeto Valores, o qual tinha o objetivo de realizar abordagens que contribuíssem com o desenvolvimento social e comportamental dos alunos, além do fortalecimento de competências atitudinais e socioemocionais. As atividades foram realizadas nos horários da orientação educacional, que eram disponibilizadas à equipe técnica da Seção Psicopedagógica, com todas as turmas da escola, semanalmente. Dentre essas, no caso específico aqui analisado, foram desenvolvidas pela assistente social por meio de atividade lúdicas, dinâmicas e/ou filmes, reflexões sobre os conteúdos atitudinais de temas transversais, tais como: cidadania, ética, pluralidade cultural, bullying, igualdade de direitos e justiça.
Os temas capacidade de convivência, respeito mútuo, tolerância, solidariedade foram trabalhados por meio da realização de gincana e torneios, envolvendo valores como cooperação, responsabilidade, disciplina, dedicação e voluntariedade. As atividades abarcaram todo corpo docente e discente da escola, apoiadas pela Legião de Honra do Colégio Militar e APM, com a realização de ações recreativas e campanhas solidárias para ajudar a Instituições carentes do município de Salvador- Ba.
Outra ação que também demandava atuação ao assistente social e psicólogo na Instituição de Ensino era o acolhimento e assistência aos professores e agentes de ensino em relação a questões de saúde, sobretudo saúde mental. Os casos necessários foram acompanhados e/ou encaminhados, além de acionada a rede de apoio do usuário, buscando melhor assisti-lo e orientá-los sobre seus direitos.
Já as atividades de assistência social das Forças Armadas, as quais foram executadas pela assistente social do CMS, e estão descritas abaixo, encontramse amparadas na Portaria Normativa n.º 1.173/MD, de 06 de setembro de 2006, que aprovou a Política de Assistência Social das Forças Armadas.
Trata-se de ações de caráter geral no âmbito militar, não estando diretamente ligadas à educação básica, cada uma normatizada por portaria específica, a qual determina os objetivos das ações dos programas.
Desta forma, a assistente social do CMS buscou criar estratégias para inserir algumas ações no cotidiano escolar de seu público de atuação, docentes e discentes, buscando difundir os programas sociais do Exército, uma vez que a maioria dos sujeitos assistidos pelo Estabelecimento de Ensino estão diretamente e/ou indiretamente ligados a família militar.
As ações realizadas neste sentido, buscou atender também a demandas dos alunos, seus familiares e corpo docente da escola. Dentre estas destacamse as atividades realizadas anualmente referente aos seguintes programas:
- Programa de Valorização da Vida- PVV (Portaria n.º 151-DGP, de 4 de agosto de 2016): tem por objetivo a promoção da qualidade de vida, da saúde biopsicossocial e proteção da vida humana (prevenção ao suicídio), dentro da Exército. No Colégio Militar de Salvador, para os alunos, as ações foram realizadas por meios de atividades lúdicas, musicais e recreativas, realizadas durante a Semana de Valorização da Vida, as quais ocorreram anualmente, no mês de julho, e buscou-se trabalhar com os alunos conteúdo de acordo com a faixa etária, retratando questão sobre a importância da qualidade de vida, prática de atividade física, fortalecimento das relações sociais, crenças, e etc. Já com o público adulto de militares e servidores civil (professores e agentes de ensino), foram realizadas palestras sobre prevenção ao suicídio e qualidade de vida, com o apoio do psicólogo da escola.
- Programa de Apoio à Pessoa com Deficiência – PAPD (Portaria n.º 239-DGP, de 9 de novembro de 2016): tem o objetivo de contribuir com a integração e a inserção social da pessoa com deficiência. Para isto, foram realizadas anualmente, no mês de março, a Semana da Inclusão nos Colégios Militares do Brasil. No CMS, as atividades foram coordenadas pelos profissionais da equipe Psicopedagógica e Seção de Atendimento Educacional Especializado, executadas em parceria com a seção de educação física, através da realização de práticas esportivas de inclusão, tais como basquete na cadeira de rodas, natação, futebol e handebol para deficientes físicos, corrida de cegos, trabalhando conteúdos atitudinais de respeito, empatia e cooperação.
- Programa de Prevenção à Dependência Química – PPDQ (Portaria n.º 183-DGP, de 12 de setembro de 2016): visa executar ações preventivas à dependência química pautadas em princípios éticos e na pluralidade cultural, planejadas e direcionadas ao desenvolvimento humano e a educação para uma vida saudável, valorizando a esfera das relações familiares e comunitárias. O conteúdo deste tema para os alunos do CMS foi abordado em conjunto com as pedagogas, nos horários de orientação educacional, por meio de abordagem reflexiva e dinâmica.
- Programa de Apoio Socioeconômico- PASE (Portaria n.º 131-DGP, de 18 de julho de 2016): trata-se de um programa direcionado especificamente ao público militar, com objetivo de enfrentamento das vulnerabilidades socioeconômicas por meio da prevenção em educação financeira. As ações foram executadas pela assistente social através da escuta ativa, orientação social e financeira. Casos específicos foram estudados por meio de uma anamnese social e encaminhados a escalão superior, no intuito da garantia do bem-estar mental e social do militar e sua família.
- Auxílio Funeral (Portaria n.º 250-DGP, de 10 de novembro de 2014): Em caso do falecimento de algum militar e/ou seu dependente, foi realizado o acolhimento a família e solicitado imediatamente o apoio da Seção de Assistência Social da Região Militar para viabilização dos direitos do militar e/ou seu familiar.
Em todas as ações e intervenções, desde os atendimentos individualizados aos alunos, seus pais/responsáveis e aos professores e agentes de ensino, a assistente social buscou contribuir com a formação pedagógica e cidadã dos alunos, entendendo que eles estão em processo de formação e definição de seu caráter, buscando garantir a eles condições de acesso à educação e estudo com qualidade.
4. APONTAMENTOS CONCLUSIVOS
A Lei Federal 13.935/19 (BRASIL, 2019), é mais um resultado de uma árdua luta da categoria dos profissionais do Serviço Social e da Psicologia na busca pela regulamentação dessas profissões para a atuação na educação básica.
Observa-se, que apesar do avanço na regulamentação da presença do assistente social na educação básica, a legislação federal em vigor, não dispõe sobre as atribuições do profissional nos espaços de trabalho escolar, nem tampouco apresenta elementos substanciais que direcionem o processo de trabalho profissional.
O espaço de atuação para o assistente social na educação básica precisa ser reconhecido e colocado em prática de forma efetiva, pois o assistente social surgiu no âmbito da educação para auxiliares na garantia dos direitos sociais de seus usuários.
As atividades sociais realizadas, conforme descritas neste artigo, foram realizadas para identificar e compreender as questões sociais dos estudantes, pais, responsáveis e comunidade, com objetivo de uma intervenção social capaz de modificar a realidade por eles vivenciada.
Vale ressaltar ainda, a importância do trabalho multiprofissional realizado pela Seção Psicopedagógica do CMS, tendo em vista um papel transformação e mudança social.
No que tange aos aspectos técnicos, o assistente social exerce um papel de assessoramento à Direção da Instituição, acolhimento e escuta diante das fragilidades do sistema macrossocial e apontar possíveis intervenções.
Evidentemente, em decorrência da expansão do serviço social nas instituições de educação básica, a produção deste artigo visou contribuir de maneira clara e ilustrativa, no compartilhamento das ações executadas pela assistente social do CMS em seu processo de atuação em instituição de educação básica, possibilitando aos leitores compreender a organização do trabalho e gerenciamento dos processos que demandam a atuação do assistente social, mas também, ser material de leitura que possa interessar a gestores educacionais e demais profissionais, contribuindo para entenderem a prática profissional do assistente social na escola e suas demandas de trabalho.
5. REFERÊNCIAS
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AMARO, Sarita Terezinha Alves. Serviço Social na Escola: O encontro da realidade com a educação. Porto Alegre: Sagra Luzzatto, 1997.
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______. Lei 13935 de 11 de dezembro de 2019. Lei sobre a prestação de serviços de psicologia e de serviço social nas redes públicas de educação básica. Brasília/DF, 2019.
CAMPOS, Carlos Roberto Pires. Gênero e diversidade na escola: práticas pedagógicas e refl exões necessárias / organizador Carlos Roberto Pires Campos – Vitória: Ifes, 2015.
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FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
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MINISTÉRIO DA DEFESA. EXÉRCIRO BRASILEIRO. SECRETARIA GERAL DO EXÉRCITO. Portaria – DECEx/CEx n.º 68, de 23 de março de 2022. Aprova as Normas de Psicopedagogia Escolar da Educação Básica no Sistema Colégio Militar do Brasil (EB60-N-8.003), 1ª Edição, 2022. Disponível em: http://www.sgex.eb.mil.br/sg8/005_normas/01_normas_diversas/07_departame nto_de_educacao_e_cultura_do_exercito/port_n_068_decex_23mar2022.html
[3] A quota mensal escolar é a contribuição paga pelos pais/responsáveis dos alunos, para custeio das atividades do Sistema Colégio Militar do Brasil e não possui natureza tributária.
[1] Assistente social e discente do curso de Mestrado em Educação pela Universidade Estácio de Sá-UNESA.
[2] Doutora em Educação, professora e orientadora do curso de Mestrado em Educação pela Universidade Estácio de Sá-UNESA.
O presente artigo foi elaborado com o objetivo de apresentar uma análise do trabalho desenvolvido pela assistente social no Colégio Militar de Salvador-CMS, durante os anos de 2017 a 2021. O interesse investigativo deste documento, consiste em esboçar as principais ações profissionais que competem ao assistente social no CMS, desenvolvidas com os alunos e seus familiares, bem como com o corpo docente e agentes de ensino. A coleta dos dados foi orientada pelo método dialético-crítico, e utilizou-se de instrumentais técnicos como relatórios e diários de campo para organização das informações. A conduta e as ações profissional tomaram como base o Projeto Ético Político Profissional, a Lei de Regulamentação da Profissão e as Normas de Psicopedagogia Escolar da Educação Básica no Sistema Colégio Militar do Brasil- NPEEB/SCMB, respeitando sempre o previsto o Código de Ética Profissional do assistente social.