RISCOS OCUPACIONAIS EM ÁREAS RURAIS DOS SERVIDORES AMBIENTAIS DE MINAS GERAIS  

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8384513


Francisco de Assis da Silva Júnior1
Felipe Oliveira da Silva Azevedo² 


RESUMO 

Este estudo investiga a segurança e saúde ocupacionais de servidores ambientais que atuam em áreas rurais de Minas Gerais, com um enfoque particular em práticas agrícolas sustentáveis. O trabalho analisa o contexto legal, incluindo o Sistema Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Sisema) e as Normas Regulamentadoras (NRs) brasileiras, visando avaliar as condições e riscos laborais específicos aos servidores que vão a campo. A pesquisa é justificada pela imperativa necessidade de proteger a saúde dos servidores e de contribuir para a revisão e adequação das normativas de segurança agrícola. Foram identificados riscos químicos, biológicos, físicos e ergonômicos, bem como lacunas no treinamento em primeiros socorros e riscos psicológicos associados ao trabalho rural. A inadequada disponibilização de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e a percepção de insegurança nas atividades agrícolas são aspectos críticos. Recomenda-se o desenvolvimento de treinamentos específicos para o setor, apoio psicológico, auditorias de conformidade agrícola e a promoção de uma cultura de segurança proativa. 

Palavras-chave: Segurança ocupacional; Ciências Agrárias; Normas Regulamentadoras; Minas Gerais; Sisema. 

1. INTRODUÇÃO 

A questão da segurança e saúde ocupacionais é imperativa em diversas esferas profissionais, tornando-se particularmente relevante na área ambiental e, mais especificamente, nas práticas rurais sustentáveis (World Health Organization, 2020). Profissionais que atuam neste domínio, incluindo engenheiros ambientais e florestais, biólogos, geólogos e técnicos agrícolas, desempenham um papel crucial na gestão responsável e na preservação de recursos naturais e agrícolas (Meadows et al., 2004). A complexidade de suas funções os expõe a uma variedade de riscos ocupacionais, com implicações diretas em sua saúde e bem-estar (Ferreira e Assunção, 2017). 

Em Minas Gerais, um cenário complexo se desenha, não apenas devido à sua rica biodiversidade, mas também à presença significativa de atividades agrícolas e minerárias. Este contexto multifacetado amplifica a importância de avaliar os riscos ocupacionais enfrentados pelos servidores da área ambiental, especialmente aqueles envolvidos em atividades de campo em zonas rurais. Segundo dados do sistema DATASUS, uma iniciativa do Ministério da Saúde, foram catalogadas 18.161 ocorrências de acidentes de trabalho em Minas Gerais no ano de 2022. Dentre esses, um número significativo ocorreu em contextos rurais, evidenciando a vulnerabilidade desses profissionais a riscos ocupacionais elevados. Estes riscos incluem, mas não se limitam a, o contato com maquinários agrícolas e substâncias químicas  (SINAN NET, 2022). 

Apesar da crescente consciência sobre a importância da segurança e saúde ocupacionais, há uma lacuna notável em pesquisas focadas nos riscos específicos enfrentados pelos profissionais da área ambiental em Minas Gerais (Silva et al., 2019). Este estudo é orientado pela hipótese de que os riscos ocupacionais nesse contexto possuem especificidades que podem não ser completamente atendidas pelas diretrizes de segurança atuais (Ferreira e Assunção, 2017).   

Marco legal em Minas Gerais, consolidado pela Lei nº 21.972 de 21 de janeiro de 2016, institui o Sistema Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Sisema) como alicerce fundamental da política ambiental estadual (ALMG, 2016). Profissionais atuando sob este sistema exercem uma gama diversificada de funções, que abrangem desde a fiscalização de práticas agrícolas e atividades com potencial poluidor até a administração de áreas ecologicamente comprometidas e sistemas hídricos (ALMG, 2016). Tais atividades requerem um nível elevado de vigilância, particularmente devido à exposição a agroquímicos como pesticidas e herbicidas, ao manuseio de maquinário agrícola de grande porte, e à interação com espécies de fauna e flora que apresentam riscos potenciais em cenários agrícolas (ABNT NBR 15219, 2005). 

Nesse contexto, a segurança ocupacional é regida por um conjunto de normativas, como a Norma Regulamentadora NR-1, que serve como base para a implementação das demais Normas Regulamentadoras, incluindo aquelas específicas para o setor agrário, como a NR 31 (Brasil, 1978). A eficácia dessas normas depende de um compromisso organizacional abrangente para mitigar os riscos associados às atividades rurais e ambientais (Martins; Ferreira, 2015). 

Portanto, este estudo tem como objetivo avaliar de forma abrangente e sistemática as condições laborais e os riscos ocupacionais dos servidores do Sistema Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (SISEMA) que atuam em atividades de campo. 

2. MATERIAIS E MÉTODOS 

    2.1 Público-alvo do estudo 

    O foco deste estudo recai sobre os servidores públicos vinculados ao Sistema Estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos de Minas Gerais (Sisema), Brasil. Este sistema abarca a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (SEMAD) e suas entidades associadas: Fundação Estadual do Meio Ambiente (FEAM), Instituto Estadual de Florestas (IEF) e Instituto Mineiro de Gestão das Águas (IGAM). 

    Os profissionais dessas entidades desempenham uma gama de funções que frequentemente envolvem atividades de campo em contextos agrários e rurais. Estas atividades incluem, mas não se limitam a, vistorias técnicas, fiscalizações ambientais, monitoramento de recursos naturais (como fauna, flora e recursos hídricos), e gerenciamento de áreas legalmente protegidas e biomas nativos. A diversidade biogeográfica de Minas Gerais, que engloba diferentes biomas e desafios ambientais, torna essa população particularmente relevante para investigações detalhadas sobre segurança ocupacional. 

    De acordo com o Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN NET), foram catalogadas 673 ocorrências de quedas no mesmo nível devido a escorregões e tropeços, e 569 ocorrências de acidentes decorrentes de compressão ou esmagamento entre objetos. Além disso, foram notificados 157 casos de mordidas ou golpes por cães, 107 por outros mamíferos e 10 de contato com vegetação espinhosa ou cortante. 

    Essas estatísticas sublinham a necessidade de um olhar atento para esses servidores envolvidos em atividades de campo que requerem manipulação de equipamentos diversos, deslocamento em terrenos perigosos, bem como a exposição a fauna e flora perigosas.  

    2.2 Instrumento de Coleta de Dados 

    Estudo adotou uma abordagem metodológica mista, utilizando um questionário semi-estruturado online como instrumento principal de coleta de dados. Este questionário foi customizado para atender às especificidades dos servidores da área ambiental em Minas Gerais e baseia-se em literatura prévia que valida a eficácia de questionários online para coleta de dados qualitativos e quantitativos (Smith, 2015; Johnson & Turner, 2003). O software Google Forms foi escolhido por suas vantagens em termos de acessibilidade, custo-benefício e funcionalidades diversas, incluindo questões de múltipla escolha e escalas de Likert (Baltar & Brunet, 2012). 

    Questionário foi projetado para abordar uma variedade de aspectos relacionados à segurança ocupacional, incluindo exposição a riscos específicos do setor rural, adequação da formação profissional e percepções sobre o suporte organizacional em questões de segurança. Todos os participantes foram informados sobre o caráter anônimo e os objetivos acadêmicos da pesquisa. 

    2.3 Análise dos dados 

    Para a análise dos dados coletados, utilizou-se o software estatístico SPSS. Técnicas de estatística descritiva foram empregadas para avaliar as respostas às questões objetivas, enquanto uma análise de conteúdo qualitativa foi realizada para as respostas discursivas. Adicionalmente, foi conduzida uma análise de correlação para investigar as relações entre a percepção da adequação do treinamento e dos equipamentos de proteção individual (EPIs) e a incidência de acidentes ou lesões ocupacionais. Esta última análise foi categorizada manualmente, agrupando as respostas em temas e identificando padrões nas opiniões dos respondentes (Miles & Huberman, 1994). 

    3. RESULTADOS E DISCUSSÃO 

    3.1 Percepção da Segurança Ocupacional entre Servidores  

    Os resultados do estudo evidenciam uma heterogeneidade significativa na percepção de segurança entre os servidores públicos alocados na área ambiental em Minas Gerais, especialmente aqueles envolvidos em atividades rurais. Os servidores lotados em funções administrativas e de gestão ambiental, em sua maioria, relataram uma sensação de segurança ocupacional elevada, independentemente da frequência com que realizam atividades de campo. Em contrapartida, servidores incumbidos de tarefas ligadas à fiscalização ambiental, emergências ambientais e intervenções no âmbito da ‘Agenda Verde’ apresentam uma percepção de segurança mais oscilante. 

    Gráfico 01 – Distribuição da Frequência de Atividades de Campo

    A frequência das atividades de campo parece ser um fator determinante na percepção de segurança desses profissionais. De acordo com o Gráfico 01, servidores que realizam incursões ao campo semanalmente ou mensalmente se sentem predominantemente seguros. Esta tendência sugere que a frequência com que os servidores se expõem a ambientes de campo, particularmente em contextos rurais, pode influenciar diretamente na sua percepção de segurança. Este fenômeno pode estar ligado à variabilidade nos riscos ocupacionais e à eficácia dos Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) fornecidos (Barreto et al., 2020). 

    Quanto à diversidade dos setores dos servidores públicos que responderam ao questionário, o segmento mais representativo é o de Fiscalização Ambiental (28%), seguido pelo setor de Licenciamento/Regularização Ambiental (20%). A atividade ambiental dos agentes envolve visitas frequentes a diferentes tipos de ambientes, desde áreas rurais e agrícolas até áreas industriais, florestais, minerações e locais contaminados. Estas visitas são fundamentais para a implementação e fiscalização de políticas ambientais, bem como para a identificação e correção de irregularidades em contextos agrários (Oliveira e Freitas, 2019; Silva et al., 2018). 

    3.2 Exposição a Riscos Ocupacionais em Campo 

    Dentre os participantes da pesquisa, 47,3% dos participantes (n=35) relataram exposição a substâncias químicas tóxicas no ambiente laboral, muitas vezes relacionadas à agricultura, como pesticidas e fertilizantes. Notavelmente, houve relatos de exposição a combustíveis e águas contaminadas e, em cenários de emergência, a substâncias tóxicas com o uso de EPI fornecido pelo empregador. No tocante à formação para manejo de substâncias tóxicas, uma esmagadora maioria de 90,5% (n=67) afirmou não ter recebido treinamento, enquanto 9,5% (n=7) asseguraram ter sido treinados. Este dado é desconcertante, uma vez que a Norma Regulamentadora NR 31 do Ministério do Trabalho (2018) estabelece que o empregador rural ou equiparado deve promover condições de segurança, higiene e conforto para o exercício das atividades laborais (Brasil, 2018). 

    3.3 Riscos Ergonômicos e Físicos: 

    Os dados levantados na pesquisa trazem à tona uma importante lacuna em relação ao treinamento de profissionais que trabalham em áreas de risco ou com características geográficas particulares, como terrenos rurais íngremes ou alagados. Ao analisar o conjunto de respostas, torna-se evidente que a maioria dos entrevistados não recebeu qualquer tipo de treinamento focado em riscos ergonômicos ou físicos associados ao seu trabalho em contextos agrários (Dul et al., 2012; Brown et al., 2011). 

    Exposição a Terrenos Perigosos e Condições Climáticas Adversas: 

    Notoriamente, 86,5% dos entrevistados afirmaram já ter realizado atividades em áreas de difícil acesso, como terrenos rurais íngremes ou alagados. Este dado é alarmante, pois, como sinalizado por Kjellberg et al. (2019), trabalhadores não treinados para lidar com terrenos íngremes ou acidentados têm maior probabilidade de sofrer acidentes fatais ou incapacitantes. Isso se torna ainda mais preocupante à luz das diretrizes estabelecidas pela Norma Regulamentadora NR 33 (2018), que exige treinamento e equipamentos de proteção individual (EPIs) adequados. 

    Os dados coletados apontam que 79% dos servidores afirmaram ter enfrentado condições climáticas adversas, como tempestades, enchentes e calor extremo em atividades de campo em áreas agrárias. Este elevado percentual é congruente com os relatórios do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET, 2020), que destacam a ocorrência frequente de fenômenos climáticos extremos em Minas Gerais. 

    3.4 Disponibilização de Equipamentos de Proteção Individual e Incidência de Acidentes em Contextos Rurais

    A pesquisa evidencia uma lacuna significativa no fornecimento de Equipamento de Proteção Individual (EPI) aos servidores do SISEMA, o que é particularmente preocupante dada a frequência com que esses profissionais atuam em ambientes campestres. Conforme ilustrado no Gráfico 08, uma proporção elevada de servidores relata receber EPIs inadequados ou insuficientes, contrariando a Norma Regulamentadora NR-6, que estipula a obrigatoriedade do fornecimento de EPIs apropriados aos riscos da atividade laboral (NR-6, 2010). 

    Gráfico 02 – Disponibilidade de EPIs 

    A deficiência no fornecimento de EPIs não apenas eleva o risco de acidentes, mas também agrava as consequências desses incidentes. A NR-6 não apenas exige o fornecimento de EPIs, mas também enfatiza que estes devem ser pertinentes aos riscos ocupacionais (NR-6, 2010). O estudo de Oliveira et al. (2021) reforça que a ausência ou inadequação de EPIs pode resultar em uma série de problemas de saúde ocupacional, desde lesões físicas até exposição a agentes químicos ou biológicos, que são especialmente prevalentes em ambientes agrícolas  (Oliveira et al., 2021). 

    Questionário também destaca uma falha na comunicação e na observância das diretrizes de segurança dentro da instituição. Esta lacuna organizacional e ética aumenta os riscos físicos e cria um ambiente de trabalho estressante, corroborando pesquisas em saúde ocupacional que apontam para os impactos negativos do estresse no ambiente de trabalho. 

    De forma alarmante, uma proporção significativa dos servidores relatou ter sofrido acidentes ou lesões durante o exercício de suas funções em ambientes externos. Este dado é especialmente grave à luz das Normas Regulamentadoras NR-6 e NR-9, que estabelecem critérios rigorosos para o fornecimento de EPIs e para a avaliação e controle de riscos ocupacionais em tais contextos (NR-6; NR-9). 

    Entre os servidores que relataram acidentes, a inadequação ou ausência de EPIs foi identificada como uma das causas predominantes. Este fato é especialmente alarmante, pois representa uma violação clara das normativas que impõem aos empregadores a responsabilidade de fornecer EPIs adequados aos riscos associados às atividades laborais em ambientes rusticanos. A alta incidência de acidentes relacionados à falta de EPIs indica falhas no processo de avaliação de riscos, conforme preconizado pela NR-9. 

    Tecnicamente, o elevado número de acidentes é um indicador crítico da necessidade de revisões e melhorias urgentes na gestão de segurança e saúde ocupacional em ambientes agrários e rurais. Este cenário exige ações imediatas, como auditorias de segurança, treinamentos específicos para contextos agrários, e uma revisão rigorosa do processo de fornecimento e controle de EPIs. 

    3.5 Percepção da Segurança entre Servidores em Ambientes  durante o campo 

    A análise dos dados coletados revela tendências alarmantes na percepção de segurança entre os servidores que atuam em ambientes em campo. Uma proporção substancial de servidores relatou ter enfrentado cenários de ameaça ou hostilidade durante a execução de suas tarefas nesses ambientes. A frequência “Na maioria das vezes” foi preponderante nas respostas dos participantes, conforme ilustrado no Gráfico 10, indicando que a questão da insegurança é sistêmica e recorrente. 

    Gráfico 03 – Percepção de Insegurança entre Servidores nas atividade de Campo 

    Esta constatação está alinhada com a literatura em saúde e segurança ocupacional, que demonstra que ambientes de trabalho psicologicamente estressantes estão diretamente relacionados com altas taxas de ansiedade e depressão (Smith et al., 2019). A insegurança no ambiente de trabalho não apenas compromete a integridade física dos servidores, mas também contribui para um ciclo vicioso de risco e malefício psicológico. 

    Outro dado importante é que 62% dos servidores entrevistados afirmam já ter realizado vistorias em áreas marcadas por históricos de violência ou criminalidade associada à exploração ilícita de recursos naturais. Dessas ocorrências, 60,08% dos entrevistados confirmaram ter sido alvo de algum tipo de ameaça ou hostilidade durante suas atividades profissionais em tais contextos. 

    Nesses cenários de risco elevado, a falta de resposta institucional é especialmente alarmante. Em 75% dos casos em que ameaças ou hostilidades foram relatadas, não houve tratamento adequado por parte das instituições responsáveis. Este é um indicativo crítico de deficiências sistêmicas no apoio e segurança dos servidores, que frequentemente se encontram em situações de risco em ambientes agrestes. O mínimo esperado seria a implementação rigorosa de um Plano de Prevenção de Riscos de Acidentes (PPRA) e um Plano de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO) que sejam altamente específicos e englobem a segurança pessoal dos servidores em tais contextos. 

    A revisão dos dados coletados revela uma falha estrutural no sistema de segurança ocupacional, particularmente no que tange à preparação dos servidores para enfrentar cenários hostis em ambientes rurais. A conformidade com normas como a NR-9, que trata do PPRA, e a NR-7, que aborda o PCMSO, torna-se imperativa para assegurar a integridade física e mental dos profissionais em campo (NR-7, 2019; NR-9, 2020). 

    Dos respondentes, um percentual alarmante de 45% reportou ter sofrido algum tipo de ameaça verbal. Adicionalmente, 10% mencionaram ameaças que incluíram armas de fogo ou armas brancas. Importante ressaltar que em apenas 30% dos casos relatados houve tratamento adequado da situação, o que indica uma grave falha no protocolo de segurança em tais contextos. 

    Ainda mais preocupante é o fato de que, em 12% dos casos, houve ameaças associadas a armas de fogo ou armas brancas, aumentando exponencialmente o risco de um incidente fatal em regiões sem policiamento, como as zonas rurais. Essa estatística é crítica e deveria acionar imediatamente procedimentos de revisão e aprimoramento dos protocolos existentes. 

    Além disso, em vários relatos, a hostilidade foi tão grave que impediu a realização de vistorias, levando à necessidade de intervenção policial. As estatísticas revelam que servidores da área ambiental de Minas Gerais enfrentam um espectro preocupante de riscos, desde ameaças verbais até situações que envolvem armas de fogo ou armas brancas. A falta de tratamento adequado dessas ameaças é um indicativo de falha institucional que requer atenção imediata. 

    É impossível ignorar o impacto psicológico desses números. Servidores que trabalham sob constante ameaça ou hostilidade estão propensos a um espectro de problemas de saúde mental, como estresse, ansiedade e, em casos extremos, síndrome do estresse pós-traumático (TEPT). Pesquisas em psicologia ocupacional demonstram que o estresse crônico no trabalho pode afetar negativamente tanto a produtividade quanto a qualidade de vida dos servidores em tais contextos. 

    3.6 Resposta da Instituição às Demandas dos Servidores 

    A análise das respostas do questionário sobre a segurança ocupacional  evidencia um cenário preocupante dentro da instituição. De acordo com os dados coletados, aproximadamente 60% dos servidores consideram o ambiente de trabalho como inseguro, um dado que se torna ainda mais alarmante quando se considera que em 44,1% desses casos, a instituição não implementou as medidas corretivas necessárias. Tal omissão contraria diretamente as diretrizes estabelecidas na Norma Regulamentadora NR-1, que prevê diretrizes gerais para assegurar a saúde e segurança dos trabalhadores em ambientes agrários (NR-1). 

    É relevante também destacar que 46% dos servidores nunca reportaram uma situação de risco. Este comportamento pode ser interpretado como um sintoma de uma cultura organizacional que desestimula o reporte de condições inseguras, perpetuando um ciclo de não-conformidade e riscos em ambientes rurais (Lei Nº 8.213/91; Artigo 19). Além disso, apenas 16% das condições de risco reportadas foram efetivamente resolvidas. Este dado reflete uma vulnerabilidade institucional intolerável e coloca em destaque a ineficácia do sistema atual de segurança, conforme estipulado pela Lei Nº 8.213/91. 

    As falhas observadas não apenas comprometem o bem-estar dos servidores que atuam em campo, mas também podem resultar em sérias consequências legais para a instituição (Artigo 19, Lei Nº 8.213/91).A falta de ações preventivas e corretivas é absolutamente inaceitável e negligencia normativas fundamentais que deveriam reger qualquer organização laboral, especialmente aquelas atuantes em ambientes mais rusticos (Lei Nº 8.213/91; NR1; NR-12; NR-32). A estratégia de prevenção é univocamente corroborada pela literatura científica como o meio mais eficaz para garantir a integridade física e mental dos servidores em tais contextos (Neumann et al., 2018). 

    3. 7 Medidas Propostas pelos Participantes do Estudo 

    O questionário apontou diversas perspectivas para o aprimoramento da segurança no ambiente de trabalho em contextos ruais. As respostas coletadas sugerem um leque de medidas, que vão desde treinamentos específicos até o fornecimento adequado de EPIs. A maior parcela dos respondentes, correspondente a aproximadamente 68%, sublinhou a importância cardinal dos treinamentos contínuos na asseguração da segurança ocupacionalnesses ambientes.  

    A questão concernente ao fornecimento de EPIs também surgiu como um aspecto  de destaque, sendo citada por aproximadamente 53% dos participantes da pesquisa. Esta constatação corrobora as diretrizes da NR-6, que atribui ao empregador a responsabilidade de disponibilizar EPIs adequados aos riscos associados à atividade laboral em ambientes agrários (BRASIL, 2021). 

    Ademais, cerca de 17% dos respondentes enfatizaram a necessidade de uma identidade institucional mais robusta, abarcando desde a padronização de uniformes até a utilização de veículos devidamente identificados.  No que tange à presença policial em atividades de fiscalização, este aspecto foi assinalado por aproximadamente 10% do corpo de servidores entrevistados. Esta manifestação reflete não apenas o grau de periculosidade inerente a determinadas operações, mas também encontra suporte na legislação vigente, mais especificamente no Decreto nº 9.527 de 2018, que institui o Comitê Interministerial de Segurança Pública (BRASIL, 2018). 

    4. CONCLUSÕES 

    Os resultados evidenciam discrepâncias significativas em relação às Normas Regulamentadoras (NRs) vigentes, especialmente aquelas que têm relevância direta para ambientes rurais. 

    A percepção de segurança entre os servidores mostrou-se variável, especialmente em relação ao tipo de atividade exercida em contextos agrários. Isso aponta para necessidades distintas de treinamento e equipamento, especialmente para aqueles envolvidos em fiscalização ambiental, emergências ambientais e atividades relacionadas à ‘Agenda Verde’. 

    De forma alarmante, o estudo identificou lacunas significativas no treinamento sobre riscos químicos e biológicos, com 90,5% e 93,2% dos servidores, respectivamente, sem treinamento nessas áreas críticas. Esta falta de preparo é particularmente preocupante, onde 47,3% dos servidores relatam exposição a substâncias químicas tóxicas e 85,1% a riscos biológicos. 

    A inadequação no fornecimento de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) constitui uma violação direta da NR-6 e emerge como um fator contribuinte para acidentes ocupacionais em ambientes agrários. 

    A exposição a terrenos perigosos e condições climáticas adversas, como tempestades, enchentes e calor extremo, é comum em atividades agrárias, com 89% dos servidores enfrentando essas condições. Isso destaca a importância de medidas de mitigação, previstas na NR-35, que estão notoriamente ausentes na prática atual. 

    A capacitação sobre os riscos ergonômicos, físicos e em primeiros socorros é notavelmente baixa, com apenas 9,3%, 4,1% e 10,8% dos servidores treinados nessas áreas, respectivamente. Esta situação agrava a vulnerabilidade a acidentes e tem implicações diretas na saúde física e mental dos servidores. 

    A percepção de insegurança entre os servidores que atuam em campo é alarmante, com uma parcela significativa relatando ter enfrentado cenários de ameaça ou hostilidade durante suas tarefas. 

    Por fim, a falta de resposta institucional adequada para situações de ameaça ou hostilidade é preocupante, indicando deficiências sistêmicas na segurança dos servidores. 

    Os resultados deste estudo ressaltam a necessidade urgente de revisões e melhorias nas políticas e práticas de segurança ocupacional, especialmente em contextos das atividades externas e rurais. O Estudo serve como um catalisador para a ação, fornecendo um roteiro crítico para futuras intervenções e reformas. 

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    1Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, 39803-371, Teófilo Otoni, MG, Brasil. francisco.silva@meioambiente.mg.gov.br; *Corresponding author:
    ² Instituto de Direito Ambiental (IDAM), felipeengflorestal@gmail.com