RISCOS DA SUBJETIVIDADE HERMENÊUTICA NO DIREITO TRIBUTÁRIO BRASILEIRO: DA INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA À SOLIDARIEDADE SOCIAL

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7872693


Inácio Augusto Teixeira Maia de Oliveira1
André de Souza Dantas Elali2


RESUMO

O presente trabalho tem por objetivo analisar, mesmo que sucintamente, o sentido e o alcance da solidariedade social para o estado democrático de direito e para a arrecadação de tributos. Existe um dever fundamental de pagar tributos? É possível a criação de deveres tributários em decorrência da aplicação dos princípios da solidariedade, da capacidade contributiva ou da igualdade? Se sim, isso poderia gerar a “deslegalização” do Direito Tributário? 

PALAVRAS-CHAVE: CAPACIDADE CONTRIBUTIVA, LEGALIDADE, DEVER FUNDAMENTAL DE PAGAR TRIBUTOS.

ABSTRACT

This work aims to analyze, briefly, the meaning and scope of social solidarity for the democratic rule of law and for tax collection. Is there a fundamental duty to pay taxes? Is it possible to create tax duties as a result of the application of the principles of solidarity, contributory capacity or equality? If so, could this generate the “delegalization” of Tax Law?

KEYWORDS: CONTRIBUTION CAPACITY, LEGALITY, FUNDAMENTAL DUTY TO PAY TAXES.

1 INTRODUÇÃO

Um dos problemas que afetam a interpretação das normas é o estabelecimento de um método seguro que garanta os resultados pretendidos. Embora este assunto tenha sido estudado diligentemente por diferentes escolas do pensamento jurídico, de uma perspectiva metodológica, também é suscetível de preocupação por parte do direito constitucional. Com efeito, uma das várias finalidades da constituição é regular o exercício do poder político e, consequentemente, a constituição e funcionamento dos órgãos encarregados de redigir as normas jurídicas. Em outras palavras, a constituição trata do sistema de fontes. Não é necessário lembrar que a interpretação revela o sentido das normas e que, por conseguinte, contribui para determinar o alcance delas diante dos casos concretos; a extensão da validade normativa dependerá de sua interpretação. Se a constituição tem entre seus poderes ordenar a produção normativa, ela não pode estar alheia aos problemas interpretativos.

Essa inter-relação entre constitucionalismo e metodologia, no entanto, está longe de ser simples, pois as demandas que o primeiro faz sobre a segunda não são unívocas. Na verdade, os critérios metodológicos e as teorias são abundantes em uma variedade que podem até mesmo se tornar contraditórias. Por outro lado, os conceitos de constituição, estado de direito e constitucionalismo evoluíram desde as suas origens e é necessário levar esta variação em consideração para analisar os requisitos do constitucionalismo atual antes da interpretação das normas jurídicas. Em razão disso, surge o seguinte questionamento: o próprio sistema jurídico adota de maior justificação determinadas interpretações em detrimento de outras? A conformação constitucional brasileira, na forma de diretivas cogentes (regras), realiza, de modo prévio, a ponderação de certos valores em âmbitos específicos do direito? Acreditamos que a resposta seja positiva para ambas as perguntas.

Isso significa que o próprio sistema jurídico impõe ao intérprete-aplicador dessas regras jurídicas um menor nível de discricionariedade e abertura a determinados modelos argumentativos no momento de interpretá-las e aplicá-las, pois o sentido preliminar dos termos utilizados pelo legislador ao formular os textos legais é dotado de força vinculante.

Nesse contexto, o presente trabalho tem por objetivo analisar, ainda que sucintamente, o sentido e o alcance da solidariedade social para o estado democrático de direito e para a arrecadação de tributos. Existe um dever fundamental de pagar tributos? É possível a criação de deveres tributários em decorrência da aplicação de um método interpretativo que prioriza os princípios da solidariedade, da capacidade contributiva ou da igualdade? Se sim, isso poderia gerar a “deslegalização” do Direito Tributário? É o que se passa a analisar. 

2 SOLIDARIEDADE SOCIAL, TRIBUTAÇÃO E A INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA

Etimologicamente, o termo solidariedade tem as suas raízes na expressão latina solidarium, que vem de solidum e soldum. A solidariedade pode ser compreendida em dois sentidos: objetivo e subjetivo. O primeiro leva em conta a relação de pertença, de partilha e de corresponsabilidade, capaz de ligar os membros da comunidade entre si. O sentido subjetivo traz a concepção de ética social, expressando o sentimento e a consciência dessa mesma pertença à comunidade. Corrobora-se que essa relação ou consciência de pertença que tem por fundamento uma relação de auxílio mútuo perante as dificuldades, encontra igualmente relações com a fraternidade. 

A solidariedade também pode ser identificada como valor que informa a edição de normas jurídicas que se destinam a regular a relação entre os interesses individuais de cada pessoa e os interesses coletivos do grupo social, a fim de promover a convivência social harmoniosa (VIDIGAL, 2009, p. 27). O sentido jurídico de solidariedade social remontaria à ideia de justiça social. Nesta “cidadania solidária”, o cidadão exerce um novo papel, com novos encargos e responsabilidades, que não podem ser encarados como tarefas exclusivas do Estado, implicando o simultâneo e permanente empenho estatal e privado para a inclusão dos membros da respectiva comunidade de modo a partilharem o mesmo denominador comum (NABAIS, 2005, 114-115).

O tema da solidariedade, ou solidariedade social constitui, na lição de Marco Aurélio Greco e Marciano Seabra de Godói, elemento referencial de uma certa concepção de tributação. Para estes autores, analisar as relações entre tributação e a solidariedade social é apurar o “modo de ser” da tributação na contemporaneidade, investigando, igualmente, a sua justificação (o seu “porquê”) e a sua finalidade (ou o seu “para quê”).  As discussões não se restringiram a analisar os fundamentos legais da exigência tributária, mas se alastram para o momento da interpretação e da aplicação das normas tributárias, em razão das finalidades pretendidas com sua instituição (GRECO; GODÓI, 2005, pp. 5-6).

Desse modo, no estado democrático de direito não haveria apenas a preocupação com os direitos individuais, mas também com a incorporação de valores outros decorrentes da solidariedade. O projeto constitucional de um estado democrático é um projeto que exigiria a participação de todos. O paradigma do estado fiscal exige compreender o fenômeno tributário de outra forma: ao invés de encarar o tributo como uma norma de rejeição social, se deveria entender o tributo como um dever fundamental, inerente à cidadania e decorrente da solidariedade, que busca servir como um instrumento adequado e necessário para possibilitar a transformação social.

Para essa corrente doutrinária, diversamente da Constituição de 1967, detentora de um feitio de uma Constituição do Estado-aparato, o perfil da Constituição de 1988 é de uma constituição da sociedade civil (GRECO, 2005). Esta modificação político-ideológica teria se espraiado por todo o texto constitucional, estabelecendo, por exemplo, que um dos fundamentos da República é a construção de uma sociedade livre, justa e solidária. Isto implicaria reconhecer a solidariedade social como fundamento último da tributação, já que a Constituição de 1988 teria colocado no mesmo patamar a variável social e o plano individual (GRECO, 2005).

O artigo 5º não teria assumido o papel de apenas elencar os “direitos e garantias individuais” (como o artigo 150 da CF/67 e o art. 153 na redação da EC n. 1/69), mas sim o de contemplar os “direitos e deveres individuais e coletivos”. Se trataria de uma mudança relevante, já que a liberdade individual passaria a ser condicionada a uma razão não meramente individual. Isso significaria que não se trata a função social de uma mera limitação, mas sim a razão do exercício dessa liberdade, destacando a importância das motivações que levaram à celebração de determinado ato ou negócio jurídico (GRECO, 2008a, p. 505-514). A liberdade, conquanto princípio informador da Constituição, deveria ser exercida segundo os ditames da justiça social e dignidade humana.

Em matéria tributária, especificamente, a Constituição de 1988 teria estabelecido os tradicionais princípios tributários (legalidade, anterioridade e irretroatividade) como “limitações constitucionais”, apenas exercendo o papel de regras de bloqueio ao exercício do poder de tributar, e não como valores positivos preeminentes no ordenamento jurídico. Por outro lado, a capacidade contributiva, esta sim, seria um valor positivado. Isso implica dizer que a variável filosófica e política encampada na Constituição foi modificada. Essa evolução também teria ocorrido no plano teórico, pois teríamos migrado da jurisprudência dos conceitos para a jurisprudência dos valores, inclusive no âmbito tributário.

A própria ideia de igualdade tributária teria sido revista. Na vigência da Constituição de 1967, seria considerado quebra da isonomia tributária se o fisco exigir tributo de algum contribuinte de forma discriminatória; na vigência da Constituição de 1988, em que a capacidade contributiva se tornou princípio tributário explícito, seria considerado quebra da isonomia tributária a não cobrança de tributo de alguém que manifestou capacidade contributiva. Portanto, dois sentidos podem ser extraídos do inciso II do artigo 150 da CF/88: i) proibição de exigência discriminatória; ii) proibição de não exigir o tributo de todos que se encontrem em situação equivalente.

Desse modo, recairia sobre os contribuintes um dever de fraternidade, de cooperação social, que permitiria a justificar a tributação sem o supedâneo nas regras de competência tributária. Na interpretação da legislação tributária, caberia ao intérprete-aplicador não apenas analisar a existência de competência tributária que autoriza a formulação de determinado preceito, mas sim o sentido prático do dispositivo normativo e os seus efeitos com relação à hipótese de cooperação social.

Sob bases ideológicas reformadoras, essa corrente afirma não ser possível compatibilizar a ideia de uma tributação mínima com o estado brasileiro, já que este possui grandes responsabilidades sociais decorrentes do texto constitucional. Assim sendo, não seria possível a interpretação do sistema constitucional tributário apenas como um conjunto de normas jurídicas que limitam o poder estatal de tributar, devendo a capacidade contributiva ser guindada à condição de princípio geral do sistema tributário, a teor do § 1º do artigo 145 da CF/88. 

O estado social, tal como o brasileiro, não deveria ser visto apenas como garantidor das liberdades públicas, mas sim como provedor, tendo como escopo o desenvolvimento social e a diminuição das desigualdades. Seria função do estado a implementação de políticas públicas que objetivam a concretização da dignidade ao maior número de pessoas possível.

Em paralelo, também teria ocorrido evolução no debate sobre o papel a ser exercido pelas normas programáticas. Estas deixariam de ser simples recomendações e assumiriam o papel de direcionadoras da produção legislativa e jurisprudencial. Esta eficácia positiva das normas programáticas teria gerado reflexos tanto nas prestações positivas do estado, como no plano de interpretação e aplicação das normas jurídicas em geral e tributárias em particular (PIMENTA, 1999, p. 237; GRECO, 2008a, p. 329). 

Portanto, os fatos se mostrariam mais fortes que os modelos formais. A liberdade dos contribuintes seria mitigada pela isonomia e capacidade contributiva. Defende-se a criação de deveres jurídico-tributários a fim de contribuir com a arrecadação estatal em decorrência dos valores constitucionais da solidariedade e da capacidade contributiva. Esses valores passam a ter o papel de orientar a interpretação, enriquecendo-a, com vistas a assegurar a maior “efetividade” possível aos preceitos existentes; a capacidade contributiva, desta perspectiva, assume uma eficácia positiva na aplicabilidade do ordenamento jurídico.  Isto é, a capacidade contributiva serve como um vetor de alcance da legislação, permitindo alcançar, além das materialidades previstas na hipótese de incidência das normas, assim como aquilo que resulta da sua conjugação do texto positivado com o princípio da capacidade contributiva (GRECO, 2008a).

Com base nisso, vemos a ênfase que é dada ao papel atribuído à capacidade contributiva: ela serve como medida positiva, tendo a capacidade de direcionar a interpretação e o âmbito de aplicação da regra jurídica para “ir além do que a lei prevê” (LEÃO, 2018). Isso confere ao intérprete a prerrogativa de, levando em consideração a capacidade contributiva, a solidariedade social e a igualdade, potencializar a incidência da norma, mediante o desenvolvimento de sentidos às palavras para além daqueles preliminarmente utilizados pela legislação. 

Acaba-se criando, a partir desse raciocínio, uma regra de prevalência na interpretação e aplicação das normas tributárias: o argumento finalístico (capacidade contributiva) prevalece sobre a argumentação literal (sentido preliminar do texto normativo) (LEÃO, 2018).

Isso significa que a hipótese de incidência dos tributos deve ser analisada e interpretada para além do preceito constitucionalmente elencado, dando-se ênfase ao resultado prático gerado por eles. Ou seja, a tributação seria um fim amparado na ideia de solidariedade social. Nessa linha, a tributação concretiza o valor axiológico do ideal de solidariedade, podendo-se afirmar que tributação e solidariedade são faces da mesma moeda, já que sem um não se alcança o outro. Não existiria verdadeira solidariedade sem tributação, e sem solidariedade, não se justifica adequadamente a exigência de tributos.

A partir dessa perspectiva, os tributos deixam de ser excepcionais, passando a instrumentos de receita pública derivada, dos quais, continuamente, o Estado se valeria para atender aos objetivos assumidos na redução das desigualdades socioeconômicas. Nesse sentido, não bastaria mais a observância de critérios formais para se chegar à juridicidade de uma determinada exação, sendo importante a observância da capacidade de cada cidadão ou sociedade empresária para arcar com a tributação.

 Cria-se, portanto, um paradigma de moralidade fiscal, impondo limitações à liberdade de planejamento dos contribuintes, com o fito de preservar outros valores como a justiça fiscal, igualdade, capacidade contributiva, neutralidade tributária e eficiência econômica.

Portanto, o   dever   de   pagar   tributos   representaria   um   dos   principais aspectos do exercício da cidadania, que compreende não apenas direitos, mas também deveres a serem observados pelos cidadãos, a fim de garantir um adequado funcionamento da própria sociedade organizada representada pelo Estado, o que inclui a concretização dos próprios direitos dos cidadãos, sobretudo os de cunho prestacional.

3 CRÍTICAS À INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA NO DIREITO TRIBUTÁRIO COM BASE NA A SOLIDARIEDADE E NA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA 

A interpretação está intimamente ligada à ideia de segurança jurídica. A atividade interpretativa, sistematizada de modo lógico e racional, almeja, como objetivo primordial, restringir a liberdade do intérprete, reduzir sua discricionariedade, a fim de evitar arbitrariedades. As regras interpretativas são ferramentas que funcionam como uma espécie de contenção, impossibilitando que o intérprete pratique abusos.

Atribui-se ao texto legislado, portanto, posição de protagonismo, buscando-se dirimir a possibilidade de interpretação totalmente dissociada das intenções do legislador, principalmente no que se refere às competências tributárias. Deve o intérprete, à vista disso, buscar os possíveis significados da norma a ser apreciada, cuja existência preexiste à própria atividade interpretativa. 

Por obra da inesgotabilidade da ação de interpretar, no dialogismo da comunicação jurídica, o grande obstáculo é legitimar a significação proposta. A superação dos problemas de sentido não ocorre pelas definições, mas sim pelas técnicas de legitimação que são utilizadas para que a definição seja aceita pelos interlocutores no lugar de outra qualquer. Aquele que fala em nome do sistema jurídico (prescreve condutas) deve ser coerente com o próprio sistema. A proposição será dotada de maior legitimidade quanto maior for sua coerência com o sistema que faz parte (GAMA, 2009, p. 232).

O direito positivo, por ser estruturado de modo hierarquizado, exige do agente interpretativo seu envolvimento com as proporções inteiras da sistemática jurídica. Logo, há um caminho obrigatório a ser percorrido pelo agente que deseja realizar uma correta interpretação das normas tributárias. Deve-se primeiro analisar as normas constitucionais, especialmente as diretrizes principiológicas, para, depois, esmiuçar o plano infraconstitucional.

Assim sendo, para a devida aceitação de uma definição/proposição, é fundamental que o agente edifique o plano de conteúdo da linguagem do direito positivo em obediência às relações de hierarquia presentes no sistema jurídico-prescritivo, atento à dinâmica interpretativa própria do âmbito contextual em que operam, o qual, fundado nas denominadas regras de estrutura, impõe menor nível de liberdade na criação de normas prescritivas de conduta. As normas positivadas, mediante as regras de estrutura, impõe limitações à atividade do intérprete-aplicador, não permitindo que qualquer significado seja atribuído aos termos jurídicos. Se assim fosse, de nada valeriam os textos legais (MOUSSALLEM, p. 1215-1216).

Portanto, forçoso concluir que, embora a adoção de sentidos esteja sempre imbuída pela subjetividade do intérprete, variando as relações de significação construídas em razão de suas crenças e valores, a tomada de decisões pelo aplicador do Direito por uma definição/proposição jurídica em detrimento das demais há sempre de considerar os limites textuais e contextuais impostos pelo ordenamento, articulando normas em harmonia com as diretrizes do sistema do direito positivo.

Seria a interpretação da doutrina acerca da aplicação da solidariedade e da capacidade contributiva compatível com a ordem jurídica brasileira? Ao positivar as normas jurídico-tributárias, busca-se sempre extrair sempre a máxima riqueza possível dos contribuintes? É legítima a imposição de prevalência de um método interpretação e aplicação das normas que sempre se pautam pela máxima carga tributária, visando uma maior arrecadação? Acreditamos que não.

De acordo com a conformação jurídico-constitucional brasileira, as normas jurídico-tributárias não podem ser sempre interpretadas com base em sua finalidade fiscal (obtenção de receita). Isso porque a finalidade arrecadatória, objetivando cobrir as despesas do estado, não pode servir como premissa para a interpretação teleológica (LEHNER, 1998, pp. 143-154). Ao defender a aplicação de um método de interpretação teleológico que tem como fundamento principal a capacidade econômica do contribuinte, estamos diante, na verdade, de uma reinterpretação da teoria da “interpretação econômica do Direito”. 

Cabe lembrar que a interpretação econômica conferida à hipótese de incidência tributária, formulada no início do Século XX pelo alemão Enno Becker, descarta, groso modo, a utilização de conceitos prévios, sustentando que os signos tributários possuem significação específica. Essa corrente considera, para a determinação da hipótese de incidência, os seguintes fatores: (i) a constância econômica da hipótese tributária; (ii) os meios adotados para que determinado fim se realize; e (iii) a função de cada tributo criado. 

Wilhelm Hartz (1993, p. 95), em sua obra “Interpretação da Lei Tributária”, expõe que o critério econômico pode ser usado como princípio de valoração, ou seja, na análise de um acontecimento concreto, real, relativamente às suas consequências tributárias. Caberia, desse modo, ao intérprete da norma jurídica tributária contemplar não somente à estrita hipótese de incidência nela contida, mas, em especial, aos fins colimados pelo legislador ao criá-la, alcançando, em consequência, outros fatos de mesmo significado econômico, porém não contidos de modo expresso em sua prótase.

À vista disso, a utilização desse método interpretativo permite que o aplicador da lei tributária possa flexibilizá-la, distendendo sua esfera de atuação para além daqueles fatos descritos na hipótese de incidência, e que, uma vez ocorridos no mundo fenomênico, ensejam sua incidência. Constata-se, portanto, que consoante o critério econômico, importante é compreender os fatos em seu sentido econômico, quer dizer, preferindo os verdadeiros efeitos visados pelas partes à adoção desta ou daquela forma jurídica

Com precisão, Luís Eduardo Schoueri (2010) afirma que a doutrina da “interpretação econômica” não foi esquecida ou abandonada, passando por um processo de desenvolvimento e adaptação até se transformar numa espécie de interpretação teleológica, isto é, parte desse método de interpretação. Com isso, o conteúdo econômico das operações passou a marcar vários critérios de interpretação e aplicação das normas tributárias. Resultado disso é a doutrina da substância sobre a forma e a própria interpretação extensiva (LEÃO, 2018, p. 167).

Exemplo recente de aplicação da ideia de “critério econômico” como decorrência do aspecto teleológico baseado nos valores da igualdade, capacidade contributiva e solidariedade foi o julgamento pelo STF, em 2016, da incidência do Imposto sobre Serviços (ISS) sobre as atividades realizadas pelas operadoras de plano de saúde. O recurso foi interposto questionando a cobrança sob a alegação de que a atividade exercida por planos de saúde seriam equiparáveis as de contratação de um seguro. Submetido à sistemática da repercussão geral, firmou-se, por maioria de votos (oito votos a um), precedente no sentido de as atividades desenvolvidas pelas operadoras de planos de saúde estarem sujeitas à incidência do ISS. 

Nesse julgamento, foi reforçada a noção de que o Direito Privado não exaure a atividade interpretativa dos conceitos constitucionais tributários, permitindo que o Direito Tributário busque aporte em outras ciências afins, como a Ciência das Finanças, a Economia e a Contabilidade.

Para o relator, ministro Luiz Fux, interpretar o conceito de serviço à luz do artigo 110 do CTN seria subverter a supremacia hierárquica da Constituição ao legislador infraconstitucional. O conceito de serviço previsto na Constituição não se confunde com o estabelecido pelo Direito Privado, não podendo a incidência do ISS ser limitada às típicas “obrigações fazer”, devendo o intérprete da lei não só observar os elementos jurídicos das normas, mas, além disso, se atentar à real intenção e aos efeitos económicos pretendidos pelo contribuinte. 

Desse modo, houve utilização de um critério econômico para a interpretação do termo “serviço”, como decorrência da apreciação axiológica que se baseia nos valores da igualdade, capacidade contributiva e solidariedade. Esse entendimento encontra amparo em parte da doutrina que defende “a busca do verdadeiro conteúdo econômico do negócio jurídico praticado”, sendo esta um resultado do aspecto teleológico, que não derivaria de uma preocupação arrecadatória, mas de uma apreciação baseada nos valores da igualdade de solidariedade.

Portanto, essa obrigatoriedade de que a solidariedade e a capacidade contributiva devem orientar a interpretação das normas jurídico-tributárias é uma derivação direta da ideia de “interpretação econômica”, pois, segundo essa visão, a solidariedade social só poderia ser efetivada mediante a tributação, em seu aspecto máximo. Nesse sentido, a capacidade contributiva viabiliza o alcance da tributação sobre todas as manifestações de riqueza, mesmo aquelas não previstas na hipótese de incidência da norma tributária. Essa forma de raciocinar é decorrente da aplicação da doutrina do dever fundamental de pagar impostos (LEÃO, 2018, p. 169).

Apesar da solidariedade tocar diretamente a ordem tributária e, consequentemente, influenciar na formulação dos tributos, tal princípio não tem o condão de irromper todo um sistema de divisão de poderes e a rigidez do ordenamento tributário brasileiro, que está fundamentado em valores fundamentais como direitos e garantias individuais, segurança jurídica, separação de poderes etc., que limitam a atuação do estado fiscal. 

Por isso, conferir maior primazia à solidariedade e à capacidade contributiva como fundamento para tributação seria conceder uma carta branca ao estado-fiscal para gravar arbitrariamente o patrimônio dos particulares. A solidariedade é somente um dos fundamentos (moral, político e jurídico) para custeio das despesas estatais, não podendo ser utilizada como fundamentação para tributar abusivamente o patrimônio dos particulares ou dilapidar direitos individuais. 

A Constituição de 1988, ao mesmo tempo em que estabeleceu a solidariedade e a capacidade contributiva como princípios, também prescreveu que é de competência do legislador, e não da administração fiscal ou do Poder Judiciário, definir as manifestações de riqueza que se sujeitam à tributação. Isto significa que somente as manifestações de riqueza elencadas pelo legislador, em consonância com o arquétipo definido pelas regras de competência estabelecidas pela Constituição, estarão sujeitas a tributação, excluindo-se as demais (LEÃO, 2018, p. 175). Não impor limites aos vetores da solidariedade e da capacidade contributiva é anular o princípio da legalidade, pois acabar-se-á legitimando a tributação com base em princípios, e não na lei, o que não é admitido no sistema jurídico-tributário brasileiro, que se sustenta na previsibilidade (LEÃO, 2018, p. 175).

Frise-se que não se está questionando o valor da solidariedade social e da capacidade contributiva como princípios informadores da ordem jurídica brasileira. O constituinte determinou a promoção desses valores, inclusive por meio da tributação. O que se busca destacar é que esses valores podem ser materializados de outras formas, e não somente mediante a tributação maximizada. Outrossim, tais valores servem como ferramentas a serem utilizadas pelo legislador no momento de formulação das normas jurídico-tributárias, e não ao intérprete-aplicador, muito menos à administração tributária (LEÃO, 2018, p. 177).

Se levado às últimas consequências, Esse método teleológico de interpretação das normas tributárias reduzirá a eficácia dos princípios e garantias da legalidade, da liberdade e da propriedade. (LEÃO, 2018, p. 177). Isso porque, como vimos, essa doutrina coloca em lados opostos os valores constitucionalmente previstos, classificando os valores liberdade e propriedade como ligados, predominantemente, a uma posição individual, e os valores solidariedade, capacidade contributiva e isonomia como ligados a uma postura coletivista (GRECO, p. 310).

Portanto, a tributação é o produto de um sopesamento de valores e interesses. De um lado tem-se o dever de contribuir financeiramente para o aprimoramento de um projeto social, e, de outro, o direito de ter seu patrimônio preservado. A tributação, ainda que atuante em prol da solidariedade social, é caracterizada como uma intervenção nos direitos de liberdade e de propriedade dos cidadãos, não podendo servir de fundamento para uma leitura constitucional parcial. O próprio texto constitucional já atribuiu as funções de cada um dos princípios no sistema tributário brasileiro, o que impossibilita o intérprete-aplicador de manipular, de modo discricionário, tais atribuições, conferindo a um determinado valor, por exemplo, uma prevalência que não foi outorgada pela Constituição (LEÃO, 2018, p. 179).

4 REPARTIÇÃO DE COMPETÊNCIAS TRIBUTÁRIAS E O IDEAL DE HARMONIA: rigidez do Sistema Tributário e o alto grau de vinculação do intérprete à Constituição

Sistema, grosso modo, é a reunião harmônica de elementos organizados a partir de um critério unificador, que se relacionam entre si segundo determinadas regras (KELSEN, 2012). A noção de sistema, a partir dessa concepção, busca dirimir a existência de contradições internas. Nessa toada, se faz possível afirmar que se trata o Sistema Tributário Nacional de um conjunto de normas estruturadas de modo hierárquico, que governam a instituição dos tributos, desde o altiplano constitucional até a esfera infraconstitucional, partindo, de modo racional, a tributação, a fim de limitá-la.

Segundo Hart (2020), as normas de competência estão inseridas entre as normas de modificação, categoria em que se incluem tanto os enunciados normativos que conferem “poderes públicos” como os que outorgam “poderes privados” para a introdução ou eliminação de normas no sistema. Isso porque o autor enxerga as normas de competência como distintas das prescrições, e a interpretação mais corrente é a de que as veria como “definições”. Hart vislumbra três características nas normas de competência: i) sua associação não com a noção de sanção, mas sim com a noção de nulidade; ii) possibilidade de distinção entre atos públicos e atos privados de um mesmo indivíduo; iii) impossibilidade lógica de serem “desobedecidas” ou “violadas”, no mesmo sentido em que se pode falar em infração a uma norma de conduta.

A competência é a capacidade jurídica estabelecida de criar normas jurídicas (ou efeitos jurídicos) por meio de e de acordo com enunciados (ROSS, 2000, p. 76). Portanto, cabe às normas de competência o estabelecimento das condições necessárias para a criação de outras normas, podendo – as normas de competência – ser divididas em três categorias: i) as que qualificam o indivíduo que poderá criar a normas (competência pessoal); ii) as que prescrevem o procedimento que deve ser seguido (competência processual); iii) as que estabelecem o alcance das normas em relação ao seu sujeito, situação e tema (competência material). A interação dessas três categorias de normas delimita as condições para a criação de uma norma.

Todo ato jurídico é o exercício de um poder outorgado ao autor por meio de uma regra de competência. Tais regras determinam as condições em que o pronunciamento deve ser feito para chegar a produzir as consequências jurídicas desejadas. Quando satisfeitos os requisitos da competência (pessoal, formal e material), o ato é válido. Desse modo, pode-se dizer que toda norma de competência investe a pessoa competente do poder de criar as consequências jurídicas desejadas.

Além de regular a criação das normas, as normas de competência também estabelecem as consequências para a circunstância de suas determinações não serem atendidas. O irregular exercício da competência implica na invalidade da norma criada. Porém, o exercício irregular de uma norma que não seja de competência projetaria, apenas e tão somente, um caso de responsabilidade para aquele que infringiu os deveres que lhe foram impostos.

O pacto federativo brasileiro conferiu autonomia à União, Estados-membros, Distrito Federal e aos Municípios. Em razão disso, a Constituição de 1988 proveu aos entes políticos recursos financeiros para que possam suportar suas respectivas despesas. Para o provimento de receitas, foi estabelecida, de forma sistematizada, as competências tributárias impositivas, designando, a cuidados superlativos, as molduras normativas com base nas quais os entes políticos podem instituir tributos (ATALIBA, 1968, p. 37).

Por intermédio de rijos e vastos contornos constitucionais na distribuição das aptidões tributárias, alcançou-se a rigidez do sistema. Ao delimitar e demarcar, de modo esmerado, não somente o exercício da competência para instituir tributos, mas também toda a atividade fiscal, o Sistema Tributário Nacional almejou conter conflitos de competência e bitributação, assim como preservar a isonomia, a autonomia financeira dos entes políticos e a estabilidade nas relações entre fisco e particulares.

Deste modo, o Sistema Tributário Brasileiro possui, precipuamente, duas funções: (i) estruturante: consagrando a competência estatal de tributar; (ii) garantista: resguardando os contribuintes em face do exercício dessa competência estatal. Tais perspectivas estão vinculadas à Constituição, que além de discriminar e disciplinar de modo minudente as competências tributárias impositivas, estabelece, ainda, uma série de limitações ao poder de tributar, alicerçadas nos princípios-garantia, nos princípios institucionais e nas imunidades.

O caráter exaustivo do texto constitucional, aliado à tradição brasileira de atribuir máxima efetividade às normas constitucionais garantidoras de direitos fundamentais, transfere a maioria das discussões tributárias para o altiplano constitucional.

Isso pois, levando em consideração os sujeitos envolvidos na relação jurídico-tributária (contribuintes versus fisco), toda legislação que institui tributo pode, de algum modo, ser reconduzida a algum direito subjetivo fundamental, consagrado pela Constituição como limitação ao poder de tributar. Por consequência, resta pouco espaço de conformação legislativa, reservando-se menos matéria ao debate político e à discricionariedade do Poder Legislativo infraconstitucional. Esses aspectos – função estruturante e garantista da Constituição e tradição de máxima efetividade – contribuem para a rigidez do nosso sistema constitucional-tributário.

Convém ressaltar que a rigidez aqui apontada não está relacionada ao termo comumente adotado no Direito Constitucional, relativo ao processo mais complexo de alteração da Constituição, mas sim ao grau de vinculação e limitação imposto ao legislador e ao intérprete. Geraldo Ataliba faz importante distinção entre a rigidez jurídica da disciplina constitucional tributária e a sua flexibilidade econômica, referente à possibilidade de adaptação aos progressos econômicos e científicos. 

Sob o enfoque jurídico, a rigidez sempre se fará presente, já que o legislador está submisso em seus atos à literalidade textual e ao conteúdo dos mandamentos que constituem o rol de competências; ante a perspectiva econômica, ao legislador foi possibilitado “atualizar-se com as conquistas da ciência econômica e acompanhar o progresso das especulações financeiras, adaptando-se às exigências fluidas e mutáveis das realidades condicionais do comércio privado” (ATALIBA, 1968, p. 38). 

Assim sendo, a listagem contida nos artigos 153, 155 e 156 não esgota todas as manifestações de capacidade contributiva sujeitas a serem oneradas pelos impostos. A Constituição outorgou à União, no artigo 154, inciso I, a competência residual para tributar fatos de relevância econômica que não se subsume às materialidades já elencadas de modo rigoroso no texto constitucional.

Portanto, a competência residual reforça a rigidez do sistema, pois explicita que a amplitude na disciplina da aptidão para instituir impostos é total na medida em que todo e qualquer fato que revele conteúdo econômico, salvo os albergados pelas normas de imunidade, poderá ser objeto de tributação. Posto isto, não existe, juridicamente, possibilidade de qualquer tipo de imposto escapar ao dilema: ou se configurou como privativo (artigos 153, 155 e 156) ou será residual (artigo 154, inciso I) (ATALIBA, 1968, p. 213).

Em resumo: é vedado ao Estado promover a potencialização da arrecadação financeira através da tributação com base, exclusivamente, nos valores da solidariedade social e capacidade contributiva, já que a Constituição assim não determinou e, consequentemente, não autorizou que alguém assim procedesse. Esse entendimento é incompatível com a nossa ordem jurídica, visto que o sistema constitucional tributário brasileiro possui caráter garantista e protetivo aos contribuintes, assumindo uma posição cada vez mais limitativa ao poder de tributar. 

O próprio ideal de solidariedade social só pode ser imposto de acordo com os contornos que a lei lhe der. Para o provimento de receitas, foi estabelecida, de forma sistematizada, as competências tributárias impositivas, designando, a cuidados superlativos, as molduras normativas com base nas quais os entes políticos podem instituir tributos (ATALIBA, 1968, p. 37).

Portanto, configura-se como “slogan propagandista” a utilização da solidariedade, a capacidade contributiva e o dever fundamental de pagar tributos sem a verdadeira contextualização destes valores diante da Constituição de 1988 e do Sistema Tributário Nacional lá estruturado (LEÃO, 2018, p. 180). Na Constituição de 1988, há o enquadramento tipificador que limita as espécies e os tipos de tributos que podem ser exigidos por cada um dos entes políticos, o que pode ser constatada por uma leitura honesta da Constituição, sem ranços ideológicos.

Portanto, o dever fundamental de pagar tributos é o dever de fazê-lo na justa medida, significa dizer, não se pode exigir o martírio econômico de quem quer que seja. Contribui-se na medida adequada de seu patrimônio, nem mais, nem menos, e de acordo com a legalidade. Não se alcança harmonia e paz social destruindo a propriedade dos indivíduos, pelo contrário, a dignidade da pessoa humana, enquanto fundamento do estado democrático de direito, exige a garantia de condições materiais indispensáveis para uma vida digna. É daqui que se extrai a ideia de mínimo existencial.

5 CONCLUSÃO

Como visto, os textos jurídicos ganham sentido por meio da contínua interpretação. Por ser um sistema autopoiético, o direito positivado é transformado e ampliado pela fluidez progressiva de decisões proferidas pelos aplicadores do Direito, se revelando em novos estudos científicos, novas leis, novos atos administrativos etc. Todavia, não se pode admitir que a atividade hermenêutica esteja livre de limites, podendo o intérprete fabricar qualquer sentido jurídico.

A construção de sentidos aos enunciados jurídicos é restringida pelo próprio texto e seu contexto. A interpretação tem por base o texto: nele tem início, por ele se conduz e, até o intercâmbio com outros discursos, instaura-se a partir dele. O ingresso no plano do conteúdo dos textos jurídico-positivos tem de levar em consideração as diretrizes do sistema (CARVALHO, 2015, p. 205).

Os termos empregados pelo legislador constituinte ao estabelecer as competências tributárias correspondem a conceitos, que transportam um conjunto de ideias, um conteúdo semântico que se consagrou ao longo do tempo, pelo uso linguístico específico, resultante do labor doutrinário, cujos estudos descritivos servem de auxílio, de motivação dos processos decisionais. 

O uso específico de termos jurídicos são fundamentais para guiar o processo de interpretação e aplicação das normas, reduzindo as variantes semânticas dos vocábulos e palavras positivadas e estruturando as fronteiras da atuação do exegeta. A definição de conceitos jamais dependerá do arbítrio do intérprete.

Contudo, bem sabemos que as águas agitadas da economia ocupam, sem pedir licença, o mar do Direito. Enquanto no cenário natural tal fenômeno resulta na beleza do encontro riomar, fonte de inspirações poéticas, no âmbito da tributação, o horizonte não é nada aprazível para o pagador de tributos, gentilmente denominado “contribuinte”.

A recessão econômica, aliada ao déficit fiscal, impele os Poderes Legislativo e Executivo a buscarem soluções imediatistas na tentativa de amenizar tais problemáticas. Implementam uma política fiscal de caráter contracionista, perseguindo a equalização das contas públicas amplificando a arrecadação. Para tal, estabelece como uma de suas diretivas básicas o “alargamento” das hipóteses de incidência tributária, objetivando alcançar atividades antes não abrangidas.

Quer se entenda os signos constitucionais como algo a ser livremente definido pelo agente interpretador ou, diferentemente, fenômeno adstrito aos conceitos pré-estabelecidos, o ponto crucial é que uma atividade não pode, como um passe de mágica, assumir uma conotação, uma roupagem distinta, apenas para fins de subsunção à hipótese de incidência dos tributos. Caso assim ocorra, haverá uma derrocada do Sistema Tributário Nacional, ante a ausência de segurança jurídica, princípio caro e necessário ao bom e regular desenvolvimento da atividade econômica.

A Constituição de 1988 é enfática ao estabelecer limites ao poder de tributar do Estado, visando, desse modo, minimizar as violações dos direitos fundamentais. As normas comuns a todas as esferas dos entes políticos – União, Estados, Distrito Federal e Municípios – restringem-se aos princípios constitucionais tributários, às limitações ao poder de tributar e às normas gerais de Direito Tributário estabelecidas por lei complementar.

Assim sendo, trata-se a Constituição de um complexo normativo a partir do qual do qual se forma o Direito Constitucional Tributário, cuja expressiva relevância decorre do fato de fornecer os contornos básicos do Direito Tributário (VELLOSO, 2012, p. 15). A arrecadação tributária não pode representar, em hipótese alguma, ofensa a nenhum direito fundamental, não podendo haver antagonismo entre a necessidade de arrecadação fiscal do Estado e os direitos fundamentais do cidadão contribuinte.

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1Mestrando em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários. Advogado. E-mail: inacio.augusto.015@ufrn.edu.br
2Advogado. Professor Associado do Departamento de Direito Público da UFRN. Mestre em Direito Político e Econômico pela Universidade Mackenzie/SP e Doutor em Direito Público pela Faculdade de Direito do Recife (UFPE) com Estágio e Bolsa de Pesquisa no Max-Planck-Institüt für Steuerrecht, em Munique, Alemanha. E-mail: andreelali@gmail.com.