RESPONSABILIZAÇÃO DOS AGENTES PÚBLICOS NA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA E OS IMPACTOS DA CORRUPÇÃO NO SERVIÇO PÚBLICO.

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7936797


Jose Mauri de Freitas Francisco1
Nathalia Martins da Silva Reis Pimental2
Érik Serafim da Silva3


Resumo

A proteção da moralidade administrativa ergue-se como um relevante tema a ser estudado quando abordamos a temática da gestão pública.  A imposição jurídica da atuação proba por parte dos agentes públicos, alicerça a própria ideia de Estado Democrático de Direito, onde o interesse público se sobrepõe aos interesses privados e se privilegia a atuação escorreita em detrimento a práticas inidôneas. Nesse contexto, a análise da Lei 8.429/1992 constitui o objeto de pesquisa do nosso trabalho, sobretudo por ser o diploma legal que tutela a moralidade administrativa no Brasil, disciplinando as disposições constitucionais, tipificando condutas e combinando sanções.  Para além do estudo jurídico do tema, ganha pungência entender quais as consequências dos atos de improbidade na prestação dos serviços públicos e no regular desenvolvimento das atividades administrativas e como isso implica negativamente na vida dos indivíduos.  Dessa forma, buscamos, na tratativa do tema, abordar não apenas aspectos legais e jurisprudenciais da lei, mas também aspectos empíricos e concretistas das mazelas causadas pela patologia corruptiva que incide na gestão pública brasileira desde a sua concepção e hoje encontra-se latente e nas pautas de discussão da sociedade contemporânea, tamanha incidência e dimensão epidemiológica em que o tema se apresenta no contexto atual da sociedade brasileira, e que somente o despertar de uma consciência coletiva de corresponsabilidade com a coisa pública pode fazer com que superemos o problema.

Palavras-chave: moralidade administrativa, administração pública, serviços públicos

1 INTRODUÇÃO

A administração pública no Brasil é regida por dois princípios que, embora implícitos, são diretrizes para o regime jurídico administrativo, são eles: o princípio da supremacia do interesse público e o princípio da indisponibilidade do interesse público. 

A partir dessas duas balizas principiológicas podemos extrair a base teórica que fundamenta a tutela da moralidade administrativa, uma vez que se compreende que o agente público deve pautar sua conduta na satisfação do interesse público, posto que quando age é o próprio Estado a atuar concretamente na vida dos indivíduos, para tanto deve dirigir sua conduta  com base nos deveres de honestidade, boa-fé e probidade, por vezes, essa conduta desvirtuada  impacta na mal distribuição de recursos  públicos,  que acabam remanejados para interesses particulares.

Se fizermos uma análise histórica da evolução legislativa no que tange à proteção a moralidade administrativa, podemos encontrar suas raízes já na constituição de 1946, onde havia previsão do sequestro de bens e pena de perdimento para o agente público que incorresse em enriquecimento ilícito no exercício de sua função. 

Todavia é a partir da Constituição Federal de 1988 onde a moralidade administrativa é alçada ao princípio expresso da Administração Pública, que a sua proteção começa a ganhar contornos mais sólidos. O texto da Constituição Cidadã traz diversos dispositivos incumbidos da tutela da probidade, demonstrando sua importância para o legislador constituinte, que, inclusive, traz punições as quais estaria sujeito o agente público que  praticasse um ato de ímprobo, no intuito de regulamentar todos esses  dispositivos foi editada a lei 8.429/92, Lei de Improbidade Administrativa, também cognominada de LIA, é importante ressaltar que essa lei sofreu significativas alterações pela Lei 14.230/ 2021, ganhando uma nova roupagem o que será apreciado em nosso estudo a seguir.  

Isso posto, discorreremos sobre os principais aspectos da responsabilização dos agentes públicos na Lei e suas implicações na tutela da moralidade administrativa, frisamos, por último, que esse trabalho não tem o intuito de analisar aspectos penais das condutas dos agentes públicos e que ao final do nosso estudo observamos os impactos da improbidade na prestação dos serviços públicos.

O nosso estudo estará dividido em duas etapas, em uma primeira análise abordaremos a responsabilização dos agentes públicos na Lei 8.429/92, destacando os seus pontos controvertidos e aspectos jurisprudenciais por meio de uma acepção eminentemente jurídica do tema; em uma segunda análise, abordaremos os impactos dos atos de corrupção na prestação dos serviços públicos no Brasil e o comprometimento da eficiência pública.  

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 

O trabalho a seguir é parte de uma análise multidisciplinar do tema perpassando por diversas áreas do direito, pelas quais reverbera a temática tais como: direito administrativo, civil, penal e principalmente o direito constitucional, posto que com o advento do neoconstitucionalismo todas as temáticas jurídicas devem ser apreciadas de forma primeira pelo prisma  da Constituição, uma vez que ela é o vértice de todo o sistema jurídico normativo, com a expectativa de fornecer maior base teórica optamos por apresentar o posicionamento dos principais doutrinadores  sobre  as questões mais  controversas que afligem  a legislação. 

Para robustecer nossa pesquisa trouxemos, ainda, o posicionamento dos Tribunais Superiores. Garantindo que nossa pesquisa contempla as três principais fontes do direito positivo, a saber: lei doutrina e jurisprudência. Para além dos recursos supracitados, apreciam os dados sobre as consequências dos atos ímprobos no setor público. 

 Inicialmente vamos  analisar a natureza jurídica do ato de improbidade, alguns doutrinadores afirmam que a LIA possuía natureza penal e as condutas descritas em seu texto seriam verdadeiros tipos penais, porém a  própria constituição em seu art. 37 §4 assevera que as sanções prevista  para os atos de improbidade  seriam aplicadas sem prejuízo da ação penal cabível, logo tratar-se-iam  de coisas distintas, assim o STF na ADI 2797 decidiu que as condutas trazidas na LIA possuíam natureza jurídica civil, mesmo que algumas sanções  repercutem nos direitos políticos. 

Destacamos ainda que os agentes públicos no exercício de sua função estão sujeitos a uma tríplice responsabilização e um mesmo ato que importe em improbidade, pode configura um crime  e uma infração administrativo concomitantemente e poderá ser punido nas três esferas independentemente da sorte dos demais processos por força do princípio da independência das instâncias.  Excepcionalmente haverá comunicação dos processos no caso de absolvição na seara penal, desde que fundamentada na negativa de fato ou de autoria e excludente de ilicitude na qual teremos a absolvição nas demais instâncias; e a condenação penal que obriga a condenação nas demais instâncias, posto que  é, por regra, no processo penal onde se tem o maior número de garantias processuais em favor do réu e, portanto, em virtude do in dubio pro reo, sua condenação só se pode dar  com um juízo de certeza. 

2.1 Sujeito passivo e ativo do ato de Improbidade Administrativa

A LIA dispõe em seu artigo Art. 2º os ativos do ato de Improbidade, adotando um conceito alargado de agente público:

“Art. 2° Art. 2º Para os efeitos desta Lei, consideram-se agente público o agente político, o servidor público e todo aquele que exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades referidas no art. 1º desta Lei.” 

Nota-se que para lei não há necessidade de vinculo efetivo ou de remuneração e também estão abrangidos os particulares que exercem transitoriamente a função pública tais como os mesários e jurados. A LIA amplia ainda mais o seu alcance ao dispor que em seu parágrafo único do art. 2° que terceiros não integrantes da administração pública sejam pessoa física ou jurídica que celebra com a administração pública convênio, contrato de repasse, contrato de gestão, termo de parceria, termo de cooperação ou ajuste administrativo.

De outra banda, considera-se sujeitos passivos do ato de improbidade, portanto vítimas do ato de improbidade, os órgãos do Poder Legislativo, Executivo e Judiciário, Entidades da Administração direta e indireta, bem como todas as entidades que recebam subvenção, auxílio, benefício fiscal ou creditício por parte do poder público como também as entidades privadas cuja a criação e o custeio o erário tenha concorrido. 

De modo geral, sempre que tivermos entidades que recebam verbas ou subvenções públicas, elas poderão ser sujeitas passivos dos ilícitos tipificados na LIA. Devemos alertar que o sujeito passivo é a pessoa jurídica que sofre as consequências do ato ímprobo, e esse será sujeito ativo da ação de improbidade, o que são coisas completamente distintas.

2.2 Dos atos de Improbidade Administrativa e suas respectivas sanções

O próprio texto constitucional traz as balizas da punição dos atos de improbidade, trazendo as seguintes consequências em seu art.37§4ºCF/88: “Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.” O professor Scatolino traz algumas considerações a respeito do tema (2016, p.778): 

“Inicialmente, cabe discorrer sobre as consequências constitucionais da prática do ato de improbidade, ressaltando que aplicação das sanções decorrentes da ação de improbidade deve ser aplicadas pela via judicial. Dessa forma, caberá ao Poder Judiciário, com a autonomia que lhe é atribuída, decidir quais sanções serão aplicadas em cada caso, dentro dos limites definidos em lei. Nesse ponto, dispõe o parágrafo único do art.12 que “na fixação das penas previstas nesta lei o juiz levará em conta a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo agente.” 

Ainda sobre as punições dos agentes público, cabe lembrar que o magistrado tem a sua disposição um extenso rol de sanções que poderão ser aplicadas cumulativamente mesmo que o indivíduo tenha praticado apenas um ato, contudo preciosas são as lições de Carvalho Filho (2017, p.1226):

“Outro comentário que se faz necessário é o de que bem maior deve ser a prudência do aplicador da lei à ocasião em que for enquadrada a conduta como de improbidade e também quando tiver que ser aplicada a penalidade. Mais do que nunca aqui será inevitável o recurso aos princípios da razoabilidade, para aferir-se a real gravidade do comportamento, e da proporcionalidade, a fim de proceder-se à dosimetria punitiva. Fora de semelhantes parâmetros, a atuação da autoridade refletirá abuso de poder. P.1226”

A partir de agora seguiremos com a análise dos atos de improbidade propriamente ditos e suas respectivas punições, a luz das recentes alterações da legislação ordinária. Os atos de Improbidade são divididos em três tipos: os que acarretam enriquecimento ilícito (art. 9°), os que causam danos ao erário (art. 10) e os que ferem os princípios da administração pública (art.11) vejamos: 

“Art. 9º Constitui ato de improbidade administrativa importando em enriquecimento ilícito auferir, mediante a prática de ato doloso, qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, de mandato, de função, de emprego ou de atividade nas entidades referidas no art. 1º desta Lei, (…) “. “Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta Lei. (…) “. “Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública a ação ou omissão dolosa que viole os deveres de honestidade, de imparcialidade e de legalidade, caracterizada por uma das seguintes condutas. (…) “

A partir das alterações promovidas pela Lei  14.230/ 2021, destacamos algumas  inovações: a primeira delas é que deixou de existir a possibilidade do cometimento de improbidade de forma culposa, antes era possível na modalidade dano ao erário. Atualmente a Lei prevê de forma expressa que só é possível a punição de atos a título de dolo.  Após as alterações, o STF passou a considerar que o rol do art. 11 (violação aos princípios) é taxativo, portanto não se pode interpretar para criar outras hipóteses não previstas em lei. Ressalvamos que nas demais situações, enriquecimento ilícito e danos ao erário o rol continua exemplificativo.

As penas para os atos de improbidade estão graduadas segundo a gravidade das condutas e para as que importam em enriquecimento ilícito, e estão dispostas no art. 12 da lei.

Art. 12. Independentemente do ressarcimento integral do dano patrimonial, se efetivo, e das sanções penais comuns e de responsabilidade, civis e administrativas previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade sujeito às seguintes cominações, que podem ser aplicadas isolada ou cumulativamente, de acordo com a gravidade do fato:

I – na hipótese do art. 9º desta Lei, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos até 14 (catorze) anos, pagamento de multa civil equivalente ao valor do acréscimo patrimonial e proibição de contratar com o poder público ou de receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo não superior a 14 (catorze) anos;

II – na hipótese do art. 10 desta Lei, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância, perda da função pública, suspensão dos direitos políticos até 12 (doze) anos, pagamento de multa civil equivalente ao valor do dano e proibição de contratar com o poder público ou de receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo não superior a 12 (doze) anos; 

III – na hipótese do art. 11 desta Lei, pagamento de multa civil de até 24 (vinte e quatro) vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e proibição de contratar com o poder público ou de receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo não superior a 4 (quatro) anos;

3 METODOLOGIA

A metodologia aplicada para o desenvolvimento do trabalho em apreço, é o método descritivo, onde pretendemos através da observância da legislação em vigor, dos precedentes dos tribunais e da análise fática da atual conjuntura social brasileira descrever a ocorrência de casos de improbidade administrativa por parte dos agentes públicos e de como isso é tratado pelo Estado brasileiro.

Nessa perspectiva, a pesquisa se vale de uma análise minuciosa dos principais aspectos da improbidade e as consequências de sua ocorrência na prestação de serviços públicos e por via reflexa na população que os usufrui. Para tal pretensão, fizemos a utilização de larga pesquisa na jurisprudência e na doutrina correlata.

4 RESULTADOS E DISCUSSÕES 

4.1 Impacto dos atos de Corrupção nos serviços públicos no Brasil

Para explicar o cenário de corrupção que atinge a administração pública e como eles impactam na prestação dos serviços públicos, devemos compreender primariamente as concepções do modelo de administração patrimonialista,  implantado inicialmente no Brasil. Nesse modelo não existe separação entre a res pública e a  res principis, ou seja, o patrimônio do povo  e o do soberano eram um só. 

O governante exercia amplos poderes sobre esses bens e não precisava prestar contas à sociedade. Além disso, esse modo de administração privilegiava práticas como o nepotismo, coronelialismo e corrupção, a falta de concurso público para o provimento dos cargos públicos gerava situações de apadrinhamento políticos  e o loteamento de cargos dentro dos governos. 

Durante o  governo Vargas,  esse modelo de administração passa  a ser suplantado por um modelo burocrático  em que abre-se espaço para o princípio da impessoalidade e  do formalismo,  com o advento da Constituição Federal de 1988, inaugura-se um modelo de administração gerencial, prezando pela eficiência  e com foco nos resultados, admitindo a  concessão de serviços públicos a pessoas jurídicas privadas, da nas palavras de  Claudia Adriele( 2013): 

A prestação de serviços públicos não exclusivos do Estado, ou seja, não correspondentes à manifestação de uma feição do poder do Estado, como o poder de polícia, ganhou novos modelos. Trata-se do estabelecimento de parceria com o Terceiro Setor para prestação de serviços como saúde, educação, pesquisa científica, fomento, entre outros. A prestação de serviços público por intermédio de agentes não estatais, atuando sob formas menos rígidas e sujeita ao controle estatal quanto aos resultados, é aplicação prática do princípio da eficiência. Tal mudança visa, na verdade, ao acréscimo de qualidade na prestação dos serviços públicos sociais, perdida com a crise de financiamento que levou à derrocada do Estado Social.

Em que pese todo esse processo evolutivo da administração no Brasil, resquícios do  modelo paternalista sobrevivem nos dias atuais e  comprometem a atividade pública pois funcionam como locus para corrupção, um exemplo  disso é a existência de cargos de livre  nomeação e exoneração  que dão ampla margem de discricionariedade ao administrador para o seu preenchimento, além disso, temos  que embora a prática de  nepotismo seja vedada pelo o ordenamento, inclusive com determinação legal após a lei 14.230/21, que reproduz a    Súmula Vinculante nº 13  do STF:

“A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade, até o terceiro grau, inclusive, da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica, investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento, para o exercício de cargo em comissão ou de confiança, ou, ainda, de função gratificada na Administração Pública direta e indireta, em qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal.”

 Admite-se, no entanto, a nomeação de parentes até terceiro grau para cargos públicos que aufiram  natureza política, salvo quando manifesta a incompetência do nomeado para o cargo. Essas brechas legislativas no ordenamento jurídico viabilizam a prática de condutas ímprobas e o vilipêndio à moralidade administrativa. 

Dados da Transparência Internacional, que indicam o nível percebido de corrupção no setor público, Índice de Percepção da Corrupção (IPC), mostram que em relação ao ano de 2017 o Brasil caiu 9 posições no IPC, ocupando em 2018 a 105ª colocação entre 180 países avaliados. Países como Uruguai, Chile e Costa Rica, respectivamente 23º, 27º e 48º colocados estão bem à frente do Brasil. Segundo a ONG, entre os dez primeiros colocados, sete são países europeus, o organismo internacional aponta que essas nações apresentam como ponto de intersecção instituições democráticas fortes, liberdade de imprensa e, sobretudo, uma população imbuída de uma consciência política  de que é preciso participar dos espaços de poder  e de tomada de decisão bem como fiscalizar os agentes públicos. 

Em países, como o Brasil, em que há altos índices de corrupção, os impactos  dessas condutas desvirtuadas se manifestam também na economia, pois o país perde em capital de investimento privado, posto que  não apresenta uma ambiente atrativo ao capital estrangeiro, tendo em  vista que a instabilidade política, provocada por inúmeras denúncias de corrupção geram incertezas sobre o rumo do país, reverberando negativamente na economia, dessa forma a corrupção faz com que o país perda em competitividade  no plano internacional. 

O professor Luiz Flávio Gomes, analisando dados da Fiesp que apontavam que em 2010 o custo médio da corrupção no Brasil, foi estimado entre 1,38% a 2,3% do PIB, algo equivalente a R$50,8 bilhões a R$84,5 bilhões, afirma:

“ Num cenário realista, o custo da corrupção seria de R$ 50,8 bilhões, com o qual o Brasil poderia arcar com o custo anual de 24,5 milhões de alunos das séries iniciais do ensino fundamental segundo os parâmetros do CAQi (Custo Aluno-Qualidade Inicial – CAQI–, originalmente desenvolvido pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação, estabelece padrões mínimos de qualidade da Educação Básica por etapa, fase e modalidade.).Também seria possível equipar e prover o material para 129 mil escolas das séries iniciais do ensino fundamental com capacidade para 600 alunos segundo o modelo CAQi.”

Os reflexos na prestação dos serviços públicos são inevitáveis, esses são comprometidos tanto no aspecto quantitativo como qualitativo. A partir desse cenário caótico de mau gerenciamento dos recursos públicos e do fato que o país perpassa por uma crise fiscal, provocada pelo aumento do gasto público e queda  na arrecadação  tributária, ocorre o contingenciamento orçamentário cada vez mais rigoroso e como no Brasil o orçamento é repleto de despesas obrigatórias, esses  cortes recaem sobre as despesas correntes, que compreendem serviços como saúde, educação e segurança. Todo esse problema conjuntural e sistêmico acedia de sobremaneira a população mais carente, via de regra, a maior demandadora de serviços estatais, programas sociais são deixados para segundo plano, perde-se em eficiência e recursos são alocados na satisfação de interesses particulares. 

“A não aplicação de recursos públicos nas políticas públicas sociais, por vontade política às vezes condicionada pelas patologias corruptivas, possui potencial de causar impactos diferenciados à população vulnerável e aos diversos grupos que a compõem. Há impactos diferentes para homens e mulheres, de forma que a corrupção contribui para a perpetuação das desigualdades de gênero, influenciam de maneira mais agravada crianças e adolescentes, os quais, tendo em vista a intersetorialidade das políticas específicas para essa população, ficam à mercê das diversas situações de violação, seja nos seus diretos à convivência familiar e comunitária, em relação a políticas de enfrentamento à violência em suas variadas formas, bem como no combate ao trabalho infantil. P (SOUZA, p.115)”

Esse alto índice de corrupção, caracterizada por atos de improbidade, minam os princípios estruturantes da Administração Pública e corroem os pilares jurídicos e finalísticos da boa administração.

Os atos de improbidade prejudicam de sobremaneira todas as atividades da administração pública, principalmente, aqueles que causam enriquecimento ilícito e dano ao cenário, pois em ambos temos a fluidez de recursos públicos para interesses escusos, a não alocação  do dinheiro em serviços públicos torna a atividade administrativa deficitária, isso pode ser verificado nas mais  variadas estruturas da administração  no Sistema Único de Saúde, por exemplo, em estudo feito pela CGU e divulgado pelo Conselho Federal de Medicina  contatou-se  que entre  2002 e 2015 foram desviados  R$ 4.555.960.367,85  de recursos da saúde. Em reportagem divulgada pelo jornal diário de Pernambuco:  

“As áreas de saúde e educação foram alvo de quase 70% dos esquemas de corrupção e fraude desvendados em operações policiais e de fiscalização do uso de verba federal pelos municípios nos últimos 13 anos. Os desvios descobertos pelo Ministério da Transparência, Fiscalização e Controladoria-Geral da União (CGU), em parceria com a Polícia Federal e o Ministério Público Federal, evidenciam como recursos destinados a essas duas áreas são especialmente visados por gestores municipais corruptos.”

Os impactos também são sentidos na educação, nesse segmento, temos uma agravante, posto que a má qualidade da educação impede a formação de cidadãos conscientes os renegando a um ciclo intransponível de ignorância e perpetuação da pobreza. A não formação de indivíduos com senso crítico e fiscalizadores da res publica, facilita a manutenção de agentes públicos ímprobos no poder e por consequência a constante dilapidação do erário. 

5 CONCLUSÃO

Diante do panorama teratológico de patologias corruptivas no qual está imersa a Administração Pública no Brasil, onde a linha que cinde o público do privado está cada vez mais translúcida se faz necessário que sejam implementados instrumentos eficazes para estancar o escoamento dos recursos públicos rumo ao atendimento de interesse particulares, condição si ne qua non para a melhoria efetiva da prestação de serviços públicos.

 Em que pese o árduo combate feito contra corrupção nos últimos anos, ainda observamos um número elevado de atos de improbidade conforme demonstram os dados da transparência internacional, por conseguinte  surge a necessidade da implantação de  novos mecanismos para  o tratamento da patologia corruptiva, o primeiro deles perpassa pela efetiva punição dos agentes envolvidos nos atos de improbidade, nesse sentido, a lei 8.432/92  constitui  uma importante ferramenta  de  tutela da moralidade administrativa, pois regulamentou as disposições constitucionais sobre o tema e ergueu uma estrutura jurídica  de coibição de condutas inidôneas  por partes dos  agentes públicos, não obstante a isso o posicionamento dos Tribunais Superiores têm contribuindo para esse finalidade, pois no exercício da atividade hermenêutica têm dado maior rigidez a norma e a seus institutos.

 Para além de mecanismos coercitivos se faz necessário a criação de uma consciência coletiva de corresponsabilidade com a coisa pública, que se desdobra na responsabilidade dos gestores públicos que administram coisa alheia e, portanto, enquanto estiverem nessa condição, não devem desviarem-se do interesse público; e dos cidadãos, no intuito de fiscalizarem a atuação dos gestores participando ativamente dos espaços de decisão política. E por fim, a superação do modelo de administração patrimonialista, para um modelo gerencial de administração, no qual as práticas de impessoalidade são mantidas e se enfatiza a buscas pelo princípio da eficiência, sem, contudo, abrir mão dos mecanismos de controle.  

Portanto, para nos desvencilharmos, dessas más práticas corruptivas precisamos conjugar três elementos: uma consciência política aguçada, tanto para administrar quanto para fiscalizar, mecanismo coercitivos de controle dos atos administrativos e de punição, e a implantação de um modelo gerencial de administração pública que preza pela eficiência dos serviços públicos prestados sem abrir mão da proteção à moralidade administrativa.

REFERÊNCIAS

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SARTURI, Claudia Adriele. Os modelos de Administração Pública: patrimonialista, burocrática e gerencial. Conteúdo Jurídico, Brasília-DF: 21 maio 2013. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/?artigos&ver=2.43523&seo=1>. Acesso em: 03 mar. 2019.

SCATOLINO, Gustavo. TRINDADE, João. Manuel de Direito administrativo. 4º Edição. Salvador: JusPodivim, 2016.  

SOUSA, Simone Letícia Severo (Coord). O Impacto da corrupção sobre as políticas públicas. Belo Horizonte: Plácida, 2016. 

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1Graduando no Curso Superior Tecnológico em Gestão Pública, no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Rondônia. Email: josemaurifreitas@gmail.com
2Professora Orientadora: Nathalia Martins da Silva Reis Email:
3Professor coorientador, pós graduado em Gestão Pública e Mestre em Ciências Agrárias Agroecologia. Email: erik.silva@professor.pb.gov.br