REFLEXÕES SOBRE A OBRA “MÁQUINAS COMO EU”

REGISTRO DOI:10.5281/zenodo.10967387


Lucas Fernandes de Moura1; Cindy Emily Pinheiro Bonfim2; Glycia Ruthênia Tomaz Pontes3; Tereza Marina Melo Boggio4; Jéssica Cássia Barbosa5; Orivaldo Pimentel Lopes Júnior6; Douglas Araújo Doutor em História7; Thiago Chellappa8


RESUMO

Para a elaboração do presente Artigo, apresentou-se uma breve reflexão baseada na leitura da obra “Máquinas como eu: E gente como vocês”, do escritor inglês Ian McEwan. Buscou-se compreender fatores importantes sobre as questões trazidas pelo autor e que entendeu-se ser pertinentes às Ciências Humanas e onde obtiveram maior relevância para o aprendizado reflexivo transformador na mensagem do livro.

Palavras Chaves : Leitura, questões, aprendizado.

INTRODUÇÃO

Para criar a história, o autor desenvolveu vários dilemas narrativos inspirados n o mundo real contemporâneo, com base em um contexto misto entre o fictício e a realidade da Inglaterra na década de 1980. A associação e, ao mesmo tempo, a dissociação com esse período histórico, serviu para a complementação distópica na criação d e uma realidade inexistente. De antemão, o autor utilizou o contexto deste período p ara a construção de uma narrativa fictícia em que a tecnologia de Inteligência Artificia l (IA) havia avançado ao ponto de existir uma profunda relação entre os humanos e os androides. Em contrapartida, percebe-se que avanços que vivenciamos hoje, na real idade do século XXI – como, por exemplo, a conexão dos smartphones com a interne t globalizada – ainda não era uma realidade muito bem definida na história de Ian Mc Ewan.

ASPECTOS HISTÓRICOS DA OBRA QUE SÃO DISSIDENTES DA REALIDADE

No período que ficou marcado como Guerra das Malvinas, o vencedor na ficção de McEwan foi a Argentina, divergindo da realidade histórica no mundo onde o Rei no Unido obteve êxito na vitória da guerra e conquista das ilhas e não o país sul-americano. Outro fato que diverge da história real é a criação de que o Reino Unido se encontrava em uma crise política, econômica e social – quando, na realidade, o cenário do país estava em situação econômica e social estáveis.

Além desses fatores políticos, que estão inteiramente ligados aos interesses de Charlie por assuntos políticos, outra mudança histórica importante foi a presença de Alan Turing. Na ficção, ele foi um dos grandes personagens e serviu para o desenvolvimento da narrativa de outro personagem importante, o Adão, e também foi construí da em sua imagem, o personagem de um teórico que desenvolveu o mecanismo de I A.

No decorrer do livro, ele está vivo e é um renomado cientista atuante no mercado tecnológico. Na vida real, Turing cometeu suicídio em 1954, dois anos após ser conde nado por “atos homossexuais e indecência” no Reino Unido.

OS DILEMAS DE CHARLIE

Na obra Máquinas como eu: E gente como vocês, o autor nos traz uma visão ampla e impactante sobre a IA e o desenrolar de concepções morais, éticas e existenciais, atreladas à convivência dos humanos com essa moderna tecnologia. No livro, o narrador-protagonista traz à tona questões envolvendo sua vida e dramas existenciais atrelados à sua relação com o androide Adão, seu robô recém adquirido.

Charlie é o protagonista humano desse livro, formado em Antropologia e apaixonado por tecnologia e Ciências Humanas. Em boa parte da história, ele relata seus dramas pessoais, suas tentativas inglórias de realização pessoal e profissional, seus fracassos financeiros, suas reprogramações de escolhas e caminhos que seguiu ou que ele mesmo se queixa em diversos momentos, que poderia ter seguido. Uma de suas dúvidas e receios foi o fato de ele ter gasto parte da herança que recebera de sua mãe na compra de seu novo “brinquedo” humanoide, a exemplo disso, o autor descreve o seguinte trecho em que o narrador diz:

Aos trinta e dois anos, eu estava financeiramente quebrado. Gastar a herança de minha mãe numa engenhoca era apenas parte de meu problema – mas bem típico. Sempre que recebia algum dinheiro, fazia com que desaparecesse, queimava numa fogueira mágica, enfiava numa cartola e de lá tirava um rato morto (M CEWAN, 2019, p. 16).

A priori, foram produzidos doze Adãos e treze Evas, sua primeira escolha era gastar a sua herança em uma Eva, mas elas foram as de melhor aceitação no mercado e acabaram mais rápido. Assim, ele leva seu Adão para um modesto apartamento em uma Londres um pouco decadente. Adão deve ser configurado e programado por se u dono, essa programação é que vai definir humor, comportamento e o tornar o mais humano possível, para isso Charlie resolve que deve chamar Miranda, sua vizinha por quem logo ele se descobre apaixonado, para dividir com ele a programação, porém eles têm personalidades completamente diferentes e, por isso, combinam que cada u m preencherá metade do questionário que servirá para moldar a personalidade de sua recente compra, assim a personalidade de Adão irá se moldando em convívio com o casal.

A questão central do livro é sobre como a IA gera consequências e interferências na vida dos personagens demasiadamente humanos. Segundo Charlie, Adão era filho da eletrônica e da antropologia. Ao tratar de tecnologia, Ian McEwan cria uma história que nos faz refletir sobre questões como a adoção, a aceitação da paternidade, suicídio, além de várias questões existenciais, éticas e morais. As ações tomadas por figuras políticas da época, como Margaret Thatcher, a justiça tomada na decisão dos f atos ocorridos e relacionados ao passado de Miranda, enfim, uma diversidade de assuntos e temas que fazem a narrativa se tornar extremamente reflexiva acerca de nossa própria humanidade.

ADÃO E O SEU EU

Charlie não aceita bem a relação sexual que Adão, aquele conjunto de “engrenagens e volantes” (MCEWAN, 2019, p. 175), e Miranda tiveram relações sexuais em uma noite, e justo em uma noite que aconteceu um desentendimento entre ele e Miranda. Tal fato, posteriormente, faz Adão revelar para Charlie que está apaixonado por Miranda. Charlie passa a questionar a legitimidade do sentimento que uma máquina poderia desenvolver por uma humana. Então o autor, nos devaneios e questões de Charlie, nos faz a seguinte questão:

Sem autoconsciência, não estaria pensando de modo algum, apenas processando informações. Mas Adão havia me dito que estava apaixonado. Tinha haikus que comprovaram. O amor não era possível na ausência de um eu, tampouco ato de pensar. Faltava-me ainda resolver a questão básica. Talvez ela estivesse fora de alcance. Ninguém saberia o que é que havíamos criado. Qual quer que fosse a vida subjetiva de Adão e seus congêneres, nós não teríamos condições de verificar (MCEWAN, 2019, p. 175).

Ao decorrer da história, percebe-se que Charlie e Miranda negligenciam a relação que se mantinha atrelada a vida deles com a de Adão. O modelo de androide super moderno começa a apresentar características peculiares: poder de ação, independência, reflexões filosóficas, aprende a ter sentimentos e reage com violência ao seu “do no” após uma tentativa de desativá-lo depois de uma ação reguladora de seu “dono” em um ato de imprudência e controle. As suas características, definidas por seus responsáveis no momento de sua chegada, passaram a trazer questões à história que são passíveis de indagações filosóficas. Tal artefato tecnológico não apenas mais possuía ordenamentos configurativos e espelhados, estabelecidos por seus “primeiros amigo s” ao momento de sua ligação.

Mesmo diante das mudanças que foram aparecendo em seu comportamento, Charlie e Miranda não associavam a individualidade de Adão enquanto um ser possui dor de um “eu” e o mantinham à condição de uma máquina que servia para suas atividades domésticas, até mesmo, para atividades laborais. A inclusão em cada discurso sobre a presença dele, era voltada para uma máquina de utilidades, mesmo Miranda querendo o incluir na visita a casa de seu pai.

SEGREDOS DE MIRANDA E A CHEGADA DE MARK

Ao mentir para justiça sobre o caso de violência sexual que supostamente ela teria passado, Miranda cria questionamentos na cabeça de Charlie. Mais tarde Miranda revela a sua verdadeira história sobre o caso envolvendo sua amiga de infância e Gorringe. Sua ação dominada por sua vontade de fazer justiça pela sua amiga Mariam passou a afetar diretamente no tempo presente, visto que Miranda também mantinha um segredo dos seus encontros com o pequeno Mark.

O personagem Mark aparece no texto como uma criança com problemas familiares sérios e entra na vida de Charlie e Miranda também por uma necessidade e subjetividade do sentido de justiça, desta vez, por tomada de ação de Charlie que queria o proteger de sua mãe.

Segundo Yuval Noah Harari (2018, p. 218) em sua obra 21 Lições para o século 21, o senso de justiça, “Como todos os nossos sensos, nosso senso de justiça tem antigas raízes evolutivas.”. Assim, a construção de nossos sensos do que se é justo ou não é moldada de acordo com princípios e dilemas sociais de acordo com cada processo cultural em um determinado tempo.

Miranda acreditou em seu senso de justiça, cometeu o delito em nome da honra de sua amiga e depois colheu do senso de justiça que Adão, que consequentemente te em suas características absorvidas a partir de seus momentos de inflexão e também de toda sua vivência já desenvolvida, agiu dotado de sentido de justiça baseado no que ele havia aprendido sobre “verdade”.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao abordar dilemas humanos, tão caros culturalmente e filosoficamente, na máquina tecnológica Adão, coloca-se a pensar qual relação vai se construindo no futuro com as IAs. Assim, McEwan obtém êxito ao construir novos aprendizados e reflexões em seu romance acerca dos novos sentidos que as relações entre humanos e máquinas humanoides poderiam gerar diante de uma realidade hipotética que já não nos parece mais tão distante.

REFERÊNCIAS

HARARI, Yuval Noah. 21 lições para o século 21. São Paulo: Companhia das Letras, 20 18.

MCEWAN, Ian. Máquinas como eu: E gente como vocês. 1ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.


1Graduando em Humanidades lucasfernandes1981@hotmail.com
Universidade Do Rio Grande Do Norte / Instituto Humanitas de Estudos Integrados
2Graduanda em Humanidades Cindypinheiro07@gmail.com RN Universidade Do Rio Grande Do Norte / Instituto Humanitas de Estudos Integrados
3Graduanda em Humanidades glyciaruthenia15@gmail.com Universidade Do Rio Grande Do Norte / Instituto Humanitas de Estudos Integrados
4Graduada em Bacharelado em Educação Física
marinamboggio@gmail.com
Universidade Do Rio Grande Do Norte / Departamento de Educação Física
5Doutora em Filosofia jessica.cassia.barbosa@gmail.com Universidade Do Rio Grande Do Norte / Departamento de Filosofia
6Doutor em Ciências Sociais orivaldojr@yahoo.com Universidade Do Rio Grande Do Norte / Instituto Humanitas de Estudos Integrados
7salgoud@uol.com.br Universidade Do Rio Grande Do Norte / Instituto Humanitas de Estudos Integrados
8Doutor em Ciência e Engenharia de Materiais chellappathiago@gmail.com
Universidade Do Rio Grande Do Norte / Instituto Humanitas de Estudos Integrado