RECUPERAÇÃO DA MATA CILIAR  ÀS MARGENS DO RIO BULANGI NO ASSENTAMENTO RURAL DOM HÉLDER CÂMARA E CONSCIENTIZAÇÃO AMBIENTAL DOS ASSENTADOS

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10936350


José Ronaldo da Silva Santos


RESUMO: O reflorestamento da mata ciliar é uma prática essencial para a preservação dos recursos hídricos e da biodiversidade. Este artigo aborda a importância da mata ciliar, seus benefícios ambientais e socioeconômicos, assim como os desafios e estratégias para sua recuperação. Serão discutidos os riscos da devastação das matas nas margens do rio Bulangi, no assentamento Dom Hélder Câmara, métodos de restauração e conscientização ambiental dos assentados envolvidos na comunidade. Ao final, são apresentadas recomendações para futuras pesquisas e ações nessa área.

Palavras – chave: Reflorestamento ambiental, Assentamento Dom Hélder Câmara, Mata Ciliar, rio Bulangi

RESUMEN: La reforestación de bosques ribereños es una práctica esencial para la preservación de los recursos hídricos y la biodiversidad. Este artículo aborda la importancia de la caída del cabello, sus beneficios ambientales y socioeconómicos, así como los desafíos y estrategias para su recuperación. Se discutirán los riesgos de devastación de los bosques a orillas del río Bulangi, en el asentamiento Dom Hélder Câmara, los métodos de restauración y la conciencia ambiental de los colonos involucrados en la comunidad. Finalmente, se presentan recomendaciones para futuras investigaciones y acciones en esta área.

Introdução

O assentamento Dom Hélder Câmara, localizado na zona rural da cidade de Murici, zona da mata alagoana, abriga cerca de 70 famílias em 48 lotes do programa nacional de reforma agrária, ligada ao movimento social denominado Comissão Pastoral da Terra (CPT). Tendo ocupação no ano de 1998, quando ainda era fazenda (Santa Juliana), conhecida popularmente como Duas Barras. Sua homologação se deu no 2000 pelo INCRA (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária), conferindo a concessão de uso e posse aos assentados. O assentamento caracteriza-se pela prática constante da agricultura familiar, grande área de floresta nativa, pássaros silvestres e afluentes de rios, como por exemplo, o rio Bulangi.

Nesse sentido, os agricultores sem assistência técnica, falta de informação realizam o cultivo de lavouras em ambientes inadequados e de utilização restrita, como por exemplo às margens de rios e áreas de preservação permanente, pois são nessas áreas que eles encontram maior facilidade de irrigação e solo fértil, propício a prática da agricultura.

Atrelado a isso, a devastação da mata ciliar no assentamento Dom Hélder vem se expandindo de forma significativa, chegando apresentar um percentual de 75% em sua composição natural (dados do próprio assentamento, 2017), afetando principalmente as afluentes de rios.

Mediante a isso, vem os impactos e consequências advindos do processo de desmatamento causado pelo homem, como por exemplo, extinção de espécies de plantas, árvores e animais nativos, redução da quantidade e qualidade de água disponível, assoreamento dos rios, erosão do solo, etc.

Desse modo, além dos impactos causado a natureza, os agricultores estão cometendo uma infração grave, uma vez que, está previsto no novo código florestal que as matas ciliares  são áreas de preservação permanente e devem ser mantidas. 

Aliado a isso, viu-se a necessidade de conscientização dos agricultores e restauração de parte da mata ciliar que fora devastada às margens do rio Bulangi.

Logo, este trabalho tem por objetivo apresentar dados coletados durante o estágio de prática profissional, realizado no assentamento Dom Hélder Câmara (em forma de ação de extensão, nos anos de 2016 a 2019), que objetivou a restaurar da mata ciliar às margens do rio Bulangi, conscientização dos agricultores sobre os impactos do desmatamento e os riscos da prática da agricultura às margens de rios, bem como, contribuição com a redução do desmatamento através de plantio de espécies de árvores nativas e/ou não nativas e consequentemente os danos causados diretamente ao solo.

2. Histórico e caracterização do Assentamento Dom Hélder Câmara

O assentamento Dom Hélder Câmara, localiza-se na cidade de Murici, possui uma área de mais de 116 mil hectares de terra e conta atualmente com a maior área contínua de Mata Atlântica do Nordeste, segundo dados do IBGE, além de possuir uma rede hidrográfica muito rica, que contempla uma grande quantidade de nascentes e pequenos riachos, os quais alimentam o rio Mundaú, única bacia hidrográfica que corta a região, destacando os rios Bulangi e Remédio, ambos afluentes do rio Mundaú (ESEC, 2006).

O assentamento foi ocupado em dezembro de 1998, quando ainda chamava-se Fazenda Santa Juliana, e sua posse se deu em janeiro de 2000, obtendo assim, seu registro no Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), passando a ser denominado Assentamento Dom Hélder Câmara, sendo assim registrado pela história de vida e luta do padre Dom Hélder Câmara.

Atualmente, abriga mais de 70 famílias em 48 lotes, que sobrevivem do uso da terra, em outras palavras, sobrevivem da comercialização de seus produtos oriundos da agricultura familiar.

O Dom Hélder Câmara caracteriza-se pela prática constante da agricultura familiar, produzindo assim, uma vasta variedade de produtos oriundo da roça, como por exemplo, banana (Musa spp.), laranja (Citrus sinensis L.), abacaxi (Ananas comosus L.), macaxeira (Manihot esculenta), abacate (Persea americana), inhame (Dioscorea trifida), batata doce (Ipomoea batatas), milho (Zea mays), feijão-de-corda (Vigna unguiculata), etc; para comercialização em feiras livres, mercadinhos e quitandas.

Por possuir uma das maiores áreas de mata contínua da região e rede hidrográfica muito rica, o assentamento deveria possuir uma equipe especializada para auxiliar os produtores do assentamento, pois o perfil deles ainda consiste no plantio em áreas que são enquadradas como de preservação ambiental, sendo a principal, às margens de rios e mata ciliares. (Dados do próprio assentamento).

Nesse contexto, é de extrema importância conscientizar os agricultores/assentados e orientá-los a respeito do que diz o novo Código Florestal sobre a proteção da vegetação nativa, que está prevista na Lei n° 12.651, de 25 de Maio de 2012, em seu capítulo II, artigo 4°, inciso I, que considera como APP (Área de Preservação Permanente), em zonas rurais ou urbanas as faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e intermitente.

Diante disso, a lei estabelece que determinadas áreas (APP) devam ser permanentemente preservada, o que não acontece no assentamento, pois são nessas áreas que os agricultores cultivam maior parte ou metade de suas lavouras, uma vez que, nas outras áreas os produtores relatam a perda de produtividade econômica, redução no potencial de produção, compactação do solo e dificuldade de irrigação.

Atrelado a isso, o assentamento Dom Hélder, vinha apresentando elevada devastação nas matas próximas aos rios e a causa maior deve-se ao plantio de lavouras, o que tem influenciado de forma significativa na redução da quantidade de peixes e água.

Um dos fatores para elevação do agravamento do problema é a resistência dos assentados e a falta de assistência técnica, pois os agricultores em sua maioria desconhecem o novo código florestal brasileiro e suas normas, o que mais tarde pode ocasionar em prejuízos, tanto na questão ambiental (como por exemplo, desmatamento), quanto nas questões legais (como multas), pois o novo código estabelece medidas mínimas para as faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e intermitente, desde a borda da calha do leito regular.

Segundo o novo código florestal brasileiro, Lei 12.651/2012, Seção I, Art. 4° consideram-se para as florestas e demais formas de vegetação natural ao longo dos rios ou de qualquer curso d’água, as seguintes faixas de preservação;

a) 30 (trinta) metros, para os cursos d’água de menos de 10 (dez) metros de largura;

b) 50 (cinquenta) metros, para os cursos d’água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinquenta) metros de largura;

c) 100 (cem) metros, para os cursos d’água que tenham de 50 (cinquenta) a 200 (duzentos) metros de largura;

d) 200 (duzentos) metros, para os cursos d’água  que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura;

e) 500 (quinhentos) metros, para os cursos d’água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros;

A maioria dos agricultores não conhece essas especificações técnicas e acabam desmatando as áreas de preservação do assentamento devido à prática da agricultura, o que pode ocasionar problemas futuros, pois, de acordo com Piolli et al., (2004) às margens dos rios são extremamente vulneráveis à erosão, o que pode causar danos gravíssimos, como assoreamento e perdas de solo para agricultura.

E isso se torna mais grave se considerarmos que o perfil do produtor rural do assentamento ainda consiste em sua maioria no modelo da agricultura convencional, que segundo Gliessman (2000, apud Barboza et al, 2012) está fundada em dois conceitos que se correlacionam: maximização da produção e do lucro, deixando de lado os fatores ambientais.

Desse modo, o agricultor visando o aumento da produção e consequentemente a sua subsistência, explora de forma constante e sem orientação técnica às margens de rios, o que segundo o mesmo autor resultará na redução da fertilidade, compactação, erosão do solo e assoreamento de rios.

Entretanto, essa realidade vem se modificando aos poucos e isso se deve a presença constante de alunos e professores do Instituto Federal de Alagoas – Campus Murici, que através de ações de extensão e pesquisa vem modificando o olhar do produtor para um novo jeito de plantar e trabalhar com agricultura. Esse novo olhar envolve uma forma sustentável, que respeita a biodiversidade, fauna e flora, agricultura isenta de agrotóxicos e adubos químicos.

O estágio no assentamento se deu através de ações de extensão, (vale ressaltar que o trabalho não se deu em apenas 4 meses, mas sim, 4 anos de ações, voltadas aos assentados, porém, para este trabalho será feito um recorte de apenas 4 meses), mas é importante destacar que todos os anos as temáticas abordadas estavam voltadas para as questões do meio ambiente e sua relação com os produtores; nesse contexto, o estágio/projeto pôde auxiliar os agricultores a se adequarem a realidade da legislação brasileira atual dentro de sua realidade e perspectiva, permitindo que eles obtenham alimentos para sua subsistência por meio da agricultura, de forma harmoniosa com o meio ambiente. Além da recuperação/reposição da mata ciliar às margens do rio Bulangir.

3. Agricultura familiar e o meio ambiente

“Desde o início do processo de ocupação do território brasileiro a agricultura familiar – por muito tempo chamada de subsistência – faz parte da rotina das atividades produtivas do país” (MATTEI, 2014).

Todavia, durante todo seu longo processo de surgimento e desenvolvimento, ela não recebeu apoio governamental, tendo assim, seu processo de adequação precário e muito abaixo do esperado, pois, “constata-se, ainda, que durante o processo de modernização da agricultura brasileira (décadas de 1960 e 1970), as políticas públicas para área rural, em especial a política agrícola, privilegiaram os setores mais capitalizados” (MATTEI, 2014).

Desse modo, através de muita luta de classe, pressão do povo, principalmente pelos movimentos sociais rurais, a agricultura familiar começa a ter visibilidade pelas autoridades governamentais. Porém, “se pode dizer que até o início da década de 1990 não existia nenhum tipo de política pública, com abrangência nacional, voltada ao atendimento das necessidades específicas do segmento social de agricultores familiares” (MATTEI, 2014).

Segundo o coordenador da juventude da CONTRAF BRASIL (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura Familiar), Auri Júnior, foi com a vitória do presidente Lula em 2002, que a agricultura familiar foi reconhecida e ganhou mais força com a definição clara nos programas e políticas públicas para o setor. Como por exemplo, o fortalecimento do Ministério do Desenvolvimento Agrário (criado em 25 de novembro de 1999) e o lançamento de um plano Safra específico.

Entretanto, foi em anos anteriores, através de muita organização, luta e pressão da classe trabalhadora rural, que em 1996 foi criado o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF), “para atender a uma antiga reivindicação das organizações dos trabalhadores rurais, as quais demandavam a formulação e a implantação de políticas de desenvolvimento rural específicas”. (MATTEI, 2014).

No assentamento Dom Hélder, a agricultura familiar possui papel central, fundamental e efetivo no que tange o sustento das famílias camponesas, e consequentemente o desenvolvimento do assentamento. Contudo, os assentados sofrem pela falta de assistência técnica, o que contribui para a falta de orientação efetiva, contribuindo assim para o aumento da distância entre os agricultores familiares e empresas do setor. Além da dificuldade de investimento em alternativas sustentáveis e compatíveis com a realidade da agricultura familiar, como por exemplo, as práticas de manejo alternativas, controle de pragas, rotação de cultura, manejo do solo, etc.

Dessa forma, além do desfavorecimento com a precariedade da falta de assistência técnica no assentamento, os agricultores sofrem também com a falta de programas voltado ao fortalecimento da agricultura familiar, além de viverem no dilema de que as árvores que estão às margens de rio de nada serve se não são frutíferas, e sem um prévio conhecimento técnico a respeito acabam desmatando para o cultivo de lavouras, o que comprometem diretamente a mata ciliar e suas funções no meio ambiente, como por exemplo, função ecológica (FU, et al. 2016), proteção dos recursos hídricos (ELLIOT e VOSE, 2016) e estabilização dos processos erosivos (OLIVEIRA, et al. 2011; MCCLOSKEY et al. 2016).

Sendo que, “sua ação está ligada também à proteção dos cursos de água, das nascentes e das margens dos rios, mantendo a capacidade original de escoamento, facilitando a infiltração da água no solo e diminuindo a potencialidade de assoreamento (EMBRAPA, 2003; OLIVEIRA, et al. 2011). 

Desse modo, nota-se a importância da preservação da mata ciliar, principalmente por trata-se da agricultura familiar, a qual é desenvolvida em pequenas propriedades, que é o caso do assentamento Dom Hélder, que caracteriza-se sua prática por membros da família, como por exemplo, pai, mãe, filhos, netos etc; conferindo assim, uma necessidade maior de se preservar e ter um olhar diferenciado do modelo da agricultura convencional.

Por outro lado, existem os aspectos legais, os quais obrigam os agricultores a preservação permanente de suas áreas de mata ciliar e margem de rios. Porém, este fato é desconhecido pela maioria dos camponeses, que nunca ouviram sequer falar em novo código florestal, complicando ainda mais o agravamento do desmatamento, pois além de não existir conscientização ecológica eles desconhecem o mínimo do conjunto de lei/regra que obriga a preservação.

Segundo Tavares (2017) o Novo Código Florestal é como é conhecida a Lei Federal 12.651/2012, a qual delimita os locais que devem ser protegidos e mantidos com mata nativa na propriedade rural. Esses locais são chamados de Área de Preservação Permanente (APP), Reserva Legal (RL) e Áreas de uso restrito. Essas áreas são “protegidas por Lei (coberta ou não por mata nativa) que possui importância ambiental (área importante principalmente para a proteção dos cursos d’água, do solo e da própria floresta)”. (TAVARES, 2017).   

Nesse contexto, é de extrema importância conscientizar os agricultores/assentados e orientá-los a respeito do que diz o novo Código Florestal sobre a proteção da vegetação nativa, que está prevista na Lei n° 12.651, de 25 de Maio de 2012, em seu capítulo II, artigo 4°, inciso I, que considera como APP (Área de Preservação Permanente), em zonas rurais ou urbanas as faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e intermitente.

Diante disso, a lei estabelece que determinadas áreas (APP) devam ser permanentemente preservada, o que não acontece no assentamento, pois são nessas áreas

 4. Contextualização da pesquisa

O presente trabalho de pesquisa busca discutir os dados do estágio realizado entre 2016 a 2019, com um recorte de 4 meses, sendo que o estágio teve como objetivo dar continuidade ao projeto Minha Comunidade, realizado no ano de 2016, que por sua vez, foi implantado um viveiro para produção de mudas no assentamento Dom Hélder Câmara – Murici, restaurar a mata ciliar que foi devastada às margens do rio Bulangi, e conscientização ecológica dos agricultores sobre os riscos da prática da agricultura às margens de rios e impactos do desmatamento, além de ressaltar a importância da preservação ambiental e o reflexo de sua destruição.

Pois, a mata ciliar, além de exercer proteção física nas margens de rios, ela recicla elementos que se depositam nos solos encharcados e tem capacidade de promover a interação entre o ecossistema terrestre e aquático.

E “o solo quando privado de sua cobertura florestal fica modificado em sua estrutura e perde as propriedades físico-químicas capazes de garantir a retenção de água”.(SANTOS, 2008). Efeito que os agricultores do assentamento vem enfrentando, sem a proteção florestal, as fortes chuvas leva para o leito do rio grande quantidade de água, terra e areia, contribuindo assim para o assoreamento do rio e erosão do solo, pois:

“A vegetação existente ao longo dos rios funciona como um obstáculo natural ao escoamento das águas, que ficam retidas e são absorvidas, em grande parte, pela mata, evitando que uma quantidade exagerada de partículas sólidas sejam arrastadas e depositadas no leito dos rios”. (SANTOS, 2008).

Dessa forma, a quantidade de água nos rios começam a diminuir e consequentemente a quantidade de peixes.

Com duração de 8 (oito) meses, o estágio se iniciou no mês de abril de 2017, tendo seu término no mês de novembro do mesmo ano. Contando com uma carga horária de 12h semanais, dividida em 3 (três) dias por semana com 4h cada dia. O estágio se deu por meio de ação de extensão1 e contou com 2 (dois) bolsistas (que chamarei neste trabalho de estagiários e 2 (dois) voluntários.

5. Desenvolvimento e discussão das atividades

O estágio iniciou-se com o planejamento2, nele foi discutido o estudo do desenvolvimento de como seria apresentado a proposta de estágio para a comunidade.

Desse modo, após o planejamento, os estagiários junto ao professor orientador, apresentaram a proposta de estágio para os assentados (público alvo) (imagem 1), que foi bem recebida por todos, sendo assim, neste momento os assentados que possuíam lotes às margens do rio Bulangi, efetuaram o cadastro. Contabilizando 12 (doze) famílias. 

Diante disso, o estágio foi divido em duas grandes etapas, durante os 8 (oito) meses de realização, sendo 4 (quatro) meses para a primeira etapa e os outros 4 (quatro) para segunda. Na primeira foram atendidas 6 (seis) famílias e na segunda as outras 6 (seis), totalizando as 12 (doze) famílias.

Mediante a isso, e com o cadastro realizado, os estagiários fizeram um estudo da melhor forma de conscientização dos agricultores, uma vez que, a maioria não sabe ler nem escrever e a dificuldade em reunir todos em um mesmo momento e local se tornou uma missão quase que impossível, pois os agricultores trabalham em horários diferentes e turnos alternados.

E levando em conta que a fase de conscientização, seria talvez, a mais importante3, complexa e delicada, foi necessário um estudo minucioso, pois nela estaria sendo discutido valores, costumes e práticas.

Diversos paradigmas teriam que ser quebrados, principalmente, porque “o modelo agrícola disponibilizado é fortemente exigente em insumos modernos, agrotóxicos, fertilizantes químicos” (MACHADO, 1998), e os assentados ainda fazem uso deste modelo. Além do mais, a maioria dos assentados ainda não conseguem ver a importância do reflorestamento e tão pouco a da preservação de mata, em especial aquelas às margens de rios.

 Por isso, a fala dos estagiários teria que funcionar, os argumentos necessitava de base sólida e segura, ao mesmo tempo que carecia de um dualismo na linguagem, porque ela teria que ser técnica e popular, pois assim, e só assim, ela alcançaria o maior número de agricultor.

Levando em conta que, “a língua não se realiza num vácuo social. Ela não existe fora da sociedade, da mesma forma que a sociedade não existe sem ela. A relação entre língua e sociedade não é uma relação em que uma determina a outra, mas de interação entre elas.” (SILVA e SOUSA, 2017), na qual uma se refrata na outra.

Então, a melhor solução encontrada para aquele momento foi a criação de panfletos (imagem 2) contendo imagens explicativas com o mínimo de letras, para ser entregue na casa dos agricultores. Desta forma, os estagiários faziam a panfletagem e conscientização dos agricultores a respeito dos riscos da prática da agricultura às margens de rios, dos impactos do desmatamento, sempre ressaltando a importância do reflorestamento (imagem 3), da preservação ambiental e aspectos legais contidos no novo código florestal.

Diante disso, iniciaram-se os ciclos de oficinas entre os agricultores e estagiários, para que fosse realizado o estudo da coleta de sementes/mudas de árvores nativas e não nativas frutíferas ou não para o plantio no viveiro (imagem 4). Essas oficinas foram utilizadas para decisão de escolha da espécie a ser coletada, período de coleta e método de coleta, visando sempre a minimização de grandes danos as sementes e mudas, pois é “durante as etapas de coleta e beneficiamento” que “ocorrem os maiores riscos das sementes sofrerem danos, perdendo a sua viabilidade (NOGUEIRA & MEDEIROS, 2007), e tal fato não pode acontecer, uma vez que, “as sementes são organismos responsáveis pela perpetuação e disseminação das espécies na natureza” (MEDEIROS, 2001), e “a obtenção destas é o ponto de partida para a produção de mudas” (BELLEI, 2013).

Mediante a isso, o planejamento através das oficinas, foi o primeiro e decisivo passo para eleger um momento apropriado na coleta das sementes e seleção das espécies. A coleta das sementes e mudas de árvores ocorreram na mata do assentamento durante os  meses de maio, junho e julho de 2017.

Um grande desafio na coleta das sementes foi as fortes chuva dessa época, pois grande quantidade foram levadas pelas águas, causando assim um grande entrave, uma vez que, foram perdidas diversas variedade para o reflorestamento.

Outro entrave foi com relação a germinação das sementes, que devido a dormência, “fenômeno em que as sementes de determinada espécie, mesmo sendo viáveis e possuindo todas as condições ambientais para iniciar o processo germinativo, não germinam” (Azania et. Al., 2009), porém, mesmo os estagiários conhecendo os métodos de quebra de dormência4, optaram por não fazer, mas coletar novas espécies.

Logo, a solução encontrada foi a substituição dessas sementes por mudas já em fase de crescimento e novas sementes que em condições favoráveis germinaram.

Feito a coleta de semente/mudas, os estagiários fizeram o plantio no viveiro do assentamento (imagem 5); as sementes foram plantadas em bandejas, copos descartáveis e/ou sacos plásticos, já as mudas que foram coletadas da mata seu plantio se deu em garrafas pets. Estas, foram mantidas em viveiro coberto com sombrite, até se encontrarem em condições adequada para o transplantio às margens do rio.

Para o plantio das sementes e mudas no viveiro foi preparado um substrato para o suporte das plantas na fixação das raízes e desenvolvimento delas no ambiente, sendo sua constituição basicamente por componente mineral, terra preta do subsolo, retirado de uma profundidade de aproximadamente 30 cm e componentes orgânicos, esterco bovino e caprino, serragem curtida e torta filtro.

Para preparação do substrato utilizou-se 9 carros de mão de terra preta, 3 carros de mão de matéria orgânica. Peneirou-se a terra preta e misturou-a com a matéria orgânica.

Enquanto as sementes estavam no viveiro era realizado os tratos culturais, que consistia na limpeza do viveiro (envolvendo atividades como limpeza das bandejas, corredores do viveiro e suas laterais externas, para diminuição de ervas daninhas e as pragas de caramujo) e das mudas, dança das mudas, ajuste no viveiro, eliminação de pragas, irrigação e seleção de mudas para replantio no viveiro (imagem 6).

Semanalmente era feita limpeza  nos recipientes com as mudas, afim de controlar a incidência de plantas espontâneas, as quais competem diretamente com as mudas por luz, água e nutrientes. A dança/moveção das mudas era feita sempre que se notava que as raízes estavam extravasando as embalagens, para que não houvesse danos nelas quando fossem retirada para o transplantio.

A eliminação das pragas em sua maioria era do caramujo africano, logo, o método utilizado foi o controle manual, pois não existia outro método especifico e eficaz que pudesse eliminar a praga.

Para a realização do transplantio, era feito uma seleção das mudas, para que fosse escolhida as que melhores apresentassem características adequada, para o plantio no campo, como por exemplo, aparência e aspecto saudável e livres de pragas. O transplantio era realizado após a germinação das sementes, quando elas atingiam o tamanho de 15 a 20 cm (esse tamanho serviu também para as espécie que foram coletadas na forma de mudas).

Depois que as mudas atingiam seu tamanho adequado para o transplantio, elas eram levadas até às margens do rio Bulangi. Seu transporte era feito através de um carro de mão (imagem 7).

Antes do plantio das mudas, procedeu-se o preparo da área de plantio junto com os assentados (donos dos lotes). o preparo do local de plantio constitui-se na limpeza da área por meio de capina (imagem 7).

Após a limpeza da área, foi realizado o transplantio das mudas para o local definitivo (imagem 8).

De acordo com o quadro abaixo (quadro 1) ao final do estágio, foram plantadas mais de 300 (trezentas) mudas de 10 (dez) espécies diferentes, evidenciando a alta eficácia e contribuição desse estágio para o meio ambiente e os assentados da região da zona da mata alagoana.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Apesar das dificuldades encontradas no decorrer deste trabalho, como a falta de políticas públicas voltada aos assentados a respeito da preservação ambiental, como por exemplo, orientações técnicas, para auxiliar os agricultores nas informações básicas e necessárias sobre a importância da preservação, têm-se também, a ruptura de diversos paradigmas imposto ao longo do tempo, como o de que não há necessidade de plantio e de preservação de árvores.

Entretanto, o presente trabalho evidencia e chama atenção para a importância da conservação de mata, água e solo, principalmente, às margens de rios, nascentes e encostas.

Por outro lado, é notório que os assentados necessitam de apoio governamental para o suporte técnico, pois mesmo com os trabalhos desenvolvidos pelo Instituto Federal de Alagoas – Campus Murici no assentado, entendemos que o tempo de duração não seja suficiente para modificação de costumes e tradições de longas datas que estejam enraizadas na cabeça de cada produtor.

Diante disso, faz-se necessário um trabalho contínuo e permanente, pois plantamos a semente no coração de cada um, chamando atenção deles para importância da preservação ambiental em suas propriedades, mas para que germine e floresça esse trabalho tem que ter continuidade, sempre adicionando reticências.

Portanto, através das pesquisas desenvolvidas para a realização deste trabalho, torna-se evidente a presença da consciência ecológica dos assentados no que diz respeito à importância ambiental.  


1Chamarei a ação de extensão de estágio, uma vez que ela está sendo usada como tal.

2Vale ressaltar que o planejamento era realizado todas às vezes que os estagiários iam trabalhar diretamente com o púbico alvo, ou seja, durante todo o estágio, pois os agricultores participaram de todas as etapas da ação. Ele serviu também para discutir e preparar as várias estratégias lúdicas de trocas de informações entre alunos e agricultores e preparação das oficinas, desde coleta de semente até o transplantio às margens do rio. Importante destacar que a Profa. Orientadora e o Prof. Coorientador participaram direta ou indiretamente da realização do planejamento.

3Se os argumentos dos estagiários funcionassem, talvez, ali se iniciaria um novo jeito de se trabalhar com agricultura, no qual a natureza não seria mais vista como adversária do agricultor e sim aliada.

4Escarificação ácida, imersão em água quente e/ou fria, escarificação mecânica, estratificação a frio, estratificação quente e fria.

6. REFERÊNCIAS

AZANIA, C. A. M. et al. Superação da dormência de sementes de corda-de-viola (Ipomoea quamoclit e I. hederifolia). Planta daninha, v.27, n.1, p.23-27, 2009, Disponivel em: http://dx.doi.org/10.1590/S0100-8358200300200005. Acesso em: 09 julho de 2020. 

BELLEI, A. F.; Produção de mudas nativas no viveiro do  parque municipal da lagoa do Perei, Florianópolis – SC, 2013.

EMBRAPA – EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA. Práticas de Conservação do Solo e Recuperação de Áreas Degradadas. Rio Branco: MDA, 2003, 32p.

ELLIOTT, K. J. e VOSE, J. M. Effects of riparian  zone buffer widths on vegetation diversity in southern Appalachian headwater catchments. Forest Ecology and Management, v 376, n. 15, p 9-23. 2016.

FU, B.; LI, Y.; WANG, Y.; ZHANG, B.; YIN, S., ZHUS, S.; XING, Z. Evaluation of ecosystem service value of riparian zone using land use data from 1986 to 2012. Ecological Indicators, v 69, p. 873-881. 2016.

GLIESSMAN, S. R. Agroecologia: processos ecológicos em agricultura sustentável. Porto Alegre: Ed. Universidade UFRGS, 2000. 653p; apud BARBOZA, Luís Gabriel Antão, et al. Para além do discurso ambientalista: percepções, práticas e perspectivas da agricultura agroecológico.

JÚNIOR, A. Agricultura familiar. Uma história de luta, conquistas e transformação camponesa. Disponível em: https://contrafbrasil.org.br/artigos/agricultura-familiar-uma-historia-de-luta-conquistas-e-transformacao-camponesa-fc85/ Acesso em: 21 maio. 2020

MACHADO, A. M. B. Educação ambiental para desenvolvimento sustentável em assentamentos rurais: contribuições de um estudo de representações sociais, 1998

MATTEI, L. O papel e a importância da agricultura familiar no desenvolvimento rural brasileiro contemporâneo, 2014.

MEDEIROS, A. C. S. Armazenamento de Sementes de Espécies Florestais Nativas. Embrapa Florestas, p.24, 2001. (Documento: 66)

MCCLOSKEY, G. L.; WASSON, R. J.; BOGGS. G. S.; DOUGLAS. M. Timing and causes of gully erosion in the riparian zone of the semi-arid tropical Victoria River, Austrália: Management  implications. Geomorphology, v. 1, p. 96-104. 2016.

NOGUEIRA, A. C.; MEDEIROS, A. D. S. Extração e beneficiamento de sementes florestal nativas. Embrapa Florestas. Circular técnica, v.131, 2007.

TAVARES, M. F. O novo código florestal para os pequenos proprietários rurais: estudo de caso no bairro de Pereiras, Amparo – SP – Cartilha 1. – Piracicaba: IPEF, 2017.

OLIVEIRA, L. C. de; PEREIRA, R.; VIEIRA, J. R. G. Análise da degradação ambiental da mata  ciliar em um trecho do Rio Maxaranguape – RN: uma contribuição à gestão dos recursos hídricos do Rio Grande do Norte – Brasil. HOLOS, Ano 27, Vol 5. 2011.         

PIOLLI, A. L.; CELESTINI, R. M.; MAGON, R. Teoria e prática em recuperação de áreas degradadas: plantando a semente de um mundo melhor. Serra Negra: Secretaria do Meio Ambiente, 2004. p. 21.

SILVA, P. C. G; SOUSA, A. P. de. Língua e Sociedade: influências mútuas no processo de construção sociocultural, 2017.

SANTOS, S. C. H. Mata ciliar – fundamentos e importância, 2008. Disponível em: http://www.meioambiente.mppr.mp.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=45 Acesso em 24 maio. 2020