30-DAY READMISSION AFTER STROKE: A REVIEW OF ASSOCIATED FACTORS
REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.11075605
Cássia Helena Santos Alves1
Cristiane Regina Guerino Furini2
Resumo
O Acidente Vascular Cerebral (AVC) se enquadra na categoria das Doenças Crônicas não Transmissíveis (DCNT). A taxa de readmissão em 30 dias é frequentemente utilizada como um critério de avaliação dos cuidados prestados pelo hospital aos pacientes de AVC. Por outro lado, esse parâmetro é importante na administração hospitalar, tendo em vista os custos decorrentes de readmissão de pacientes de AVC após eles terem tido alta. O presente trabalho tem como objetivo realizar uma revisão bibliográfica das publicações recentes que abordam a readmissão hospitalar, no prazo de 30 dias, de pacientes que foram vítimas de Acidente Vascular Cerebral (AVC). Ao verificar os trabalhos na literatura, é notável a predominância de pesquisas realizadas em hospitais situados em países desenvolvidos. Essa predominância se deve, em parte, ao interesse econômico, mas também em razão da facilidade de obtenção dos dados necessários para a pesquisa. Por outro lado, cabe salientar o grande número de trabalhos realizados em países asiáticos, contrastando com o pequeno número de informações concernentes a países em desenvolvimento. De um modo geral, as taxas de readmissão em um prazo de 30 dias após um AVC se situam na faixa de 10% a 15%. As causas mais apontadas para as readmissões em 30 dias são as infecções e o AVC recorrente. A determinação de fatores capazes de prever as readmissões é de suma importância para a administração hospitalar. Embora várias tentativas tenham sido feitas, nenhum resultado definitivo foi alcançado no que diz respeito à identificação de fatores preditivos para as readmissões de pacientes com AVC dentro de um período de 30 dias.
Palavras-chave: Readmissão hospitalar. Readmissão em 30 Dias. Doenças crônicas não transmissíveis. Acidente vascular cerebral.
Abstract
Stroke belongs to the category of Chronical Non-transmissible Diseases (CNTD). 30-day readmission is frequently employed as an evaluation criteria of hospital care for stroke patients. On the other side, this is an important parameter in hospital administration, taking in account readmission costs of stroke patients. The present paper aims a bibliographical review of publications dealing with 30-day readmission of stroke victims. It is remarkable in the literature the amount of research carried out in hospitals located in developed countries. This is due not only to the economical reason but also to the availability of data. On the other side it is remarkable the number of research carried out in Asiatic Countries, contrasting with the shortage of information for Countries under development. In general, 30-day readmission after stroke ranges from 10% to 15%. The main causes for 30-day readmission after stroke are infections and recurrent stroke. The determination of factors able to forecast 30-day readmissions is of paramount importance to the hospital administration. Although several attempts have been made, no definitive result has been achieved for readmission within 30 days of stroke patients.
Key words: Hospital readmission. 30-day readmission. Chronical Non-transmissible Diseases. Stroke.
Introdução
O Acidente Vascular Cerebral (AVC), é considerado uma das doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) cada vez mais prevalentes na população mundial (WHO, 2023) e uma das principais causas de mortalidade no Brasil (Min. Saúde, 2013). A incidência de AVC aumenta com a idade, com cerca de dois terços de todos os AVCs ocorrendo em pessoas com menos de 70 anos (WHO, 2018).
O World Report on Disability, publicado pela World Health Organization em parceria com o Banco Mundial (WHO, 2011) afirma que mais de um bilhão de pessoas no mundo convivem com algum tipo de deficiência. As DCNT são responsáveis por 74% das mortes, com 77% das mortes prematuras (menos de 77 anos) ocorrendo em países de baixa renda. A doenças cardiovasculares representam 43,7% das mortes, o câncer 22,7%, as doenças respiratórias crônicas 0,10%, e o diabetes 0,05%. O uso de tabaco, o sedentarismo, o uso prejudicial de álcool e dietas não saudáveis aumentam os riscos das DCNT. O Ministério da Saúde do Brasil publicou um manual intitulado “Diretrizes de Atenção à Reabilitação de Pessoa com Acidente Vascular Cerebral com o objetivo de fornecer orientações para as equipes multiprofissionais de saúde, especificamente em relação aos cuidados prestados a pacientes vítimas de AVC. Segundo essa publicação, dados da World Stroke Organization indicam que, de cada seis indivíduos no mundo, um deles sofrerá um AVC ao longo de sua vida (Min. Saúde, 2013).
Uma revisão sistemática de casos de fatalidade decorrentes de AVC em períodos de 21 dias a 1 mês, abrangendo o período de 1970 a 2008 e utilizando o World Bank Country Classification by Income Level foi realizada por Hamadeh et al(Hamadeh, 2022). Os AVCs foram classificados quanto ao tipo patológico em: isquêmico; hemorragia primária intracerebral e hemorragia subaracnoide. O trabalho revelou uma redução de 42% nos casos de AVC em países de alta renda e um aumento superior a 100% em países de renda média ou baixa.
As taxas de readmissões hospitalares após um AVC agudo têm sido utilizadas como parâmetro para avaliar o desempenho dos sistemas de saúde e para o gerenciamento da doença (Lichtman, 2010. Condon, 2016). Essas taxas são importantes tanto sob o ponto de vista econômico quanto no contexto do aprimoramento das práticas assistenciais e na formulação de decisões políticas para os sistemas de saúde. A identificação dos fatores que contribuem para as readmissões é outro ponto crucial a ser considerado, uma vez que possibilitam a prevenção de hospitalizações recorrentes.
Assim, a presente revisão bibliográfica tem como objetivo analisar os estudos publicados que abordam as taxas e causas de readmissões no período de 30 dias após a alta de pacientes vítimas de acidente vascular cerebral. Isso permitirá a comparação das taxas de readmissão em diversos países, bem como a identificação dos principais fatores que contribuem para essas readmissões. Dado o volume de trabalhos publicados nessa área, limitamos nossa investigação aos estudos publicados a partir do ano 2000.
Causas e taxas de readmissão em 30 dias após AVC
Ao consultar a bibliografia sobre readmissão de pacientes vítimas de AVC após trinta dias, observa-se um número considerável de estudos realizados em países asiáticos. Por outro lado, na América do Norte, de modo geral, os estudos são numerosos e envolvem uma grande quantidade de pacientes, devido a intensa pesquisa e pela disponibilidade de dados. No entanto, em países em desenvolvimento, como na América do Sul, os estudos sobre esse tema são escassos e praticamente inexistentes.
Um estudo conduzido em sete hospitais de Taipei (Taiwan), avaliou 489 pacientes com AVC com o objetivo de identificar os fatores que levaram à readmissão em 30 dias e observou que 24,3% dos pacientes foram readmitidos nesse período. Os fatores identificados para readmissão foram limitação nas atividades diárias, primeiro episódio de AVC, a necessidade de cuidados especiais e o local para onde o paciente é enviado após a alta hospitalar. Ao contrário do que era esperado, a idade, o período de internação, aconselhamento antes da alta e a necessidade de cuidados não apresentaram efeito sobre a readmissão (Chuang, 2005).
Outro estudo realizado em Taiwan, avaliou a readmissão por AVC isquêmico agudo. O estudo envolveu pacientes admitidos em 2006 e readmitidos após 1 mês, 6 meses e 1 ano após a alta hospitalar. O estudo incluiu 1194 pacientes, sendo que a taxa de readmissão 30 dias após a alta foi de 9,9%. Os autores concluíram que é possível reduzir as readmissões em Taiwan e que isso não depende de maiores ou menores cuidados, mas sim do uso de agentes antiplaquetários (Li, 2011). Nesse estudo os autores afirmam que o uso de agentes antiplaquetários por menos de 9 meses após a alta hospitalar é um dos fatores preditores de readmissão. As principais causas, por eles apontadas para a readmissão são: AVC recorrente; infarto agudo do miocárdio e doenças respiratórias. Um terceiro estudo também conduzido em Taiwan revelou uma taxa de readmissão de 10%, muito semelhante à observada no estudo de Ln et al. (Lin, 2011).
Um estudo realizado nos Estados Unidos da América (EUA) com 265 pacientes revelou que durante a primeira internação, 13 pacientes faleceram e a taxa de readmissão foi de 9,9%. Dentre os pacientes readmitidos, 32% retornaram por razões neurológicas, enquanto 68% o fizeram por razões não-neurológicas. Entre as causas neurológicas, foram observados 3 casos de AVC isquêmico, 1 de AVC hemorrágico e 4 de ataques isquêmicos transitórios. No grupo de causas não-neurológicas, destacam-se 6 casos de infecções, 3 perturbações eletrolíticas e 2 de traumas resultantes de quedas. Os autores também afirmam que pacientes que ao receber alta foram encaminhados para suas residências ou para instituições especializadas tiveram menor probabilidade de serem readmitidos (Bhattacharya, 2011).
Outro estudo conduzido nos EUA, com beneficiários do Medicare, estudou a previsibilidade de readmissões em 30 dias após AVC isquêmico. Segundo os autores, a proporção de readmissões potencialmente previsíveis é desconhecida. O estudo foi conduzido entre dezembro de 2005 e novembro de 2006. Dos 307887 pacientes analisados, 44379 (14,4%) foram readmitidos em 30 dias sendo que 1,7% deles retornaram devido a causas previsíveis, como pneumonia e câncer (Lichtman, 2013).
Estudos foram conduzidos para avaliar fatores que podem ser usados como preditores de readmissão no período de 30 dias após um AVC hemorrágico. Em um desses estudos, realizado na Northwestern University – Feinberg School of Medicine, Chicago (EUA), de um total de 246 pacientes, 11% foram readmitidos nesse período. Os principais fatores associados à readmissão foram infecções e eventos vasculares. Entre os fatores previsíveis de readmissão destacam-se a idade, histórico de AVC, hipertensão e a gravidade do déficit neurológico na admissão. No entanto, a severidade da doença não foi associada à readmissão em 30 dias (Liotta, 2013).
Outro estudo, também realizado na Northwestern University (EUA), analisou o impacto de complicações médicas nas readmissões em 30 dias após um AVC. Eles verificaram que alguns fatores, como sexo, idade e gravidade do AVC, não podiam ser modificados, mas outras condições pós-AVC isquêmico poderiam ser. A pesquisa abrangeu o período de agosto de 2012 a julho de 2013 e incluiu 505 pacientes, sendo que 21,2% tiveram pelo menos uma complicação médica, sendo a mais comum infecção do trato urinário (8,7%) seguida de tromboembolismo (6,1%). Setenta e oito pacientes (15,4%) foram readmitidos no período em 30 dias. Os autores concluíram que a incidência de complicações médicas após um AVC ou AIT (ataque isquêmico transitório) aumentam o risco de readmissões e que o tratamento dessas complicações médicas no hospital poderia reduzir o risco de readmissão (Shah SV, 2015).
Em um levantamento que abrangeu 24240 pacientes de AVC hemorrágico em hospitais da Califórnia, se constatou que 14,5% deles foram readmitidos não planejados em 30 dias, com 22% dessas readmissões relacionadas a infecções após a alta hospitalar. Os diagnósticos mais comuns de infecções foram septicemia (11,8%), infecção do trato urinário (4,0%), pneumonia (3,5%), e infecção gastrointestinal (1,2%). O estudo foi realizado entre 2006 e 2010, e os autores recomendaram que esforços sejam feitos para reduzir as infecções após a alta hospitalar (Lord AS, 2016).
Outro amplo estudo realizado nos EUA, que abrangeu 319.317 análises de prontuários, concluiu que a readmissão após 30 dias para pacientes com AVC isquêmico foi de 12,1%, com 89,6% dessas readmissões sendo não planejadas e 12,9% sendo readmissões potencialmente previsíveis (Vahidi, 2017). Na pesquisa, os autores incluíram apenas pacientes com AVC isquêmico com mais de 65 anos. Segundo eles, as maiores causas de readmissão após 30 dias são as doenças cerebrovasculares agudas e a septicemia. Pacientes com idade avançada e portadores de comorbidades estão mais sujeitos à readmissão. O estudo também demonstrou que o uso da terapia de recanalização é efetivo na diminuição de readmissões.
Além disso, 537 pacientes com AVC isquêmico avaliados entre janeiro de 2007 e dezembro de 2011, apresentaram uma taxa de readmissão de 7,6% em um período de 30 dias. Os autores observaram que o fato do paciente ser casado, quando da ocorrência do AVC, é um fator negativo para a previsão de readmissão (Mittal, 2017).
Outro estudo conduzido nos EUA, envolvendo mais de dois milhões de pacientes com AVC, revelou que 13,70% dos pacientes com AVC hemorrágico foram readmitidos em 30 dias, em comparação com 12,44% dos pacientes com AVC isquêmico e 11,48% dos pacientes com AVC hemorrágico subaracnóide. Além disso, as taxas de readmissão estavam diminuindo a uma taxa anual de 3,3%. O estudo também apontou que pacientes que receberam alta de hospitais que não eram hospitais-escola tinham um maior risco de readmissão em 30 dias, sendo que os maiores fatores de readmissão foram doença cerebral aguda e septicemia (Bambhrolya, (2018).
Um estudo norueguês realizado entre julho de 2007 e dezembro de 2013 observou que, dos 1874 pacientes estudados, as readmissões não planejadas após 30 dias em pacientes com AVC corresponderam a 10,7%. As causas mais frequentes de readmissões foram eventos relacionados ao AVC, infecção, AVC/AIT recorrente e doença cardíaca. Os autores salientam que, embora os tratamentos para AVC tenham melhorado, as taxas de readmissão permaneceram constantes na Noruega (Bjerkrein, 2018).
Em um estudo conduzido por Boehme et al, na Universidade de Colúmbia, New York, NY, a partir de uma análise ponderada do National Readmission Database de 2013 foi demonstrado que as infecções aumentam o risco de readmissão entre sobreviventes de AVC. Entre os 319 pacientes com AVC isquêmico analisados, 12,1% foram readmitidos em um período de 30 dias, sendo que 29% tiveram infecção durante a hospitalização (Boehme, 2018).
Na Coreia do Sul, um estudo avaliando as readmissões não planejadas de pacientes com AVC após um período de 30 dias, envolveu 44729 pacientes em 94 hospitais, e verificou que 9,2% foram readmitidos em 30 dias, dos quais 7,6% corresponderam a readmissões não planejadas. Os autores destacam que os pacientes admitidos em hospitais que oferecem maior qualidade de cuidados em relação ao AVC apresentaram menores taxas de readmissão (Lee, 2019).
Com relação aos fatores de alto risco que contribuem para readmissões em 30 dias após AVC isquêmico agudo, Loebel et al, descrevem que o período logo após a alta hospitalar é o mais vulnerável, em especial para aqueles pacientes de maior complexidade. Foi realizada uma análise estatística incluindo idade, sexo, doença coronariana arterial (DCA) (1,7%), insuficiência renal (IR), histórico de AVC prévio ou AIT (1,6%), período de hospitalização (PH) >7(1,7%) e o escore NIHSS (escala de derrame do NIH, National Institute of Health Stroke Scale) ≥ 5 (4,5%) O estudo foi conduzido em Nova York (EUA), com pacientes internados entre janeiro de 2016 e dezembro de 2019. Dos 1591 pacientes investigados, 6,7% foram readmitidos no período de 30 dias. Se observou que os pacientes readmitidos após 30 dias geralmente apresentam comorbidades médicas complexas e histórico de AVC ou AIT. Pacientes com AVC mais graves e maior período de hospitalização podem se beneficiar de cuidados individualizados e de um acompanhamento mais rigoroso durante o período crítico de 30 dias após o AVC. As causas de readmissão foram DCA (1,7%), AVC prévio ou AIT (1,6%), PH > 7 (1,7%) e NIHSS ≥ 5 (4,5%) (Loebel, 2022).
Khaksary et al, da Universidade de Colúmbia, New York, NY, sugerem que a qualidade dos cuidados é menor nos finais de semana que nos demais dias da semana. Os autores utilizaram os dados do Nationwide Readmission Database3 e verificaram que os pacientes com AVC isquêmico hospitalizados nos finais de semana, têm maior probabilidade de serem readmitidos em um período de 30 dias (Khaksary, 2019).
Quando avaliado o impacto do status socioeconômico e o destino dos pacientes após a alta hospitalar com as readmissões em 30 dias de pacientes com AVC isquêmico, Man et al, verificaram que pacientes com planos de saúde públicos são mais sujeitos à readmissão em 30 dias do que aqueles com planos de saúde privados. Pacientes pertencentes ao quartil de renda mais baixa apresentaram maior taxa de readmissão em 30 dias (12,4%) do que aqueles nos quartis de renda mais altos (10,3%, 10,1% e 10,7%, respectivamente). O estudo abrangeu 52301 pacientes dos estados de Arkansas, Iowa e Wisconsin (EUA), no período de 2016 a 2017, e de New York (EUA) de 2016 (Man, 2021).
Lekoubou et al, investigaram a associação entre o diagnóstico de convulsões com as readmissões hospitalares após uma internação por AVC nos EUA. O estudo abrangeu uma população com idade superior a 18 anos que sofreram um AVC. Dos 271.148 pacientes com AVC analisados, 6,3% tiveram um diagnóstico secundário de convulsões, incluindo 5,0% de pacientes com AVC isquêmico e 13,4% com AVC hemorrágico. As taxas de readmissão em 30 dias foram de 14,2% para AVC hemorrágico e 11,6% para AVC isquêmico. Além disso, as taxas de readmissão em 30 dias foram mais elevadas para os pacientes que apresentaram convulsões em ambos os tipos de AVC (15,6% em comparação com 11,7%) (Lekoubou, 2020).
Outro fator importante associado à readmissão pode ser o desenvolvimento de um quadro de delirium. Vahidy et al, descrevem que o delirium é uma das causas da diminuição das taxas de alta hospitalar de pacientes com AVC isquêmico ou hemorrágico. O estudo investigou a associação entre a incidência de delirium, a alta hospitalar e as readmissões em 30 dias para os anos de 2010 a 2015, utilizando dados do Nationwide Readmission Database. Dos 3107347 pacientes com AVC que receberam alta, 7,45% apresentaram um quadro de delirium. Essa taxa aumentou significativamente entre 2010 (6,3%) e 2015 (8,7%). Pacientes com delirium apresentaram uma maior taxa de mortalidade hospitalar (12,3% em comparação com 7,8%), maior período de hospitalização (11,6 dias contra 7,3 dias) e uma probabilidade elevada de readmissão em 30 dias (16,7%) quando comparado àqueles que não apresentaram delirium (12,2%) (Vahidy, 2019).
Em um estudo realizado no Havaí (EUA), Nakagawa et al, pesquisaram a influência da desigualdade étnica nas readmissões após um AVC. Foram utilizados dados de hospitalizações dos anos de 2007 a 2012 e comparadas as diferenças étnicas com a frequência de readmissões em 30 dias. Dos 10.050 pacientes com AVC pesquisados, 8,4% foram readmitidos dentro desse período, sendo 8,7% dos casos relacionados a AVC isquêmico e 6,8% a AVC hemorrágico. Ainda, os resultados indicaram que pacientes de etnia chinesa apresentam maior risco de readmissão em 30 dias após um AVC, quando comparado com pacientes de etnia branca (Nakagawa, 2016).
Carthon et al, da Universidade de Pennsylvania, Philadelphia, observaram uma interação significativa no que diz respeito à raça e à equipe de enfermagem. Em um estudo realizado em 542 hospitais, incluindo 87% pacientes brancos e 13% pacientes afrodescendentes, verificou-se que os pacientes afrodescendentes eram mais propensos a readmissões em 30 dias após um AVC. A probabilidade cresce com o número de pacientes afrodescendentes aos cuidados de uma enfermeira. Entretanto, em hospitais com equipes de enfermagem mais numerosas (menos de três pacientes por atendente) a disparidade racial não foi mais evidente (Carthon, 2022).
Por outro lado, Tran et al, da Yale School of Public Health, New Haven (EUA), examinaram a relação entre a poluição do ar e as readmissões em 30 dias após um AVC, considerando o impacto da exposição prolongada a poluentes atmosféricos. Foram consideradas as exposições, por longos períodos, ao monóxido de carbono, dióxido de nitrogênio, material particulado e dióxido de enxofre. Para tanto, os autores utilizaram os limites permissíveis estabelecidos pela EPA (Environment Protection Agency). Verificou-se que o aumento de um limite permissível de monóxido de carbono, dióxido de nitrogênio, material particulado e dióxido de enxofre causa um aumento na probabilidade de readmissão em 30 dias de 1,1%, 3,6%, 1,2% e 2,0% respectivamente. Segundo os autores, é preciso mais pesquisas para determinar se o aumento na qualidade do ar em hospitais é capaz de diminuir as readmissões em 30 dias (Tran, 2023).
Brogan et al conduziram um estudo que abordou os problemas de deglutição, que afetam de 37 a 78% dos pacientes com AVC. A pesquisa envolveu 536 pacientes em hospitais da Austrália, revelando a presença de disfagia em 58,5% das internações. Dos pacientes internados, 30,5% se recuperaram da disfagia na primeira semana. Dos pacientes recuperados, 11% apresentaram infecção respiratória, sendo que destes, 17% tinham disfagia. A disfagia também foi identificada como um fator preditivo de AVC em pacientes com mais de 70 anos. No entanto, embora os pacientes com disfagia apresentem maior risco de infecção respiratória, foi encontrada pouca correlação entre a disfagia, aspiração e pneumonia por aspiração. Além disso, os autores investigaram outros fatores como mobilidade diminuída, higiene oral pobre e tubos de alimentação. A inserção de tubo nasogástrico é um previsor de infecção respiratória. O estudo indicou que a pneumonia aspirativa é multifatorial e a incidência de infecção respiratória é significativa durante o período agudo do AVC (Brogan, 2014).
Kim et al, verificaram que um aumento nos cuidados pós-AVC no ambiente hospitalar através da reabilitação pode resultar na diminuição das taxas de readmissão de pacientes no período de 30 dias. No estudo em questão, foi observada uma redução de 0,19 pontos percentuais nas taxas de readmissão em 30 dias para os pacientes que receberam cuidados pós-AVC (Kim, 2021).
Ang et al, investigaram as tendências de readmissões na Malásia no período de 2005 a 2015 e avaliaram as causas e fatores que levaram às readmissões em 2015. De 151.729 pacientes, 11 a 13% foram readmitidos dentro de um período de 28 dias. As principais causas de readmissão identificadas foram AVC recorrente (32,1%), pneumonia (13,0%) e septicemia (4,8%). Os autores recomendam que esforços sejam empreendidos no sentido de minimizar as readmissões potencialmente previsíveis, especialmente em pacientes com maior risco de readmissão (Ang, 2021).
Fehnel et al, do Rhode Island Hospital, Providence, EUA, em uma tentativa de diminuir as taxas de readmissão após um AVC, constataram que os modelos de previsão de readmissões atualmente em uso são imprecisos, uma vez que se concentram em casos agudos de hospitalização. Segundo os autores, após examinar os dados de 39.178 pacientes encaminhados para casas geriátricas, constatou-se que 21% deles foram readmitidos dentro de 30-dias, e 7% faleceram durante esse período (Fehnel, 2015).
Finlayson et al, destacam a pneumonia como sendo a mais comum das complicações após um AVC. Embora vários fatores tenham sido sugeridos como possíveis causadores de pneumonia, o tema ainda não está claro. Nesse artigo, um estudo foi conduzido com pacientes que sofreram AVC isquêmico e foram admitidos em Centros Regionais de AVC do Canadá. A presença de pneumonia dentro de um período de 30 dias foi confirmada radiograficamente. Foram observados 8.251 pacientes, dos quais 7,1% foram diagnosticados com pneumonia. A pesquisa ainda constatou que a pneumonia aumentou a taxa de mortalidade no período de 30 dias e de um ano, mas não afetou a mortalidade nos primeiros 7 dias (Finlayson, 2011).
Quando analisados dados da Austrian Stroke Unit a partir de dezembro de 2013, Matz et al observaram que dos 59.588 pacientes, 5,2% tiveram pneumonia pós-AVC. Os fatores de risco não modificáveis incluíram idade e gravidade do AVC, enquanto os fatores modificáveis incluíram consumo crônico de álcool e fibrilação atrial. Sexo feminino, AVC do hemisfério esquerdo, AVC criptogênico, patogênese específica e tratamento com drogas redutoras de lipídeos foram identificados como fatores associados a uma menor incidência de pneumonia após um AVC (Matz, 2016).
Gregersen et al destacam que pacientes frágeis apresentam maior risco de readmissões não planejadas. A previsão de readmissões não planejadas é fundamental no contexto de intervenções em tratamentos de saúde. Nesse sentido, o Índice de prognóstico multidimensional (IPM) baseado em avaliação geriátrica abrangente (AGA) permite a previsão da mortalidade e do período de internação de pacientes idosos hospitalizados. Assim, o objetivo do estudo foi validar o IPM como uma ferramenta capaz de prever a readmissão de pacientes geriátricos, com foco em pacientes com mais de 65 anos. Os pacientes foram classificados em três grupos com base na fragilidade: não frágeis (IPM-1), moderadamente frágeis (IPM-2) e severamente frágeis (IPM-3). O estudo visava estabelecer uma relação entre a fragilidade e a probabilidade de readmissão em 30 dias. Do total de 1467 pacientes, com idade média de 84.2 anos, 15,7% foram readmitidos. A taxa de readmissão para o grupo IPM-2 foi de 2,57% e para o grupo IPM-3 foi de 2,60%, indicando que a probabilidade de readmissão em 30 dias após um AVC aumenta com a fragilidade do paciente. Além disso, o IPM se mostrou um indicador relevante para prever o tempo de hospitalização e a mortalidade (Gregersen, 2020).
Keawpugdee et al, considerando que os dados de readmissão hospitalar de pessoas idosas vítimas de AVC são necessários para a prevenção de riscos, desenvolveram a ferramenta denominada Readmission Stroke Screening Tool (RRST), demonstrando que a RRST é capaz de prever riscos de readmissão com uma precisão de 92,5% Keawpudgee, 2021).
Um estudo conduzido na China englobou 50.912 pacientes de 375 hospitais. Foram computados os pacientes que tiveram readmissão não planejada em um período de 31 dias. A principal causa de readmissão foi AVC recorrente, com 28,8% dos pacientes sendo readmitidos nesse período (Wen, 2018). Outro estudo realizado na China, envolveu uma meta-análise para avaliar os riscos e as causas das readmissões hospitalares pós-AVC. O estudo abrangeu 253.680 pacientes com AVC, dos quais 17,4% foram readmitidos no período de 30 dias. As três maiores causas de readmissão foram infecção, doença da artéria coronária e AVC recorrente (Zong, 2016).
Tabela 1. Porcentagens de pacientes com AVC readmitidos em período de 30 dias e suas causas em diversas localidades.
Autor | Pacientes AVC | Read. % | Causas da Readmissão | Localidade |
---|---|---|---|---|
Chuang | 489 | 24,3 | Limitação das atividades diárias. Primeira incidência de AVC. Necessidade de cuidado de ferimentos. Localização após a alta. | Taipei |
Battacharya | 265 | 9,9 | Neurológicas: AVC isquêmico, AVC hemorrágico e ataque isquêmicoTransiente (TIA). Não neurológicas: infecções, perturbações eletrolíticas e quedas. | EUA |
Li | 1194 | 9,9 | Idade avançada. Longa permanência no hospital. Uso de antiplaquetários por menos de nove meses. | Taiwan |
Lin | 2657 | 10,0 | Infecções. AVC recorrente. Eventos cardiológicos. Idade avançada. AVC prévio ou TIA.Fibrilação atrial. Longa permanência no hospital. Doença coronariana arterial. Dependência após alta. | Taiwan |
Lichtman | 307887 | 14,4 | Pneumonia. Câncer. Comorbidades cardiovasculares.Falha congestiva do coração. Infarto do miocárdio. Diabetes. Falha renal. Idade avançada. | EUA |
Liotta | 246 | 11,0 | Infecções. Eventos vasculares. | EUA |
Sha | 505 | 15,4 | AVC recorrente. Condição cardíaca, arritmia. Hipertensão acelerada. Angina. Infecção do trato urinário. Tromboembolismo venoso. Pneumonia. | EUA |
Lord | 24240 | 14,5 | Pneumonite por aspiração. Septicemia. Pneumonia. Infecção do trato urinário. Infecção gastrointestinal. | EUA |
Vahidy | 319327 | 12,1 | Doenças cerebrovasculares. Septicemia. | EUA |
Mittal MK | 537 | 7,6 | Alta de pacientes para casas não geriátricas Pacientes solteiros | EUA |
Bambhrolya | >2000 | 13,701 12,442 11,483 | Doenças cerebrovasculares agudas. Septicemia. | EUA |
Bjerkrein | 1874 | 10,7 | Eventos relacionados ao AVC. Infecções. AVC ou TIA recorrente. | Noruega |
Boehme | 319 | 12,1 | Infecções adquiridas no hospital. Infecções após a alta hospitalar. | EUA |
Lee | 44729 | 9,2 | Ajuda médica. Longa permanência no hospital. Hospital com menos recursos. Hospitais localizados fora das capitais. | EUA |
Loebel | 1591 | 6,7 | AVC ou TIA prévios, Infecções do trato urinário. Infecções do trato respiratório. Embolismo pulmonar. | EUA |
Ang | 151729 | 11-13 | AVC recorrente. Pneumonia. Septicemia. | Malásia |
Fehnel | 39178 | 21 | Comatose. Paraplegia, Hemiplegia, Quadriplegia Demência. Depressão. Doenças cardíacas. Pneumonia. | EUA |
Wen | 50942 | 28,8 | AVC recorrente. Hipertensão. Doenças cárdio ou cerebrovasculares. Diabetes. | China |
Zong | 253680 | 17,4 | AVC ou TIA recorrente. Doença coronariana arterial. | China |
1AVC hemorrágico, 2AVC isquêmico, 3AVC subaracnoide
Conclusões
A pesquisa bibliográfica foi realizada nas principais revistas da área e, torna-se necessário salientar, que os levantamentos apresentados pelos diversos autores possuem uma margem inerente de erro. Tal erro se deve ao fato de muitos pacientes serem readmitidos numa instituição diferente daquela da primeira internação. Tais casos nem sempre são computados pelo fato de não se dispor de um seguimento do paciente após receber a alta hospitalar.
A grande preocupação é, naturalmente, evitar ao máximo as readmissões e, para tanto, a determinação de fatores preditores dessas internações são importantes. Inúmeras tentativas têm sido feitas no sentido de relacionar alguns desses fatores com as readmissões no período de trinta dias, porém os resultados não têm sido satisfatórios.
Tanto a readmissão como a mortalidade são comuns entre os pacientes com AVC isquêmico. A readmissão é um fator de risco independente da mortalidade (Nkemdirim, 2020). Por essa razão, os cuidados continuados devem ser motivo de preocupação.
Apesar das dificuldades de comunicação afetarem um número significativo de pacientes sobreviventes de AVC, nem sempre o cuidado de um especialista está disponível, nestes casos o auxílio do quadro de enfermagem se torna muito importante. (Pringle, 2010).
As infecções, como a pneumonia, são as principais causas não só das readmissões como também dos óbitos em pacientes com AVC. Klehmet et al, realizaram uma pesquisa, duplo cego e controlada com placebo de um tratamento antibacteriano, numa tentativa de evitar infecções. Uma perda rápida e a desativação funcional de células T são mudanças comuns em pacientes com AVC sendo consistentes com imunodepressão após uma isquemia cerebral. Um decréscimo acentuado na resposta imunológica após um AVC está associado a um alto risco de infecções. Pacientes do grupo placebo e pacientes tratados com moxifloxacin, e que desenvolveram ou não infecções, foram comparados a fim de serem identificadas as mudanças imunológicas associadas ao aparecimento de infecções. Um grupo de pacientes se beneficiou com o tratamento antibacteriano, embora alguns pacientes tenham desenvolvido infecções apesar do uso de moxifloxacin. As infecções são citadas com frequência como a principal causa das readmissões em períodos de 30 dias (Klehmet, 2020).
Muitos pacientes desenvolvem infecções após um AVC mesmo que os cuidados pós-AVC sejam considerados ótimos. É controverso que as infecções agravam o estado do paciente ou que indiquem uma doença severa (Chamorro, 2007). O cérebro e o sistema imunológico estão interligados por caminhos neurais e não é raro verificar uma diminuição imunológica por severas condições neurológicas, resultando no aparecimento de infecções. Não está claro se as infecções contribuem para o AVC.
Para alguns há uma relação estreita entre AVC e a síndrome da imunodepressão cerebral embora o mecanismo ainda permaneça pouco claro. Sykora et al, pesquisaram 62 pacientes com hemorragia intracerebral aguda. A ocorrência de infecções foi investigada e verificou-se que 58% dos pacientes tiveram infecções durante os cinco primeiros dias de hospitalização (Sykora, 2011).
A relação entre os fatores e as causas de readmissão de pacientes com AVC agudo são poucas. Rao et al, em uma revisão sistemática utilizando várias bases de dados, encontraram 24 trabalhos dos quais somente 4 tratam das causas da readmissão de pacientes com AVC com seguimento de 30 dias a 5 anos. A finalidade do estudo foi investigar as causas comuns e os padrões de readmissão de pacientes de AVC utilizando dados administrativos de hospitais. As causas comuns de readmissão, na maioria dos estudos, foram AVC recorrente, infecções e condições cardíacas (Rao, 2016).
Os dados epidemiológicos sobre AVC são escassos nos países latino-americanos de média e baixa renda. Bahit et al, examinaram a incidência anual do primeiro AVC e AIT e a mortalidade em 30 dias em uma população em Tandil, Argentina. O período da pesquisa foi de janeiro de 2013 a abril de 2015. Foram identificados 314 casos de AVC e 108 de AIT. A incidência de AVC foi ligeiramente mais alta nos homens que nas mulheres. As fatalidades em 30 dias foram de 14,7% no caso de AVC isquêmico, 24,1% no caso de AVC hemorrágico e 1,9% no caso de AIT. As fatalidades após 30 dias foram semelhantes às encontradas para outras populações latino-americanas (Bahit, 2016). Por outro lado, a epidemiologia dos AVCs nas populações latino-americanas e a variação dos subtipos entre as comunidades é incerta (Lavados, 2005). Em um estudo foi conduzido em uma população hispano-mestiça em Iquique, região desértica ao norte do Chile. O período de coleta dos dados foi de julho de 2000 a junho de 2002. Dos 380 casos examinados, 292 foram de AVC. Dos 292 pacientes, 71% foram hospitalizados. A mortalidade em 30 dias foi de 23,3% e em seis meses 33,0% respectivamente (Lavados, 2005).
Assim, as readmissões em um período de 30 dias devem ser mais estudadas, especialmente em países de média e baixa renda, onde a disponibilidade de dados é escassa. As readmissões permitem avaliar os cuidados dispensados aos pacientes de AVC e melhor gerenciar a doença. Importante também é a busca de fatores preditores das readmissões, como um meio de reduzir a incidência delas.
Os fatores de risco para os AVCs, que podem ser modificados, como o tabagismo, o uso prejudicial do álcool, as dietas não saudáveis e o sedentarismo devem ser considerados como uma forma de diminuir a incidência da doença que têm se tornado cada vez mais frequente entre a população mundial.
3O Nationwide Readmission Database (NRD) é parte de um conjunto de base de dados e ferramentas de software desenvolvido para o Healthcare Control and Utilization Project (HCUP).
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1Discente do Curso de Pós- Graduação em Gerontologia Biomédica – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
2Docente do Curso de Pós- Graduação em Gerontologia Biomédica – Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.