PALLIATIVE PSYCHIATRY: ITS BENEFITS FOR PATIENTS WITH MENTAL DISORDERS
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/fa10202411111905
Bárbara Inocente Terçariolli1,
Janaína Carla Parizotto da Rosa1,
Guilherme Pelissari Vieira1,
Renato Daniel Ramalho Cardoso2,
Paula Souza Lage3
RESUMO
Introdução: Os transtornos mentais são definidos como sendo síndromes caracterizadas por uma perturbação clinicamente expressiva na cognição, na regulação emocional ou no comportamento de um indivíduo, que refletem uma disfunção nos processos psicológicos, biológicos ou de desenvolvimento subjacentes ao funcionamento mental. Estes estão frequentemente associados ao sofrimento ou às incapacidades. Sabe-se que uma das características marcantes de determinados transtornos está relacionada à cronicidade dos mesmos, o que reduz a possiblidade de cura e levanta a discussão a respeito do controle dos sintomas destes para a manutenção da qualidade de vida dos indivíduos que deles sofrem. Uma intervenção pouco associada, mas relevante, se for analisado o estado dos usuários crônicos em saúde mental, são os cuidados paliativos e suas ações paliativas que não buscam por cura, mas por oferecer o máximo de conforto possível ao usuário desde o diagnóstico até o seu último dia de vida. Objetivo: Reunir e analisar informações a respeito da psiquiatria paliativa e seus benefícios aos pacientes com transtornos mentais. Metodologia: Foram avaliados artigos publicados em revistas indexadas nas bases de dados Scientific Electronic Library Online (SCIELO), National Library of Medicine/NLM (MEDLINE) e National Library of Medicine/NLM (PUBMED), além de sites oficiais como o Ministério da Saúde do Brasil e a Organização Mundial da Saúde, no período de 2014 a 2024. Resultados e discussão: Após busca foram encontrados 33 artigos relacionados ao tema proposto. Foi observado que a psiquiatria paliativa abrange uma ampla gama de questões, incluindo condições de saúde mental amplamente conhecidas, como ansiedade ou depressão, doenças mentais graves refratárias ao tratamento, cuidados neuropaliativos e carga de sintomas em vários níveis. Além disso, aborda problemas éticos e psicossociais, sofrimento psicológico, personalidade, desejo e vontade de morrer, dignidade, solidão, isolamento social, bem como psicofarmacologia. E que esses cuidados seriam vantajosos e de fundamental importância aos pacientes com doenças mentais graves. Conclusão: Diante das novas perspectivas para o cuidado em saúde mental de uma maneira cada vez mais humanizada, os artigos evidenciaram os benefícios da psiquiatria paliativa e sua importância na melhora da qualidade de vida dos pacientes com transtornos mentais graves. Entretanto, foi observado ainda que muitas barreiras precisam ser vencidas para garantir o atendimento de qualidade para o grupo em questão.
Palavras chave: Cuidados Paliativos, Psiquiatria Paliativa, Benefícios
ABSTRACT
Introduction: Mental disorders are defined as syndromes characterized by a clinically significant disturbance in an individual’s cognition, emotional regulation or behavior, which reflect a dysfunction in the psychological, biological or developmental processes underlying mental functioning. These are often associated with suffering or disabilities. It is known that one of the striking characteristics of certain disorders is related to their chronicity, which reduces the possibility of a cure and raises the discussion about controlling their symptoms to maintain the quality of life of individuals who suffer from them. A little associated but relevant intervention, if the state of chronic users in mental health is analyzed, is palliative care and its palliative actions that do not seek a cure, but to offer the maximum possible comfort to the user from diagnosis until their last day of life. Objective: Gather and analyze information regarding palliative psychiatry and its benefits for patients with mental disorders. Methodology: Articles published in indexed journals in the Scientific Electronic Library Online (SCIELO), National Library of Medicine/NLM (MEDLINE), and National Library of Medicine/NLM (PUBMED) databases were evaluated, in addition to official sites such as the Ministry of Health of Brazil and the World Health Organization, covering the period from 2014 to 2024. Results and Discussion: After completing the data collection phase, 33 relevant articles were identified for analysis of the proposed theme. It has been noted that palliative psychiatry encompasses a wide range of issues, including widely known mental health conditions such as anxiety or depression, severe mental illnesses refractory to treatment, neuropalliative care, and symptom burden at various levels. Furthermore, it addresses ethical and psychosocial problems, psychological suffering, personality, desire and desire to die, dignity, loneliness, social isolation, as well as psychopharmacology. And that this care would be advantageous and of fundamental importance to patients with serious mental illnesses. Conclusion: Given the new perspectives for mental health care in an increasingly humanized way, the articles highlighted the benefits of palliative psychiatry and its importance in improving the quality of life of patients with serious mental disorders. However, it was also observed that many barriers need to be overcome to guarantee quality care for the group in question.
Keywords: Palliative care, Palliative Psychiatry, Benefits
INTRODUÇÃO
De acordo com a Organização Mundial de Saúde os Cuidados Paliativos (CP) são uma abordagem que melhora a qualidade de vida dos pacientes, adultos ou crianças, e de seus familiares que enfrentam problemas associados a doenças que ameaçam a vida. Eles previnem e aliviam o sofrimento por meio da investigação precoce, da avaliação correta e do tratamento da dor e de outros problemas como físicos, psicossociais ou espirituais [1]. Sendo considerados relevantes, mais frequentemente, quando as tentativas curativas cessam ou perto do fim da vida. Entretanto, este foco prejudica seriamente seu potencial para abordar questões de qualidade de vida, diante da variedade de doenças crônicas e no início das patologias. Atualmente, esses são vistos como um direito do ser humano, com o foco na melhoria da qualidade de vida dos pacientes e familiares, e não apenas na gestão dos sintomas de final de vida. Além disso, os cuidados paliativos e as intervenções curativas não são mutuamente exclusivos, os princípios de ambos podem e devem coexistir quando relevantes e apropriados para uma gama diversificada de doenças que limitam a vida [2].
O campo da Psiquiatria e Cuidados Paliativos compartilham um terreno comum, pois ambas as disciplinas evoluíram historicamente da medicina interna, são fundamentadas no modelo biopsicossocial e geralmente operam dentro de equipes multiprofissionais [3].
Aproximadamente 4,5% da população vive com doença mental grave [4]. Essas estão em risco de mortalidade prematura em relação às pessoas sem doenças mentais graves e as enfermidades crônicas contribuem significativamente para a mortalidade entre esses indivíduos. O padrão de atendimento para indivíduos com problemas médicos graves inclui cuidados paliativos. No entanto, o acesso universal a esses e aos cuidados de fim de vida para pacientes que sofrem de doenças mentais graves continua a ser um objetivo não alcançado [5].
A psiquiatria paliativa abrange uma ampla gama de problemas, incluindo condições de saúde mental amplamente conhecidas, como ansiedade ou depressão, doenças mentais graves refratárias ao tratamento, cuidados neuropaliativos e carga de sintomas em vários níveis. Além disso, aborda problemas éticos e psicossociais, sofrimento psicológico, personalidade, desejo e vontade de morrer, dignidade, solidão, isolamento social, bem como psicofarmacologia. Além disso, os “3 Ds” da psiquiatria paliativa incluem depressão, demência e delirium [6]. E vale ressaltar que as comorbidades psiquiátricas são comuns em pacientes que recebem cuidados paliativos [7].
No geral, a colaboração entre os campos da psiquiatria e dos CP cresceu significativamente na maioria dos países desenvolvidos nas últimas duas décadas [3]. E a prestação de cuidados psiquiátricos, psicoterapêuticos ou psicossociais é considerada um indicador de CP de alta qualidade em casos de doença médica avançada [8].
Pessoas com doenças mentais graves e comorbidades de saúde física que limitam a vida são uma população vulnerável que está sub-representada nas pesquisas sobre disparidades em saúde [9]. Isso ocorre devido esses pacientes serem afetados pelo estigma associado a doenças mentais [10]. E ainda existe na área da saúde mental um desafio que é identificar e tratar eficazmente pacientes com doenças mentais graves e condições concomitantes limitantes de vida em diversos ambientes de cuidados, para que esta população tenha resultados de saúde física e qualidade de vida pelo menos equivalentes aos pacientes sem doenças mentais graves [11].
Estudos têm mostrado maior mortalidade entre pacientes com doença mental grave e persistentes, que morrem 10 a 20 anos antes, em média, do que pessoas na população em geral [12, 13, 14, 15]. Estudo de Olfson e colaboradores em 2015 [14] demonstrou que esse grupo de pacientes apresentam taxas de mortalidade padronizadas de 3,6% para doenças cardiovasculares, 2,4% para câncer e 9,9% para doença pulmonar obstrutiva crônica. Com valores persistentes mesmo quando se controlam fatores como situação socioeconômica e comorbidades [16].
Estudos tem descrito ainda a relevância no tratamento de certas doenças mentais graves e persistentes, como na depressão refratária, na esquizofrenia e na anorexia nervosa [3, 17].
Dessa maneira, a psiquiatria paliativa poderia ser particularmente útil fazendo uma interfase entre as doenças psíquicas e físicas, como exemplo: garantindo que os regimes de medicamentos psiquiátricos sejam mantidos e atualizados de acordo com tratamentos médicos, visando a diminuição dos efeitos adversos. Os psiquiatras paliativos também podem fornecer avaliações contínuas de comorbidades e riscos psiquiátricos, uma vez que o fator biopsicossocial das doenças crônicas graves pode colocar os pacientes em risco de crises de sintomas psiquiátricos, agitação e/ou suicídio. Ao garantir a continuidade cuidados psiquiátricos, esses podem dar aos pacientes a melhor oportunidade possível de participar plenamente do tratamento e, ao mesmo tempo, ampliar as opções disponíveis [5,17].
Um outro ponto relevante é que a maioria dos pacientes com doença mental grave e persistente são capaz de tomar decisões em relação ao seu tratamento e esses devem ser engajados em um modelo de tomada de decisão compartilhada, no qual as partes interessadas: pacientes, médicos e famílias tomem as decisões conjuntamente. É importante salientar que mesmo entre os pacientes sem diagnóstico de doença mental, há evidências de uma na maioria das vezes essa parceria na tomada de decisão não ocorre. E assim, pacientes e familiares podem ter um papel de tomada de decisão menor do que o desejado [18].
É importante salientar que a utilização de cuidados paliativos em psiquiatria, como em outras áreas da saúde, não exclui outras abordagens de tratamento. As características das abordagens do cuidado, como a aliança contínua com os pacientes e seus familiares, o manejo dos sintomas e a busca por conforto do paciente e da família de maneira integral, por exemplo, são compatíveis e consistentes com os princípios do modelo de recuperação. Neste sentido, as abordagens desses podem oferecer aos psiquiatras ferramentas adicionais no cuidado do paciente com doença mental grave e persistente, particularmente quando as necessidades e objetivos do paciente não podem ser atendidos pelas intervenções psiquiátricas atuais [19].
Nesse contexto, considerando o número de pacientes com doenças mentais graves e persistentes, sua concomitância com doenças físicas, e sabendo da necessidade de um acompanhamento mais integral, que os cuidados paliativos pode trazer por meio do alívio de sintomas e do acompanhamento global do paciente e de seus familiares, trazendo inúmeros benefícios e a necessidade do aumento da oferta desse tipo de cuidados no grupo em questão, esta revisão integrativa teve como objetivo reunir e analisar informações sobre a abordagem da psiquiatria paliativa e seus benefícios.
2. METODOLOGIA
Este artigo foi elaborado a partir de uma revisão integrativa da literatura. Para isso, foram identificados artigos publicados em revistas indexadas nas seguintes bases de dados: Scientific Electronic Library Online (SCIELO), Google Acadêmico, National Library of Medicine/NLM (MEDLINE) e National Library of Medicine/NLM (PUBMED). Também foram utilizados dados de fontes oficiais como Organização Mundial de Saúde e o Ministério da Saúde do Brasil. O estudo foi dividido em dois momentos, sendo que no primeiro, foram buscados os seguintes descritores em artigos nacionais e internacionais nos idiomas português e inglês: psiquiatria paliativa, cuidados paliativos, doenças mentais graves, benefícios, desafios, palliative psychiatry, palliative care, serious mental illnesses, benefits and challenges. No segundo momento, foram avaliados os títulos e resumos dos artigos encontrados para definir sua inclusão ou exclusão com base nos critérios descritos a seguir, inclusão: estudos realizados por meio de revisões, meta-análises e ensaios clínicos controlados publicados entre 2014 e 2024, que abordavam o tema em questão e que fossem de livre acesso, foram encontrados 315 artigos. E para exclusão do artigo, foram utilizados os seguintes critérios: estudos anteriores há 10 anos de publicação e artigos com baixo rigor metodológico. Para garantir a relevância e qualidade dos estudos selecionados neste artigo valeu-se destes critérios de forma que a revisão de literatura tivesse maior grau de validade e confiabilidade em seus resultados. Após a inclusão dos artigos baseados nos critérios supracitados e que havia relação ao tema proposto, os textos foram integralmente lidos, interpretados e tiveram suas principais informações sintetizadas, finalizando com 33 artigos.
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Como resultado da metodologia após a seleção dos artigos esses foram usados para síntese. Sendo assim, elaborada a Tabela 1 com as principais informações.
Tabela 1. Síntese dos trabalhos encontrados relacionando psiquiatria paliativa e seus benéficos para os pacientes com transtornos mentais
Título | Palliative Psychiatry for Patients With Severe and Persistent Mental Illness: A Survey on the Attitudes of Psychiatrists in India Compared to Psychiatrists in Switzerland [20] |
Autor/ ano | Stoll, J.et al., 2022. |
Principais achados | Enquanto a psiquiatria curativa se concentra no transtorno mental com o objetivo de remissão (parcial) dos sintomas, a psiquiatria paliativa visa melhorar a qualidade de vida por outros meios, além da remissão de sintomas. Em resumo, este estudo demonstrou o potencial da psiquiatria paliativa como uma abordagem biopsicossocial-existencial genuína que integra sistematicamente fatores biológicos, psicológicos, sociais e existenciais do cuidado. |
Título | Atuação da medicina paliativa em pacientes psiquiátricos [21] |
Autor/ ano | Sampaio; Ribeiro; 2024. |
Principais achados | Foram identificados 182 artigos, sendo que 176 documentos foram excluídos após aplicação dos critérios de exclusão e inclusão. A amostra final resultou em 6 estudos, na qual três foram publicados em 2019, um em 2020, um em 2021 e um em 2022. Concluiu-se, então, que é comum existir atraso nos diagnósticos de fim de vida, falta de suporte para os sintomas, presunção de incapacidade na tomada de decisões, e barreiras que as condições psiquiátricas graves podem trazer ao cuidado. |
Título | On the Margins of Death: A Scoping Review on Palliative Care and Schizophrenia [22] |
Autor/ ano | Relyea et al., 2019. |
Principais achados | Foi realizada uma revisão de literatura com o objetivo de melhorar a compreensão dos cuidados paliativos em pacientes com esquizofrenia. Foram identificados os seguintes temas: Estigma que afeta a qualidade do cuidado e o acesso ao cuidado; questões relacionadas com o consentimento e capacidade para tomar decisões sobre cuidados de fim de vida do paciente e nomear decisores substitutos; melhores práticas para intervenções psicossociais, farmacologia, colaboração familiar e de cuidados de saúde, objetivos de cuidados, ambiente e tabagismo; e barreiras aos cuidados, incluindo ambiente, comunicação, educação do prestador e acesso aos cuidados. A revisão sugeriu a importância de práticas de formação interdisciplinares obrigatórias e de normas políticas que definam a comunicação cooperativa entre os prestadores de cuidados de saúde. Destaca lacunas na investigação baseada em evidências sobre intervenções psicossociais e quadros colaborativos para permitir a prestação de cuidados de qualidade no fim da vida a indivíduos com esquizofrenia. |
Título | End of life care for people with severe mental illness: Mixed methods systematic review and thematic synthesis (the MENLOC study) [23] |
Autor/ ano | Edwards et al., 2021. |
Principais achados | O objetivo desse artigo foi sintetizar políticas e orientações internacionais, relativas à organização, prestação e recepção de cuidados de fim de vida para pessoas com doenças mentais graves. Foram avaliadas a estrutura do sistema; questões profissionais; contextos de cuidado; e viver com doença mental grave. As implicações para os serviços e a prática refletiram evidências nas quais existe um elevado grau de confiança. Sugerem que devem ser desenvolvidas parcerias em todos os sistemas de saúde mental e de fim de vida, e é necessário que sejam encontradas formas de ajudar as pessoas a morrer de forma digna. Os profissionais que cuidam de pessoas com doenças mentais graves em fim de vida necessitam de educação, apoio e supervisão. Os cuidados de fim de vida para pessoas com doenças mentais graves requerem uma abordagem multidisciplinar, incluindo a advocacia. E por fim, são necessários cuidados proativos de saúde física para pessoas com doenças mentais graves para resolver problemas como o diagnóstico tardio. |
Título | A palliative care approach in psychiatry: clinical implications [24] |
Autor/ ano | Strand et al., 2023. |
Principais achados | Este artigo contribui para a crescente literatura sobre uma abordagem paliativa em psiquiatria e baseia-se no pressuposto de que uma mudança de perspectiva de uma abordagem curativa para uma abordagem paliativa poderia ajudar a promover a centralização no paciente e aumentar a qualidade de vida de pacientes gravemente enfermos também em psiquiatria. Foram avaliados três cenários clínicos diferentes: anorexia nervosa grave e duradoura, esquizofrenia refratária ao tratamento, automutilação persistente no transtorno de personalidade borderline e suicídio. O trabalho demonstrou que muitas intervenções típicas para transtornos psiquiátricos refratários ao tratamento podem, de fato, ser de natureza paliativa. Além disso, a introdução de características tradicionais de cuidados paliativos, por exemplo os chamados objetivos das conversas sobre cuidados, poderiam ajudar ainda mais a garantir que cuidadores, pacientes e famílias concordem sobre quais objetivos de tratamento devem ser priorizados, a fim de otimizar a qualidade de vida, apesar do transtorno mental grave e persistente. |
Título | Severe mental illness and palliative care: patient semistructured interviews [25] |
Autor/ ano | Knippenberg et al., 2021. |
Principais achados | O objetivo desse artigo foi explorar percepções, experiências e expectativas em relação aos cuidados paliativos de pacientes com doença mental grave (SMI) e uma doença crônica incurável e limitante da vida. A análise dos dados revelou oito categorias: percepções sobre saúde e problemas de saúde, enfrentamento de doenças e sintomas, experiências e desejos de cuidados de saúde atuais, contato com familiares e residentes, experiências com o fim da vida de familiares e residentes, disposição para discutir a respeito do fim da vida, vida e morte, desejos e expectativas em relação ao próprio fim da vida e aspectos práticos relativos a assuntos após a morte. Essas categorias foram agrupadas em dois temas distintos: situação atual e antecipação do fim da vida. Os entrevistados pareciam não estar habituados a comunicar sobre questões de fim de vida, morte e morrer devido a doenças potencialmente fatais. Eles tendiam a discutir apenas sua situação atual e, após maior exploração do pesquisador, a fase terminal da vida. Eles pareciam não estar envolvidos no planejamento futuro de cuidados paliativos. Os resultados deste estudo destacam inadequações no planejamento antecipado de cuidados para pacientes com doenças mentais graves. Os resultados sugerem a utilização de valores, desejos atuais e próximos e necessidades como ponto de partida para estabelecer uma discussão gradual sobre objetivos e preferências para futuros tratamentos e cuidados médicos e mentais. |
Título | Adapting the collaborative care model to palliative care: Establishing mental health–serious illness care integration [26] |
Autor/ ano | Wozniak et al., 2023. |
Principais achados | Os modelos de integração entre cuidados paliativos e cuidados especializados em doenças graves permitiram que um maior número de pessoas usufruísse dos benefícios dos cuidados paliativos. A integração da saúde mental é a próxima fronteira na prestação de cuidados holísticos a indivíduos que vivem com doenças graves. Modelos da integração saúde mental-médica, como o modelo de cuidado colaborativo, são meios atraentes para alcançar a integração da saúde mental porque têm sido utilizados de forma eficaz para melhorar a prestação de serviços de saúde mental nos cuidados primários e noutros contextos médicos; também foram adaptados à integração dos cuidados paliativos com a oncologia e outras áreas médicas. A integração entre os cuidados médicos especializados, cuidados paliativos e saúde mental poderia promover um alívio do sofrimento e a melhoria da qualidade de vida. |
Título | Por uma Psiquiatria paliativa: Aplicação de cuidados paliativos a usuários da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) [27] |
Autor/ ano | Konig Luiz R.C., 2024. |
Principais achados | O objetivo geral desse artigo foi investigar, nas perspectivas médica e bioética, a viabilidade de portadores de sofrimento psíquico, transtornos mentais e abuso ou dependência de substâncias serem submetidos a cuidados paliativos na RAPS, em função desses agravos e não como condição secundária a doenças de base orgânica. Foram objetivos específicos: identificar os fundamentos bioéticos da ideia de cuidado; examinar o papel da clínica ampliada e do Projeto Terapêutico Singular (PTS) no contexto da atenção psicossocial; e vislumbrar o eventual caráter paliativo das intervenções em saúde mental. O estudo propôs ainda uma análise de dados obtidos a partir de levantamento não-sistemático da literatura. Do ponto de vista bioético, medidas paliativas justificam-se na perspectiva integradora de uma ética do cuidado. Verificou-se também que termos como “cura” e “cuidado” comportam uma imprecisão – e, portanto, uma plasticidade conceitual – que possibilita estender a ideia de paliatividade às práticas dentro da RAPS, de maneira alinhada aos princípios do movimento hospice e da Reforma Psiquiátrica brasileira. Para tanto, o ponto de partida deve ser a elaboração do PTS, no âmbito da clínica ampliada. Por fim, ao incluir medidas suportivas, isoladamente ou em conjunto com ações terapêuticas, o modelo de intervenção atual parece admitir a possibilidade de inclusão de práticas paliativas. Ressalva-se ainda a necessidade das equipes multidisciplinares que atuam em saúde mental devem receber treinamento específico quanto a técnicas em cuidados paliativos, com vistas ao aperfeiçoamento da assistência prestada. |
Título | Transtornos mentais crônicos e cuidados paliativos: a prática de terapeutas ocupacionais [28] |
Autor/ ano | Silva et al., 2024. |
Principais achados | O objetivo desse estudo foi investigar a prática de terapeutas ocupacionais, bem como suas abordagens e recursos utilizados na saúde mental, a partir da perspectiva dos cuidados paliativos. Participaram quatro terapeutas ocupacionais atuantes em um hospital de referência em emergência psiquiátrica. Emergiram quatro categorias: 1) Relação entre a abordagem dos cuidados paliativos e saúde mental; 2) Prática do terapeuta ocupacional atuante em saúde mental utilizando a abordagem dos cuidados paliativos; 3) Recursos utilizados por terapeutas ocupacionais em suas práticas no contexto da saúde mental; 4) Desafios encontrados pelo terapeuta ocupacional ao trabalhar com a abordagem dos cuidados paliativos na saúde mental. Os profissionais entrevistados já utilizavam em suas práticas no campo da Saúde Mental a abordagem dos cuidados paliativos, e observaram um aumento da qualidade de vida dos pacientes atendidos. |
Embora a maioria dos sistemas de saúde separe a saúde mental dos serviços de saúde física, criando barreiras sistémicas aos cuidados paliativos integrados para pacientes com doenças mentais graves, algumas áreas médicas, como a psiquiatria clínica, estão a prestar cuidados no sentido inverso num quadro de cuidados paliativos. Na verdade, a psiquiatria paliativa é um campo em evolução que se concentra em doenças mentais graves, refratárias e muitas vezes que não respondem aos tratamentos psiquiátricos e psicossociais convencionais [7].
Com base nesta definição ampla, algumas intervenções psiquiátricas podem ser consideradas paliativas, pois visam principalmente melhorar a qualidade de vida por meio do controle adequado dos sintomas e concentrando-se na incapacidade e não na cura da doença [3].
Em indivíduos com esquizofrenia estudos apontaram que menos da metade tinham a probabilidade de receber cuidados paliativos especializados. Eles também tinham cerca de 30% menos probabilidades de receber analgesia prescrita, possivelmente refletindo subtratamento ou subnotificação de dor; essa discrepância foi ainda mais pronunciada entre indivíduos com câncer. Enquanto doentes terminais, os indivíduos com esquizofrenia também tinham significativamente menos acesso aos seus psiquiatras e foram mais propensos a passar os últimos meses em uma enfermagem lar [5]. Dados a nível populacional de outros sistemas de saúde incluindo a Austrália e a Nova Zelândia demonstraram que os indivíduos com doenças mentais graves têm entre 2 e 4 vezes menos probabilidade do que indivíduos sem doença mental de acessar serviços de cuidados paliativos nos últimos meses de vida [30, 31].
Em um inquérito aos psiquiatras na Suíça, quase todos os inquiridos acreditavam que o pacientes com doença mental crônica podem apresentar doenças terminais, entretanto eles apresentam uma prioridade menor de cuidados, como a redução do sofrimento e o funcionamento na vida quotidiana. A mortalidade prematura é um aspecto negligenciado nos cuidados de saúde mental [32].
Outros estudos citam três diferentes cenários de condições psiquiátricas relacionadas a sofrimento intenso: anorexia nervosa grave e prolongada; esquizofrenia resistente ao tratamento; e tendência crônica ao suicídio e automutilação persistente no transtorno de personalidade borderline. Em relação à anorexia nervosa, cerca de 25% dos pacientes não alcançam remissão a longo prazo, com artigos mostrando a ineficácia dos tratamentos médicos, levando à morte por desnutrição extrema ou por complicações de tratamentos agressivos. O estudo também destaca a frustração e tratamentos indesejados causados por múltiplos ciclos de alta e retorno aos cuidados devido à falta de motivação dos pacientes. Propõe-se que o foco no aumento da qualidade de vida pode ser uma solução para este problema, destacando programas que visam a reintegração dos pacientes na sociedade e a prevenção de complicações, em vez de apenas restaurar o peso corporal, permitindo uma transição suave entre cuidados paliativos e curativos [24].
As abordagens em cuidados paliativos, no entanto, são aplicáveis em conjunto com outras terapias destinadas a prolongar a vida. Um próximo passo poderia ser envolver os usuários do serviço e desenvolver um consenso sobre o que os cuidados paliativos e seus benefícios para os pacientes com transtorne mental. Uma estrutura para identificar quais pacientes podem se beneficiar de cuidados paliativos deve ser explorada para o desenvolvimento futuro de cuidados para os pacientes [16].
O padrão de cuidados para doenças graves inclui cuidados especializados e cuidados paliativos integrados longitudinalmente; os benefícios dos cuidados paliativos para pacientes com doenças graves estão bem descritos e incluem melhoria da qualidade de vida, diminuição da carga de sintomas, aumento dos cuidados concordantes com os objetivos e apoio do cuidador [33].
Entretanto, o cuidado de pacientes psiquiátricos em fim de vida é um desafio complexo e delicado. Muitas vezes, esses pacientes são vistos como incapazes de tomar decisões sobre seu tratamento, mesmo que possam ter capacidade para isso. Ademais, a falta de diretivas antecipadas pode levar a decisões sendo tomadas por tutores ou curadores, muitas vezes contra os desejos do paciente. Por fim, ressalta que o tratamento de pacientes psiquiátricos em fim de vida deve ser adequado e humanizado, respeitando suas necessidades e autonomia (COFFEY, Michael et al. End-of-life care for people with severe mental illness: mixed methods systematic review and thematic synthesis of published case studies (the MENLOC study) [21].
4. CONCLUSÕES
Dessa maneira a psiquiatria paliativa mostra-se de fundamental importância no acompanhamento dos pacientes e de seus familiares, auxiliando na melhora significativa da qualidade de vida. Entretanto, ainda existem muitas barreiras no cuidado dos pacientes com transtornos mentais. Ressaltamos ainda que a uma necessidade de mais estudos a respeito do tema.
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1Pós-Graduando em Psiquiatria pelo Hospital Vida- Londrina, Paraná, Brasil.
2Doutor pelo Programa de Pós-graduação em Patologia Experimental pela Universidade Estadual de Londrina – UEL; Paraná, Brasil.
3Doutora pelo Programa de Pós- Graduação em Ciências da Saúde: Infectologia e Medicina Tropical, Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais/UFMG, Belo Horizonte, Minas Gerais, Brasil.