POLYAMOR: CONCOMITANT FAMILIES AND ITS CIVIL LEGAL EFFECTS
REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7966837
Letícia Borges Ferreira1
Marina Teodoro2
RESUMO
Este estudo buscou tratar acerca do poliamor e as entidades poliamorosas, temas ainda pouco abordados, e merecem ser abordados em razão da ausência de previsão e tutela de direitos desta modalidade familiar. Assim, o objetivo foi discutir a relevância dos efeitos jurídicos cíveis das uniões poliamorosas, destacando a necessidade de reconhecimento jurídico destas famílias, tendo em vista a dignidade da pessoa humana e o pluralismo familiar assegurado pela Constituição de 1988. No decorrer do texto buscou-se discorrer acerca do contexto histórico da família no Brasil, oferecer conhecimento da perspectiva da Constituição no que se refere as famílias e compreender o assunto família poliamorosa e suas implicações no âmbito jurídico. Esta é uma pesquisa exploratória realizada a partir de uma revisão bibliográfica sobre o tema, utilizando como fundamentos para a escrita artigos científicos, periódicos, monografias, dissertações e as legislações pertinentes.
PALAVRAS-CHAVE: Poliamor.Triação de bens. Entidades poliamorosas. Pluralismo Familiar.
1 INTRODUÇÃO
O poliamor é prática antiga e tem como essência a liberdade no amor, validando o estabelecimento de vínculos afetivos, sendo estes sexuais ou não, entre mais de duas pessoas, composto por homens ou mulheres. A partir disso, o poliamor e as entidades poliamorosas são temas ainda não muito trabalhados no Brasil, carecendo de respaldo no ordenamento jurídico.
Portanto, o desafio dessa pesquisa é possibilitar a compreensão quanto à união poliamorosa, seu surgimento e como propagou. Fazer análise quanto a importância da família. E responder questionamentos como: Qual a viabilidade de reconhecimento da união poliamorosa como organização familiar? Quais os efeitos considerando aspectos jurídicos?
Logo, a presente pesquisa é de suma importância pois serão discutidos a relevância dos efeitos jurídicos cíveis das uniões poliamorosas, destacando a necessidade de reconhecimento jurídico destas famílias. Assim, o objetivo principal deste texto é identificar a necessidade de respaldo para a relação poliamorosa dentro do ordenamento jurídico, e em paralelo discorrer acerca do contexto histórico da família no Brasil, oferecer conhecimento da perspectiva Constitucional a respeito das famílias e compreender o assunto família poliamorosa e suas implicações no âmbito jurídico.
A pesquisa é exploratória, construída mediante revisões bibliográficas, utilizando-se do acervo já existente a respeito do conteúdo para podermos extrair as melhores e mais importantes informações a respeito do tema. Os resultados serão colhidos de maneira qualitativa. Com esse trabalho realizaremos estudos de modo a esmiuçar o tema poliamor dentro do direito Civil e a relevância do respaldo jurídico para essas famílias. Será utilizado artigos acadêmicos, o Código Civil, livros, jurisprudências e doutrinas.
2. PROGRESSÃO DO CONCEITO DE FAMÍLIA NO DIREITO BRASILEIRO
O primeiro agente socializador do ser humano é a família, consiste no primeiro grupo social a que um indivíduo faz parte: o núcleo social primário. Assim, é a primeira forma de convivência social formada pelo agrupamento de pessoas, constitui a base da sociedade e é um instituto que possui grande relevância na história da humanidade. Desde os primórdios o ser humano sempre buscou se reunir em grupos em prol de interesses em comum e para fortalecer a própria espécie. Em períodos mais antigos e com base no instinto ele já se organizava em tribos em busca da sobrevivência, para buscar alimento, se defender de ataques e também para a reprodução (RIZZARDO, 2019).
Nessa sociedade primitiva os integrantes da tribo se relacionavam sexual e afetivamente entre si. Tanto homens como mulheres viviam no que hoje poderia se entender como poligamia (mais de um parceiro) ou até mesmo o poliamor. Os filhos que nasciam na tribo era filhos comunais, ou seja, de toda a tribo, e não era possível determinar a paternidade das crianças (RIZZARDO, 2019).
Com o passar do tempo e a evolução humana com o desenvolvimento de técnicas de agricultura as tribos começaram a deixar de ser nômades que viviam de caça e coleta de alimentos para começar a plantar e a criar animais. Começaram também a fazer uso de metais, desenvolver fundições e fabricações de ferramentas. Cabia ao homem esses trabalhos manuais e assim ele começou a acumular riquezas iniciando a disputa por terras e bens, assim a sociedade tribal deixou de ser matriarcal e passou a ser patriarcal, centrada na liderança masculina (FLECK, 2019).
Este contexto patriarcal nas sociedades antigas deu fundamento ao conceito de monogamia. Os homens queriam assegurar a transmissão de seus bens e terras somente aqueles filhos que fossem geneticamente legítimos e as mulheres foram proibidas de se relacionar com outros parceiros, se não o marido. Entretanto, aos homens era permitido manter relações com outra mulher, uma poligamia consentida (FLECK, 2019).
Com a chegada da Idade Média o direito canônico, que era o conjunto de leis que regia a Igreja Católica para governo da organização cristã e seus membros prevaleceu em razão de seus méritos e inovações para assegurar a segurança jurídica. A Igreja Católica e a ideia de casamento sagrado se espalharam pelo continente europeu, neste ponto a família era formada apenas pelo casamento e tinha finalidades bíblicas relacionadas ao cumprimento de deveres do homem e da mulher (FLECK, 2019).
No contexto brasileiro a família se consolidou como uma unidade tanto de produção como de consumo. Seu fundamento também estava acima de tudo em um núcleo religioso, mas também político e econômico. Foi a partir do século XIX que o Estado passou a interferir na família e impor algumas regras, restringindo o modelo de família, que só era legitimo com a consumação do casamento (CARDIN; MORAES, 2018).
Isto posto, conceituar família não é uma tarefa fácil visto que se trata de um instituto que sofre frequentemente influências sociais que propiciam mudanças em sua estrutura. Assim, atualmente é possível perceber grandes modificações no Direito de Família e nas composições das famílias, além da tradicional, o que ocasiona sempre a renovação de conceitos que antes eram predeterminados (STIMAMIGLIO; BERTANI, 2016).
Com o decorrer dos anos a sociedade supera a supervalorização do matrimônio tradicional, ou seja, aquele que compreende um homem e uma mulher casados e com filhos. Vários fatores têm influenciado essas mudanças de conceitos, podendo ser mencionado como principais os movimentos feministas com a independência da mulher e a sua inserção no mercado de trabalho, bem como a capacidade de manter uma família sozinha, a promoção da liberdade sexual e a valorização do afeto dentro dos relacionamentos (CONSALTER; KRINERT, 2022).
Ainda, grande propulsora nas mudanças legislativas foi a Constituição Federal de 1988 que trouxe a dignidade humana como princípio constitucional e norteador do ordenamento jurídico pátrio, servindo de base para as leis infraconstitucionais. Logo, a dignidade humana inspirou o Direito de Família a trazer mais foco para o indivíduo e as suas particularidades e desejos, do que em apenas proteger os institutos, a exemplo, o casamento. Nesta perspectiva, nasce a afetividade como um princípio fundamental do Direito de Família. (CONSALTER; KRINERT, 2022).
Assim, a família compreende um espaço de amor e de afeto, não apenas uma fonte para crescimento econômico e reprodução. Desta forma, não existe sentido e foge da realidade moderna tentar trazer um conceito único de família, isto porque atualmente existe uma multiplicidade de relações socio afetivas que unem as pessoas e um modelo único e absoluto para a família é incompatível com o Direito atual. A família é uma construção cultural que se modifica constantemente, pode ser entendida como uma estrutura psíquica em que todos os membros possuem uma função, quais sejam, o pai, a mãe ou os filhos, mesmo que não haja ligação biológica entre eles. Essa estrutura se constitui em um lugar de respeito e principalmente de afeto, e deve ser protegida e resguardada pela legislação vigente (DIAS, 2021).
3. DAS RELAÇÕES POLIAMORISTAS
Ao fazer análise da semântica do termo poliamor, tem-se que poli, possui origem no grego e significa vários ou muitos, e amor, é derivado do latim, a junção dos dois termos forma a expressão poliamor, que busca indicar uma relação consensual e duradoura entre três ou mais pessoas, e foge dos padrões monogâmicos. Se trata de relação simultânea consensual entre mais de duas pessoas, o que é diferente de apenas se envolver com diversos indivíduos diferentes casualmente, isso se trata de relacionamento aberto. O poliamor diz respeito a uma poliafetividade, um envolvimento profundo em que há a convivência e vida de casados (SANTOS, 2020).
Atualmente a discussão para qualificar o poliamor surge da preocupação em solucionar demandas sociais atuais que envolvem relações não-monogâmicas consensuais, principalmente sob o aspecto econômico. “Pelo contrário, sua origem seria resultado do desgaste em se denominar certo relacionamento como decorrente da prática da “não-monogamia”, um termo hifenizado que traria consigo a ideia de negatividade e oposição à monogamia.” (SANTIAGO, 2014, p. 115).
Logo, tem-se que o poliamor compreende relações poliamorosa que acontecem de forma concomitante, e de forma honesta e transparente. Assim, das demandas sociais atuais, também surge a necessidade de utilizar o termo poliamor desvinculado de uma comparação direta com a monogamia. Isso porque amor e monogamia não são sinônimos, mas sim coisas diferentes visto que “amor é um sentimento/emoção, monogamia é uma regra social criada (e imposta) pela sociedade para todos” (CONSALTER; KRINERT, 2022, p. 07).
No mesmo sentido o poliamor não deve ser associado ao concubinato ou ao adultério, justamente pelo fato de que todos os membros que pertencem a essa relação múltipla estão conscientes. Logo, o amor é mútuo e o relacionamento se desenvolve observando as vontades de cada um, mantendo também o respeito, honestidade e a fidelidade entre si (AZEVEDO, C.; AZEVEDO, T., 2018).
A primeira característica e também fundamento do poliamor é o afeto. A afetividade já foi destacada nesta pesquisa diversas vezes em razão da sua importância no Direito de Família, e por ser o motivo de se reconhecer atualmente em no ordenamento brasileiros arranjos familiares diversos como a união estável, a família monoparental, anaparental, homoafetiva, entre outras. Outra característica possível de se constatar nas entidades familiares no geral, e que também se faz presente no poliamor é a estabilidade, ela se mostra através da fidelidade dos membros do relacionamento que se relacionam apenas entre si, e com proposito. Em paralelo, outra característica observada é a convivência pública, as entidades poliamorosas se portam e buscam o seu reconhecimento enquanto família, apesar de todas as pressões sociais e religiosas que ocasionam preconceitos e discriminação (AZEVEDO, C.; AZEVEDO, T., 2018).
Ainda no que se refere as características que podem ser identificadas nos relacionamentos poliamorosos tem-se a não-exclusividade e a autonomia dos indivíduos, pois um dos maiores valores destas relações é a preservação da liberdade e individualidade das pessoas, logo não deve existir ciúme ou relação exclusiva entre os integrantes do poliamor, todos se relacionam em níveis iguais (PILÃO; GOLDENBERG, 2012).
Desta forma, a entidade poliamorosa também deve se basear na transparência e honestidade no que diz respeito ao tratamento entre os parceiros, buscando valorizar a intimidade, o carinho, a igualdade e principalmente a comunicação. Obviamente que essas características aqui mencionadas são as mais comumente percebidas, mas não são exclusivas ou impostas a todos os relacionamentos, tendo em vista a liberdade pregada no poliamor (PILÃO; GOLDENBERG, 2012).
A partir disso, é importante destacar também algumas modalidades de poliamor partindo da premissa de que pode haver um número ilimitado de tipos de poliamor, tendo em vista que essas relações não se limitam teoricamente. Aqui, conforme os estudos de Elizabeth Emens, professora da Columbia Law School e estudiosa de renome sobre o poliamor, serão apresentadas três modalidades: a polifidelidade, o poliamorismo aberto e o poliamorismo com redes de relacionamentos íntimos hierarquizados.
A polifidelidade pode ser também denominada de casamento entre um grupo fechado, ela possui características comuns a um matrimónio entre mais de duas pessoas, de modo que todos se relacionam, estritamente entre eles, de forma amorosa, intima e/ou sexual. Os integrantes destes relacionamentos são homens e mulheres que possuem diversas orientações sexuais, habitam a mesma casa e convivem em harmonia enquanto cônjuges (SANTIAGO, 2014).
Apesar de os relacionamentos poliamorosos em grande maioria das vezes serem exclusivos entre os integrantes, algumas organizações poliamorosas permitem o envolvimento com terceiros alheios a essa relação. Este se trata do poliamorismo aberto em que é possível manter relação intima, amorosa, e/ou sexual com pessoas que não integram a entidade. Esses relacionamentos com pessoas diferentes podem acontecer em vários tipos e intensidades, de forma que isso é permitido dentro desta modalidade de poliamor por ela visar a pluralidade de relacionamentos e não a hierarquia (SANTIAGO, 2014).
Em contrapartida, existe o modelo de poliamorismo com redes de relacionamentos íntimos hierarquizados, em que existem grupos de pessoas com níveis diferentes de compromisso e interligação pessoal compartilhando a crença e o estilo de vida do poloiamorismo. Neste tipo de poliamor existe hierarquia na organização dos relacionamentos existindo relações primárias, secundárias e terciárias para classificar e descrever os diversos níveis de envolvimento entre os indivíduos participantes (SANTIAGO, 2014).
4. RECONHECIMENTO E EFEITOS JURIDICOS DO POLIAMOR: TRIAÇÃO DE BENS
O afeto é um princípio norteador do Direito de Família e essencial para o reconhecimento legal das demais entidades familiares, de igual modo o afeto é o vínculo que une e nutre os integrantes de um relacionamento poliamoroso. Assim como os demais casamentos eles se organizam, mas a sua própria forma, e convivem buscando a plena realização pessoal e a proteção da sua dignidade humana. A união poliamorosa é instituto com peculiaridades próprias, não se confundindo com o concubinato improprio ou outros impedimentos legais que impedem indivíduos de se casar e ter a sua união juridicamente reconhecida. Com suas próprias caraterísticas de convivência e consentimento coletivos, o poliamor possuí suas próprias particularidades e não se associa a outros institutos, de forma que cabe ao Estado tutelar os direitos e garantias dessas pessoas, em razão da dignidade humana e do pluralismo familiar (BARROS, 2018).
O cenário jurídico do Direito de Família atualmente tem se destacado pela necessidade de regulação de modelos diversos de família, aqui se inclui principalmente as entidades poliamorosas, haja vista os direitos das pessoas envolvidas nesta relação. Sendo assim, é urgente e comprovada a necessidade de preservar a dignidade humana dos integrantes e dos filhos no que tange a dissolução dessa união, a morte e por consequência os direitos sucessórios, partilha, alimentos e outros direitos relacionados (BARROS, 2018).
As relações poliamorosas são oriundas da própria legislação que já engloba diversos tipos de família, mas que continuam a ser ignoradas pelo judiciário. Isto tendo em vista o vínculo afetivo e estável formado por essas pessoas, que geram direitos e obrigações como se casados fossem a partir da legislação do Direito de Família, de forma que o Estado não pode ser omisso a garantia de direitos nesses relacionamentos (SILVA, 2017).
Restou entendido que no poliamor se forma uma entidade familiar única, com todos os aspectos do matrimónio e convívio sob o mesmo teto, a diferença está no número de integrantes. Verifica-se assim diversas características e princípios idênticos ás estruturas de famílias amparadas e validadas constitucionalmente, sendo um núcleo estruturado pela liberdade, solidariedade, igualdade e a busca pela felicidade (DIAS, 2021).
Nos demais relacionamentos ocorre a meação, em que metade do patrimônio é pertencente ao cônjuge ou companheiro no momento do desfazimento da união. Entretanto, ao se falar nas entidades poliamorosas com multiplicidade de integrantes a partilha dos bens deverá observar as particularidades da entidade, e a meação poderá se transformar em triação. A utilização do termo triação se deu pela primeira vez em decisão do Des. Rui Portanova em 2015, 8º Câmara Cível do TJ/RS. No processo foi demontrado a ocorrência de dua uniões estáveis ao mesmo tento, bem como a obtenção de patrimônios em conjunto enquanto família que seriam divididos entre as companheiras e o de cujus (ALVES, 2014).
Desde então, a depender do caso concreto alguns tribunais adotam a teoria da triação como uma forma de reinterpretação para garantir os direitos de famílias monogâmicas também as relações poliamorosas. Assim, resguardando a aplicação, a valorização e o resguardo do princípio da afetividade, fundamento do Direito de Família. Este entendimento que defende a triação e é aplicado por alguns tribunais se manifesta no sentido de reconhecer os relacionamentos simultâneos consentidos por uma pessoa. Assim, ao firmar o reconhecimento é possível tutelar os direitos não apenas de um dos(as) conviventes, mas resguardar ambos para não negar, excluir ou omitir direitos provenientes de uma relação poliamorosa (SILVA, 2017).
Sendo assim, a partir da teoria da triação de bens, a repartição do patrimônio ocorreria em três partes (nos casos em que o relacionamento contenha apenas três pessoas) devendo ser adequada ao caso concreto em que haja mais integrantes. Portanto, na triação em três partes, um terço dos bens iria para uma companheira ou companheiro e um terço para o outro cônjuge, o terço restante seria a parte pertencente aos filhos provenientes desta entidade familiar, se houver (AZEVEDO, C.; AZEVEDO, T., 2018).
Conforme esclarece Fleck (2019) a apreciação acerca do poliamor ainda não chegou de forma concreta tanto para o STF como do STJ. Os julgados sobre uniões concomitantes sempre foram no sentido de famílias paralelas que eram mantidas por um indivíduo em sigilo, sem consentimento. Para estes casos as duas Cortes Supremas decidiram no sentido de negar o reconhecimento por não ser possível existir um casamento e uma união estável ao mesmo tempo. Ressalta-se que poliamor nada tema a ver com famílias paralelas, como diversas vezes aqui reiterado.
No mais, ao que se refere ao posicionamento dos tribunais, em alguns processos é possível perceber decisões favoráveis, como o do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1), tendo como Relator Antônio Oswaldo Scarpa, em julgamento de Apelação em 2009, deu provimento a apelante que requereu benefício de pensão por morte. Restou comprovado que o de cujus convivia em união estável com as duas mulheres, de forma que seria inviável deixar em desamparo a companheira após anos de convivência (Apl XXXXX20094013300, TRF1, Relator Antônio Oswaldo Scarpa, DJE- Data: 05/02/2015).
De igual forma, o Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF-5) também reconheceu em 2015 a coexistência de duas uniões estáveis entre um homem e duas mulheres, isso tendo em vista que ele conviviam em um relacionamento público, contínuo e duradouro, de forma concedida a pensão por morte entre as companheiras (Apl XXXXX20104058300, Desembargador Federal Ivan Lira de Carvalho, TRF5, Segunda Turma, DJE- Data: 19/06/2015).
No ano de 2018 o Tribunal de Justiça de São Paulo, em Agravo Regimental, decidiu por fazer a manutenção na pensão fixada em liminar a mulher no curso da demanda. No caso em tela o requerido que admitiu ter convivido por anos com a autora e ter 3 filhas com a mesma, informou viver em “poliamor, inclusive havendo outras mulheres na mesma condição, razão pela qual entendia não haver união estável e não estar presente o dever de prestar alimentos” (AgRg XXXXX3320188260000, Reatora Silvia Maria Facchina Espósito Martinez, TJSP, 10ª Câmara de Direito Privado, 17/09/2019).
Diante de todo o exposto e a partir das alegações do requerido que foram apresentadas em sede de recurso utilizando do poliamor como método de isenção de responsabilidade para com deveres conjugais e com os filhos, é comprovado que a lacuna legislativa precisa ser suprida e as entidades poliamorosas reconhecidas e amparadas enquanto família para a legislação, resguardando assim os direitos de todas as partes envolvidas.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O foco deste estudo foi analisar as entidades poliamorosas, partindo do pressuposto de que atualmente elas não possuem respaldo legal no ordenamento pátrio. Assim, o objetivo foi entender a temática, compreendendo inicialmente aspectos importantes acerca da família e do Direito de Família, para posteriormente entender as origens do poliamor, seu conceito, característica e como identificar essas entidades familiares sem confundi-la com outras situações que podem envolver, por exemplo, a infidelidade.
Portanto, foi possível constatar que apesar de a monogamia ser predominante no mundo, ela não é o estado natural do homem de modo que os relacionamentos monogâmicos surgiram de construções sociais, culturais e principalmente religiosas. Em contrapartida, os relacionamentos poliamorosos sempre existiram, muitas vezes confundidos com adultério ou práticas imorais, mas nada tem a ver com isso.
Ao passo que o Direito deve conseguir acompanhar e evoluir conforme as demandas sociais, a existência de relacionamentos poliamorosos demanda a atenção do Estado. Isso tendo em vista que a constituição destas famílias também são passíveis de formar direitos, e partir da dissolução do relacionamento seja por morte ou por vontade das partes, é imprescindível tutelar e assegurar os direitos de todas as partes envolvidas.
A solução mais viável aqui apresentada é pelo reconhecimento destas famílias a partir do princípio da dignidade humana e do pluralismo familiar adotado pela Constituição Federal de 1988, que permite o reconhecimento de diversas entidades familiares, superando o entendimento de que família só se forma a partir de um matrimónio.
Deste modo, se conclui que não existe envasamento legal para privar que as entidades poliamorosas sejam reconhecidas jurídica e socialmente enquanto uma família, para tutelar os direitos de todos os integrantes e consagrar a proteção a família assegurada constitucionalmente.
ABSTRACT
This study sought to deal with polyamory and polyamorous entities, themes that are still little addressed, and that deserve to be addressed due to the lack of prediction and protection of rights of this family modality. Thus, the objective was to discuss the relevance of the civil legal effects of polyamorous unions, highlighting the need for legal recognition of these families, in view of the dignity of the human person and the family pluralism guaranteed by the 1988 Constitution. discuss the historical context of the family in Brazil, offer knowledge from the perspective of the Constitution with regard to families and understand the polyamorous family subject and its implications in the legal field. This is an exploratory research based on a bibliographic review on the subject, using scientific articles, periodicals, monographs, dissertations and relevant legislation as foundations for writing.
Keywords: Polyamory. Sorting of goods. Polyamorous entities. Family Pluralism
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1 Graduanda. Curso de Direito da Universidade Evangélica de Goiás – UniEVANGÉLICA – E-mail: leticiaborgesferreira@gmail.com.
2 Professora. Curso de Direito da Universidade Evangélica de Goiás – UniEVANGÉLICA – E-mail: marina.teodoro@docente.unievangelica.edu.br.