PINK TAX: RELAÇÃO ENTRE O DIREITO TRIBUTÁRIO E A SEGURANÇA JURÍDICA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202411111448


Thayanara Picanço dos Santos1


RESUMO

A relação entre a Pink Tax, o direito tributário e a segurança jurídica são complexas. A segurança jurídica é fundamental para proteger os direitos dos consumidores e garantir que práticas discriminatórias, como a Pink Tax, sejam efetivamente combatidas. Assim, é imprescindível que as políticas tributárias considerem a equidade de gênero, promovendo uma abordagem que não apenas assegure justiça fiscal, mas também dignidade e direitos às mulheres no acesso a bens essenciais. Dessa forma, o tema convida à reflexão sobre a necessidade de regulamentação específica que elimine a discriminação de preços e reforce a segurança jurídica, assegurando que todas as pessoas, independentemente do gênero, tenham igualdade de condições no mercado de consumo. A análise da Pink Tax serve como um chamado à ação para a promoção de um sistema mais justo e inclusivo, que respeite a diversidade e combata as desigualdades econômicas e sociais.

Palavras-chave: Direito Tributação. Segurança Jurídica. Gênero. Mercado

ABSTRACT

The relationship between Pink Tax, tax law and legal certainty is complex. Legal certainty is essential to protect consumer rights and ensure that discriminatory practices, such as the Pink Tax, are effectively combatted. Therefore, it is essential that tax policies consider gender equity, promoting an approach that not only ensures tax justice, but also dignity and rights for women in accessing essential goods. In this way, the theme invites reflection on the need for specific regulations that eliminate price discrimination and reinforce legal security, ensuring that all people, regardless of gender, have equal conditions in the consumer market. Pink Tax’s analysis serves as a call to action to promote a fairer and more inclusive system that respects diversity and combats economic and social inequalities.

Keywords Taxation Law. Legal Security. Gender. Market

1 INTRODUÇÃO 

A Pink Tax, ou Taxa Rosa, é uma prática do mercado de consumo, em conjunto com empresas de marketing e design, que estabelece preços diferentes para produtos idênticos destinados a homens e mulheres. Esse aumento ocorre pelo simples fato de o produto conter elementos específicos para uso feminino, resultando em uma discrepância de valores. Essa prática pode ter sérios impactos na vida das mulheres, que acabam pagando mais por produtos similares, o que leva a uma maior carga tributária sobre elas. Considerando que dados revelam uma condição social mais vulnerável para mulheres, essa prática agrava a desigualdade entre homens e mulheres na sociedade brasileira.

Essa discriminação de preços levanta questões importantes no direito tributário, especialmente no que tange à isonomia e à justiça fiscal. A relação entre a Pink Tax, o direito tributário e a segurança jurídica é complexa, envolvendo a análise de princípios constitucionais que garantem igualdade de tratamento, proteção ao consumidor e equidade na tributação. Em um contexto em que a equidade de gênero é cada vez mais relevante, é essencial entender como as normas tributárias podem tanto perpetuar quanto mitigar desigualdades de gênero. Além disso, a segurança jurídica é fundamental para assegurar que os direitos dos consumidores sejam respeitados e que práticas discriminatórias, como a Pink Tax, sejam combatidas. Este estudo visa explorar essas interações, destacando a necessidade de uma abordagem que promova não apenas justiça fiscal, mas também dignidade e direitos para as mulheres no consumo de bens essenciais.

2 DIFERENCIAÇÃO DE PREÇOS PARA PRODUTOS E SERVIÇOS DIRIGIDOS A MULHERES

A taxa possui raízes históricas associadas às dinâmicas de gênero no consumo e à evolução das estratégias de marketing e publicidade, especialmente ao longo do século XX. Embora o debate sobre igualdade de gênero tenha ganhado força nos últimos anos, o conceito é resultado de uma interação complexa entre fatores econômicos, culturais e sociais que influenciaram a forma diferenciada como produtos e serviços são direcionados a homens e mulheres.

Mary Del Priore (2004) descreve com precisão a percepção atribuída às mulheres: eram consideradas inferiores e submissas, vistas como não merecedoras nem aptas a ocupar os mesmos espaços públicos que eram destinados e concebidos para os homens.

Com o crescimento das indústrias de moda e beleza, as mulheres passaram a ser alvo de constantes mensagens sugerindo que deveriam gastar mais para se ajustar a padrões de beleza idealizados. Produtos como lâminas de barbear, sabonetes e perfumes começaram a ser adaptados para o público feminino, frequentemente com embalagens mais atraentes, porém sem justificativa funcional para a elevação de preço em relação aos produtos voltados para os homens.

Relatórios de organizações de defesa do consumidor, tanto nos Estados Unidos quanto em outros países, começaram a documentar amplamente essa prática. Um estudo realizado em 1994 pelo California Assembly Office of Research revelou que mulheres na Califórnia pagavam, em média, US$ 1.351 a mais por bens e serviços em comparação aos homens. Esse foi um dos primeiros estudos a chamar a atenção pública para a desigualdade de preços com base no gênero.

Na primeira década dos anos 2000, o termo “taxa rosa” ganhou popularidade nas discussões políticas e sociais sobre igualdade de gênero e justiça no consumo. A prática passou a ser amplamente debatida na mídia e entre legisladores, levando alguns países a buscarem formas de regulamentação para proteger os consumidores, especialmente as mulheres.

Como observado por Del Priore (2004), embora a visão tradicional sobre as mulheres fosse estreitamente vinculada ao trabalho doméstico e ao cuidado familiar — uma percepção que ainda persiste —, diversas circunstâncias impuseram a necessidade de incluir as mulheres no mercado de trabalho. A ausência dos homens para ocupação de postos nas fábricas e as dificuldades financeiras enfrentadas pelas famílias forçaram as mulheres a lutarem por espaço e pelo fim da distinção de gênero.

Um relatório de 2015 do Departamento de Assuntos do Consumidor de Nova York, que analisou 800 produtos, revelou que itens voltados para mulheres custavam, em média, 7% a mais do que seus equivalentes masculinos. Esse estudo aprofundou o debate sobre a injustiça da “taxa rosa” e sua contribuição para a desigualdade econômica de gênero.

Com base em uma análise sociológica do consumo e nos estudos de Abraham Maslow sobre as necessidades humanas para alcançar satisfação pessoal e profissional, Philip Kotler (1998) concluiu que quatro fatores psicológicos são essenciais para entender o comportamento do consumidor: motivação, percepção, aprendizagem, crenças e atitudes. Segundo Kotler e Keller (2006, p.33), “o produto ou oferta terá êxito se proporcionar valor e satisfação ao comprador-alvo. O comprador escolhe entre diferentes ofertas com base naquilo que parece oferecer o maior valor”.

Sob essa perspectiva, as empresas identificaram uma nova forma de aumentar seus lucros, promovendo produtos sob uma falsa noção de inclusão e atração de um público-alvo que, até então, não se via atendido por produtos desenvolvidos especificamente para as mulheres.

2.1. A relação dos princípios constitucionais da igualdade e da seletividade 

Esses princípios são essenciais para assegurar que a tributação seja aplicada de maneira justa e equilibrada, evitando qualquer discriminação de gênero na precificação e tributação de bens e serviços.

Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios:

II – Instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos;

No contexto tributário, o Princípio da Igualdade visa assegurar que contribuintes que estejam em condições semelhantes sejam tratados de maneira equitativa, exceto quando houver uma justificativa razoável para o tratamento diferenciado.

Conforme expressa Reale (1986, p. 60):

Princípios são, pois verdades ou juízos fundamentais, que servem de alicerce ou de garantia de certeza a um conjunto de juízos, ordenados em um sistema de conceitos relativos à dada porção da realidade. Às vezes também se denominam princípios certas proposições, que apesar de não serem evidentes ou resultantes de evidências, são assumidas como fundantes da validez de um sistema particular de conhecimentos, como seus pressupostos necessários

A Pink Tax, no entanto, viola esse princípio, pois impõe às mulheres um custo mais alto por produtos que desempenham as mesmas funções que os destinados aos homens, sem justificativa plausível para essa diferenciação. A prática de tributar produtos femininos de maneira mais onerosa, sem que haja uma diferença econômica real entre eles e os masculinos, constitui uma forma de discriminação. O Princípio da Igualdade Constitucional protege as mulheres de uma carga tributária desproporcional, garantindo que os tributos sejam aplicados de maneira justa e sem distinções arbitrárias entre gêneros.

Por outro ângulo temos o princípio da seletividade estabelece que a tributação deve variar conforme a essencialidade do produto ou serviço, ou seja, produtos essenciais devem ser tributados com alíquotas menores, enquanto bens supérfluos ou de luxo devem ter uma carga tributária maior.

Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:

§ 3º O imposto previsto no inciso IV:

I – Será seletivo, em função da essencialidade do produto;

 No contexto da Pink Tax, muitos produtos femininos são itens de primeira necessidade, como absorventes, lâminas de barbear e produtos de higiene pessoal, que deveriam ser classificados como bens essenciais e, portanto, sujeitos a tributação reduzida. Contudo, esses produtos frequentemente são tributados de maneira equivalente ou superior a bens supérfluos, o que infringe o Princípio da Seletividade.

 A correta aplicação da seletividade garantiria uma tributação mais justa para esses itens, reconhecendo sua importância para a saúde e o bem-estar das mulheres. Ao não respeitar essa diferenciação e ignorar a essencialidade dos produtos femininos, o sistema tributário contribui para aprofundar a desigualdade de gênero.

Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

§ 2º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:

III – poderá ser seletivo, em função da essencialidade das mercadorias e dos serviços;

Previsto entre os princípios tributários, o princípio da seletividade deve ser aplicado de maneira consistente para cumprir suas finalidades e garantir a proteção dos direitos do contribuinte. O legislador tem a faculdade de ajustar a carga tributária, aumentando ou reduzindo as alíquotas, conforme a essencialidade dos bens ou serviços.

Ricardo Lobo Torres, ao abordar o princípio da seletividade, o vincula ao princípio fundamental do direito tributário, o da capacidade contributiva, já discutido anteriormente. 

A seletividade se subordina ao princípio maior da capacidade contributiva e significa que o tributo deve incidir progressivamente na razão inversa da essencialidade dos produtos: quanto menor a essencialidade do produto, tanto maior deverá ser a alíquota e vice-versa 

 Observa-se que esse princípio busca respeitar a capacidade contributiva ao aplicar alíquotas menores a produtos essenciais. Tal medida facilita o acesso da população a itens indispensáveis e impõe tributos mais elevados aos bens supérfluos, promovendo uma distribuição mais justa da carga tributária. 

Melo (2012, p. 358) distingue a seletividade do ICMS e do IPI, afirmando que “constitui princípio constitucional obrigatório no IPI, e opcional no ICMS”. Assim, a diferença entre a seletividade no ICMS e no IPI reside nos critérios de aplicação: enquanto no IPI a seletividade se fundamenta na relevância para a população, no ICMS, o critério é o processo industrial.

Quanto à aplicação da seletividade no ICMS, alguns problemas merecem destaque. O primeiro se refere à redação do artigo 155 da CF/88, que trata o princípio de forma diferente em relação ao IPI. A escolha dos termos “será” e “poderá” pelo legislador impõe comandos distintos. Com essa formulação, a seletividade é frequentemente interpretada como facultativa, embora uma leitura que considere a proteção dos direitos fundamentais possa sugerir que “poderá” dever ser entendido como “deverá”, conforme argumenta Baleeiro (2010).

Nos tribunais, a questão da seletividade também é objeto de discussão. A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça analisou o tema, estabelecendo critérios para sua aplicação prática. O Ministro Herman Benjamin, ao julgar o Recurso em Mandado de Segurança (RMS) 28.277/GO, abordou o Princípio da Seletividade e as circunstâncias de sua violação. Segundo o Ministro, “[…] não é possível verificar uma violação ao Princípio da Seletividade sem uma análise ampla e detalhada das demais incidências e alíquotas previstas na legislação estadual”.

O Ministro Mauro Campbell Marques, ao decidir sobre assunto no RMS 32.425/ES, pontuou:

A verificação da seletividade, conforme a essencialidade do bem, depende de ampla e criteriosa análise das alíquotas do ICMS incidentes sobre as outras espécies de mercadorias, sendo que tal verificação depende, necessariamente, de dilação probatória, o que é incompatível com a via do mandamus.

Em outras palavras, para que se considere uma violação do princípio da seletividade, é indispensável a apresentação de provas que a comprovem. O Supremo Tribunal Federal também possui diversos precedentes que tratam do princípio da seletividade. O Ministro Joaquim Barbosa, ao decidir sobre a seletividade aplicada aos serviços de saúde em um Recurso Extraordinário, esclareceu que a seletividade não equivale à imunidade e que está relacionada a outros princípios tributários.

(…) não há violação do dever fundamental de prestação de serviços de saúde. O princípio da seletividade impõe que o Poder Público gradue a carga tributária conforme a essencialidade da operação ou do produto. Isto não significa haver imunidade, ainda que as operações ou os bens sejam essenciais ao ser humano. Em especial há que ser considerado o princípio da capacidade contributiva, da concorrência e da livre iniciativa, considerado o postulado da solidariedade no custeio das atividades estatais.

Já o Ministro Marco Aurélio Bellize decidiu sobre a seletividade alegando que está se dá pela possibilidade de haver alíquotas diferentes considerando não só os insumos, mas os diferentes produtos. 

Consoante dispõe o inciso I do § 3º do art. 153 da Carta Federal, o IPI é seletivo. Vale dizer sobre a possibilidade de haver alíquotas diferentes considerando não só os diversos insumos como também a variedade de produtos. Eis a essência do caráter seletivo. Ora, uma vez adquirido o insumo mediante incidência do tributo com certa alíquota, o creditamento faz-se ante o que realmente foi recolhido. 

A seletividade também é um dos principais fatores responsáveis pelo caráter extrafiscal do ICMS, pois pode estimular ou desestimular certos comportamentos, sem foco arrecadatório, mas com objetivos sociais e políticos, em conformidade com a Constituição Federal.

Na Constituição brasileira, o princípio da seletividade é aplicado com base na essencialidade do bem ou serviço, como mencionado anteriormente. Assim, cabe ao legislador avaliar a relevância social de cada produto ou serviço ao definir a alíquota tributária apropriada.

Contudo, embora o princípio da seletividade esteja fundamentado na essencialidade, a Constituição de 1988 não estabelece de forma específica o que deve ser considerado essencial, já que essa definição varia conforme o contexto histórico e social. Nesses casos, é responsabilidade do Judiciário controlar a aplicação da seletividade e verificar a essencialidade onde não se aplica essa regra.

A combinação dos Princípios da Igualdade e da Seletividade oferece uma sólida base jurídica para combater a Pink Tax no Brasil: 

Igualdade Tributária: Quando produtos femininos são tratados de forma mais onerosa sem justificativa, há uma violação do princípio da igualdade, que exige que contribuintes em situações semelhantes (homens e mulheres comprando produtos equivalentes) sejam tributados de maneira justa.

Seletividade Justa: Ao tributar desproporcionalmente produtos femininos essenciais, desrespeita-se o princípio da seletividade, que garante que bens essenciais tenham alíquotas mais baixas, promovendo maior equidade fiscal.

Portanto, tanto o Princípio da Igualdade quanto o da Seletividade podem ser ferramentas poderosas para questionar e combater a prática da Pink Tax. Esses princípios são essenciais para garantir que as mulheres não sejam injustamente oneradas por produtos destinados ao seu uso, especialmente quando não há razões econômicas ou fiscais que justifiquem a diferença de preços ou a carga tributária maior.

2.2 Questões de isonomia na aplicação de tributos relacionados ao consumo de produtos femininos

O princípio da isonomia assegura a igualdade de todos perante a lei. Foi por meio desse princípio que as mulheres conquistaram a garantia de seus direitos trabalhistas, que passaram a ser amplamente praticados para combater a desigualdade de gênero e a discriminação. Assim, eventuais práticas trabalhistas diferenciadas entre homens e mulheres só são justificáveis quando têm como objetivo a inclusão, proteção ou ampliação da participação feminina no mercado de trabalho.

No âmbito trabalhista, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) elaborou a Convenção nº 156 sobre “Igualdade de Oportunidades e de Tratamento para Trabalhadores e Trabalhadoras com Responsabilidades Familiares”, que entrou em vigor em agosto de 1981. Conforme o artigo 3º dessa Convenção, cabe ao Estado a responsabilidade de garantir uma igualdade efetiva:

Cada Estado Membro deve tornar a igualdade efetiva de oportunidades e de tratamento de trabalhadores e trabalhadoras objetivo de suas políticas nacionais, com vistas a possibilitar às pessoas com responsabilidades familiares, que estão trabalhando ou queiram trabalhar, exercer o direito de fazê-lo sem estar sujeitas à discriminação.

A Organização Internacional do Trabalho, com o objetivo de orientar ações voltadas para o trabalho digno e a promoção da igualdade no ambiente de trabalho, inspirou a criação da Comissão Tripartite de Igualdade de Oportunidade e de Tratamento no Brasil.

A Comissão Tripartite de Igualdade de Oportunidades e Tratamento de Gênero e Raça no Trabalho foi instituída no âmbito do Ministério do Trabalho e Emprego pelo Decreto de 20 de agosto de 2004, com o objetivo principal de “[…] promover políticas públicas de igualdade de oportunidades e de tratamento, além de combater todas as formas de discriminação de gênero e raça no emprego e na ocupação”. A atuação da Comissão sobre as desigualdades no ambiente de trabalho representa um dos maiores avanços sobre o tema no Brasil.

A isonomia na aplicação de tributos para produtos femininos é, portanto, fundamental para que o sistema tributário promova igualdade real e reconheça as necessidades específicas de cada grupo, contribuindo para uma sociedade mais justa e inclusiva.

3 A FUNÇÃO DO DIREITO TRIBUTÁRIO NA IGUALDADE DE GÊNEROS

A discriminação de gênero tem como pilar estrutural o entendimento da existência de dois sexos; o masculino e o feminino, no entanto, foram somente no início do século XIX que a ideia de que somos divididos em dois sexos, começou a ganhar força cultural. 

Como elucida Jurandir Freire Costa, anteriormente, a medicina e a ciência galênica acreditavam na existência de um só sexo, o masculino, sendo a mulher representante inferior desse sexo, posição justificada pela falta de calor vital suficiente para atingir a perfeição metafísica do macho. 

A diferenciação dos sexos trouxe consigo a diferença de gênero entre homens e mulheres, a qual, segundo autores como Foucault e Laqueur (apud COSTA,1995), teve seu desenvolvimento encorajado para servir de justificativa para os ideais igualitários da revolução democrático-burguesa. Portanto, cria-se o fundamento da desigualdade por natureza, baseada na constituição nervosa e óssea.

O argumento proposto, ainda hoje, é bastante utilizado para justificar a discriminação cometida contra as mulheres, não sendo raro encontrar atividades do cotidiano as quais “não são coisa de mulher”. Ocorre que, atualmente, a desigualdade de gênero esbarra em argumentos mais complexos trazidos pelos fatores sociais, incrementando a justificativa da discriminação.

No debate político-econômico atual, o conceito de gênero encontra sua definição muito mais nas construções sociais de ordem cultural do que nas diferenças biológicas propriamente ditas. Assim, de acordo com Cassia Maria Carloto (2001), a distinção biológica de sexos dividida entre macho e fêmea está relacionada à produção da existência humana, enquanto a distinção de gênero entre o masculino e o feminino está relacionada à produção social da existência. A produção social da existência atribui a cada um dos gêneros diferentes responsabilidades de produção e reprodução social, de maneira desigual, alheia à vontade individual e baseando-se em princípios sexistas, classistas e racistas. ́ Exemplo disso, são os produtos comercializados na cor rosa pressupondo um público-alvo feminino.

3.1. Enquadramento jurídico da Pink Tax

O enquadramento jurídico da “Pink Tax”, ou “taxa rosa”, aborda a prática de cobrar preços mais altos por produtos voltados para o público feminino em comparação a itens semelhantes destinados aos homens. Esse fenômeno tem implicações legais e pode ser analisado sob a ótica de princípios constitucionais e normas de defesa do consumidor que visam a igualdade, a justiça tributária e a proteção contra práticas discriminatórias.

No Brasil, a Constituição Federal de 1988 estabelece o princípio da isonomia em seu artigo 5º, assegurando que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. No contexto da Pink Tax, a diferença de preços entre produtos femininos e masculinos, muitas vezes sem justificativa objetiva relacionada aos custos de produção, representa uma prática que impacta desproporcionalmente as mulheres. Isso ocorre não apenas com cosméticos e roupas, mas também com produtos essenciais, como absorventes menstruais, que são itens de primeira necessidade para a saúde feminina.

O Código de Defesa do Consumidor (CDC) também aborda a questão, defendendo o direito dos consumidores contra práticas abusivas e discriminatórias (art. 6º, IV e VIII):

Art. 6º. São direitos básicos do consumidor:

IV – a proteção contra a publicidade enganosa e abusiva, métodos comerciais coercitivos ou desleais, bem como contra práticas e cláusulas abusivas ou impostas no 17 fornecimento de produtos e serviços;

VIII – a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;

Com base nessa norma, a Pink Tax pode ser vista como uma prática abusiva, uma vez que impõe um ônus financeiro adicional às mulheres, cobrando valores superiores por produtos equivalentes aos masculinos. Esse tipo de diferenciação é considerado discriminatório, pois não é respaldado por uma justificativa objetiva e penaliza o público feminino.

No campo tributário, a aplicação de impostos sobre produtos de higiene feminina também levanta questionamentos de isonomia. Produtos essenciais, como alimentos e medicamentos, recebem frequentemente isenções ou reduções tributárias, enquanto itens de higiene feminina, como absorventes, continuam a ser tributados como bens comuns. A isonomia tributária, prevista no artigo 150 da Constituição, orienta que a carga tributária deve ser proporcional e baseada na capacidade contributiva de cada cidadão. No entanto, a manutenção de impostos elevados sobre produtos de uso exclusivo das mulheres reflete uma desigualdade fiscal, que recai sobre um segmento específico da população.

Em nível internacional, a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW) e as normas da Organização Internacional do Trabalho (OIT) incentivam a promoção de políticas de igualdade de gênero e proteção contra discriminação, princípios que fundamentam o questionamento da Pink Tax. Alguns países já tomaram medidas para proibir ou reduzir essa prática, seja regulamentando a precificação de produtos ou isentando impostos de itens essenciais para as mulheres.

Assim, o enquadramento jurídico da Pink Tax envolve uma combinação de princípios constitucionais de igualdade, defesa do consumidor e isonomia tributária, destacando a necessidade de políticas específicas para combater essa prática discriminatória. A eliminação da Pink Tax é essencial para garantir que o sistema jurídico e tributário seja mais justo e inclusivo, reconhecendo as necessidades específicas das mulheres e promovendo uma sociedade mais igualitária.

3.2. Consequências econômicas para as mulheres

O impacto econômico da taxa rosa sobre as mulheres resulta em uma desvantagem financeira adicional em um contexto de desigualdade de gênero já presente em salários e oportunidades econômicas, enquanto a sociedade como um todo sofre os efeitos colaterais dessa prática injusta.

Elevação do custo de produtos essenciais para mulheres, como produtos de higiene pessoal, roupas e cuidados com a saúde. Isso faz com que as mulheres gastam mais em itens de uso diário do que os homens, mesmo quando a qualidade e funcionalidade dos produtos são equivalentes. O aumento das despesas reduz o poder de compra feminino e afeta o orçamento pessoal.

Uma menor capacidade de poupança e investimento: Ao ter que gastar mais com produtos do dia a dia, as mulheres têm menos recursos disponíveis para poupar, investir ou destinar a oportunidades de desenvolvimento pessoal, como educação ou empreendedorismo. A acumulação de riqueza é prejudicada, limitando o crescimento econômico das mulheres ao longo do tempo.

O impacto da taxa rosa não é apenas imediato, mas se acumula ao longo do tempo. As mulheres acabam pagando mais ao longo de suas vidas por produtos e serviços essenciais, o que pode contribuir para uma maior dificuldade em planejar a aposentadoria, construir patrimônio ou enfrentar emergências financeiras.

Além disso, com a crescente presença das mulheres no mercado de trabalho, o advento do Código Civil de 2002 trouxe uma nova configuração para a figura feminina, independentemente de seu estado civil. Ao serem reconhecidas como pessoas dotadas de capacidade civil, as mulheres conquistaram autonomia sobre seus bens, suas conquistas, suas decisões e suas vontades, não necessitando mais de permissão para agir dessa forma, conforme destaca Venosa (2014, p. 319).

Como ressalta Del Priore (2004), embora a imagem da mulher tenha historicamente estado ligada aos serviços domésticos e ao cuidado da família—uma percepção que ainda persiste nos dias atuais—diversas circunstâncias levaram à necessidade de integrar as mulheres ao mercado de trabalho. Seja pela ausência dos homens em funções nas fábricas ou pelos desafios financeiros enfrentados pelas famílias em busca de sua sobrevivência, as mulheres precisaram lutar por seu espaço e pelo fim da distinção entre os gêneros. Com a entrada das mulheres no mercado de trabalho, emergiu um nicho econômico com grande potencial de exploração. À medida que as mulheres passaram a ter seu próprio dinheiro e maior liberdade para gastá-lo, tornou-se evidente a necessidade de o mercado de consumo se adaptar para atender às demandas e desejos desse novo público.

Muitas mulheres desempenham o papel de principais cuidadoras e gerenciadoras das finanças domésticas. Ao gastar mais com produtos devido à taxa rosa, as famílias chefiadas por mulheres podem ter menos recursos para destinar à educação, saúde e bem-estar dos filhos, perpetuando ciclos de pobreza intergeracional.

A taxa rosa gera uma série de consequências econômicas prejudiciais tanto para as mulheres quanto para a sociedade. Ao aumentar os custos de vida femininos e limitar a capacidade de poupança e investimento, a prática amplia a desigualdade de gênero e impede o pleno potencial econômico das mulheres. 

4 A IMPORTÂNCIA DA SEGURANÇA JURÍDICA 

A segurança jurídica, é dotada de status e regime jurídico de direito fundamental, implica posições jurídicas subjetivas de natureza defensiva ou negativa, que blindam restrições retroativas, a fim de assegurar a integridade, estabilidade, certeza e previsibilidade na aplicação do direito a fatos jurídicos pretéritos e que já produziram efeitos (tanto no mundo jurídico quanto no mundo fático.

Nesse sentido, é exemplar a decisão do STF, da relatoria do ministro Luís Roberto Barroso, reconhecendo as perspectivas objetiva e subjetiva derivadas do regime jurídico-constitucional de proteção da segurança jurídica: 

O princípio da segurança jurídica, em um enfoque objetivo, veda a retroação da lei, tutelando o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada. Em sua perspectiva subjetiva, a segurança jurídica protege a confiança legítima, procurando preservar fatos pretéritos de eventuais modificações na interpretação jurídica, bem como resguardando efeitos jurídicos de atos considerados inválidos por qualquer razão. Em última análise, o princípio da confiança legítima destina-se precipuamente a proteger expectativas legitimamente criadas em indivíduos por atos estatais.

Aliomar Baleeiro (1987, p. 259) define que “a capacidade contributiva do indivíduo significa sua aptidão econômica para suportar, sem prejuízo do essencial à uma vida compatível com a dignidade humana, uma parcela do custo total dos serviços públicos”. Paulo Barros de Carvalho, por sua vez, aborda o parâmetro da capacidade do contribuinte como base para a exigência de tributos, conforme exposto:

A capacidade contributiva do sujeito passivo sempre foi o padrão de referência básico para aferir-se o impacto da carga tributária e o critério comum dos juízos de valor sobre o cabimento e a proporção do expediente impositivo (Carvalho, 2013, p. 331)

A capacidade contributiva protege o contribuinte contra a tributação excessiva, privilégios fiscais e discriminações arbitrárias, fundamentando-se nos ideais de justiça social e na promoção da igualdade por meio da equidade. Assim, conforme disposto no artigo 145, § 1º, da Constituição Federal, os tributos – compreendidos aqui em seu sentido amplo, não se limitando apenas aos impostos – devem ser ajustados de acordo com a capacidade econômica e contributiva de cada contribuinte, de modo a alcançar uma ordem jurídico-tributária justa.

Contudo, esse princípio não possui um fim em si mesmo. Schoueri (2013, p. 332) considera a capacidade contributiva como um parâmetro no direito tributário para avaliar a igualdade estabelecida na Constituição:

O Princípio da Capacidade Contributiva é o corolário, em matéria dos impostos, empréstimos e contribuições sociais, do Princípio da Igualdade. Como este exige um parâmetro, a Capacidade Contributiva vem preencher a exigência do Princípio da Igualdade, conferindo critério para a comparação de contribuintes

Especificamente em relação ao IPI e ao ICMS, esses tributos possuem princípios que lhes conferem características distintas. O IPI se destaca pelos princípios da seletividade, da não cumulatividade, da isenção para produtos industrializados destinados ao exterior e pela redução de seu impacto na aquisição de bens de capital pelo contribuinte, conforme disposto no artigo 153, inciso IV, §3º. Já o ICMS apresenta como princípios específicos a não cumulatividade e a seletividade.

Quando o princípio da seletividade é posto ao lado da capacidade contributiva, presume-se que produtos essenciais são consumidos por uma parte muito grande da população, independentemente de uma análise quanto à classe social, uma vez que são necessários para a subsistência e sobrevivência. Logo, no consumo destes bens, reduz-se a capacidade contributiva. 

Além da alíquota, convênios interestaduais podem fazer com que o princípio seja levado em consideração ao adotar reduções de bases de cálculo, isenções e outros instrumentos permitidos pela Constituição Federal.

Estes convênios interestaduais enquadram-se como políticas públicas. Políticas Públicas são ações e decisões governamentais voltadas ou não para solucionar problemas sociais, traçando metas e planos para alcançar o bem-estar social dentro dos limites do interesse público. 

4.1 Análise dos efeitos econômicos da aplicação da Pink Tax

A aplicação da Pink Tax aumenta o custo de vida das mulheres. Ao pagarem mais por produtos de uso diário — como lâminas de barbear, shampoos e desodorantes — as mulheres enfrentam despesas desproporcionalmente maiores, o que reduz seu poder de compra. Isso é especialmente prejudicial em um contexto em que as mulheres já ganham, em média, menos do que os homens para desempenharem funções semelhantes. Essa disparidade econômica, agravada pelos preços mais elevados de produtos femininos, limita sua capacidade de poupar, investir e alcançar autonomia financeira.

Em abril de 2019, o tema foi amplamente discutido durante o Encontro do Subcomitê de Assuntos Tributários do Comitê Econômico e Social (ECOSOC) da Organização das Nações Unidas (ONU), ocasião em que foram levantados os seguintes questionamentos:

Qual é o papel da tributação na redução da desigualdade, dentro de países com diferentes níveis de desenvolvimento? Como as políticas fiscais podem agravar a desigualdade? Quais são as opções disponíveis aos países para tributar a riqueza e melhorar a igualdade, tanto no lado da tributação quanto no lado das despesas?Quais são os efeitos econômicos gerais de tais políticas? Como determinar o que é a “desejável” distribuição de renda?

Dada a complexidade do tema, é sensato reconhecer que as questões tributárias e financeiras de cada país só podem ser devidamente estudadas quando se consideram as diversas particularidades regionais. Somente por meio do direito comparado é possível analisar com precisão os impactos da desigualdade de gênero nas normas tributárias e nas políticas públicas de cada país, permitindo a proposição de soluções específicas para as distorções identificadas.

De acordo com o Relatório Global sobre a Lacuna de Gênero do Fórum Econômico Mundial, em 2020 o Brasil ocupava a 130ª posição em um ranking de 153 países quanto à igualdade salarial entre homens e mulheres em funções semelhantes. Apesar de o número de mulheres no mercado de trabalho e o nível de escolaridade feminina terem crescido consideravelmente, esses avanços ainda não se refletem de forma justa em salários e remunerações.

Os efeitos da Pink Tax não se limitam às mulheres individualmente, mas têm consequências para toda a sociedade. Em termos econômicos, a prática reduz a capacidade de participação plena das mulheres no mercado de consumo e de trabalho. Com menos recursos disponíveis para investir em si mesmas, as mulheres contribuem menos para o crescimento econômico global. Isso representa um desperdício de potencial econômico, já que as mulheres constituem uma parcela significativa da força de trabalho e do mercado consumidor.

Além disso, a Pink Tax amplia as desigualdades sociais e econômicas. Mulheres de baixa renda são particularmente afetadas, pois os custos adicionais impostos por essa prática consomem uma maior parcela de seus orçamentos. Isso pode gerar uma maior dependência de serviços públicos e programas de assistência social, sobrecarregando os sistemas de bem-estar social e ampliando o ciclo de pobreza e exclusão econômica.

4.2 Comparação com outras formas de tributação 

A Pink Tax, difere de outras formas de tributação porque, apesar do nome, não é um imposto oficial, mas uma prática de mercado em que produtos e serviços voltados para mulheres custam mais do que os equivalentes destinados aos homens. Essa diferenciação de preços gera impactos econômicos que podem ser comparados com os de outras formas de tributação, como impostos diretos e indiretos. Ao examinar a Pink Tax em relação a outras formas de tributação, fica claro que seus efeitos são desiguais e perpetuam a desigualdade de gênero, ao passo que outros tipos de impostos buscam, em tese, arrecadar fundos para o bem comum, com impactos mais amplos e, em alguns casos, regressivos.

Tendo analisado o caráter extrajudicial do princípio da seletividade em consonância com a dignidade humana, o Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ), em 20 de outubro de 2021, resolveu celebrar o Convênio ICMS 187/21, que permite a isenção do ICMS nas operações realizadas com absorventes íntimos femininos destinados a órgãos da Administração Pública. O Convênio assim dispõe:

Os Estados e o Distrito Federal ficam autorizados a isentar do Imposto sobre 51 Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação – ICMS – as operações realizadas com absorventes íntimos femininos, internos e externos, tampões higiênicos, coletores e discos menstruais, calcinhas absorventes e panos absorventes íntimos, NCM 9619.00.00, destinados a órgãos da Administração Pública Direta e Indireta Federal, Estadual e Municipal e a suas fundações públicas. Parágrafo único. As unidades federadas ficam autorizadas a não exigir o estorno do crédito fiscal previsto no art. 21 da Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996, nas operações de que trata este convênio.

Tal medida é um avanço no combate a problemas como a pobreza menstrual e redução da desigualdade de gênero. A única questão ainda presente neste ponto é que, muito embora o convênio permita a isenção do ICMS, não há previsão legal que obrigue os Estados a adotarem adotar tal medida. 

Um aspecto crucial que diferencia a Pink Tax de outras formas de tributação é a falta de transparência. Enquanto impostos diretos e indiretos são regulados pelo governo e conhecidos pela população, a Pink Tax é uma prática de mercado invisível que muitas vezes passa despercebida. Consumidoras frequentemente não percebem que estão pagando mais por produtos simplesmente por serem rotulados como femininos. Esse aspecto cria uma desvantagem oculta para as mulheres, ao contrário dos impostos tradicionais, que têm um propósito explícito e são aplicados de forma uniforme.

Impostos diretos, como o Imposto de Renda, são baseados na renda ou patrimônio das pessoas e, em geral, procuram seguir um princípio de progressividade: quem ganha mais, paga mais. Esse tipo de imposto é desenhado para promover certa justiça social, redistribuindo a renda e financiando programas públicos que beneficiam toda a população. Em contrapartida, a Pink Tax é uma forma de tributação implícita que afeta de maneira desigual as mulheres, independentemente de sua renda. Todas as mulheres, independentemente de classe econômica, estão sujeitas a pagar mais por produtos equivalentes, o que impõe um custo extra não justificado apenas por questões de demanda ou valor real dos produtos.

Impostos indiretos, como o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) ou o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), são aplicados ao consumo e afetam todos os compradores, mas têm uma característica regressiva, pois impactam mais fortemente as pessoas de baixa renda, que gastam uma maior parcela de seu orçamento com bens de consumo. A Pink Tax, por sua vez, tem um efeito semelhante a esse, já que também representa uma forma de tributação regressiva. Mulheres de todas as faixas de renda são afetadas, mas aquelas com rendas mais baixas sofrem de maneira mais pronunciada, pois a diferença de preço absorve uma parcela maior de seus rendimentos.

A Pink Tax impõe um fardo adicional exclusivamente sobre as mulheres. Essa prática de mercado reforça a desigualdade de gênero, pois as mulheres, que já enfrentam disparidades salariais e de oportunidades, ainda precisam lidar com preços mais altos para itens essenciais. Isso cria uma barreira financeira adicional, limitando sua capacidade de poupança e investimento, o que se reflete em uma menor autonomia econômica ao longo da vida.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A uma urgência de abordar as disparidades de gênero na precificação de produtos e serviços “taxa rosa” não apenas por representar uma injustiça econômica, mas também contraria princípios fundamentais de igualdade e isonomia que estão consagrados na Constituição brasileira. Nesse contexto, o direito tributário desempenha um papel crucial, pois as normas que regem a tributação devem ser cuidadosamente avaliadas e reformuladas para evitar discriminações baseadas no gênero.

A segurança jurídica se mostra essencial para a proteção dos direitos dos consumidores, especialmente no que diz respeito à transparência nas práticas de mercado e à certeza das regras aplicáveis. A promoção de uma regulamentação que elimine a discriminação de preços, como a Pink Tax, é fundamental não apenas para garantir a equidade no consumo, mas também para assegurar um ambiente de negócios que respeite e valorize a dignidade de todas as pessoas, independentemente do gênero.

Para enfrentar a Pink Tax, algumas medidas podem ser implementadas com base na aplicação de princípios do direito tributário e na promoção da segurança jurídica. Essas ações incluem: Revisão das Alíquotas Tributárias para Produtos de Necessidade Básica; Regulamentação e Transparência de Preços no Setor de Consumo e Educação e Conscientização de Consumidores e Empresas e Incentivo à Produção.

Portanto, é essencial que legisladores, juristas e a sociedade civil se unam para criar leis que combatam práticas discriminatórias e promovam a justiça fiscal e a igualdade de gênero. O combate à Pink Tax representa um avanço rumo a um sistema mais justo e inclusivo, valorizando a diversidade e a equidade. Essa luta vai além da tributação: é uma defesa da dignidade e dos direitos fundamentais de todas as pessoas.

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1 Graduando do Curso de Direito do Centro Universitário Fametro. E-mail: thayanarapicanco@gmail.com. ORCID: https://orcid.org/0009-0003-7146-5788