PETRÓLEO E GÁS EM MOÇAMBIQUE: DESAFIOS JURÍDICOS PARA UMA  EXPLORAÇÃO SUSTENTÁVEL E TRANSPARENTE 

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/dt10202509232305


Carmen Denise Ustá1


RESUMO 

Este artigo analisa os principais desafios jurídicos relacionados à exploração de petróleo  e gás em Moçambique, com foco na sustentabilidade, transparência e proteção dos direitos das  comunidades locais. A partir de uma abordagem crítica das legislações vigentes e da prática  contratual no setor, propõe-se um conjunto de medidas para fortalecer o marco legal e garantir  uma exploração mais justa e responsável dos recursos naturais. 

Palavras-chave: petróleo, gás natural, Moçambique, direito ambiental, contratos públicos,  comunidades locais. 

ABSTRACT  

This article analyzes the main legal challenges related to oil and gas exploration in  Mozambique, focusing on sustainability, transparency, and the protection of local community  rights. Through a critical approach to existing legislation and contractual practices in the sector,  it proposes a set of measures to strengthen the legal framework and ensure a fair and responsible  exploitation of natural resources.

Keywords: oil; natural gas; Mozambique; environmental law; public contracts; local  communities. 

1. Introdução 

A descoberta de grandes reservas de gás natural na Bacia do Rovuma colocou  Moçambique no centro das atenções globais quanto ao potencial energético da África. No  entanto, a exploração desses recursos levanta questões complexas de ordem jurídica, ambiental  e social. Este artigo busca refletir sobre os principais desafios legais enfrentados pelo país,  especialmente no que diz respeito à proteção das comunidades afetadas, à transparência nos  contratos e à sustentabilidade ambiental. 

A análise parte da legislação nacional vigente, incluindo a Constituição da República, a  Lei do Petróleo (Lei n.º 21/2014), a Lei Ambiental (Lei n.º 20/97) e a Lei de Terras (Lei n.º  19/97), além de instrumentos internacionais ratificados por Moçambique. O objetivo é  identificar lacunas normativas e propor caminhos para uma governança mais eficaz dos recursos  naturais. 

2. Marco Legal da Exploração de Petróleo e Gás 

A exploração de hidrocarbonetos em Moçambique é regulada por um conjunto de leis  que visam garantir a soberania nacional sobre os recursos, promover o desenvolvimento  sustentável e proteger os direitos das populações locais. Os principais instrumentos jurídicos  incluem: 

Constituição da República de Moçambique (2004): Estabelece que os recursos naturais  pertencem ao Estado e devem ser explorados em benefício do povo moçambicano.

– Lei do Petróleo (Lei n.º 21/2014): Regula as atividades de prospeção, pesquisa,  desenvolvimento, produção e comercialização de petróleo e gás natural. 

– Lei Ambiental (Lei n.º 20/97): Define os princípios da gestão ambiental, incluindo o  direito à informação, à participação pública e à avaliação de impacto ambiental. 

– Lei de Terras (Lei n.º 19/97):Reconhece os direitos das comunidades locais sobre as  terras que ocupam, mesmo sem título formal, e estabelece mecanismos de consulta e  compensação. 

Apesar da existência desse arcabouço legal, persistem desafios na sua implementação  prática, especialmente no que diz respeito à fiscalização, à transparência dos contratos e à  efetiva participação das comunidades. 

3. Desafios Jurídicos Identificados 

Apesar do avanço legislativo, a exploração de petróleo e gás em Moçambique enfrenta  diversos entraves jurídicos que comprometem a justiça social, a proteção ambiental e a  transparência institucional. Os principais desafios incluem: 

3.1. Conflitos fundiários e direitos das comunidades locais 

A sobreposição entre áreas de concessão para exploração de hidrocarbonetos e terras  ocupadas por comunidades rurais tem gerado conflitos fundiários recorrentes. Embora a Lei de  Terras reconheça o direito de uso e aproveitamento da terra (DUAT) com base na ocupação  tradicional, muitas vezes esses direitos são ignorados ou mal compensados nos processos de  licenciamento. 

– Falta de consulta pública efetiva e informada  

– Compensações inadequadas ou inexistentes  

– Deslocamentos forçados sem garantias legais claras

3.2. Fragilidade na fiscalização ambiental 

A aplicação da Lei Ambiental enfrenta limitações operacionais e institucionais,  especialmente nas zonas costeiras e rurais onde ocorrem as atividades de exploração. A  Avaliação de Impacto Ambiental (AIA), embora obrigatória, nem sempre é realizada com rigor  técnico ou com participação comunitária significativa. 

– Deficiência de recursos humanos e técnicos nos órgãos fiscalizadores  

– Falta de acesso público aos relatórios de impacto ambiental  

– Ausência de mecanismos eficazes de monitoramento contínuo 

3.3. Opacidade nos contratos de concessão 

Os contratos celebrados entre o Estado e empresas petrolíferas são, em muitos casos,  protegidos por cláusulas de confidencialidade que dificultam o escrutínio público. Isso  compromete a transparência e a responsabilização dos agentes envolvidos. 

– Dificuldade de acesso aos termos contratuais  

– Falta de mecanismos de auditoria independente  

– Riscos de corrupção e captura regulatória 

3.4. Lacunas na legislação sobre partilha de benefícios 

Embora existam normas que preveem a redistribuição de receitas provenientes da  exploração de recursos naturais, a implementação prática dessas medidas é limitada. As comunidades afetadas raramente recebem benefícios tangíveis, como infraestruturas, serviços  públicos ou programas de capacitação. 

– Ausência de fundos comunitários vinculados aos projetos  

– Falta de indicadores claros de redistribuição de renda  

– Desigualdade regional na alocação de investimentos 

4. Propostas de Melhoria Jurídica 

Diante dos desafios identificados, torna-se urgente fortalecer o marco jurídico e  institucional que regula a exploração de petróleo e gás em Moçambique. As propostas a seguir  visam promover maior justiça social, transparência e sustentabilidade ambiental. 

4.1. Fortalecimento da consulta comunitária 

É necessário garantir que as comunidades locais sejam efetivamente consultadas antes  da concessão de licenças para exploração de recursos naturais. Para isso, propõe-se: 

– Tornar obrigatória a realização de audiências públicas com registro documental 

– Criar comitês locais de acompanhamento com representantes comunitários 

– Estabelecer prazos mínimos para consulta e resposta antes da aprovação de projetos 

4.2. Transparência nos contratos e dados públicos 

A opacidade nos contratos de concessão compromete a confiança pública. Recomenda se:

– Publicação obrigatória dos contratos e relatórios financeiros no portal do governo 

– Criação de um observatório independente para monitorar os acordos e receitas 

– Inclusão de cláusulas de responsabilização em caso de descumprimento contratual 

4.3. Reforço da fiscalização ambiental 

Para garantir que os impactos ambientais sejam devidamente controlados, é preciso: 

– Investir na capacitação técnica dos fiscais ambientais  

– Estabelecer parcerias com universidades e ONGs para monitoramento participativo 

– Criar mecanismos de denúncia acessíveis às comunidades afetadas 

4.4. Redistribuição justa dos benefícios 

A exploração de recursos naturais deve gerar benefícios concretos para as populações  locais. Sugere-se: 

– Criação de fundos comunitários vinculados à receita dos projetos  

– Investimento direto em saúde, educação e infraestrutura nas zonas afetadas 

– Estabelecimento de indicadores de impacto social e econômico 

4.5. Formação jurídica especializada 

A complexidade dos contratos e das normas exige profissionais capacitados. Propõe-se:

– Inclusão de módulos sobre direito dos recursos naturais nos cursos de Direito 

– Realização de formações contínuas para magistrados, advogados e técnicos públicos 

– Criação de núcleos de assessoria jurídica comunitária 

5. Conclusão 

A exploração de petróleo e gás em Moçambique representa uma oportunidade  estratégica para o desenvolvimento nacional, mas também impõe desafios jurídicos  significativos que não podem ser ignorados. A análise realizada neste artigo evidencia que,  embora exista um marco legal relativamente robusto, sua aplicação prática ainda enfrenta  obstáculos relacionados à proteção dos direitos das comunidades locais, à fiscalização  ambiental e à transparência contratual. 

As propostas apresentadas visam contribuir para o fortalecimento da governança dos  recursos naturais, promovendo uma exploração mais justa, sustentável e participativa. É  fundamental que o Estado moçambicano, em articulação com a sociedade civil, universidades  e parceiros internacionais, assuma um papel ativo na revisão das políticas públicas e na  capacitação dos agentes jurídicos envolvidos. 

Mais do que uma questão técnica, trata-se de uma escolha política e ética: garantir que  os benefícios da exploração dos recursos naturais cheguem a todos os moçambicanos,  respeitando os direitos humanos, o meio ambiente e a justiça social. 

6. Referências 

– Constituição da República de Moçambique (2004) 

– Lei n.º 21/2014 – Lei do Petróleo  

– Lei n.º 20/97 – Lei do Ambiente  

– Lei n.º 19/97 – Lei de Terras  

– Ministério dos Recursos Minerais e Energia (MIREME). Relatórios anuais.  

– Centro Terra Viva (CTV). Estudos sobre impactos socioambientais em zonas de  exploração.  

– Nguenha, F. (2020). Governança dos recursos naturais em Moçambique: desafios e  perspectivas. Maputo: Escolar Editora.  

– Transparency International Moçambique. (2023). Índice de transparência no setor  extractivo.  

– UNDP. (2022). Natural Resource Governance Framework for Africa.


 1Universidade Católica de Moçambique (UCM) – Docente Universitária;  Advogada
E-mail: carmeneisy@gmail.com
ORCID: https://orcid.org/0009-0006-1799-359X