OS ÓRFÃOS DO FEMINICÍDIO: UMA ANÁLISE DA LEI Nº 14.717/2023

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.11424672


Gabriela De Almeida Silva1
Orientador: Prof. Antônio Carlos de Sousa Gomes Junior2


RESUMO

Este estudo analisa a Lei nº 14.717/2023, que institui a pensão especial aos filhos e dependentes órfãos em decorrência do feminicídio, com foco na proteção e amparo dessas vítimas indiretas da violência de gênero. O objetivo deste estudo é avaliar a interpretação, aplicação e impacto da Lei nº 14.717/2023 na proteção e assistência aos órfãos do feminicídio, identificando desafios, lacunas e áreas de melhoria na legislação, para ao final entender como alcançar as pessoas que precisam. Este estudo é conduzido por meio de uma revisão crítica da literatura, abrangendo fontes legislativas, textos acadêmicos e relatórios governamentais sobre o tema, sua legislação e suas consequências sociais que atinge principalmente as crianças e adolescentes. A análise é realizada por meio de uma abordagem qualitativa, examinando a interpretação e aplicação da Lei nº 14.717/2023 em diferentes contextos e jurisdições. A análise da Lei nº 14.717/2023 revela avanços significativos na proteção dos órfãos de feminicídio, oferecendo suporte financeiro e assistencial às vítimas indiretas desta forma de violência de gênero, desde que atendidas as determinações da legais. No entanto, há desafios a serem enfrentados, como a possibilidade de subnotificação de casos, falta de conscientização e recursos limitados para atender aos diversos casos. Embora a lei represente um passo importante, sua eficácia depende da interpretação adequada e da coordenação entre as instituições responsáveis, é crucial continuar fortalecendo políticas de prevenção e proteção, além de garantir a redução da ocorrência de órfãos não incluídos nestes sistema de proteção e reparo, buscando garantir, a dignidade, bem como uma maior segurança após a perda de suas genitoras para o feminicídio.

Palavras-chave: Feminicídio, Lei nº 14.717/2023, Órfãos, Proteção, Impacto.

ABSTRACT

This study analyzes Law No. 14,717/2023, which establishes a special pension for children and dependents orphaned as a result of feminicide, focusing on the protection and support of these indirect victims of gender-based violence. The objective of this study is to evaluate the interpretation, application and impact of Law No. 14,717/2023 on the protection and assistance to orphans from femicide, identifying challenges, gaps and areas for improvement in the legislation, in order to ultimately understand how to reach people in need. This study is conducted through a critical review of the literature, covering legislative sources, academic texts and government reports on the topic, its legislation and its social consequences that mainly affect children and adolescents. The analysis is carried out through a qualitative approach, examining the interpretation and application of Law nº 14,717/2023 in different contexts and jurisdictions. The analysis of Law No. 14,717/2023 reveals significant advances in the protection of orphans from femicide, offering financial and assistance support to indirect victims of this form of gender-based violence, as long as legal requirements are met. However, there are challenges to be faced, such as the possibility of underreporting of cases, lack of awareness and limited resources to deal with different cases. Although the law represents an important step, its effectiveness depends on adequate interpretation and coordination between responsible institutions, it is crucial to continue strengthening prevention and protection policies, in addition to ensuring the reduction in the occurrence of orphans not included in these protection and repair systems, seeking to guarantee dignity, as well as greater security after the loss of their mothers to femicide.

Keywords: Femicide, Law nº 14,717/2023, Orphans, Protection, Impact.

1. INTRODUÇÃO 

Nos últimos anos, o feminicídio emergiu como uma das formas mais cruéis e persistentes de violência de gênero em todo o mundo. Este fenômeno nefasto não apenas ceifa vidas femininas de maneira violenta e injusta, mas também deixa para trás um rastro de devastação e sofrimento que afeta não apenas as vítimas diretas, mas também suas famílias e comunidades. Em meio a esse contexto desolador, surge a necessidade premente de examinar não apenas a incidência e as causas do feminicídio, mas também as respostas legais e sociais a esse fenômeno.

O tema dos órfãos do feminicídio, em particular, lança luz sobre uma dimensão frequentemente negligenciada dessa forma extrema de violência de gênero. Enquanto a atenção geralmente se concentra nas vítimas diretas, os filhos e filhas deixados para trás enfrentam desafios únicos e traumáticos, muitas vezes lutando para reconstruir suas vidas em meio ao luto e à perda.

A Lei nº 14.717/2023, em conjunto com o Código Penal de 1940, representa um marco legislativo importante na abordagem do feminicídio e suas consequências. No entanto, a eficácia e a adequação dessas medidas legais no amparo e na proteção dos órfãos do feminicídio ainda carecem de uma análise aprofundada e crítica.

Portanto, este artigo se propõe a realizar uma análise minuciosa da Lei nº 14.717/2023, em conjunto com as disposições pertinentes do Código Penal de 1940, com o objetivo de avaliar como essas leis abordam especificamente a situação dos órfãos do feminicídio. Ao examinar a legislação existente sob essa perspectiva, esperamos contribuir para uma compreensão mais completa dos desafios enfrentados por essas crianças e adolescentes e para a identificação de possíveis lacunas ou áreas de melhoria na proteção legal e no apoio a esse grupo vulnerável.

Como será aplicada a Lei nº 14.717/2023, que instituí a pensão especial aos filhos e dependentes crianças ou adolescentes, órfãos em razão do crime de feminicídio tipificado no inciso VI do § 2º do art. 121 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal)?

O objetivo geral da pesquisa é identificar como será aplicada a Lei nº 14.717/2023, que instituí a pensão especial aos filhos e dependentes crianças ou adolescentes, órfãos em razão do crime de feminicídio tipificado no inciso VI do § 2º do art. 121 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal).

Os objetivos específicos buscam compreender a evolução histórica do fenômeno do feminicídio, desde suas origens até os contextos contemporâneos, identificando fatores sociais; culturais e políticos que influenciaram sua ocorrência ao longo do tempo; analisar criticamente as definições e conceitos de feminicídio, tanto do ponto de vista sociológico quanto jurídico, considerando suas nuances e variações em diferentes contextos geográficos e culturais; estudar a legislação relacionada ao feminicídio em diferentes países e regiões, analisando a natureza jurídica das leis existentes, suas origens, objetivos e impactos na prevenção e punição deste crime específico.

O feminicídio é uma das formas mais cruéis de violência de gênero, deixando um rastro de devastação e sofrimento não apenas para as vítimas diretas, mas também para suas famílias e comunidades. Os órfãos do feminicídio enfrentam desafios únicos e traumáticos, e é crucial compreender como a legislação atual aborda sua situação e identificar possíveis lacunas ou áreas de melhoria na proteção legal e no apoio a esse grupo vulnerável.

A Lei nº 14.717/2023 representa um marco legislativo importante ao instituir a pensão especial aos órfãos do feminicídio. No entanto, sua eficácia e adequação na proteção desses órfãos ainda precisam ser avaliadas criticamente. É fundamental que a sociedade e as autoridades reconheçam e abordem adequadamente os impactos do feminicídio sobre os órfãos, garantindo-lhes proteção legal, apoio emocional e oportunidades de reconstruir suas vidas. Esta pesquisa visa promover essa conscientização e contribuir para a construção de um sistema mais justo e inclusivo para todos os afetados pela violência de gênero.

2. HISTÓRIA DO FEMINICÍDIO 

O termo feminicídio foi mencionado pela primeira vez pela ativista feminista Diana Russell durante o Tribunal Internacional de Crimes contra Mulheres, realizado em Bruxelas, Bélgica, em 1976. Ele ressurgiu nos anos 1990 com o objetivo de enfatizar que a morte violenta de mulheres não é um evento acidental. Mais tarde, Diana Russell e Jill Radford escreveram o livro “Femicide: The Politics Of Woman Killing”, publicado em 1992 em Nova York, que se tornou uma das principais referências para os estudiosos do assunto (ACOSTA, 2015).

O movimento feminista, em sua busca por direitos, igualdade de gênero e eliminação da violência contra as mulheres, tem utilizado a ciência do direito penal para alcançar e aplicar esses direitos. O direito penal é considerado na sociedade como um recurso subsidiário em relação a outros ramos do direito, sendo utilizado como último recurso para resolver conflitos que envolvem interesses jurídicos de maior importância (BARROS, 2019).

O feminicídio tem suas raízes em uma longa história de opressão e subjugação das mulheres. Ao longo dos séculos, as mulheres foram consideradas como propriedade dos homens e, em muitas sociedades, a violência contra elas era tolerada e até mesmo justificada (GOMES, 2017).

As condições estruturais dessas mortes também enfatizam que são resultados da desigualdade de poder que caracteriza as relações entre homens e mulheres nas sociedades, contrapondo-se a explicações amplamente aceitas de que se tratam de crimes passionais, motivados por razões de foro íntimo ou numa abordagem patologizante, como resultado de distúrbios psíquicos (Diretrizes Nacionais, 2016).

Em determinadas situações específicas, o crime de feminicídio (mesmo que ainda não fosse chamado assim) poderia ser classificado como homicídio qualificado por motivo torpe (Inciso I do § 2º do Artigo 121º), fútil (Inciso II) ou devido à dificuldade da vítima em se defender (Inciso IV). Entretanto, não havia uma previsão legal para impor uma pena mais severa quando o crime era cometido contra a mulher por razões de gênero (BARROS, 2019).

A violência letal direcionada a mulheres por motivações de gênero, conhecida como “femicídio” ou “feminicídio” em alguns sistemas jurídicos, representa a forma mais extrema de violência contra a mulher. Esta violência não se limita ao ambiente familiar, podendo ocorrer também em espaços públicos, perpetrada por indivíduos particulares ou até mesmo tolerada pelo Estado. Tais atos violam os direitos fundamentais das mulheres, incluindo o direito à vida, à integridade física e sexual, e à liberdade. Portanto, as mulheres enfrentam um sistema de opressão sexista que as submete a diversas formas de violência simplesmente por causa de seu gênero (ONU, 2014).

O feminicídio, sendo uma manifestação de poder, está enraizado em desigualdades e estratificações de gênero, raça, classe e outros marcadores sociais hierarquizantes, requerendo uma análise interseccional para uma compreensão completa da sua dinâmica (NASCIMENTO et al., 2022).

De maneira geral, a Lei nº 13.104/15 introduz o crime de feminicídio no sistema jurídico brasileiro, trazendo importantes alterações para o direito penal ao adicionar elementos qualificadores e aumentos de pena ao crime de homicídio. Esta lei representa mais uma manifestação da expansão do direito penal como um instrumento para lidar com diversos problemas sociais. Ela visa modificar essa realidade ao estabelecer que o feminicídio seja punido como homicídio qualificado, sendo reconhecido no Brasil como um crime hediondo (BRASIL, 2015).

Antes da introdução do feminicídio, casos em que o assassino cometia um homicídio de forma particularmente violenta e direcionada às mulheres, não eram devidamente processados, julgados e punidos. Esses crimes eram tratados de maneira genérica, enquadrados simplesmente como homicídios conforme estipulado no artigo 121 do Código Penal (BRASIL, 1940).

É importante destacar que a Lei nº 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha, não tratava especificamente do crime de feminicídio. Esta lei não foi elaborada com o propósito de listar crimes em seu texto; seu objetivo principal era estabelecer medidas processuais para proteger mulheres vítimas de violência doméstica, sem introduzir novas definições legais de condutas criminosas. Portanto, o conceito de feminicídio não estava contemplado na Lei nº 11.340/2006, apesar de a própria Maria da Penha Maia Fernandes, que deu nome à lei, ter sido vítima de tentativas de feminicídio em duas ocasiões (BRASIL, 2006).

O homicídio de mulheres não é algo novo nem incomum; sempre esteve presente e talvez essa seja a questão central. Afinal, é inegável a vileza em tirar a vida de uma mulher devido à discriminação de gênero (seja por usar roupas curtas, por não realizar tarefas domésticas, por não preparar refeições ou por ter iniciado um novo relacionamento após o divórcio). No entanto, esse entendimento não era uniforme. Por isso, a importância da nova lei, que estabelece que todas essas situações sem dúvida configuram um crime hediondo. Para casos anteriores a 10 de março de 2015, ainda é possível considerar a presença do motivo torpe. No entanto, não é possível aplicar retroativamente a Lei nova (13.104/15) a eventos que ocorreram antes de sua promulgação (CAVALCANTE, 2015).

3. O CONCEITO DE FEMINICÍDIO 

O conceito de feminicídio emergiu nos anos 1970 com o objetivo de identificar e destacar a discriminação, opressão, desigualdade e violência sistemática enfrentada pelas mulheres, que muitas vezes resulta em suas mortes. Esse tipo de assassinato não ocorre de forma isolada ou súbita, mas é parte de um padrão contínuo de violência, enraizado em ideologias misóginas que legitimam o uso de violência extrema contra as mulheres (GOMES, 2015). A Lei 13.104/15, também conhecida como Lei do Feminicídio, foi promulgada após a criação de uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito destinada a investigar a situação da violência contra a mulher no Brasil. (GRECO, 2017).

Segundo Cavalcante (2015) a Lei em questão entrou em vigor em 10 de março de 2015, trazendo alterações ao artigo 121, §2º do Código Penal, ao incluir o feminicídio como uma nova circunstância qualificadora do crime de homicídio. O feminicídio é definido como o homicídio, seja ele tentado ou consumado, cometido contra uma mulher por razões relacionadas à sua condição de gênero. Essa qualificação se estabelece mediante a análise da motivação do crime, ou seja, quando a agressão ocorre baseada no gênero da vítima.

A Lei 13.104/2015 foi promulgada com o intuito de punir o crime de feminicídio e de buscar reduzir o alarmante número de mulheres mortas. Ela estabelece o feminicídio como uma circunstância agravante do crime de homicídio, conforme previsto no artigo 121, § 2º do Código Penal, e o inclui na lista de crimes hediondos, conforme estipulado pela Lei nº 8.072/90.

Homicídio simples Art. 121. 

Homicídio qualificado § 2º 

Feminicídio

VI – contra a mulher por razões da condição de sexo feminino:

§ 2º -A Considera-se que há razões de condição de sexo feminino quando o crime envolve:

I – violência doméstica e familiar;

II – menosprezo ou discriminação à condição de mulher. 

Aumento de pena

§ 7º A pena do feminicídio é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado:

I – durante a gestação ou nos 3 (três) meses posteriores ao parto; II – contra pessoa menor de 14 (catorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos ou com deficiência;

III – na presença de descendente ou de ascendente da vítima (BRASIL, 2015).

Segundo Almeida et.al, (2020) o feminicídio é entendido como a forma mais extrema de violência ou o desfecho final de um ciclo de violência contra a mulher, que reflete a cultura da dominação masculina e as desigualdades de poder entre homens e mulheres.

O professor Barros (2019) define feminicídio como:

O feminicídio pode ser definido como uma qualificadora do crime de homicídio motivada pelo ódio contra as mulheres ou crença na inferioridade da mulher, caracterizado por circunstâncias específicas nas quais o pertencimento da mulher ao sexo feminino é central na prática do delito. Entre essas circunstâncias estão incluídos: os assassinatos em contexto de violência doméstica/familiar e o menosprezo ou discriminação à condição de mulher. Os crimes que caracterizam a qualificadora do feminicídio reportam, no campo simbólico, à destruição da identidade da vítima e de sua condição de mulher. Como anota o mapa da violência contra a mulher, este conceito traz luz a um cenário preocupante: o do feminicídio cometido por parceiro íntimo, em contexto de violência doméstica e familiar, além de se caracterizar como crime de gênero ao carregar traços como ódio, que leva a destruição da vítima, e pode ser combinado com as práticas da violência sexual, tortura e/ou mutilação da vítima antes ou depois do assassinato (BARROS, 2019, p. 20)

O feminicídio se manifesta quando mulheres são mortas simplesmente por serem mulheres, refletindo a persistente desigualdade de gênero em nossa sociedade. Isso ocorre quando o crime é perpetrado em contexto de violência doméstica e familiar, ou quando demonstra menosprezo ou discriminação em relação à condição feminina (GRECO, 2017).

A introdução do crime de feminicídio trouxe à luz crimes que já ocorriam com frequência na sociedade, mas que estavam encobertos pelo viés patriarcal enraizado ao longo da história. Ao estabelecer normas para o assassinato de mulheres e considerar suas características, isso reflete o reconhecimento político e jurídico de uma forma específica de violência, que também é uma violação dos direitos humanos das mulheres (ALMEIDA, 2020).

A tipificação não funciona como medida preventiva por si só. Seu propósito é rotular uma conduta existente que não era reconhecida por esse nome, ou seja, distinguir um tipo específico de homicídio cometido contra mulheres, com forte motivação de gênero, da conceituação genérica de homicídio. O objetivo é tirar esse crime da obscuridade (CAVALCANTE, 2015).

4. A NATUREZA JURÍDICA DA LEI 

De acordo com o Instituto Patrícia Galvão, a tipificação penal do feminicídio é esperada para ter três impactos significativos. 

Em primeiro lugar, espera-se que traga uma visibilidade maior, permitindo uma compreensão mais detalhada da extensão e do contexto da violência mais extrema contra as mulheres. Espera-se que ajude a identificar obstáculos na aplicação da Lei Maria da Penha, evitando assim casos de “mortes anunciadas”. Por fim, pretende-se que funcione como uma ferramenta para combater a impunidade, desafiando narrativas comuns – não apenas no âmbito jurídico, mas em toda a sociedade, incluindo a mídia – que culpam a vítima pelo crime (INSTITUTO PATRICIA GALVÃO, 2024). 

Ao aumentar a pena mínima e estender a pena máxima para até trinta anos,  a Lei do Feminicídio atua como uma medida legal mais eficaz para deter o assassinato de mulheres, aumentar a visibilidade e o conhecimento dos casos, e buscar meios de combatê-lo e preveni-lo.

Quando uma criança perde um dos pais de forma violenta, o processo de luto se torna ainda mais difícil. Isso pode ser especialmente complicado se a criança estiver presente durante o crime. Crianças que testemunham homicídios muitas vezes experimentam uma variedade de emoções intensas, como medo, raiva e ansiedade. Podem também manifestar comportamentos como enurese noturna, agressividade, desconexão da realidade e problemas de apego. Esses sintomas estão frequentemente associados ao Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT). (MENEZES; BORSA,2020).

Os filhos órfãos de feminicídio muitas vezes são esquecidos, suas histórias raramente são expostas na mídia ou discutidas abertamente na sociedade. Essas crianças enfrentam uma perda devastadora e violenta de suas mães, o que tem um profundo impacto em sua saúde emocional e mental. Elas precisam lidar com questões como luto, abandono, negligência e violência, tudo isso enquanto tentam encontrar estabilidade e sentido em suas vidas alteradas (BIANCHINI, 2018).

A falta da mãe tem um impacto significativo no crescimento dessas crianças. As mães desempenham um papel crucial ao fornecer amor, cuidado e apoio emocional, e a ausência delas pode deixar os órfãos se sentindo desamparados e carentes de afeto. Além disso, a exposição a um ambiente de violência doméstica pode causar traumas sérios e persistentes, afetando a saúde mental e emocional dessas crianças ao longo de suas vidas (BERMAN, 2016).

A falta de dados e pesquisas precisas para determinar a quantidade de órfãos de feminicídio no Brasil é uma preocupação significativa. Até o momento, não há estatísticas oficiais disponíveis sobre esse assunto específico. No entanto, um estudo realizado com o intuito de investigar a violência contra mulheres no país indicou que aproximadamente 2.300 indivíduos se tornaram órfãos de vítimas de feminicídio no Brasil durante o ano de 2021 (ÁVILA, et al., 2022).

Segundo Berman (2016) a falta de apoio do Estado contribui para uma sensação de impunidade em casos de feminicídio, afetando tanto as crianças órfãs quanto seus familiares, que são diretamente impactados por essas tragédias. As famílias, desamparadas pela perda de um ente querido, muitas vezes enfrentam dificuldades emocionais e têm pouco conhecimento sobre como apoiar adequadamente as crianças que ficaram órfãs.

Como resultado, essas crianças podem desenvolver diversos problemas psicológicos ao longo de suas vidas devido à falta de afeto materno, apoio durante seu crescimento e, muitas vezes, dificuldades financeiras. Especialmente considerando que muitas dessas vítimas vêm de famílias de baixa renda, existe o risco de que essas crianças acabem repetindo o ciclo de violência, alimentando um ciclo vicioso perigoso (BIANCHINI, 2018).

A falta de apoio do Estado contribui para uma sensação de impunidade em casos de feminicídio, afetando tanto as crianças órfãs quanto seus familiares, que são diretamente impactados por essas tragédias. As famílias, desamparadas pela perda de um ente querido, muitas vezes enfrentam dificuldades emocionais e têm pouco conhecimento sobre como apoiar adequadamente as crianças que ficaram órfãs (ÁVILA, et al., 2022).

Como resultado, essas crianças podem desenvolver diversos problemas psicológicos ao longo de suas vidas devido à falta de afeto materno, apoio durante seu crescimento e, muitas vezes, dificuldades financeiras. Especialmente considerando que muitas dessas vítimas vêm de famílias de baixa renda, existe o risco de que essas crianças acabem repetindo o ciclo de violência, alimentando um ciclo vicioso perigoso (MENEZES; BORSA,2020).

5. A INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO DA LEI Nº 14.717/2023 

 Em busca de soluções para os desafios enfrentados pelos órfãos de feminicídio, foi aprovada a Lei 14.717/2023, com o objetivo de assegurar apoio financeiro e proteção para crianças e adolescentes que enfrentam a trágica realidade do feminicídio, assim como suas famílias. Esta legislação estabelece a concessão de uma pensão especial, equivalente a um salário mínimo, destinada a todos os filhos ou dependentes menores de 18 anos no momento do falecimento da mãe devido a este crime cruel. Um critério importante estabelecido por esta lei para a elegibilidade desses filhos e dependentes é a renda familiar mensal per capita, que deve ser igual ou inferior a ¼ do salário mínimo (BRASIL, 2022).

É importante ressaltar as medidas tomadas para amparar os órfãos de feminicídio. Em São Paulo, a Lei nº 17.851/2022 autorizou a implementação do Auxílio Ampara, destinado a crianças e adolescentes afetados por essa situação específica. Em nível federal, o presidente Lula sancionou a Lei nº 14.717/2023, que estabelece a concessão de uma pensão especial para filhos e dependentes menores de 18 anos de idade, que são descendentes de mulheres vítimas de feminicídio (BRASIL, 2023).

A Lei nº 14.717/2023, que institui a pensão especial aos filhos e dependentes crianças ou adolescentes órfãos em razão do crime de feminicídio, representa um marco importante na legislação brasileira para proteger e amparar as vítimas indiretas dessa forma de violência de gênero. A interpretação e aplicação dessa lei têm sido fundamental para garantir o suporte aos órfãos do feminicídio e para promover a justiça social e a reparação diante de uma tragédia familiar (ÁVILA, et al, 2022).

A lei estabelece o direito à pensão especial aos filhos e dependentes menores de idade que tenham perdido suas mães devido ao feminicídio, uma forma de homicídio qualificado motivado pela condição de gênero da vítima. Essa pensão especial visa fornecer suporte financeiro e assistencial para ajudar no sustento e no desenvolvimento das crianças e adolescentes que perderam suas mães para a violência de gênero. 

A interpretação da Lei nº 14.717/2023 requer uma análise cuidadosa e sensível das circunstâncias individuais de cada caso, garantindo que os órfãos do feminicídio sejam devidamente identificados e beneficiados por essa medida. Isso envolve a determinação dos critérios de elegibilidade, o processo de solicitação e concessão da pensão especial, bem como a definição dos valores e condições de pagamento (SOUZA; BARBOSA, 2024).

Além disso, a aplicação eficaz da lei requer uma coordenação adequada entre as instituições responsáveis, incluindo o sistema judiciário, os órgãos de assistência social e as instituições financeiras. É essencial que haja uma comunicação clara e eficiente para garantir que os órfãos do feminicídio tenham acesso rápido e sem complicações ao suporte previsto pela lei. 

A interpretação e aplicação da Lei também têm implicações na proteção dos direitos das mulheres. Ao reconhecer e abordar as consequências devastadoras do feminicídio para os órfãos, a lei envia uma mensagem clara de que a violência de gênero não será tolerada e de que as vítimas e suas famílias receberão apoio e justiça (JUNG; CAMPOS, 2019).

Segundo Souza; Barbosa, (2024), no entanto, é importante reconhecer que a eficácia da Lei nº 14.717/2023 pode ser afetada por desafios como a subnotificação de casos de feminicídio, a falta de conscientização sobre os direitos das vítimas e a disponibilidade limitada de recursos para implementar as disposições da lei. Portanto, a interpretação e aplicação dessa lei devem ser acompanhadas por esforços contínuos para fortalecer as políticas de prevenção e proteção contra o crime, bem como para promover uma cultura de igualdade de gênero e respeito pelos direitos humanos.

Essa nova legislação visa proteger contra abusos e fraudes no sistema, mesmo em casos em que apenas há indícios de feminicídio. O benefício pode ser concedido de forma temporária mediante requerimento, com a condição de que o autor, coautor ou partícipe do crime não represente as crianças e adolescentes que recebem ou administram a pensão. Esta medida é essencial para garantir que as vítimas e seus dependentes tenham acesso ao apoio financeiro, mesmo enquanto as investigações do crime ainda estão em curso (BRASIL, 2023).

Além disso, as restrições e exclusões estabelecem que o benefício não pode ser acumulado com outros benefícios previdenciários do regime geral de previdência social ou regimes próprios de previdência social, nem com pensões ou benefícios do sistema de proteção social dos militares. A Lei 14.717/2023 é composta por apenas quatro artigos, os quais estão descritos a seguir:

Art. 1º É instituída pensão especial aos filhos e dependentes menores de 18 (dezoito) anos de idade, órfãos em razão do crime de feminicídio tipificado no inciso VI do § 2º do art. 121 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), cuja renda familiar mensal per capita seja igual ou inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.

Art. 2º O benefício de que trata o art. 1º desta Lei será concedido às crianças e aos adolescentes elegíveis à prestação mensal na data de publicação desta Lei, inclusive nos casos de feminicídios ocorridos anteriormente, sem efeitos retroativos.

Art. 3º As despesas decorrentes do disposto nesta Lei serão classificadas na função orçamentária Assistência Social e estarão sujeitas a previsão nas respectivas leis orçamentárias anuais.

Art. 4º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação (BRASIL, 2023).

Com base no texto da lei mencionada, é evidente o avanço na proteção das vítimas de feminicídio e seus dependentes, pois visa fornecer o suporte financeiro necessário para crianças e adolescentes que perderam suas mães devido a crimes relacionados ao feminicídio, permitindo que continuem suas vidas da melhor forma possível. No entanto, a lei foi estabelecida com critérios rigorosos para garantir que o benefício seja direcionado às famílias que realmente necessitam, protegendo contra possíveis fraudes ou abusos (ÁVILA, 2022).

Apesar da nova legislação demonstrar um certo compromisso do Estado no combate à violência de gênero e na proteção das vítimas mais vulneráveis, ela não garante que o valor da pensão especial, equivalente a um salário-mínimo, seja suficiente para cobrir as necessidades adicionais das crianças, como medicamentos e acompanhamento psicológico profissional. 

Observa-se que, apesar dos esforços do Brasil em melhorar essas questões, a legislação ainda deixa lacunas significativas. É evidente que em muitas cidades do interior não há profissionais qualificados em saúde mental que ofereçam serviços gratuitos, e quando disponíveis, geralmente são limitados a uma consulta por mês. Portanto, aqueles que não têm condições financeiras para pagar pelo acompanhamento necessário são deixados à mercê de um sistema de saúde pública deficiente e burocrático no país (JUNG; CAMPOS, 2019).

A Lei nº 14.717/2023 representa um avanço significativo na proteção dos órfãos de feminicídio, ao estabelecer uma pensão especial para garantir-lhes suporte financeiro após a perda de suas genitoras. No entanto, ainda há desafios a serem enfrentados, pois o valor dessa pensão pode não ser suficiente para suprir todas as necessidades das crianças, especialmente em questões de saúde mental e acesso a serviços profissionais. 

Portanto, é crucial que o Estado continue a revisar e fortalecer políticas e programas para enfrentar efetivamente os impactos do feminicídio na vida desses órfãos e suas famílias, assegurando que nenhum deles seja deixado para trás ou negligenciado em seu direito a uma vida digna e segura.

6. RESULTADOS E DISCUSSÕES 

A implementação da Lei nº 13.104/15 no Brasil é um marco na luta contra a violência de gênero, reconhecendo o feminicídio como homicídio qualificado e crime hediondo, algo que a legislação anterior não contemplava explicitamente. Antes dessa lei, crimes motivados por questões de gênero eram tratados de maneira genérica como homicídios, sem uma pena específica agravada.

A análise do conceito de feminicídio e a evolução de sua tipificação no direito penal brasileiro revela uma abordagem multidimensional que abarca elementos históricos, sociais e jurídicos. Os dados apresentados demonstram uma evolução significativa na percepção e no tratamento legal da violência contra a mulher, especialmente no contexto do homicídio motivado por gênero.

A análise do corpus textual revela a necessidade de reconhecer o feminicídio como uma categoria distinta de homicídio, para refletir a gravidade e especificidade da violência de gênero. A inclusão do feminicídio no sistema jurídico brasileiro, conforme a Lei nº 13.104/15, representa um avanço significativo, pois introduz elementos qualificadores que aumentam a pena para homicídios cometidos contra mulheres por razões de gênero.

Segundo Barros (2019), o direito penal, sendo um recurso subsidiário, é mobilizado para tratar de conflitos envolvendo interesses jurídicos de maior importância. A aplicação da Lei nº 13.104/15 evidencia essa mobilização, pois visa tratar de um problema social grave e persistente: a violência letal contra mulheres. Esta lei, ao classificar o feminicídio como crime hediondo, busca modificar a realidade de impunidade e negligência que historicamente caracterizou a resposta a esses crimes.

Gomes (2017) enfatiza que o feminicídio tem raízes profundas na opressão e subjugação histórica das mulheres. Esta visão é corroborada pelas Diretrizes Nacionais (2016), que ressaltam que essas mortes são resultado da desigualdade de poder nas relações de gênero, contrapondo-se a explicações simplistas que classificam esses crimes como passionais ou decorrentes de distúrbios psíquicos.

Além disso, a abordagem interseccional mencionada por Nascimento et al. (2022) é crucial para entender completamente a dinâmica do feminicídio. Essa perspectiva considera as interações entre gênero, raça, classe e outros marcadores sociais, reconhecendo que a violência contra as mulheres é multifacetada e enraizada em diversas formas de desigualdade.

A Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) é um marco na proteção das mulheres contra a violência doméstica, mas não aborda especificamente o feminicídio. Conforme Brasil (2006), essa lei foca em medidas processuais e protetivas, sem introduzir novas definições legais para crimes específicos, como o feminicídio.

A Lei nº 13.104/15 foi um marco jurídico, introduzindo o feminicídio como uma qualificadora do homicídio e reconhecendo-o como crime hediondo (BRASIL, 2015). 

Isso trouxe alterações significativas ao direito penal brasileiro, ampliando as penas e fornecendo uma ferramenta legal mais eficaz para combater e prevenir o feminicídio. A introdução da Lei nº 13.104/15 é um avanço significativo, pois reconhece legalmente o feminicídio e estabelece penalidades mais severas, criando um marco jurídico essencial para combater a impunidade e a negligência histórica em relação a esses crimes.

Estudos como os de Ávila et al. (2022) e Berman (2016) mostram que as crianças que testemunham ou são vítimas indiretas de feminicídio enfrentam um luto complicado, desenvolvendo problemas psicológicos graves como Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT), além de dificuldades emocionais e financeiras.

A Lei nº 14.717/2023 surge como uma resposta à necessidade de amparo aos órfãos de feminicídio no Brasil, estabelecendo uma pensão especial para filhos e dependentes menores de 18 anos de mulheres vítimas de feminicídio. 

Essa legislação visa proporcionar suporte financeiro e proteção às crianças e adolescentes afetados por essa tragédia, refletindo um avanço significativo na proteção social e na promoção da justiça para as vítimas indiretas da violência de gênero. Os principais pontos da lei incluem critérios de elegibilidade, como a pensão especial destinada a filhos e dependentes menores de 18 anos cuja renda familiar mensal per capita seja igual ou inferior a ¼ do salário mínimo. A elegibilidade é determinada com base na condição de renda e na comprovação de que a mãe foi vítima de feminicídio.

A pensão especial, equivalente a um salário mínimo, não pode ser acumulada com outros benefícios previdenciários ou assistenciais. O benefício pode ser concedido de forma temporária até a conclusão das investigações do feminicídio, assegurando que os dependentes não sejam representados por autores ou cúmplices do crime. A aplicação eficaz da lei requer uma coordenação entre o sistema judiciário, órgãos de assistência social e instituições financeiras para garantir acesso rápido e eficiente ao benefício.

A análise dos dados do estudo revela que a Lei nº 14.717/2023 representa um avanço significativo na proteção dos direitos dos órfãos de feminicídio, oferecendo um suporte financeiro crucial para os afetados. No entanto, a eficácia da lei depende de uma interpretação cuidadosa e uma aplicação rigorosa, considerando as circunstâncias individuais de cada caso. Por exemplo, uma criança de 12 anos que perdeu a mãe devido ao feminicídio, com uma renda familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo, pode solicitar a pensão especial. Este apoio financeiro ajuda a garantir que a criança possa continuar sua educação e ter acesso às necessidades básicas, mesmo em meio à perda traumática.

A lei envia uma mensagem clara de que a violência de gênero não será tolerada, proporcionando um amparo necessário para as vítimas indiretas. Esse suporte financeiro é vital para ajudar as crianças a superar as dificuldades econômicas e emocionais resultantes do feminicídio. No entanto, a eficácia da lei pode ser comprometida pela subnotificação de casos de feminicídio e pela falta de conscientização sobre os direitos das vítimas. Além disso, a disponibilidade limitada de recursos pode dificultar a implementação das disposições da lei, especialmente em áreas mais remotas e menos favorecidas economicamente.

Segundo Souza e Barbosa (2024), a aplicação eficaz da Lei nº 14.717/2023 depende de uma coordenação adequada entre as instituições envolvidas e uma comunicação clara para garantir que os órfãos tenham acesso ao suporte previsto pela lei. Ávila et al. (2022) apontam que, embora a legislação represente um avanço, o valor da pensão pode não ser suficiente para cobrir todas as necessidades das crianças, como medicamentos e acompanhamento psicológico. Jung e Campos (2019) ressaltam que, apesar dos avanços, a legislação ainda deixa lacunas significativas, especialmente em termos de acesso a serviços de saúde mental gratuitos e de qualidade.

7. METODOLOGIA DA PESQUISA

Para a metodologia deste trabalho, adotamos uma abordagem de pesquisa bibliográfica. Inicialmente, realizamos um levantamento extensivo de fontes acadêmicas e legislativas relevantes, utilizando palavras-chave específicas, como “feminicídio”, “Lei nº 14.717/2023” e “Código Penal de 1940”. Utilizamos bases de dados online, como PubMed e Scopus, além de bibliotecas digitais de universidades, para acessar essas fontes.

Nossa seleção seguiu critérios rigorosos de inclusão e exclusão. Incluímos estudos acadêmicos publicados em periódicos revisados por pares, legislação oficial, documentos governamentais e publicações relevantes dos últimos dez anos para garantir atualidade. Excluímos trabalhos não relacionados ao tema, fontes não confiáveis, publicações desatualizadas e materiais não disponíveis em formato digital.

Com as fontes selecionadas, realizamos uma análise crítica para examinar como as leis abordam a proteção dos órfãos do feminicídio, fazendo a extrapolação e o exercício laboratorial de experimentação hipotética, avaliando padrões, lacunas relevantes, bem como, sintetizando a partir destas premissas, os resultados para fundamentar nossas conclusões e recomendações. Essa abordagem permitiu uma resposta precisa e abrangente aos objetivos da pesquisa, contribuindo para o entendimento e aprimoramento da proteção legal aos órfãos do feminicídio.

8. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nos últimos anos, o Brasil tem registrado avanços significativos nas iniciativas de combate à violência contra as mulheres. Entretanto, tanto a legislação quanto as políticas públicas implementadas pelo Estado ainda carecem de eficácia para conter os preocupantes índices de violência de gênero, especialmente no que diz respeito aos assassinatos motivados pela condição de ser mulher. 

Diante do conteúdo abordado, é possível concluir que o feminicídio é uma forma brutal de violência de gênero que ceifa não apenas vidas femininas, mas também deixa um rastro de devastação para suas famílias e comunidades. A Lei nº 14.717/2023 representa um avanço significativo ao instituir a pensão especial aos filhos e dependentes órfãos em decorrência destes crimes, reconhecendo a necessidade de proteger e amparar as vítimas indiretas dessa violência.

A interpretação e aplicação dessa lei são fundamentais para garantir que os órfãos do feminicídio recebam o suporte necessário para reconstruir suas vidas após uma tragédia familiar. No entanto, para que essa lei seja eficaz, é crucial que haja uma coordenação eficiente entre as instituições responsáveis e um esforço contínuo para fortalecer as políticas de prevenção e proteção contra os crimes de homicídios contra as mulheres.

Os impactos psicossociais devastadores enfrentados pelos filhos órfãos de feminicídio demandam medidas legislativas e políticas públicas que assegurem suporte financeiro, redução de danos e acesso a serviços de assistência e proteção em uma rede interdisciplinar. Isso implica na coordenação entre áreas como saúde, educação, trabalho, justiça, segurança e cuidados psicossociais, com foco na reconstrução da vida desses indivíduos. É crucial investir em estudos epidemiológicos e de longo prazo, ao mesmo tempo em que se capacita gestores e profissionais, adotando uma abordagem interseccional, holística e baseada nos direitos humanos.  

Além disso, é importante reconhecer que este crime não é apenas um problema legal, mas também social e cultural, enraizado em desigualdades de gênero e ideologias misóginas. Portanto, a luta contra o feminicídio requer uma abordagem abrangente que inclua educação, conscientização e promoção da igualdade de gênero em todos os níveis da sociedade.

Em última análise, a Lei nº 14.717/2023 representa um passo importante na direção certa, mas é apenas um aspecto de um esforço mais amplo para erradicar o feminicídio e garantir um futuro mais seguro e justo para todas as mulheres e suas famílias. É essencial reconhecer que essa legislação representa apenas uma parte de um esforço abrangente e contínuo para eliminar a violência de gênero e construir um futuro mais seguro e equitativo para todas as mulheres e suas famílias.

Para alcançar esse objetivo, são necessárias não apenas leis eficazes, mas também políticas públicas abrangentes, investimentos em educação e conscientização, além de uma mudança cultural que promova o respeito, a igualdade e a não violência. A luta contra o feminicídio é uma responsabilidade coletiva que requer o engajamento de toda a sociedade, instituições governamentais e organizações da sociedade civil. Somente assim poderemos construir um mundo onde todas as mulheres possam viver livres do medo e da violência.

9. REFERÊNCIAS

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1Formanda do Curso de Direito da Faculdade Carajás

2Professor de Direito Administrativo, Constitucional e Tributário da Faculdade dos Carajás, Graduado em Direito, Especialista em Licitações e Contratos e Direito Constitucional, diretor da OAB/PA – Subseção Marabá, autor e orientador de textos acadêmicos