COPYRIGHT IN BRAZIL FOR ARTWORKS CREATED BY ARTIFICIAL INTELLIGENCE
REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10050281
Dario Ferreira Silva1
Leonardo Antunes Ferreira da Silva2
RESUMO
Este trabalho explora os desafios legais e éticos relacionados à criação de obras de arte por meio das inteligências artificiais no contexto da legislação brasileira, compreendendo como ela pode enfrentar essa complexa questão através da interpretação de sua legislação vigente, e até mesmo indo ao tocante da possibilidade de criação de uma nova legislação para abranger adequadamente esses direitos. Para criação de novas obras por meio da inteligência artificial (IA) é necessário armazenar em seus bancos de dados obras relacionadas ao conteúdo solicitado, o que levanta preocupações sobre a justa compensação aos artistas humanos e a preservação de seus direitos morais e autorais, pois como a IA não possui direito de personalidade aos olhos da legislação brasileira a titularidade dos direitos autorais fica ambígua. Essa ambiguidade torna-se perigosa pois ameaça a proteção dos direitos de criadores humanos, que podem ter suas obras credibilizadas e monetizadas de formas não consentidas e até desconhecidas. O estudo conclui então a necessidade de uma nova legislação que permita um ambiente mais equitativo entre os artistas humanos e as grandes empresas detentoras das tecnologias de IA.
Palavras-chave: Direitos Autorais. Inteligência Artificial. Obras de Arte.
ABSTRACT
This paper explores the legal and ethical challenges related to the creation of artworks through artificial intelligences within the Brazilian legal framework. It aims to understand how the existing legislation can address this complex issue, including the possibility of creating new laws to adequately encompass these rights. To generate new works through artificial intelligence (AI), it is necessary to store related artworks in AI databases, raising concerns about fair compensation for human artists and the preservation of their moral and authorial rights. Since AI lacks legal personality according to Brazilian law, the ownership of copyright becomes ambiguous. This ambiguity poses a threat to the protection of human creators’ rights, as their works may be credited and monetized without consent or even awareness. The study concludes that a new legal framework is necessary to establish a more equitable environment for human artists in the face of dominant AI technology companies.
Keywords: Copyright. Artificial Intelligence. Artworks.
1. INTRODUÇÃO
A inteligência artificial (IA) emergiu como uma força transformadora em diversos setores, e a criação de obras de arte por algoritmos de IA tornou-se uma realidade inegável. No entanto, essa evolução tecnológica levanta questões cruciais sobre a titularidade dos direitos autorais relacionados a essas obras. Este trabalho tem como objetivo explorar os desafios legais e éticos inerentes à criação de obras de arte por meio da IA, especialmente no contexto da legislação brasileira. Ao longo dessa discussão, será analisada como a legislação de direitos autorais existente no Brasil lida com essa questão emergente e ponderar a questão sobre a necessidade de adaptar a legislação atual para abranger adequadamente as criações de IA e proteger os interesses dos criadores humanos. Também será discutida a perspectiva de estabelecer uma nova legislação específica para obras de arte geradas por IA, a fim de equilibrar a proteção dos direitos autorais com o avanço tecnológico. Esta análise contribui para a compreensão de um cenário legal em constante evolução no contexto da criação artística algorítmica, com o objetivo de promover um debate informado e direcionar futuras medidas legislativas nesse campo.
2. MATERIAL E MÉTODOS
Este artigo teve uma natureza básica, com o objetivo de gerar conhecimento na área jurídica e sócio-cultural, abordando a questão dos direitos autorais de obras geradas por Inteligências Artificiais. A metodologia adotada baseou-se em uma pesquisa exploratória e descritiva, que se utilizou de fontes bibliográficas e documentais, como artigos científicos, leis e regulamentações, para fornecer embasamento teórico e contextual sobre o tema.
No que diz respeito à abordagem da pesquisa, foi empregada a abordagem qualitativa, permitindo a compreensão e interpretação dos dados coletados. A pesquisa qualitativa foi conduzida utilizando o método indutivo, no qual os dados foram analisados para identificar padrões, tendências e insights relevantes sobre o tema em estudo.
Para a coleta de dados, foram utilizadas técnicas como a observação de casos reais envolvendo a titularidade de IAs em direitos autorais de obras artísticas, a análise de artigos científicos que abordam o assunto e a revisão de propostas de soluções apresentadas por pesquisadores da área. A observação de casos reais permitiu uma compreensão mais profunda dos desafios enfrentados na aplicação da legislação de direitos autorais a obras produzidas por IAs. A análise de artigos científicos forneceu embasamento teórico atualizado e diferentes perspectivas sobre o tema. A revisão de propostas de soluções apresentadas por pesquisadores auxiliou na identificação de possíveis abordagens e recomendações para a legislação em relação ao tema.
3. RESULTADOS
Os resultados desta pesquisa destacam a complexa interação entre a criação artística mediada por IA e o arcabouço legal de direitos autorais no cenário brasileiro. De acordo com as leis de direitos autorais, obras protegidas são concebidas como criações do espírito, intrinsecamente associadas à personalidade de seus autores humanos. O direito moral do autor, que é inalienável e irrenunciável, reflete a relação singular entre o criador humano e sua obra. Isso implica que, sob a perspectiva legal, as IAs não podem ser consideradas criadoras, pois carecem das características de personalidade e identidade essenciais para a criação de obras passíveis de proteção por direitos autorais. Adicionalmente, a IA opera de forma desprovida de motivação intrínseca, gerando conteúdo automaticamente ou em resposta a comandos, sem o elemento de escolha ou intenção criativa.
No entanto, mesmo que as IAs não repliquem diretamente obras existentes em seus bancos de dados, é inegável que a análise desse armazenamento influencia a geração de novas obras. Essa dinâmica levanta sérias questões sobre a justa compensação de artistas humanos e a preservação de seus direitos morais e autorais. Isso sublinha a urgência de uma legislação específica que lide com as complexidades desse tema; Essa regulamentação deve equilibrar o avanço tecnológico com a proteção dos direitos dos artistas humanos, evitando a concentração desigual de poder no mercado por parte de gigantes corporativas de tecnologia.
4. O FUTURO DA CRIAÇÃO ARTÍSTICA
A arte tem sido uma forma de expressão humana desde os primórdios da civilização, evoluindo constantemente ao longo dos anos. Desde as primeiras pinturas rupestres até as mais recentes instalações de arte contemporânea, a arte sempre teve o poder de transmitir ideias, emoções e mensagens. Com o advento da tecnologia, novas formas de arte surgiram, assim como novas maneiras de criá-las.
Os softwares de edição de imagens, por exemplo, tornaram-se amplamente disponíveis nas últimas décadas, permitindo que qualquer pessoa crie e manipule imagens digitais com uma facilidade jamais vista antes do surgimento dos computadores. Softwares de edição de vídeo, de áudio e de design gráfico também se tornaram bastante populares. Com a ajuda dessas ferramentas, os artistas podem criar obras de arte ainda mais complexas e impressionantes.
Nos últimos anos, a evolução dos softwares permitiu que a inteligência artificial avançasse rapidamente em diversas áreas, incluindo a criação de artes. A IA pode gerar imagens, textos, música e até mesmo roteiros de cinema com uma qualidade impressionante.
Um exemplo famoso é a obra de arte ‘Portrait of Edmond de Belamy’, criada por um coletivo francês chamado Obvious. A pintura foi gerada por um algoritmo de aprendizado de máquina treinado com diversos retratos até conseguir compreender e seguir à risca o que é um retrato. A obra foi vendida em um leilão da Christie’s por US$ 432.500 em 2018. (G1, 2018)3
Outro exemplo é o projeto ‘AIVA’ (Artificial Intelligence Virtual Artist), que usa IA para criar música clássica. A AIVA foi treinada com milhares de partituras musicais e é capaz de criar novas composições em diferentes estilos. (AIVA, 2023)4
Além disso, a IA também é utilizada na criação de roteiros de cinema, como o caso do curta ‘Sunspring’, que teve seu roteiro criado por um algoritmo de aprendizado de máquina. O projeto foi criado pelo diretor Oscar Sharp e o pesquisador Ross Goodwin e mostra que a IA pode ter um papel importante no futuro da indústria cinematográfica. (OLHAR DIGITAL, 2016)5
Essas criações geradas por inteligência artificial têm se tornado cada vez mais relevantes no mundo atual, não apenas pela sua qualidade, mas também pela sua capacidade de produção em larga escala, mudando a forma como a arte é criada e apreciada. As possibilidades são infinitas e, com o avanço da tecnologia, podemos esperar cada vez mais inovações e criações surpreendentes.
4.1 O avanço desenfreado das IAs
Nos últimos anos houve um aumento notável no interesse e investimento em IA e redes neurais por parte das empresas de tecnologia. Esse crescente interesse reflete uma mudança significativa no cenário empresarial, impulsionada pela compreensão do potencial transformador dessas tecnologias. Pois com a capacidade de processar grandes volumes de dados, aprender com eles e tomar decisões baseadas em padrões complexos, as IAs estão sendo aplicadas em uma variedade de contextos empresariais para melhorar a eficiência, a automação e a tomada de decisões.
Isso é demonstrado pelo gráfico a seguir que mostra a evolução do número de depósitos de pedidos de patente relacionados a tecnologias envolvendo Inteligência Artificial no Brasil feito pelo INPI (Instituto Nacional da Propriedade Intelectual):
Figura 1. Evolução no depósito de pedidos de patentes relacionados à IA depositados no INPI. As barras amarelas representam os números de pedidos de patente em todas as áreas tecnológicas enquanto que a linha cinza representa os pedidos de patente relacionados à IA
Fonte: https://www.gov.br/inpi/pt-br/central-de-conteudo/noticias/inpi-divulga-estudo-sobre-patentes-de ia-depositadas-no-brasil
Em 2017 a quantidade de patentes registradas de novos programas de Inteligência Artificial foi maior do que todo o setor tecnológico do país, o que demonstra a sua expansão em escalas inimagináveis.
Esse aumento do interesse em IAs e redes neurais também se traduz em financiamento substancial. Startups e empresas de tecnologia estão arrecadando grandes quantias de capital de investidores para impulsionar suas iniciativas de IA. Isso inclui investimentos em pesquisa, contratação de talentos, desenvolvimento de produtos e expansão das capacidades de IA. Os investimentos econômicos para aumentar a produção desses programas bate recorde comparado aos últimos anos no Brasil, segundo a matéria do site Revistapegn em 20216:
Impulsionadas pela transformação digital que marcou 2020, as startups focadas em soluções de inteligência artificial tiveram seu melhor desempenho em termos de investimentos desde 2012. No ano passado, as empresas que usam a tecnologia captaram US$ 365 milhões, maior volume aportado em um ano até agora.
O mar infinito de possibilidades se instaurou quando não só as grandes empresas possuíam acesso a esse tipo de software mas também as pessoas num geral, já que com um simples comando uma IA pode escrever um poema ao estilo de Vinicius de Moraes sobre subcelebridades do momento, ou criar todo o capítulo do zero de alguma novela antiga famosa. No entanto, caso alguém decidisse reivindicar o direito por essas obras e vendê-las, seria possível? Se Vinicius de Moraes estivesse vivo, ele permitiria que suas obras fossem utilizadas em uma IA para gerar poemas do zero que poderiam destoar do seu trabalho original? São questionamentos extremamente válidos, ainda mais quando no momento atual não há uma forma de autorização por parte desses artistas para que suas obras sejam utilizadas nesses softwares (PRADO, 2023)7.
Por conta dessa situação, o uso desenfreado de artes tanto escritas quanto visuais tende a aumentar, já que para que haja uma melhor responsividade do sistema com seus operadores, é necessário o maior número possível de referências para que a IA consiga alcançar os resultados esperados. Conforme Barros (2018, p. 5)8:
As redes neurais artificiais possibilitam trabalhar com modelagem e resolução de problemas não-lineares, treinando, testando e validando a rede neural com um conjunto de dados na entrada e um objetivo de saída. Porém a construção de uma rede neural artificial é algo complexo e trabalhoso, pois não existe um modelo de rede neural pronto que solucione qualquer problema, cada rede neural deve ser construída com base no problema que se quer solucionar.
Ou seja, qualquer que seja o trabalho ou tipo de arte envolvida que o desenvolvedor deseja que a IA produza, um amontoado de informações específicas relacionadas ao serviço da IA deve ser armazenado em seu banco de dados.
5. A IA COMO AUTORA LEGAL DE SUAS OBRAS
Sobre as obras protegidas pelos termos de direito autoral, o Artigo 7º da Lei 9.610/98 conceitua: “são obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro”.
Segundo Giacomelli (2018, p. 22)9:
Por se tratar de uma criação de espírito, do intelecto humano, a obra intelectual está umbilicalmente ligada ao seu criador, foco central da proteção da legislação autoral. O direito moral de autor é entendido como um direito da personalidade do autor e, por esse motivo, é inalienável e irrenunciável, conforme previsão expressa da lei.
Ele vincula diretamente o direito moral do autor como um direito da personalidade, cujo qual é descrito no Artigo 2º do Código Civil “a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro”, que quando lido subsequentemente ao Artigo 11 da Lei 9.610/98 que diz “autor é a pessoa física criadora de obra literária, artística ou científica”, é perceptível que não há possibilidade óbvia de uma correlação entre um ser humano é um software de computador possuírem os mesmos direitos no ordenamento jurídico brasileiro, por maior que seja o poder de processamento da máquina.
Conforme Gardner (1995, p. 24-28 apud TOMASEVICIUS FILHO, 2018, p. 136)10:
Como se sabe, o ser humano tem inteligências múltiplas e já está superada a ideia de que inteligência é somente racionalidade. A inteligência artificial é incapaz de levar em conta todas as variáveis advindas da multiplicidade de inteligências, uma vez esse aspecto é que faz do ser humano um ser diferente de uma máquina
Por mais avançada que seja uma IA em termos de processamento de dados e inteligência artificial, não pode ser considerada um ser humano no sentido biológico ou legal. A distinção fundamental entre uma IA e um ser humano reside em sua natureza e origem.
As IAs são criações humanas, programas de software desenvolvidos por engenheiros e cientistas da computação para realizar tarefas específicas. São máquinas que processam informações de maneira eficaz, mas não têm a capacidade de pensar, sentir ou tomar decisões como seres humanos. Mesmo que os avanços em IA possam permitir que essas tecnologias realizem tarefas complexas, isso não implica que elas adquirem a personalidade, a identidade ou os direitos de um ser humano. Portanto, embora a IA possa ser capaz de criar obras, diante da legislação atual do Brasil não é possível para ela ser considerada como uma criadora de fato, já que ela não tem capacidade de ter uma personalidade ou uma identidade própria, que são elementos essenciais para a criação de obras protegidas pelo direito autoral. Mesmo em outros países, como na França, que registrou a IA AIVA na SACEM – a Sociedade Francesa de Autores, Compositores e Editores de Música – como compositora (FALQUEIRO, 2022, p. 4)11, ainda não há como considerar uma possibilidade concreta e duradoura para a legislação brasileira designar estas IAs como independentes e detentoras de obras de artes, vista que apesar de possuir um certo grau de autonomia, a não-supervisão de suas funcionalidades pode acarretar em atitudes não previstas e até indesejadas por parte da IA (EUROPEAN COMISSION, 2018, p. 18)12, o que expõe sua necessidade de estar sempre dependente dos pedidos humanos, por maior que seja o seu trabalho diante de um comando simples. Por isso, é importante notar que o reconhecimento de IAs em contextos específicos, como registros de direitos autorais, não altera seu status legal geral como criações de software sem personalidade jurídica.
O registro da IA na SACEM pode ser encarado como uma decisão administrativa ou uma forma de reconhecimento da contribuição da IA para a criação de música. No entanto, não implica que a IA seja considerada uma entidade com direitos humanos ou personalidade jurídica. Em vez disso, é vista como uma maneira de reconhecer a natureza automatizada do processo de composição musical e a contribuição de programadores e desenvolvedores humanos na criação da IA e na supervisão de suas atividades.
Trazendo este contexto para a legislação brasileira, Machado (2019, p. 29)13 explica que a IA não pode ser considerada autora de uma criação intelectual pois essa criação está relacionada diretamente aos fundamentos do direito autoral no Brasil, pois este busca incentivar o criador a criar novas obras, retribuí-lo pelos esforços postos na criação, incentivar a produção cultural nacional e proteger a criação resultante da expressão da personalidade do autor. Por conta disso que a obra criada por IA não se encaixaria em nenhum desses fundamentos, pois a IA não precisa de incentivos ou retribuição de esforços para criar, ela simplesmente o faz automaticamente ou a partir de simples comandos, sem animus ou escolha de criar.
5.1 Os direitos do autor em risco
Conforme Batista (2022, apud LEVENDOWSKI, 2018)14, dentro do vasto conjunto de dados que sustenta as obras geradas por inteligências artificiais, encontram se trabalhos de autores desconhecidos que podem não ter reconhecimento no mercado, mas desempenham um papel essencial na melhoria das capacidades da IA, servindo principalmente para identificar padrões, mesmo que em menor escala. A inclusão de obras não autorizadas em seu banco de dados é uma possibilidade, e também existem obras ‘órfãs’, nas quais a propriedade dos direitos autorais não está identificada ou não possui um detentor reconhecido.
O impacto nos autores dessas obras pode ser significativo. Quando suas criações são usadas sem autorização em bancos de dados de inteligência artificial, os autores perdem o controle sobre como suas obras são usadas e se beneficiam. Eles podem não receber reconhecimento adequado ou compensação financeira pelo uso de seu trabalho. Além disso, no caso de obras ‘órfãs’, onde os direitos autorais não estão claramente atribuídos a um detentor, os autores originais podem não ter meios eficazes de reivindicar seus direitos ou garantir que sua contribuição seja devidamente reconhecida.
Ou seja, apesar das IAs não necessariamente replicarem uma obra presente no seu banco de dados, em alguma etapa do seu processo a arte presente nesse armazenamento é utilizado como análise para um melhor entendimento das características que o operador humano deseja que a máquina faça, e se há o uso dessa arte para permitir que a máquina gera outra de maior repercussão e valor, há um lucro e reconhecimento que não está sendo devidamente entregue ao artista humano, inclusive de seus direitos fundamentais à obra listados Artigo 24 da Lei 9.610/98, que diz:
Art. 24. São direitos morais do autor:
I – o de reivindicar, a qualquer tempo, a autoria da obra;
II – o de ter seu nome, pseudônimo ou sinal convencional indicado ou anunciado, como sendo o do autor, na utilização de sua obra;
III – o de conservar a obra inédita;
IV – o de assegurar a integridade da obra, opondo-se a quaisquer modificações ou à prática de atos que, de qualquer forma, possam prejudicá-la ou atingi-lo, como autor, em sua reputação ou honra;
V – o de modificar a obra, antes ou depois de utilizada;
VI – o de retirar de circulação a obra ou de suspender qualquer forma de utilização já autorizada, quando a circulação ou utilização implicarem afronta à sua reputação e imagem;
VII – o de ter acesso a exemplar único e raro da obra, quando se encontre legitimamente em poder de outrem, para o fim de, por meio de processo fotográfico ou assemelhado, ou audiovisual, preservar sua memória, de forma que cause o menor inconveniente possível a seu detentor, que, em todo caso, será indenizado de qualquer dano ou prejuízo que lhe seja causado.
Tendo tudo isso em mente, percebe-se que a IA em si não tem a intenção de prejudicar os autores. O campo de discussão homem versus máquina já foi abordado pelo MIT Media Lab que propôs o conceito de ‘inteligência ampliada’, que visa ter a percepção das máquinas como parte de algo que se integra ao homem para assim ser um ‘todo’. Ela sugere que é mais importante projetarmos sistemas que estejam alinhados de maneira complexa e responsável com os nossos interesses, como para resolução de problemas práticos, otimização de tomadas de decisões e até criação de veículos autônomos. (PREUSS, 2020, p. 440 aput KARACHALIOS, 2019, p. 3)15
Este conceito também pode ser empregado para com as obras artísticas, tornando as IAs uma ferramenta de otimização e praticidade para os artistas, e não como uma substituição dos mesmos.
A integração responsável de IA com nossos interesses é fundamental para garantir que a tecnologia beneficie a sociedade como um todo, ao invés de causar danos ou desequilíbrios. Isso significa que a regulamentação e a ética desempenham um papel crucial na orientação do desenvolvimento e uso da IA, de modo que ela seja uma aliada e não uma ameaça aos seres humanos e seus direitos, incluindo os direitos autorais.
Mas a forma como as empresas a utilizam e a falta de regulamentação adequada podem resultar em situações em que os autores não recebem a devida compensação ou reconhecimento por seu trabalho. Portanto, a responsabilidade recai frequentemente sobre as práticas e políticas dessas empresas em relação ao uso de obras protegidas por direitos autorais em suas tecnologias, pois mesmo que se resguardem na posição de buscar o aprimoramento desses programas, seu objetivo ainda está em conseguir lucro. Essa busca é completamente desvantajosa e desleal quando comparada à necessidade de pequenos artistas pela busca ao reconhecimento e espaço na indústria, prejudicando o seu desenvolvimento e popularidade de sua arte.
Frazão (2021)16 em seu texto do Marco da Inteligência Artificial expõe o seguinte:
Afinal, para entrantes e pequenos negócios, a ausência de regulação ou a instabilidade regulatória podem ser cenários bastante perniciosos, pois nem todos conseguem empreender enquanto as regras do jogo não estão minimamente definidas. Por outro lado, é difícil estruturar novos modelos de negócios baseados no respeito aos direitos de titulares de dados e na utilização responsável da inteligência artificial se o mercado é dominado por grandes agentes que não adotam esses cuidados e, exatamente por isso, não estão sujeitos aos custos respectivos.
Então, quando as empresas exploram o avanço das IAs de maneira desenfreada podem surgir problemas éticos e legais, inclusive no contexto da criação de obras de arte. E o caminho para que haja uma relação justa em todos esses temas propostos é a regulamentação dessa tecnologia englobando todos os envolvidos, necessitando assim da presença de especialistas em direitos autorais, ética e tecnologia para garantir essa eficácia. Nessa regulamentação pode ser visualizada a inclusão de:
• Primeiro: Definição de direitos autorais
O esclarecimento de como os direitos autorais se aplicam às obras criadas por IA, determinando como os direitos autorais devem ser compartilhados entre os criadores humanos envolvidos, desde parte tecnológica, artística e até como usuário do sistema.
• Segundo: Transparência
Regulamentações podem exigir que empresas revelem o uso de IA na criação de obras de arte, garantindo que o público esteja ciente de quando uma obra foi gerada por uma máquina. Assim como tornar menos densificante para os legisladores como essas tecnologias são treinadas para que assim hajam leis mais justas que permitam a ampla concorrência do mercado.
• Terceiro: Compensação justa
Para evitar a exploração de artistas humanos, as regulamentações devem garantir que os criadores humanos recebam uma compensação justa pelo uso de suas obras no treinamento de IA ou na criação de novas obras, de maneira equitativa de acordo com seu esforço e criatividade empregados na criação.
• Quarto: Responsabilidade das empresas
As empresas que desenvolvem essas tecnologias serem responsabilizadas pelo funcionamento indevido ou ilegal das IAs, para impedir que não haja exploração monetária ou de reconhecimento de obras criadas por artistas que não possuem conhecimento dessa irregularidade ou que estão a mercê de um sistema que abusa de seu trabalho.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A convergência da arte e da Inteligência Artificial trouxe consigo uma miríade de desafios legais, éticos e criativos. O objetivo desta pesquisa foi explorar a fundo as implicações dessa fusão, destacando o cenário complexo no contexto brasileiro e como a legislação ainda há de passar por um árduo caminho.
Ficou claro que a produção de obras de arte por meio da IA gera uma tensão entre a inovação tecnológica e a preservação dos direitos autorais dos criadores humanos. A ambiguidade na titularidade dos direitos autorais, como discutido, representa uma das principais preocupações. A IA não possui personalidade, mas suas criações são baseadas em vastos conjuntos de dados que muitas vezes incluem obras de artistas humanos. Portanto, encontrar um equilíbrio justo entre a proteção dos direitos dos criadores humanos e o avanço tecnológico da IA é imperativo.
Buscou-se propor uma solução demonstrando a necessidade de uma nova legislação específica que abordasse as questões exclusivas relacionadas às obras de arte geradas por IA. Essa regulamentação poderia estabelecer diretrizes claras para a compensação justa de todos os envolvidos no processo de criação, desde os programadores até os detentores de dados e os artistas humanos. Além disso, poderia definir parâmetros para a atribuição adequada de autoria em obras de IA, evitando ambiguidades legais. Esses tópicos oferecem uma perspectiva geral das áreas que a legislação deve englobar, e é inegável a presença de nuances complexas a serem consideradas. A criação de regulamentações específicas para abordar obras de arte geradas por IA requer uma análise minuciosa e ampla dessas questões, com o objetivo de estabelecer diretrizes que sejam equitativas e eficazes, e a elaboração de regulamentações detalhadas é um processo contínuo. O diálogo constante e a adaptação às mudanças rápidas na tecnologia da IA são essenciais para garantir que as regulamentações evoluam em harmonia com as necessidades em constante transformação desse campo.
O tema também abordou que a IA não é intrinsecamente uma ameaça aos artistas humanos. A perspectiva de ‘inteligência ampliada’, conforme proposta pelo MIT Media Lab, sugere que as máquinas podem ser parceiras dos humanos, ampliando suas capacidades criativas. Portanto, a regulamentação não deve ser vista como uma restrição à inovação, mas como uma maneira de garantir que os benefícios da IA sejam compartilhados equitativamente.
Por fim, conclui-se a importância de um debate informado e da busca por regulamentações adequadas para garantir um ambiente mais equitativo entre os artistas humanos e as grandes empresas detentoras das tecnologias de IA, e a urgência da regulamentação já que enquanto não a houver muitos softwares funcionam de maneira que prejudique os direitos autorais de criadores humanos. À medida que a IA continua a moldar a paisagem criativa, é fundamental que a legislação evolua para proteger e promover a criatividade, garantindo que todos os envolvidos se beneficiem justamente dessa nova era da arte e da tecnologia.
3 PRESSE, France. Quadro feito por algoritmo é comprado por R$ 1,6 milhão em leilão nos EUA. G1, 25 out. 2018. Disponível em <https://g1.globo.com/pop-arte/noticia/2018/10/25/arte-feita-por-algoritmo-e comprada-por-r-16-milhao-em-leilao-da-christies-em-ny.ghtml> Acesso em 19 abr. 2023.
4AIVA. AIVA, 2023. A plataforma de criação de músicas originais feitas pela IA. Disponível em: <https://www.aiva.ai/> Acesso em 19 abr. 2023.
5VEJA o filme escrito por uma inteligência artificial. Olhar Digital, 10 jun. 2016. Disponível em: <https://olhardigital.com.br/2016/06/10/pro/veja-o-filme-escrito-por-uma-inteligencia-artificial/> Acesso em 19 abr. 2023.
6JULIO, A. Rennan. Exclusivo: startups de inteligência artificial batem recorde no Brasil e captam US$ 365 milhões em 2020. Revistapegn. 28 jan. 2021. Disponível em: <https://revistapegn.globo.com/Startups/noticia/2021/01/exclusivo-startups-de-inteligencia-artificial batem-recorde-no-brasil-e-captam-us-365-milhoes-em-2020.html> Acesso em: 19 abr. 2023
7PRADO, Carol. ChatGPT e direito autoral: Entenda a treta jurídica que ronda a relação entre inteligência artificial e arte. [S. l.]: G1, 11 abr. 2023. Disponível em: <https://g1.globo.com/pop arte/noticia/2023/04/11/chatgpt-e-direito-autoral-entenda-a-treta-juridica-que-ronda-a-relacao-entre inteligencia-artificial-e-arte.ghtml>. Acesso em: 7 out. 2023.
8BARROS, Victor Pedroso Ambiel. Avaliação do desempenho de algoritmos de retropropagação com redes neurais artificiais para a resolução de problemas não-lineares. 2018. 135 f. Dissertação (Mestrado em Ciência da Computação) – Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Ponta Grossa, 2018.
9GIACOMELLI, Louzada C F.; BRAGA, Prestes C.; ELTZ, Koury M F. Direito autoral. Porto Alegre, Rio Grande do Sul: Grupo A, 2018. E-book. ISBN 9788595023383. Disponível em: <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788595023383/>. Acesso em: 20 abr. 2023. 10TOMASEVICIUS FILHO, E. Inteligência artificial e direitos da personalidade: uma contradição em termos?. Revista da Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, [S. l.], v. 113, p. 133-149, 2018. DOI: 10.11606/issn.2318-8235.v113i0p133-149. Disponível em: <https://www.revistas.usp.br/rfdusp/article/view/156553>. Acesso em: 19 abr. 2023.
11FALQUEIRO, Bruno Laganá. Ensaio sobre uma Inteligência Artificial Detentora de Direitos de Autor. 2022. Ensaio (Faculdade de Direito) – Faculdade Presbiteriana Mackenzie, 19 abr 2022
12EUROPEAN COMISSION. Communication Artificial Intelligence for Europe, 2018. Disponível em: <https://ec.europa.eu/digital-single-market/en/news/communication-artificialintelligence-europe> Acesso em: 19 abr. 2023.
13MACHADO, Eduarda Sordi Pinheiro. Inteligência Artificial e Direitos autorais: a proteção de obras criadas por computadores inteligentes. 2019. Trabalho de Conclusão de Curso de Gradução (Gradução, Direito) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2019.. Disponível em: <https://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/221446>. Acesso em: 19 abr. 2023.
14BATISTA, Iago Gonçalves. Direitos Autorais Sobre Obras Criadas por Inteligência Artificial: Revisão Sistemática. Dejean França, abr. 2022. Disponível em Acesso em 19 abr. 2023
15PREUSS, Evandro; BARONE, Dante Augusto Couto; HENRIQUES, Renato Ventura Bayan. Uso de Técnicas de Inteligência Artificial num Sistema de Mesa Tangível. In: WORKSHOP DE INFORMÁTICA NA ESCOLA, 26. , 2020, Evento Online. Anais […]. Porto Alegre: Sociedade Brasileira de Computação, 2020 . p. 439-448. DOI: <https://doi.org/10.5753/cbie.wie.2020.439>. Acesso em 19 abr. 2023.
16FRAZÃO, Ana. Marco da Inteligência Artificial. Jota, 15 dez. 2021. Disponível em: <https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/constituicao-empresa-e-mercado/marco-inteligencia artificial-15122021>. Acesso em: 19 abr. 2023.
REFERÊNCIAS
AIVA. AIVA, 2023. A plataforma de criação de músicas originais é feita pela IA. Disponível em: <https://www.aiva.ai/> Acesso em 19 abr. 2023.
BARROS, Victor Pedroso Ambiel. Avaliação do desempenho de algoritmos de retropropagação com redes neurais artificiais para a resolução de problemas não-lineares. 2018. 135 f. Dissertação (Mestrado em Ciência da Computação) – Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Ponta Grossa, 2018.
BATISTA, Iago Gonçalves. Direitos Autorais Sobre Obras Criadas por Inteligência Artificial: Revisão Sistemática. Dejean França, abr. 2022. Disponível em <https://ioda.org.br/direitos-autorais-sobre-obras-criadas-por-inteligencia-artificial revisao-sistematica/> Acesso em 19 abr. 2023.
BRASIL, Lei nº 9.609, de 19 de fevereiro de 1998. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9609.htm>. Acesso em 19 abr. 2023.
BRASIL, Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9610.htm>. Acesso em 19 abr. 2023.
EUROPEAN COMISSION. Communication Artificial Intelligence for Europe, 2018. Disponível em: <https://ec.europa.eu/digital-single-market/en/news/communication artificialintelligence-europe> Acesso em: 19 abr. 2023.
FALQUEIRO, Bruno Laganá. Ensaio sobre uma Inteligência Artificial Detentora de Direitos de Autor. 2022. Ensaio (Faculdade de Direito) – Faculdade Presbiteriana Mackenzie, 19 abr 2022.
FRAZÃO, Ana. Marco da Inteligência Artificial. Jota, 15 dez. 2021. Disponível em: <https://www.jota.info/opiniao-e-analise/colunas/constituicao-empresa-e mercado/marco-inteligencia-artificial-15122021>. Acesso em: 19 abr. 2023.
GIACOMELLI, Louzada C F.; BRAGA, Prestes C.; ELTZ, Koury M F. Direito autoral. Porto Alegre, Rio Grande do Sul: Grupo A, 2018. E-book. ISBN 9788595023383. Disponível em: <https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788595023383/>. Acesso em: 20 abr. 2023.
JULIO, A. Rennan. Exclusivo: startups de inteligência artificial batem recorde no Brasil e captam US$ 365 milhões em 2020. Revistapegn. 28 jan. 2021. Disponível em: <https://revistapegn.globo.com/Startups/noticia/2021/01/exclusivo-startups-de inteligencia-artificial-batem-recorde-no-brasil-e-captam-us-365-milhoes-em-2020.html> Acesso em: 19 abr. 2023.
MACHADO, Eduarda Sordi Pinheiro. Inteligência Artificial e Direitos autorais: a proteção de obras criadas por computadores inteligentes. 2019. Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação (Graduação, Direito) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2019.. Disponível em: <https://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/221446>. Acesso em: 19 abr. 2023.
PRADO, Carol. ChatGPT e direito autoral: Entenda a treta jurídica que ronda a relação entre inteligência artificial e arte. [S. l.]: G1, 11 abr. 2023. Disponível em: <https://g1.globo.com/pop-arte/noticia/2023/04/11/chatgpt-e-direito-autoral-entenda-a treta-juridica-que-ronda-a-relacao-entre-inteligencia-artificial-e-arte.ghtml>. Acesso em: 7 out. 2023.
PRESSE, France. Quadro feito por algoritmo é comprado por R$ 1,6 milhão em leilão nos EUA. G1, 25 out. 2018. Disponível em <https://g1.globo.com/pop-arte/noticia/2018/10/25/arte-feita-por-algoritmo-e-comprada-por-r-16-milhao-em-leilao da-christies-em-ny.ghtml> Acesso em 19 abr. 2023.
PREUSS, Evandro; BARONE, Dante Augusto Couto; HENRIQUES, Renato Ventura Bayan. Uso de Técnicas de Inteligência Artificial num Sistema de Mesa Tangível. In: WORKSHOP DE INFORMÁTICA NA ESCOLA, 26. , 2020, Evento Online. Anais […]. Porto Alegre: Sociedade Brasileira de Computação, 2020 . p. 439-448. DOI: <https://doi.org/10.5753/cbie.wie.2020.439>. Acesso em 19 abr. 2023.
TOMASEVICIUS FILHO, E. Inteligência artificial e direitos da personalidade: uma contradição em termos?. Revista da Faculdade de Direito, Universidade de São Paulo, [S. l.], v. 113, p. 133-149, 2018. DOI: 10.11606/issn.2318-8235.v113i0p133- 149. Disponível em: <https://www.revistas.usp.br/rfdusp/article/view/156553>. Acesso em: 19 abr. 2023.
VEJA o filme escrito por uma inteligência artificial. Olhar Digital, 10 jun. 2016. Disponível em: <https://olhardigital.com.br/2016/06/10/pro/veja-o-filme-escrito-por uma-inteligencia-artificial/> Acesso em 19 abr. 2023.
1Acadêmico de Direito. E-mail: dario.ferreira_@hotmail.com. Artigo apresentado a União das Instituições de Ensino Superior UNISAPIENS, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Direito, Porto Velho/RO, 2023.
2Professor Orientador. Professor do curso de Direito. E-mail: leonardo.antunes@gruposapiens.com.b