REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/pa10202410281429
Hugo Vinícius Simão Evangelista da Silva1
David Leite de Lima Neto2
Jennifer Alves Rates Gomes3
RESUMO
O presente artigo científico aborda a Herança de Bens Digitais e a atuação do Direito das Sucessões no Brasil, com informações referentes à legislação vigente e exemplos de casos concretos. Apresenta exemplos de bens digitais como, criptoativos, itens em jogos virtuais, itens armazenados na Blockchain, entre outros. Desta forma sem pretensão do esgotamento do tema os autores trazem a importância do Direito das Sucessões ligada à falta de legislação específica sobre o tema, ficando à mercê do judiciário dirimir questões amplas ou até mesmo a necessidade de que o titular dos bens faça um testamento direcionando aos herdeiros instruções de como acessar determinado bem, visto a variedade de itens e seu diverso valor econômico, podendo em alguns casos ser comparado até mesmo a valores de bens imóveis no Brasil.
Palavras chaves: criptoativos; herança; jogos virtuais; valor econômico; Blockchain
ABSTRACT
This scientific article addresses the Inheritance of Digital Assets and the role of Succession Law in Brazil, with information regarding current legislation and examples of concrete cases. It presents examples of digital goods such as cryptoassets, items in virtual games, items stored on the Blockchain, among others. In this way, without intending to exhaust the topic, the authors bring up the importance of Succession Law linked to the lack of specific legislation on the topic, leaving it at the mercy of the judiciary to resolve broad issues or even the need for the owner of the assets to make a will directing instructions to heirs on how to access a certain asset, given the variety of items and their diverse economic value, which in some cases can even be compared to the values of real estate in Brazil.
Keywords: cryptoassets; heritage; virtual games; economic value; Blockchain
1 INTRODUÇÃO
O Direito das Sucessões é um ramo do direito que regulamenta a transferência de bens, direitos e obrigações após o falecimento de uma pessoa. Com a crescente digitalização da vida contemporânea, surgem novos desafios no âmbito sucessório, especialmente no que se refere à herança de bens digitais. Este artigo tem como foco a análise da sucessão de ativos digitais no Brasil, um tema que, embora em ascensão, ainda carece de uma regulamentação específica.
No contexto atual, muitos indivíduos acumulam bens que existem exclusivamente em formato digital, como criptomoedas, contas em redes sociais, itens em jogos online e outros ativos intangíveis. A problemática central desta pesquisa reside na incerteza sobre como esses bens devem ser tratados no Direito Sucessório, uma vez que a legislação brasileira não aborda de maneira direta a herança de bens digitais, o que pode gerar conflitos entre herdeiros, dificultar a transferência de bens e, em certos casos, levar à perda destes bens.
Os objetivos deste estudo são, primeiramente, exemplificar os tipos de bens digitais mais comuns e suas características; analisar a legislação vigente e fazer uma projeção judicial relacionada ao tema, que não será em si esgotada devido sua evolução constante presente no cenário social e jurídico brasileiro.
2 MATERIAL E MÉTODOS
A metodologia de pesquisa será o método jurídico de modo indutivo através da análise de decisões sobre o tema e de projetos de alteração na lei, como a reforma do Código Civil por exemplo, já o método jurídico “É um procedimento por meio do qual se estabelece o objeto que deve ser controlado pelo método que indicará as bases, o fundamento da sistematização jurídica”, já de modo indutivo indica que,
O método indutivo é uma operação mental que consiste em estabelecer uma verdade universal ou uma proposição geral com base no conhecimento de certo número de dados singulares ou proposições de menor generalidade. É um processo que, com base em um conjunto de dados, permite descobrir e confirmar certas hipóteses e leis de caráter geral. A indução caracteriza-se principalmente pelo fato de, apoiada em dados, atingir ideias ou leis. Permite, portanto, inferir conclusões gerais de proposições particulares, para: a) Execução das pesquisas. b) Ampliação das propriedades relacionais. c) Estabelecimento dos critérios de prova. d) Realização de previsões4
A escolha desta metodologia se justifica através da não existência de muitos casos no Brasil referente ao tema, o processo de formação de jurisprudência e doutrina, além de não existir lei específica sobre o tema.
Também será utilizado o levantamento bibliográfico, que conforme Lozada, Gisele, e Karina S. Nunes. (2019) “é a busca de informações, em fontes bibliográficas, que se relacionem ao problema de pesquisa e o fundamentem5”. Este é um método importante a ser utilizado, pois será a partir dele que as ideias iniciais serão fundamentadas, trazendo a possibilidade de chegar a uma conclusão adequada para o tema.
Ademais, repisa-se a necessidade do método qualitativo que conforme Lozada, Gisele, e Karina S. Nunes. (2019) “Em vez da solidez da pesquisa quantitativa, esse tipo de abordagem traz a preocupação com a subjetividade, no sentido da relação direta do pesquisador com o objeto estudado”. A subjetividade neste caso trata-se na apresentação de casos e projetos de lei que ainda não se afirmaram no cenário jurídico brasileiro.
3 RESULTADOS
Os resultados da presente pesquisa foram esclarecer que por mais que não há ainda uma legislação específica sobre o tema, há uma ampla discussão entre o judiciário e legislativo, o que se tornou evidente através da apresentação de projetos de lei, jurisprudências, além da visão de doutrinadores que apresentam o tema de maneira ampla.
Chega a uma conclusão referente a evolução e adaptação do ordenamento jurídico, junto ao meu digital a fim de abranger as novas realidades da propriedade e da sucessão, quanto a bens em jogos online, criptomoedas e a tecnologia Blockchain.
4 DISCUSSÃO
A internet segundo Lopes (2022) “Tornou-se uma constante ao redor do globo, permitindo às pessoas realizarem compras, conversarem com amigos e parentes distantes, compartilharem dados e informações e também a acumular bens dentro dela.” Podemos afirmar que o avanço digital leva a necessidade do avanço das leis, inclusive esta questão de herança de bens digitais, referente a tamanhos bens intangíveis.
Sendo assim há uma incerteza referente à sucessão do patrimônio digital, conforme Paiva (2023), “o grande debate é porque não há legislação específica sobre o tema. Com isso, abre-se margem para uma discussão na doutrina e na jurisprudência”. O começo da discussão na doutrina e jurisprudência é importante para formar decisões complexas sobre o tema, no entanto, há de se ter mais peso na legislação para garantia de segurança jurídica.
Para Tartuce (2023, p.40),
Sobre o tema, tramitam no Congresso Nacional projetos de lei que pretendem discipliná-lo no âmbito da sucessão legítima. O primeiro a ser mencionado é o de nº 4.847, de 2012. A proposição pretende incluir os arts. 1.797-A a 1.797-C do Código Civil. Conforme a primeira norma projetada, “a herança digital defere-se como o conteúdo intangível do falecido, tudo o que é possível guardar ou acumular em espaço virtual, nas condições seguintes: I – senhas; II – redes sociais; III – contas da Internet; IV – qualquer bem e serviço virtual e digital de titularidade do falecido”. Há, assim, a previsão de um rol meramente exemplificativo dos bens que compõem o acervo, o que não exclui outros, como os contatos, as fotos e os textos construídos pelo de cujus.
Em continuidade, nos termos do proposto art. 1.797-B, se o falecido, tendo capacidade para testar, não o tiver feito, a herança será transmitida aos herdeiros legítimos. Por fim, está sendo sugerido que “cabe ao herdeiro: I – definir o destino das contas do falecido; a) transformá-las em memorial, deixando o acesso restrito a amigos confirmados e mantendo apenas o conteúdo principal ou; b) apagar todos os dados do usuário ou; c) remover a conta do antigo usuário” (proposta do art. 1.797-C).
Esse projeto tramita em conjunto com o PL 7.742/2017, sugerido o mais recentemente, que aguarda parecer do Relator na Câmara dos Deputados. A última norma projetada visa incluir um art. 10-A no Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014), com a seguinte dicção:
“Art. 10-A. Os provedores de aplicações de internet devem excluir as respectivas contas de usuários brasileiros mortos imediatamente após a comprovação do óbito.
§ 1.º A exclusão dependerá de requerimento aos provedores de aplicações de internet, em formulário próprio, do cônjuge, companheiro ou parente, maior de idade, obedecida a linha sucessória, reta ou colateral, até o segundo grau inclusive.
§ 2.º Mesmo após a exclusão das contas, devem os provedores de aplicações de internet manter armazenados os dados e registros dessas contas pelo prazo de 1 (um) ano, a partir da data do óbito, ressalvado requerimento cautelar da autoridade policial ou do Ministério Público de prorrogação, por igual período, da guarda de tais dados e registros.
§ 3.º As contas em aplicações de internet poderão ser mantidas mesmo após a comprovação do óbito do seu titular, sempre que essa opção for possibilitada pelo respectivo provedor e caso o cônjuge, companheiro ou parente do morto indicados no caput deste artigo formule requerimento nesse sentido, no prazo de um ano a partir do óbito, devendo ser bloqueado o seu gerenciamento por qualquer pessoa, exceto se o usuário morto tiver deixado autorização expressa indicando quem deva gerenciá-la.6
Desta forma discorre referente herança de contas de redes sociais, que somente podem ser transformadas em memoriais ou excluídas desde que seja comprovado o óbito, a pedido dos companheiros, cônjuge ou parentes, evidenciando assim a necessidade de certa atividade neste quesito. Conforme citado pelo autor há também o projeto de lei nº 4.847, de 2012 que engloba os bens que podem ser herdados dentro do ambiente digital, no entanto não se é citado como será feito o acesso destes bens pelos favorecidos, o ponto forte da discussão é o rol ser de modo exemplificativo, o que no direito possibilitara ir além destes bens citados, sendo assim a legislação pode abranger até mesmo evoluções futuras de bens que se quer existem.
Referente a necessidade de testamento não há em si uma regra para este quesito, no entanto, entendemos ser importante até o momento até que a legislação defina estas questões fixadas em lei, que por enquanto tramitam no Congresso Nacional. Dentro desse cenário é difícil afirmar com clareza como irá se firmar todas questões discutidas, no entanto podemos dizer que há uma ampla discussão em andamento que seriam de extrema importância para solucionar litígios dentro do judiciário. 4.1
4.1 Natureza dos Bens Digitais
Bens digitais certamente não são físicos dessa forma se caracterizam como ativos intangíveis, conforme citado no artigo de LANA e FERREIRA, (2023).
Juridicamente, bens digitais seriam ativos intangíveis que podem ser comercializados, compartilhados ou distribuídos por meio eletrônico, como arquivos de texto, áudio, vídeo, imagens e softwares. Tais bens são diferentes dos bens físicos, tais como carros, casas e roupas, porque não possuem uma forma física ou tangível.7
Desta forma são intangíveis quanto a sua forma, pois diferem-se de bens físicos, por mais que haja replicações reais do bem, soam como um retrato abstrato, e não são reconhecidos no meio digital.
Podemos dizer que pela doutrina são considerados como bens incorpóreos conforme LÔBO (2023, p.23),
As novas tecnologias de informação têm feito emergir bens incorpóreos que transitam entre a extra patrimonialidade e a patrimonialidade no tráfico jurídico. É o que ocorre com os dados pessoais lançados e transmitidos nas chamadas redes sociais, com as exigências antagônicas de defesa da privacidade e de utilização econômica deles. Um dos problemas emergentes é quanto ao acervo dos dados pessoais (imagens, mensagens, documentos eletrônicos) deixado no ambiente virtual pela pessoa que falece. Redes sociais passaram a facultar ao titular a escolha de um “contato herdeiro” ou “contato de legado”, para administrar suas contas após a morte.8
Os conceitos de extra patrimonialidade e patrimonialidade não estão definidos de forma clara, pode-se imaginar que um acervo de fotos só se tem valor sentimental de uma pessoa, no entanto há também que ser discutido os direitos autorais e intrínsecos da patrimonialidade de um determinado bem, o que seria de certa forma irrenunciável.
Quanto a questão de redes sociais de cunho pessoal o mais próximo que se pode imaginar seria o legado digital, o que não possui natureza de sucessão hereditária, ainda conforme LÔBO (2023, p.23),
A “herança digital” ou o “legado digital” não têm natureza de sucessão hereditária, segundo os atuais padrões legais, mas sim de legitimação para preservação e guarda da memória do falecido. Sem essa escolha prévia, os dados pessoais, que integram o âmago dos direitos da personalidade, ficam indisponíveis a qualquer pessoa, inclusive a seus herdeiros, os quais estão legitimados apenas a defendê-los em caso de ameaça ou lesão (CC, art. 12).9
Desta forma fica somente legitimado a defesa dos direitos da personalidade, que conforme o CC “Art. 12. Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei”. Neste caso os direitos da personalidade empregados seriam a honra e o nome.
4.1.1 Itens em Jogos Eletrônicos
Como já citado na introdução hoje em dia se possuem um acervo de bens digitais, e o qual podemos citar certos bens de valor econômico elevado, em jogos online podemos exemplificar conforme a notícia sob o título: “CS:GO: Skin de AK-47 é vendida por mais de R$ 800 mil – Colecionador chinês comprou a skin que tem quatro adesivos holográficos da Reason Gaming de 201410” divulgada pelo Jornal de Comunicações Globo (Vasques, 2023), que afirma “o diferencial é que ela tinha quatro adesivos holográficos da Reason Gaming, organização que saiu da modalidade em 2020.”
O valor elevado de certos bens digitais, por sua maioria em jogos virtuais, itens ficam raros por questões diversas, neste caso um item que não irá nunca retornar ao mercado visto que a organização Reason Gaming saiu da modalidade de jogo “FPS” na qual está situado o jogo Counter Strike Global Offensive (CS:GO).
Este fato ocorreu da compra de um item por um Chinês, no entanto casos similares ocorrem dentro do cenário jurídico brasileiro, conforme VELOSO, (2023),
Rian Barbosa é o influenciador digital conhecido com Cachorro1337. Ele joga Counter-Striker há sete anos e, como produtor de conteúdo, investe em cosméticos raros.
— Ganho skins, mas dentro do jogo há algumas extremamente raras e quase únicas no mundo, que se eu desejo, tenho que comprar. Na minha última
compra, paguei 16 mil dólares em uma skin muito cobiçada, a Knight, um preço próximo de R$ 80 mil — calcula o influenciador.11
Desta forma podemos afirmar que cada vez mais surge itens e bens digitais valiosos de difícil compreensão para que sejam objeto de herança, por mais que se trate de um bem incorpóreo há bens digitais que possuem um valor similar a bens corpóreos como casas e carros, itens comuns que podem ser deixados de herança já assegurados dentro do direito das sucessões.
4.1.2 Bitcoin, Criptomoedas e Blockchain
No quesito o Direito das Sucessões abrange ativos intangíveis em projetos de Lei, no entanto é um desafio quanto ao Bitcoin que somente é acessado pelo detentor da chave, não há como o Estado interferir após a morte do usuário sem que este deixe suas chaves de acesso, vejamos, conforme MORAES, (2021, p. 11),
O Bitcoin é anônimo como qualquer moeda tradicional em papel. Eles são armazenados em uma carteira digital, sendo que o dono da carteira é o único que tem as credenciais para poder acessá-la. A carteira usa um sistema de criptografia pública, na qual existem duas chaves, uma pública que pode ser livremente distribuída e a outra privada. A chave pública quando distribuída pode possuir dados com o nome do proprietário e o número de sua conta, o que chamamos de Endereço Etherium.
Uma transação de gasto do Bitcoin funciona da seguinte maneira: quem recebe o Bitcoin recebe uma chave pública e o proprietário anterior usa sua chave privada para publicar o registro de anúncio de troca da posse gerando uma nova chave pública. O protocolo do Bitcoin faz o registro de cada transação ocorrida no BlockChain.
[…] Como não existe um regramento jurídico a respeito do uso e das transações com Bitcoins, não há como tecnicamente ou juridicamente reverter o prejuízo do usuário, por isso, é fundamental sempre que se realizar uma operação que se valide os dados de preferência algumas vezes para evitar erros. 12
O Bitcoin na maneira anônima como qualquer moeda tradicional sendo o dono da carteira o único que tem as credenciais para poder acessá-la, na forma de testamento, seria uma das únicas formas de que o proprietário conseguiria deixar suas chaves para que seus sucessores fizessem o acesso, como se fosse um cofre com ouro e a senha estivesse no testamento, no entanto o cofre ainda conseguiria de alguma forma ser violado diferentemente da criptografia, além do que há de se ter responsabilidade com seu uso visto que é irreversível, quanto a transação de valores exorbitantes algumas pessoas utilizam desta técnica de validação, que seria, enviar um valor baixo para conferir se a carteira que está sendo direcionado o Bitcoin está correta, sendo assim caso a chave esteja errada o usuário perderia apenas um valor simbólico.
Conforme MORAES, (2021), “Uma das principais vantagens do Blockchain é permitir que pessoas que não possuem uma relação de confiança entre si troquem informações entre eles de forma segura e de modo inviolável.”, desta forma a blockchain é inviolável, dificultando assim que decisões judiciais interfiram no cenário de redes descentralizadas como no caso do Bitcoin, caberia o usuário deixar sob custódia, visto que em modo de auto custódia somente seria acessada por chaves privativas do usuário.
No sentido de risco jurídico discorre Carvalho, (2021, p.204);
[…] várias são as possibilidades de se regulamentar (exógenamente) as operações com criptoativos. Desde proibi-las até normalizá-las de forma específica, perpassando pela publicação de orientações interpretativas dos diplomas postos e/ou adaptações aos mesmos, ou mesmo ausência de qualquer manifestação estatal oficial. Sendo esse (último) o caso, o trabalho do intérprete jurídico será o de se buscar identificar a finalidade (ou finalidades) a que o criptoativo em análise está sendo destinado, na operação em foco, assim como os eventuais riscos sociais — objeto de proteção jurídica — que o projeto e/ou operação podem atingir, a fim de identificar o regime (ou regimes) jurídico(s) potencialmente aplicáveis. É esse o caso no Brasil atualmente.13
Neste sentido podemos dizer que uma possível regulamentação dos criptoativos iria interferir no cenário de herança e sucessão destes bens, sendo assim de enorme importância para o cenário jurídico apresentado.
4.1.3 Mudança decorrente de Evolução Tecnológica
A constante evolução da internet e da tecnologia implica uma série de mudanças na sociedade e no mundo atual, com isso surge a dificuldade de a legislação já existente atender todos os tipos de matéria, levando este fato a encargo do poder judiciário com a formação de jurisprudências ou através de questões trazidas pela doutrina, isso pode se confirmar conforme a Defensoria Pública do Estado do Paraná,
Segundo defensores públicos do Estado do Paraná, a falta de uma legislação específica sobre o tema deixa para os tribunais a responsabilidade de decidir sobre controvérsias nessa área, e os entendimentos têm variado bastante. Atualmente, diferentes leis atravessam a questão dos bens digitais, como o Marco Civil da Internet, a Lei de Direitos Autorais e as discussões sobre direitos de personalidade.14
Podemos descrever então que o fato de os entendimentos serem variados, não há uma segurança jurídica adequada para a questão, pois não há uma legislação pertinente sobre este sentido, há também leis que atravessam essa questão conforme citado na matéria, há também a LGPD – Lei Geral de Proteção de Dados, que define sobre o tratamento de dados nas redes, portanto o tratamento da herança destes bens digitais também há de se preocupar com a privacidade e os direitos da personalidade do indivíduo, visto que, cada plataforma tem sua política de privacidade, além do respeito a legislação do país em que atua.
Uma das soluções encontradas pelos operadores do Direito, foi o uso de testamento para legitimar a herança destes bens, fundamentada no art. 1.857, §2º, CC/02, que autoriza a disposição testamentária de caráter não patrimonial, isso é, até que ponto um bem digital engloba o patrimônio de um indivíduo pois trata-se de bens intangíveis, e como será possível ter acesso a esses bens em forma de herança, conforme CAPUTE, MACIEL e NUNES, (2024),
Atualmente para legitimar o acesso a herança de bem digital, é possível através da disposição de testamento
os dados e informações contidas em qualquer É prevista também a possibilidade de que o autor da herança disponha em testamento sobre aplicação de internet, bem como das senhas e códigos de acesso. Embora não haja regulação específica sobre os bens digitais — o que é solucionado pela proposta -, essa já é a regra atualmente, pois o artigo 1.857, §2º, CC/02, autoriza a disposição testamentária de caráter não patrimonial. A proposta vai ainda além, estabelecendo que o compartilhamento de senhas ou de outras formas para acesso a contas pessoais serão equiparados a disposições contratuais ou testamentárias expressas para fins de acesso dos sucessores, desde que devidamente comprovados.15
Com isso devemos inicialmente dirimir questões além do que é pessoal, visto que há de ser respeitado os direitos da personalidade presentes no Código Civil, além dos direitos à privacidade do indivíduo, no entanto um inventário de um jogo não tem nada de pessoal visto que são bens intangíveis que não contém conteúdo sensível, no caso de softwares e afins podemos dizer que há um Direito Autoral envolvido, no entanto quando este direito é vendido, há de ser preservado a herança aos famosos Royalties sobre os direitos de uso.
4.1.4 Dados sobre o crescimento de Bens Digitais em jogos no Brasil
Os mais recentes dados sobre o crescimento de bens digitais no Brasil, apontam uma crescente em demanda tanto em variedade de itens, quanto ao interesse dos usuários em itens de jogos virtuais.
Conforme VELOSO, (2023),
Os jogos digitais ganharam espaço na vida e no orçamento dos brasileiros. Segundo a Pesquisa Game Brasil 2023, desenvolvida pelo Sioux Group e Go Gamers, sete em cada dez brasileiros têm o hábito de jogá-los. E entre os jogadores, enquanto há cinco anos apenas 5% compravam moedas dentro dos jogos para consumir em seus mercados virtuais, atualmente já são 30%. Estão à venda: mapas; expansões; elementos “power-ups”, que conferem poderes; e “skins”, que podem ser roupas ou até embelezarem armas (sem aumento de eficiência).16
Sendo assim há uma crescente na procura de diversos itens no ambiente virtual, podendo ser destacado o crescimento deste fato nos jogos digitais, que passou de 5% para 30% em um período de 5 anos conforme pesquisa feita pela Game Brasil em 2023, o que é considerado um período curto para que uma atualização jurídica que consiga atingir todo este cenário.
Os valores desse mercado podem ultrapassar 50 Bilhões ao ano conforme matéria da Forbes Brasil, segundo PACETE, (2022),
Qual o valor de uma skin para um gamer? Essa foi uma das perguntas feitas na pesquisa encomendada pela Forbes Brasil para a Nimo TV, plataforma de conteúdo. Nos jogos, uma skin, ou acessório virtual, pode representar muitas coisas, desde a roupa para vestir o avatar de um competidor até itens como armas e ferramentas que afetam na performance dos jogadores. Estima-se que esse mercado, de venda de ativos virtuais dentro de jogos, movimente mais de US$ 50 bilhões ao ano.17
O valor intrínseco de bens digitais eleva a importância da discussão referente aos ativos digitais visto que há uma imensidão de mercados disponíveis sejam eles no cenário das criptomoedas, jogos eletrônicos, e itens na blockchain em geral, urge a necessidade de segurança jurídica diante a questões complexas, visto que a tendência de mercado é que itens digitais cresçam conforme a demanda dos usuários.
A precificação destes itens ainda é de certa forma determinada pela oferta e demanda conforme o desejo dos usuários sobre os itens em si, verificamos que esta questão é recorrente no cenário dos jogos virtuais e do público gamer.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Desta forma concluímos que há grandes desafios nas questões do Direito para que consigam se adequar ao cenário digital, a legislação em si formula para se abranger bens intangíveis, contas em redes sociais, criptomoedas, no entanto ainda há muitos desafios a serem quebrados para que haja a total garantia de que isso seja possível, o fato é de que atualmente para que haja total garantia se depende da manifestação de vontade através da elaboração do testamento, o que se difere de um direito adquirido em si.
Contudo a discussão sobre a herança digital e a sucessão de bens intangíveis revela-se essencial no contexto atual, em que a digitalização permeia todos os aspectos da vida cotidiana. A crescente importância dos bens digitais, como contas de redes sociais, criptomoedas e itens em jogos eletrônicos, exige uma revisão e evolução crítica da legislação atual para garantir que os direitos dos herdeiros legítimos sejam adequadamente protegidos.
Entretanto os projetos de lei em tramitação, que visam incluir disposições sobre a herança digital no Código Civil e no Marco Civil da Internet, representam um avanço significativo. A falta de regulamentação específica cria incertezas quanto ao acesso e à gestão desses bens pelos herdeiros, evidenciando a necessidade de uma abordagem mais clara e abrangente.
Sendo assim, a distinção entre a herança digital e os direitos da personalidade de nome e questões de direito autoral devem ser cuidadosamente consideradas em redes sociais, a fim de preservar a memória e a dignidade do falecido, enquanto se assegura que os herdeiros tenham acesso adequado aos ativos digitais deixados.
Por fim, a evolução tecnológica e as mudanças nas dinâmicas sociais impõem a implementação de disposições testamentárias para regular a herança digital é uma solução prática, mas é fundamental que a legislação evolua a ponto de garantir segurança jurídica em cenários mais críticos como no caso da herança de criptoativos registrados em blockchain de forma pública no entanto sendo inviolável, dificultando inclusive que se surta efeito decisões judiciais diante do cenário das redes descentralizadas.
4 MARCONI, Marina de A.; LAKATOS, Eva M. Metodologia Científica. 8th ed. Rio de Janeiro: Atlas, 2022. E-book. p.278. ISBN 9786559770670. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/reader/books/9786559770670/. Acesso em: 19 abr. 2024.
6 TARTUCE, Flávio. Direito Civil: Direito das Sucessões. v.6. 16th ed. Rio de Janeiro: Forense, 2023. E-book. ISBN 9786559646975. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/reader/books/9786559646975/. Acesso em: 18 out. 2024.
7 LANA, Henrique Avelino; FERREIRA, Fernandes Ferreira. A herança digital e o direito sucessório: nuances da destinação patrimonial digital. Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, 2023. Disponível em: https://ibdfam.org.br/artigos/1989/A+heran%C3%A7a+digital+e+o+direito+sucess%C3%B3rio%3A+nuances+da+destina%C3%A7%C3%A3o+patrimonial+digital#:~:text=Por%20outro%20lado%2C%20juridicamente%2C%20bens,%2C%20v%C3%ADdeo%2C%20imagens%20e%20softwares. Acesso em 05 de jun. 2024
8 LÔBO, Paulo. Direito civil: sucessões. v.6. 9th ed. Rio de Janeiro: Saraiva Jur, 2023. E-book. p.23. ISBN 9786553628212. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/reader/books/9786553628212/. Acesso em: 15 abr. 2024
9 LÔBO, Paulo. Direito civil: sucessões. v.6. 9th ed. Rio de Janeiro: Saraiva Jur, 2023. E-book. p.23. ISBN 9786553628212. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/reader/books/9786553628212/. Acesso em: 15 abr. 2024.
10 Vasques, Ariela. Skin de AK-47 é vendida por mais de R$ 800 mil. Grupo Globo. Esports, 2023. Disponível em: https://ge.globo.com/esports/csgo/noticia/2023/03/15/c-csgo-skin-de-ak-47-e-vendida-por-mais-de-r-800-mil.ghtml. Acesso em 18 abr. 2024.
11 EXTRA. Games: mais de 20% das pessoas que jogam no Brasil gastam com skins, itens de embelezamento virtuais. Extra, 12 dez. 2023. Disponível em: https://extra.globo.com/economia/post/2023/12/games-mais-de-20percent-das-pessoas-que-jogam-no-brasil-gastam-com-skins-itens-de-embelezamento-virtuais.ghtml. Acesso em: 19 out. 2024.
12 MORAES, Alexandre Fernandes de. Bitcoin e Blockchain: a revolução das moedas digitais. Rio de Janeiro: Expressa, 2021. E-book. p.11. ISBN 9786558110293. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/reader/books/9786558110293/. Acesso em: 18 out. 2024.
13 CARVALHO, Uhdre, Dayana de. Blockchain, tokens e criptomoedas: análise jurídica. São Paulo: Almedina Brasil, 2021. E-book. p.204. ISBN 9786556271859. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/reader/books/9786556271859/. Acesso em: 19 out. 2024.
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16 VELOSO, Ana Clara. Games: mais de 20% das pessoas que jogam no Brasil gastam com skins, itens de embelezamento virtuais. Extra, 12 dez. 2023. Disponível em: https://extra.globo.com/economia/post/2023/12/games-mais-de-20percent-das-pessoas-que-jogam-no-brasil-gastam-com-skins-itens-de-embelezamento-virtuais.ghtml. Acesso em: 19 out. 2024.
17 PACETE, Luiz Gustavo. Por que os gamers valorizam tanto as roupas e acessórios virtuais. Forbes, Rio de Janeiro, 15 mar. 2022. Disponível em: https://forbes.com.br/forbes-tech/2022/03/por-que-os-gamers-valorizam-tanto-as-roupas-e-acessorios-virtuais/. Acesso em: 19 out. 2024.
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1 Acadêmico de Direito. E-mail: hugo.silva@faculdadesapiens.edu.br. Artigo apresentado a Unisapiens, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Direito, Porto Velho/RO, 2024.
2 Acadêmico de Direito. E-mail: david.leite@faculdadesapiens.edu.br. Artigo apresentado a Unisapiens, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Direito, Porto Velho/RO, 2024.
3 Professor Orientador. Professor do curso de Direito. E-mail: jennifer.gomes@gruposapiens.com.br