OS DESAFIOS DA INCLUSÃO DE ALUNOS SURDOS NO ENSINO FUNDAMENTAL

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.12191542


Chiara Batista Gaia1
Milvio da Silva Ribeiro2


RESUMO:  O presente artigo analisa os desafios da inclusão dos alunos surdos no ensino fundamental.   Pautamos na abordagem qualitativa, do tipo estudo de caso. Como instrumento de coleta de dados utilizamos entrevistas semi estruturadas, as análises dos dados seguiu as orientações da análise de conteúdo. Como referencial teórico pautamos:  em Mantoan (2006), Caio; Carvalho (2008), Brasil (2005), Sant’ana (2005), Vieira; Castro (2020), entre outros. Os dados revelaram que a inclusão de alunos surdos ainda são grandes desafios, principalmente no ensino fundamental. A inclusão dos alunos surdos no processo ensino-aprendizagem não coadunam com a legislação, uma demanda que precisa ser superada para que se possa construir uma educação verdadeiramente igualitária.

Palavras-Chave: Inclusão; Ensino-aprendizagem; Políticas públicas educacionais.

INTRODUÇÃO

É lamentável que em pleno século XXI ainda estarmos discutindo a inclusão de pessoas surdas na sociedade. Historicamente as pessoas com deficiências não eram bem vistas nos meios sociais, sempre tiveram dificuldades de se relacionar um com os outros, eram pessoas discriminadas em todos os sentidos, sem condições de crescimento socioeconômico, político e culturalmente. “Desde o início das civilizações as pessoas com deficiência não eram consideradas ajustáveis aos padrões da normalidade, estavam à margem da sociedade, por esta entender que o indivíduo com deficiência era um castigo dos deuses para seus familiares” (Vierira; Castro, 2020, p.28).

Uma das instituições que iniciou a questionar a discriminação das pessoas com deficiências foi a igreja católica, pregando que todas as vidas importam, independentemente de qualquer natureza, isso chamou atenção da sociedade para analisar a sociedade a partir da diversidade independentemente das suas condições físicas. Essas ideias foram fundamentais para surgir instituições, conventos e lutas em prol das pessoas com deficiências, principalmente as surdas. ‘Somente no início da idade contemporânea que surgiram as ideias de luta que buscaram a integração e inclusão das pessoas com deficiência na sociedade, inclusive as das pessoas surdas […]”. (Vierira; Castro, 2020, p.28).

No Brasil, a inclusão das pessoas é garantido na Constituição Federal de 1988 e na LDB/96, esta por sua vez garante nos artigos 58 e 60 o direito de frequentar as escolas na rede regular de ensino. Um avanço importante para a sociedade e para a educação brasileira. Em outros termos, uma conquista da sociedade, que historicamente vem lutando para que as pessoas usufruam de seus direitos educacionais.

Para dar conta de analisar a temática proposta, a presente pesquisa seguiu o seguinte questionamento: como se efetiva a inclusão de alunos surdos no processo ensino-aprendizagem na Educação Básica, com destaque para o ensino fundamental? A partir do questionamento proposto, o presente artigo objetiva analisar a efetivação da inclusão dos alunos surdos no processo ensino-aprendizagem na escola do ensino fundamental.

É uma pesquisa qualitativa do tipo estudo de caso, apoiada no materialismo histórico dialético, como instrumento de coleta de dados apoiamos na entrevista semi-estruturada. Para contribuir nas informações, contamos com o apoio de dois professores e dois alunos que frequentam a escola escola ribeirinha Raimundo Corrêa no município de Cametá-Pará.

O texto está dividido em duas partes, a primeira reportamos a trajetória da pesquisa, destacando os procedimentos metodológicos do estudo. Na segunda parte, analisaremos os desafios dos alunos surdos no contexto da educação brasileira. Na terceira parte, focamos nas análises dos dados a partir do lócus da pesquisa. Por fim, as considerações finais, destacando as sínteses da conclusão da pesquisa.     

A TRAJETÓRIA DA PESQUISA

A presente pesquisa pautou-se na abordagem qualitativa, de modo que essa por sua vez proporciona uma concepção ampla do objeto pesquisado, ao mesmo tempo possibilita especificar o que se quer desvendar do fenômeno estudado. 

Na pesquisa qualitativa o pesquisador procura reduzir a distância entre a teoria e os dados, entre o contexto e a ação, usando a lógica da análise fenomenológica, isto é, da compreensão dos fenômenos pela sua descrição e interpretação. As experiências pessoais do pesquisador são elementos importantes na análise e compreensão dos fenômenos estudados (Trivinhos, 1987, p. 137).

Essa concepção de pesquisa é a mais adequada para analisar os desafios educacionais dos alunos surdos na escola ribeirinha Raimundo Corrêa Cruz, levando em conta aspectos de vivências e práticas sociais que envolvem o pesquisador, pois reduz-se a distância entre teoria, contexto e ação, uma que a lógica racional remete para compreender a descrição do fenômeno estudado. Na abordagem qualitativa as experiências de interpretação do pesquisador são fundamentais para contribuir na análise do objeto, a fim de que possam ter clareza nas  interpretações, bem como os processos formativos dos conhecimentos.

Apoiamos ainda no materialismo histórico dialético, de modo que essa concepção possibilita analisar o objeto pesquisado de forma ampla a partir da realidade vivenciada. Para  Trivianos (1987, p.53) “é uma concepção filosófica e método científico que defende que o ambiente o organismo os fenômenos físicos então em constantes movimentos”, ou seja, permite analisar as relações estabelecidas entre sujeitos e suas conexões com os processos de mudança social.

Com este método poderemos analisar a interpretar a inclusão do aluno surdo e seu desafio no processo ensino-aprendizagem a partir da escola Raimundo Corrêa Cruz no município de Cametá-PA.

A E.M.E.F Raimundo Corrêa Cruz localidade Guajará município de Cametá-PA, está  situada na região do baixo Tocantins, na mesorregião do nordeste paraense. Os sujeitos da pesquisa foram dois professores e dois alunos que frequentam a escola citada.  Os critérios para a seleção desses sujeitos pautaram na relação direta que eles possuem com a inclusão, os professores entrevistados trabalham mais de cinco anos a inclusão, possuem larga experiência com o objeto pesquisado. Os alunos entrevistados possuem alguma necessidade especiais com surdez.

Como instrumento de coleta de dados utilizamos a entrevista semiestruturada aberta e aplicada aos professores selecionados, entendemos que as entrevistas podem ser vistas como instrumento que possibilita informações importantes. (Marconi e Lakatos, 1982, p.146). O procedimento de análise de dados seguiu as orientações da análise de conteúdo, segundo Severino (2007, p.121) “é uma metodologia de tratamento e análise de informações constantes de um documento sob forma de discursos pronunciados em diferentes linguagens; escritas, orais, imagens e gestos”. O objetivo da análise supracitada é compreender criticamente no sentido das comunicações seu conteúdo manifesto ou latente, os significados explícitos ou ocultos” (Chizzotti, 2010, p.98).

Compreendemos […] “que a dinâmica das releituras sucessivas dos materiais coletados deve possibilitar a divisão em seus elementos componentes, sem o conteúdo, perder de vista as relações desses fatores com todos os outros componentes” (Ludke, Menga, 1998, p. 48) como forma de “ expressão da existência humana que, em diferentes momentos históricos, elaboram e desenvolvem representações sociais no dinamismo-internacional que estabelece entre os saberes, linguagens e pensamentos representada ação” (Franco, 2007, p. 13).

No momento da análise a descoberta de informações importantes às vezes não aparece de maneira explícita do material coletado, tendo em vista que […] “é preciso que a análise não se restrinja ao procure está explícito no material, mas, de outros modos procure ir mais a fundo, desvendando mensagens implícitas, dimensões contraditórias e temas sistematicamente silenciados” (Ludke, Menga, 1998, p. 48), pois este procedimentos no momento de análise permite buscar novos dados complementares ou mais específicos que testem suas interpretações em processo de “sintonia” que vai até análise final (Alves-Mazzotti e Gewadsznader, 1998, p. 170).

OS DESAFIOS DOS ALUNOS COM SURDEZ NO ENSINO FUNDAMENTAL  

A educação inclusiva se apresenta como um dos caminhos a percorrer dentro de políticas públicas de educação, possibilitando aos alunos,  engajamentos na construção de seus conhecimentos, possibilitando a autonomia e estimulando as habilidades e capacidades cognitivas, inerentes aos processos formativos de aprendizado no ambiente escolar, pois é necessário que a educação favorece, para os sujeitos experiências que possam contribuir para o desenvolvimento das funções psicológicas superiores, a linguagem e outras faculdades irenete as condições humanas.

A inclusão proporciona a interação social e educacional entre indivíduos com características diversificadas. Além disso, oferece à própria sociedade a convivência com o diferente para que haja o rompimento de preconceitos, uma vez que as relações acontecem naturalmente num ambiente em que todos buscam novos conhecimentos. (Vierira; Castro, 2020, p.29).

A lei de diretrizes e base da educação nacional LDBN nº 9394/ destaca que educação especial, a modalidade de educação escolar, deve ser oferecida preferencialmente na rede regular de ensino para educandos com deficiências, transtorno do desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação, dando-lhes condições necessárias para potencializar suas capacidades na ação educativa dos conhecimentos. Porém, para isso não basta somente oferecer escola, é necessário as estruturas adequadas para garantir o processo ensino-aprendizagem com qualidade aos alunos, principalmente os com surdos (Sant’Ana,2005).  

A inclusão dos alunos surdos requer reconhecimento para além dos instrumentos legais, como estratégias de ensino que permita a participação, a integração nos processos de socialização dos saberes, das práticas sociais inerentes às necessidades formativas do aprendizado, uma vez que, além de ser integrado a rede de ensino regular, a lei retrata que haverá especificidade no trato de questões específicas com profissionais habilitados que possa oferecer suporte no processo formativo. (Sanches; Teodoro, 2006).

Os alunos surdos precisam ser vistos como sujeitos ativos de sua aprendizagem, capaz de romper  os desafios para promover a inclusão no processo ensino-aprendizagem, permitindo  acesso às informações necessárias para fortalecer o potencial criador na ação do aprendizado escolar.

A Educação Inclusiva envolve a compreensão do papel importante dos diferentes graus de dificuldade e de complexidade que confrontam os professores e os alunos no processo de aprendizagem, desafiando os educadores a serem criativos e provocaram a ruptura com ideias e juízos de valores preconcebidos, rompendo as representações minimizadas que se tem dos alunos com deficiência. (Vierira; Castro, 2020, p. 30).

A inclusão do aluno surdo, principalmente na escola ribeirinha Raimundo Corrêa no município de Cametá-Pará os desafios são maiores ainda, de modo que esse estabelecimento de ensino estar situada numa região distante do centro urbano, as dificuldades são de todas as ordem, como formação de professores adequados para atender os educandos, falta de estruturas nas escolas, entre outros fatores necessários para possibilitar a inclusão.

 Os profissionais para contribuir com a formação dos alunos surdos precisam entender dos fundamentos teóricos, que apontam para a importância da inclusão que proporcione  integrar o educando surdo numa perspectiva crítica, reflexiva e transformadora das realidades do mundo social, contribuindo para vida pessoal, social e profissional.

A articulação entre os educadores é urgente, pois existe a necessidade de uma redefinição do papel do professor e de sua forma de atuar, no pensamento sistêmico. É necessário pensar na aprendizagem como um processo cooperativo e de transformação que proporcione a formação de alunos inseridos no mundo, e não mais em apenas uma comunidade local. Finalmente pensar na educação em relação aos aspectos da ética, da estética e da política; a educação fundamentada em um ideal democrático (Farfus, 2008, p. 30).

É esse o profissional que precisa estar nas escolas, capaz de fazer as ações que proporcione a inclusão dos alunos com necessidades especiais, que reconhece as limitações dos educandos, mas ao mesmo tempo, incentive construir posturas de enriquecimento pessoal, que construa clima saudável no espaço escolar, onde todos da comunidade escolar senta-se acolhidos pelo ambiente proporcionado para a inclusão de todos. Que construa relações de inclusão do aluno surdo na perspectiva da integração, participação nas atividades desenvolvidas pela escola.

Pensar numa educação de integração social, faz-se necessário compreender a inclusão em todos os sentidos da condição humana, seja físico, social, político entre outros. Em outros termos, uma educação tem por finalidade proporcionar condições essenciais para a vida, no sentido de valorizar os outros. Dessa forma, estar-se exercendo cidadania, ao mesmo tempo atribuindo para o desenvolvimento da participação ativa dos sujeitos no âmbito da sociedade como um todo.

A inclusão escolar caracterizada como movimento de ação, requer acolhimento, participação e integração nos processos de aquisição do aprendizado do aluno surdo, ou seja, requer a valorização como pessoa, independentemente de sua condição física. A sociedade precisa aprender a respeitar direito assegurado na legislação educacional brasileira, ao mesmo tempo, compreender as especificidades de cada cidadão, como por exemplo as pessoas surdas.

As escolas precisam se organizar para ter um ambiente com um contexto linguístico adequado para os Surdos, buscando um êxito na sua educação, para isso as escolas devem perceber que a língua de sinais seja uma garantia de direito do Surdo para usar sua língua natural durante a interação em sala de aula com os colegas (Ferrão; Lobato, 2016, p. 35).

Não é possível pensar na inclusão de alunos surdos sem a formação de professores com domínios da língua de sinais, essa linguagem é de fundamental importância para manter os alunos inteirados do que está acontecendo em sala de aula. Ausentar os educandos/as da linguagem é proporcionar a exclusão do convívio social, o ser humano por essência é o ser da comunicação, essa por sua vez não proporciona somente a comunicação, mas um conjunto de ações capaz de inserir o sujeito no contexto das relações sociais. Lobato, Amaral e Silva (2016, p. 11) destacam que “dentre as propostas educacionais para a melhoria da escolarização de Surdos está a formação do professor, porém, não é simples qualificar professores, sobretudo, no contexto sócio-político vigente”.

Os desafios de formar professores para desenvolver a inclusão em sala de aula, estar articulado com a concepção de sociedade que historicamente o Brasil vem passando, uma postura política conservadora, centrada numa concepção de escola mercadológica, onde prevalece o lucro. O que tem se observado hoje no contexto das políticas educacionais brasileiras, são ações do Estado que se articulam com os grandes empresários nacionais e internacionais para proporcionar as diretrizes e normas para as políticas públicas educacionais brasileiras, em outros termos, o processo do ensino-aprendizagem da escola é pensada a partir das empresas em gerar lucros. “Na educação básica, grandes grupos privados de capital aberto se movimentam, focalizando a educação básica para atender os novos requisitos fixados pela BNCC e a reforma do ensino médio” (Piolli, 2018, p. 103).

Isso demonstra que analisar a inclusão dos alunos surdos no contexto da educação básica, com destaque para o ensino fundamental, faz-se necessário compreender o contexto histórico da educação brasileira, essa por sua vez ainda não é prioridade do Estado brasileiro, de modo que não construído políticas públicas efetivas que garantam de fato fazer valer os direitos dos alunos com deficiências, principalmente os surdos no processo ensino-aprendizagem das escolas do ensino fundamental.  

Conforme Sassaki (1999, p. 20), a educação inclusiva tem como objetivo a “construção de uma sociedade para todos”, e, assim, sua prática repousa em princípios até então considerados incomuns, tais como: a aceitação das diferenças individuais, a valorização de cada pessoa, a convivência dentro da diversidade humana, a aprendizagem através da cooperação entre outros elementos que têm conceitos e ideias diferentes.

Para Mantoan (2003, p. 15), a “Inclusão de alunos deficientes é um movimento que tem sido muito polemizado por diferentes segmentos”, mas essa inserção nada mais é do que garantir o direito constitucional que todos independentes de suas necessidades, têm a uma educação de qualidade, e que a Inclusão vai depender da capacidade de lidarmos com a diversidade e as diferenças. O autor citado chama atenção para os desafios da  repetência, evasão e baixa qualidade do ensino. Sendo atribuída a elas vários culpados, como o governo, a sociedade, a criança, a família, a escola, os professores. Há preocupação em achar culpado do que resolver tais problemas a partir de políticas públicas inclusivas que desperte o sentimento de uma educação para todos.

A INCLUSÃO DOS ALUNOS SURDOS A PARTIR DA E.M.E.F RAIMUNDO CORRÊA CRUZ

Este tópico trata-se das análise dos dados pesquisados, onde iremos discorrer sobre o posicionamento dos professores assim como as falas dos alunos. Em outros termos, confrontar o que diz a legislação sobre a inclusão de alunos surdos com a realidades desses sujeitos no contexto da sala de aula. Dessa forma será possível compreender a concepção de inclusão presente na escola pesquisada, ao mesmo tempo tirarmos inferências para a realidade da educação inclusiva no contexto da educação básica brasileira, com destaque para o ensino fundamental.

Umas das perguntas direcionado para o professor D que trabalha na turma que tem um aluno surdo, respondeu que torna-se difícil desenvolver metodologia para os alunos surdos, visto que mesmo o professor possuindo algumas noções de língua de sinais a dificuldade é presente.

Sinto dificuldade de trabalhar com os alunos surdos, mesmo eu tendo algumas noções de língua de sinais a dificuldade é presente, de modo que os desafios não estar somente na comunicação, mas em desenvolver as atividades, como somente eu entendo o que o aluno diz, outros alunos não tem como colaborar, ás vezes ainda atrapalha ( Professor, D).

A fala do professor revela a contradição que assegura LDB/96, onde todos os alunos devem estar matriculados em sala de aula regular, porém não basta somente estar na escola, é preciso construir estruturas adequadas para que os alunos sintam-se integrados na sala de aula como toda. Ou melhor, onde todos os alunos e dentre estes, os que apresentam necessidades educacionais especiais: a) de acesso ao currículo; b) de participação integral, efetiva e bem-sucedida em uma programação escolar tão comum quanto possível; (BRASIL, 1996, p. 7).

Conforme Sassaki (1999, p.42), a educação inclusiva tem como objetivo a construção de uma sociedade para todos, e, assim, sua prática: “[…] repousa em princípios até então considerados incomuns, tais como: a aceitação das diferenças individuais, a valorização de cada pessoa, a convivência dentro da diversidade humana, a aprendizagem através da cooperação”, porém mais do que isso, a inclusão tem uma dimensão ampla que ultrapassa os limites do próprio ato de ensinar, aprender e conviver.

Essa concepção de de inclusão requer um conjunto de fatores, como por exemplo formação de professores adequados para trabalhar com os alunos surdos, na escola pesquisa essa é uma demanda tímida, as políticas públicas municipais não têm apresentado formação específica para os professores desenvolvem atividades com os alunos com necessidades especiais, como por exemplo os surdos.

Faz tempo que tivemos formação específica para trabalhar com os alunos com necessidades especiais, como por exemplo os alunos surdos, o que sei tive que correr atrás, fiz curso de especialização por minha própria responsabilidade, não tive ajuda de governo, tive que tirar do bolso para pagar meu curso, mas consegui, hoje estou aqui com esses alunos. ( Professor, C).  

A formação para trabalhar com os educandos/as surdos vai além de uma formação em curso de graduação e especialização, requer compreender a necessidade humana em todos os sentidos, se posicionar na situação do outro faz todo sentido quando se trata de inclusão. A “política inclusiva exige intensificação quantitativa e qualitativa na formação de recursos humanos e garantia de recursos financeiros e serviços de apoio pedagógico públicos e privados especializados para assegurar o desenvolvimento educacional dos alunos”. (MANTOAN, 2006, p. 59) dentro de uma perspectiva de ensino articulados com a vida e o mundo social dos estudantes.  

A formação do professor na perspectiva da inclusão, requer que esse profissional compreenda e desenvolva metodologia em sala de aula que atenda as necessidades dos alunos com necessidades especiais, principalmente os surdos. No âmbito de sala de aula, Caio; Carvalho (2008) conceitua adaptação curricular como um “conjunto de estratégias que permitem flexibilizar os conteúdos do currículo de modo a permitir a todos estabelecer relações com o saber”. Em outros termos, o professor deve construir estratégias de aprendizagem, capazes de atender satisfatoriamente todos os alunos.

Fico feliz quando o professor me entende, quando ele me compreende, quando ele sabe o que quero, quando tiro minha duvida sobre uma atividade que não sei, tenho um professor que se preocupa com a minha aprendizagem, percebo que ele se esforça para que eu entenda o que ele está falando, se preocupa com minha formação ( Aluno, F).

A fala do aluno destaca o esforço que o professor faz para contribuir com o processo ensino-aprendizagem dos alunos surdos. Porém, é sabido que somente o esforço do professor não é suficiente, é necessário que o estabelecimento de ensino disponibilize recursos adequados para atender os alunos com necessidades especiais, como por exemplo, os alunos surdos.     Em outros termos, a escola precisa assumir compromisso  de educar a todos os alunos sem exceção, inclusive alunos com deficiência cujos princípios e diretrizes foram introduzidos com veemência, a partir da Declaração de Salamanca (1994), que considerou a educação como fundamentos para compreender o desenvolvimento humano na sociedade.

O Decreto 5.626 de 22 de dezembro de 2005 destaca que:

[…] II – ofertar, obrigatoriamente, desde a educação infantil, o ensino da Libras e também da Língua Portuguesa, como segunda língua para alunos surdos; III – prover as escolas com: a) professor de Libras ou instrutor de Libras; b) tradutor e intérprete de Libras – Língua Portuguesa; c) professor para o ensino de Língua Portuguesa como segunda língua para pessoas surdas (BRASIL, 2005, s/n).

São essas e outras estruturas que a escola deve disponibilizar para que os alunos possam se apropriar do processo ensino-aprendizagem com qualidade, sem o ensino de libras, ou intérpretes de libras e outros recursos interrelacionados fica difícil inserir os alunos surdos nas interações com o conhecimento em sala de aula. Como já foi mencionado, a formação do professor na perspectiva da inclusão requer o domínio dos códigos necessários para interagir com os educandos surdos.

Quando o professor domina a língua de sinais ou algum intérprete para comunicar comigo, facilita muito minha interação com o professor e com o conhecimento, mas tem hora que não entendo o que o professor quer dizer, me atrapalho na comunicação, às vezes tenho vergonha de ficar perguntando o que ele quer dizer ( Aluno, G).   

Os alunos com necessidade educacionais especiais, principalmente os surdos não estão totalmente satisfeitos com o processo metodológico do professor em sala de aula, de modo que os educandos sente-se necessidade de melhor esclarecimento sobre o conteúdo repassado, às fala dos educandos surdos demonstra a timidez diante das dúvidas apresentado pelo professor. Ou melhor, quando o professor não domina a língua de sinais, cria obstáculos na comunicação com os alunos, isso dificulta a apropriação do conhecimento.

 A formação de docentes para o ensino de Libras nas séries finais do ensino fundamental, no ensino médio e na educação superior deve ser realizada em nível superior, em curso de graduação de licenciatura plena em Letras/Libras ou Letras: Libras/Língua Portuguesa com segunda língua (BRASIL, 2005, p. 2).  

O aluno deficiente não tem o dever de se adaptar ao ambiente escolar, ao contrário é a  escola que deve promover mudanças para que os alunos sejam incluídos. A escola deveria ter responsabilidade para com as dificuldades dos alunos, ao mesmo tempo, definindo um método de ensino que proporcionasse de forma igualitária aos outros alunos, dando-lhes oportunidades para desenvolver seu potencial criativo do saber escolar.

Apesar das conquistas desenvolvidas no campo da legislação da educação com necessidades especiais, principalmente para com os alunos surdos, a pesquisa demonstrou que ainda as escolas da educação básica, com destaque para o ensino fundamental, encontra-se distante do que se encontra na legislação, de modo que os direitos assegurados historicamente precisam avançar cada vez mais, de modo que os alunos surdos sente-se dificuldades de apropriar do conhecimento escolar devido às limitações nos recursos adequados para interação em sala de aula.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa tratou de analisar os desafios da inclusão dos alunos surdos a partir da E.M.E.F. Raimundo Corrêa Cruz no município de Cametá-PA, para dar conta e desvendar a inquietação do estudo, questionamos os desafios dos alunos surdos na apropriação do ensino-aprendizagem na escola básica, com destaque para o ensino fundamental. Os dados revelaram que esses sujeitos ainda encontram sérias dificuldades na apropriação de conhecimento em sala de aula devido carências de suporte adequados para suas limitações. 

  As dificuldades aumentam ainda mais na escola pesquisa por se tratar de um estabelecimento de ensino situado no campo da Amazônia ribeirinha, ou seja, às margens do rio Tocantins, distante do centro urbano. Essa localização dificulta o acesso de suporte adequado para suprir as necessidades dos alunos surdos em sala de aula, como por exemplo, contratação de professor de Libras, ou intérprete da língua.

Isso demonstra que mesmo com os avanços nas políticas públicas educacionais no campo da inclusão, presente na Constituição Federal e LDB/96, ainda necessita materializar essas conquistas no contexto da escola básica, como por exemplo o ensino fundamental.  Para Sant’Ana (2005), pensar na inclusão requer a articulação de um conjunto de fatores inter relacionados, como por exemplo, a construção de parceria escola como a família, formação de professores adequados para atender as necessidades dos surdos, estruturas das escolas compatível com as necessidades dos alunos entre outros.

A pesquisa demonstrou que os alunos são desafiados todos os dias para apropriação do conhecimento escolar, de modo que os entraves na aprendizagem são provocados pela falta de estruturas que dêem conta de atender esses alunos. Isso demonstra que as políticas públicas educacionais direcionadas para a inclusão ainda estão distante das escolas que situam no campo, uma contradição daquilo que está na legislação com a realidade dos educandos no contexto da sala de aula.

Para Mantoan (2005),  a inclusão dos alunos surdos não se restringem somente a sala de aula, é uma política que vai para além do estabelecimento de ensino, necessita construir consciência coletiva com a sociedade como toda, no sentido de proporcionar uma atmosfera segura para os alunos com necessidades especiais, como os surdos. Em outros termos, a inclusão é construir espaços em todos os sentidos para que as pessoas com necessidades especiais, com destaque para os surdos sintam-se inseridos em todos os espaços que necessitam para viver, essa concepção de inclusão ainda é um desafio para o tipo de sociedade vigente.  

Incluir os alunos surdos no processo ensino-aprendizagem com sucesso faz-se necessário que os professores dominem as línguas de sinais, para comunicar com os educandos de forma satisfatórias, ou seja, que os alunos compreendem todas as orientações de aprendizagem proferida pelo educador. Por outro lado, a escola necessita estar equipada de estruturas adequadas para acolher  os alunos independentemente de suas limitações, um espaço acolhedor é um grande avanço na política de inclusão.

Evidentemente que a pesquisa não conseguiu analisar outras demandas dos alunos surdos, mas possibilitou demonstrar que na escola do campo as dificuldades são ainda maiores em relação às escolas urbanas, de modo que as escolas do campo são distantes das administrações públicas, muitas vezes os suportes necessários para atender uma educação inclusiva torna-se desafiador, como por exemplo, contratar professores com formação na perspectiva da inclusão não é fácil, mesmo por que para esse profissional atender uma escola escola do campo também precisa de suporte para sua estadia.

A pesquisa demonstrou que a política da inclusão na educação básica, ainda é um desafio para as escolas brasileiras, principalmente para as escolas do campo, essa por sua vez não possuem estruturas adequadas e nem profissionais capacitados para atender os alunos com necessidades especiais, como os surdos, uma realidade que precisa ser combatido por todo o conjunto da sociedade.   

REFERÊNCIAS

ALVES, Mazzotti, ALDA, Judith, GEWNDSZNAJZER, Fernando. O método das ciências sociais: Pesquisa quantitativa e qualitativa, 2º. ed. são Paulo; pioneira, 1998.

BRASIL. LDB – Lei nº 9394/96, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília: MEC, 1996.

BRASIL. Lei 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 16 jul. 1990.

BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidente da República, [2016].

BRASIL. Decreto n. 5.626 de 22 de dezembro 2005. Regulamenta a Lei no 10.436, de 24 de abril de 2002, que dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais – Libras, e o art. 18 da Lei n o 10.098, de 19 de dezembro de 2000. Brasília, 2000.

CAIO, R. B, CARVALHO, R; SIMOES. Metodologia de pesquisa e produção de conhecimento. Petrópolis: Vozes, 2008.

CHIZZOTTI, Antônio. Pesquisa em ciência humanas e sociais. 6º ed. São Paulo: Cortez, 2010.

DECLARAÇÃO DE SALAMANCA: Sobre Princípios, Políticas e Práticas na Área das Necessidades Educativas Especiais. Salamanca, 1994. Disponível em: http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/salamanca.pdf. Acesso em: 12 maio 2018.

FRANCO, Maria Laura. Análise de conteúdo. Brasileira: Liber. Livro, 2007.

FARFUS, D. Organização pedagógica dos espaços educativos. Disciplina: Organização Pedagógica Espaços Educativos do curso de Pedagogia EaD da FACINTER. Curitiba: [S.n.], 2008.

FERRÃO, C. P; LOBATO, H. K. G. A inclusão do aluno surdo no ensino regular na perspectiva de professores do ensino fundamental. In: Diálogos sobre inclusão escolar e ensino-aprendizagem da Libras e língua portuguesa como segunda língua para surdos. Belém-Pará: UFPA, 2016, p. 179.

LAKATOS, Evan M.; Marconi, Mariana de. Metodologia do Trabalho Cientifico. 6. Ed.; São Paulo: Altas, 1982.

LUDKE. Menga; ANDRÉ, Marli E.D.A. Pesquisa em Educação: abordagem qualitativa. 6. Edição. São Paulo, 1998.

LOBATO, H. K. G; AMARAL, H. N. S; SILVA L. F. R. Análises e reflexões sobre a inclusão escolar de alunos surdos no ensino regular. In: Diálogos sobre inclusão escolar e ensino-aprendizagem da Libras e língua portuguesa como segunda língua para surdos. Belém-Pará: UFPA, 2016, p. 179.

MACHADO, Nilson José. Educação: projetos e valores. São Paulo: Escritores Editora, 2000.

MANTOAN, Maria Tereza Egeer. Inclusão escolar: o que é? Porque? Com. Fazer? São Paulo: moderna, 2006.

MITTER, Peter. Educação inclusiva: contextos sociais. trad. Wendy, Bragão Ferreira. Porto alegre, 2003.

PIOLLI, Evaldo. Mercantilização da educação, a reforma trabalhista e os professores: o que vem por aí?. In: KRAWCZYK, Nora; LOMBARDI, José Claudinei (Orgs.). O golpe de 2016 e a educação no Brasil. Uberlândia: Navegando Publicações, 2018.

SEVERINO. Antônio Joaquim. Metodologia do Trabalho Científico. 23. ed. rev, e atual-são Paulo; Cortez, 2007.

SANT’ANA, Izabella Mendes. Educação inclusiva: concepções de professores e diretores. Revista Psicologia em Estudo, Maringá, v. 10, n. 2, p. 227-234, maio/ago. 2005. Disponível em: http:// www.scielo.br/pdf/pe/v10n2/v10n2a09.pdf. Acesso em: 30 jul. 2018.

SANCHES, I.; TEODORO, A. Da integração à inclusão escolar: cruzando perspectivas e conceitos. Revista Lusófona de Educação, n. 8, p. 63-83, 2006. Disponível em: http://www. scielo.oces.mctes.pt/pdf/rle/n8/n8a05.pdf. Acesso em: 3 ago. 2018.

SASSAKI, Romeu Kazumi. Inclusão: construindo uma sociedade para todos. 7ed. Rio de Janeiro: WVA, 1999.

TRIVINOS, Augusto Nivaldo Silva. Introdução a pesquisa em ciências sociais qualitativa em educação. São Paulo: Atias,1987.

VIEIRA, Maria Anunciada de Barros Lima; CASTRO, Renária Rodrigues de.  A subjetividade dos entraves na inclusão de alunos surdos no ensino regular. Revista do Programa Nacional de Formação de Professores da Educação Básica. Universidade Federal do Piauí, v.8, n. 2, p.27-37, jul. / dez. 2020.  


1Graduação em pedagogia pelo Centro Universitário Leonardo da Vinci- UNIASSELVI 2020. Especialista em psicopedagogia 2021 – UNIASSELVI. Educação infantil e anos iniciais 2021. Educação Especial: Deficiência Auditiva 2022. Administração escolar, supervisão e orientação 2022. Mestranda no programa de pós-graduação em ciências da educação pela de ciências sociais interamericana – FICS. E-mail: Chiarabatista02@gmail.com

2Mílvio da Silva Ribeiro – Doutor em Geografia pelo programa de pós-graduação em Geografia da Universidade Federal do Pará _ PPGEO/UFPA. Professor da Faculdade de Teologia, Filosofia e ciências Humanas Gamaliel FATEFIG, pedagogo; Geógrafo. E-mail: milvio.geo@gmail.com. Orcid: https://orcid.org/0000-0002-1118-7152