O TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE RONDÔNIA E AS CRIANÇAS ÓRFÃS PELO FEMINICÍDIO: VÍTIMAS INDIRETAS

THE COURT OF JUSTICE OF RONDÔNIA AND CHILDREN ORPHANS BY FEMICIDE: INDIRECT VICTIMS

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10114917


Jessica Farias Gomes]
Guilherme Alexandre Monteiro da Silva2


RESUMO

O Tribunal de Justiça de Rondônia desempenha um papel fundamental na proteção dos direitos das crianças órfãs em casos de feminicídio, que são vítimas indiretas dessa grave violência de gênero. O objetivo foi  analisar o papel do Tribunal de Justiça de Rondônia na proteção dos direitos e no bem-estar das crianças que se tornam órfãs devido ao feminicídio, focando na garantia de guarda, recursos financeiros, apoio psicossocial e no contexto da violência de gênero. Foi realizado um levantamento bibliográfico com base em fundamentação teórica, buscando fontes primárias para obter informações fundamentais sobre as principais características do tema. As iniciativas de apoio psicossocial e comunitário desempenham um papel vital na vida das crianças órfãs, proporcionando-lhes o suporte necessário para lidar com as complexas questões emocionais, sociais e psicológicas que enfrentam devido à perda dos pais. Os dados analisados revelam que o feminicídio não é apenas um problema de violência contra a mulher, mas também um problema que afeta profundamente a vida de crianças que perdem suas mães de forma trágica e traumática. A discussão se concentra em três pontos cruciais. A abordagem multidisciplinar e sensível é essencial para abordar as necessidades das crianças órfãs. O tribunal deve trabalhar em estreita colaboração com serviços de assistência social, psicólogos e profissionais de saúde para garantir que essas crianças recebam o apoio necessário para lidar com o trauma e as consequências do feminicídio em suas vidas.

Palavras-chave: Feminicídio. Tribunal de Justiça. Crianças Órfãs. Violência de Gênero.

ABSTRACT

The Rondônia Court of Justice plays a fundamental role in protecting the rights of orphaned children in cases of feminicide, who are indirect victims of this serious gender-based violence. The objective was to analyze the role of the Rondônia Court of Justice in protecting the rights and well-being of children who become orphans due to feminicide, focusing on guaranteeing custody, financial resources, psychosocial support and in the context of gender-based violence. . A bibliographical survey was carried out based on theoretical foundations, searching for primary sources to obtain fundamental information about the main characteristics of the topic. Psychosocial and community support initiatives play a vital role in the lives of orphaned children, providing them with the support they need to deal with the complex emotional, social and psychological issues they face due to the loss of a parent. The data analyzed reveal that feminicide is not only a problem of violence against women, but also a problem that profoundly affects the lives of children who lose their mothers in a tragic and traumatic way. The discussion focuses on three crucial points. A multidisciplinary and sensitive approach is essential to address the needs of orphaned children. The court must work closely with social services, psychologists and health professionals to ensure that these children receive the support they need to deal with the trauma and consequences of femicide in their lives.

Keywords: Femicide. Court of justice. Orphan children. Gender Violence.

1  INTRODUÇÃO

O Tribunal de Justiça de Rondônia desempenha um papel fundamental na proteção dos direitos das crianças órfãs em casos de feminicídio, que são vítimas indiretas dessa grave violência de gênero. Em situações de feminicídio, as crianças muitas vezes se tornam órfãs, perdendo suas mães para a violência doméstica. Nesse contexto, o tribunal desempenha um papel crucial ao lidar com questões de guarda, herança e bem-estar das crianças afetadas. O Tribunal de Justiça de Rondônia tem a responsabilidade de determinar a guarda das crianças sobreviventes, assegurando que seus interesses e necessidades sejam considerados em primeiro lugar. Isso envolve a avaliação cuidadosa das circunstâncias familiares e o estabelecimento de medidas que garantam um ambiente seguro e saudável para o desenvolvimento dessas crianças (RASCOVSKI; D’AURIA, 2023).

O poder judiciário tem a função de garantir que os recursos financeiros e patrimoniais, como pensões alimentícias e heranças, sejam devidamente protegidos e gerenciados em benefício das crianças órfãs. Isso implica em assegurar que os recursos sejam usados para o seu bem-estar e educação, e não desviados de forma inadequada. No âmbito social, o tribunal pode colaborar com órgãos e instituições que prestam apoio psicológico e social às crianças órfãs, auxiliando na sua adaptação a uma nova realidade e fornecendo assistência para superar o trauma do feminicídio de suas mães (DO NASCIMENTO, 2020).

O Tribunal de Justiça de Rondônia desempenha um papel crítico na proteção dos direitos das crianças órfãs pelo feminicídio, procurando garantir que elas tenham acesso a um ambiente seguro, a recursos financeiros adequados e ao apoio necessário para superar as consequências traumáticas dessa violência de gênero. A justiça desempenha um papel vital na construção de um futuro mais seguro e promissor para essas vítimas indiretas do feminicídio (WIECKO, 2017).

O objetivo foi  analisar o papel do Tribunal de Justiça de Rondônia na proteção dos direitos e no bem-estar das crianças que se tornam órfãs devido ao feminicídio, focando na garantia de guarda, recursos financeiros, apoio psicossocial e no contexto da violência de gênero. O estudo buscou compreender como o sistema jurídico e as práticas judiciais abordam as necessidades e os desafios enfrentados por essas crianças, contribuindo para o desenvolvimento de políticas e práticas mais eficazes de proteção infantil em casos de feminicídio.

2  MATERIAL E MÉTODOS

Neste estudo, optou-se pelo modelo de pesquisa descritiva, de acordo com a abordagem de Gil (2000, p.45), que indica que a pesquisa descritiva tem como objetivo propiciar uma melhor compreensão do problema, facilitando a formulação de hipóteses ou tornando-as mais explícitas. Além disso, devido à natureza do trabalho, foi utilizado um modelo bibliográfico, que consiste na seleção de um tema, realização de um levantamento bibliográfico inicial, formulação de perguntas e desenvolvimento de um plano preliminar sobre o tema.

A pesquisa teve como objetivo analisar o problema, utilizando principalmente o modelo de pesquisa bibliográfica. Essa estratégia foi o ponto de partida para o projeto de pesquisa, que foi aprimorado com o tempo, à medida que novas informações foram sendo absorvidas por meio da leitura e do amadurecimento dos objetivos em torno da pesquisa.

De acordo com Triviños (1987), a descrição qualitativa busca capturar a aparência do fenômeno e sua essência, além de explicar sua origem, relações e mudanças, e tentar antecipar suas consequências. Lakatos e Marconi (2007), por sua vez, definem a pesquisa bibliográfica como o levantamento, seleção e documentação da bibliografia já publicada sobre um determinado tema, permitindo que o pesquisador tenha contato com esses materiais e aprofunde seus conhecimentos sobre o assunto.

A fim de identificar as obras relevantes para o trabalho, as partes do material bibliográfico foram lidas. Em seguida, os textos selecionados foram lidos detalhadamente, com o objetivo de identificar as ideias-chave, hierarquizá-las e sintetizá-las. Por fim, as leituras foram interpretadas e associadas entre si e com a questão de pesquisa, estabelecendo o raciocínio e os argumentos com base em dados sólidos.

Foi realizado um levantamento bibliográfico com base em fundamentação teórica, buscando fontes primárias para obter informações fundamentais sobre as principais características do tema. O método utilizado na pesquisa bibliográfica consistiu em uma organização lógica do tema, permitindo uma redação textual gradual e equilibrada. À medida que os paradigmas foram sendo aprofundados, foram realizadas análises e se adquiriu maior conhecimento sobre o tema, culminando em um formato mais consolidado do texto.

Para o estudo, foram incluídos textos completos em português e inglês, com acesso livre e aberto às bases de dados. Os estudos que não atenderam aos objetivos da pesquisa foram excluídos. Os materiais utilizados na pesquisa foram artigos do portal Google Acadêmico, relacionados ao tema no período de 2013 a 2023. Trata-se de uma revisão bibliográfica estruturada, baseada em material divulgado em artigos do Google Acadêmico.

3  RESULTADOS

3.1  Conceito de feminicídio

O conceito de feminismo tem uma história de décadas, com sua terminologia evoluindo ao longo do tempo. Inicialmente, o termo “feminicídio” não era comum, sendo uma tradução para o espanhol e o português a partir do termo anglo-saxão “feminicide.” A pioneira Marcela Lagarde, uma ativista social, desempenhou um papel crucial na introdução do conceito de feminicídio. É importante ressaltar que o entendimento e a prática do feminismo variam significativamente entre os países, devido às diferentes manifestações do ativismo feminino em contextos culturais diversos. Isso abrange uma ampla gama de situações, não se limitando apenas a questões familiares. O feminicídio inclui casos de mortes resultantes de violência grave, mutilação, estupro, rituais de sacrifício na Índia e perseguições às bruxas na Europa continental, sendo considerados “honrosos” em alguns países do Oriente Médio e da América Latina (BODELÓN, 2013).

O feminicídio ocorre quando um assassinato é comprovadamente motivado pela condição de gênero da vítima, ou seja, quando uma mulher é morta exclusivamente por ser mulher. No entanto, nem todo assassinato de uma mulher é automaticamente considerado feminicídio; ele deve ser motivado pelo gênero da vítima para receber essa classificação (ORTEGA, 2017). A motivação por gênero é o fator determinante para que um crime seja considerado feminicídio, tornando o ato criminoso ainda mais repreensível, requerendo, assim, punição adequada à gravidade do delito (BODELÓN, 2013).

O feminicídio não se limita apenas ao homicídio; ele abrange uma variedade de formas de violência de gênero, incluindo estupro, tortura, abuso ou assédio sexual, espancamento, agressões físicas e psicológicas, mutilação genital e a negação de alimentação ou cuidados de maternidade. Independentemente do local onde ocorram esses atos de violência, seja no âmbito familiar ou doméstico, a motivação de gênero é essencial para que se caracterize como feminicídio (BODELÓN, 2013).

No contexto legal, no Brasil, a Lei Maria da Penha (Lei número 11.340, de 07 de agosto de 2006) é utilizada para abordar casos de violência doméstica e familiar em conexão com homicídios. Esta lei tem sido fundamental na proteção das mulheres vítimas de violência. Além disso, o Brasil promulgou a Lei de número 13.104 em 2015, que introduziu uma qualificadora para o feminicídio, atendendo às diretrizes da Convenção Internacional para a prevenção e punição da violência contra as mulheres (BRASIL, 2015).

Além de questões legais e definições, é importante considerar que o fenômeno do feminicídio está interligado com mudanças na estrutura social do trabalho, o crescente processo de urbanização, e a migração global causada por eventos como conflitos armados, desastres naturais e perseguição política. Esses fatores têm contribuído para o surgimento de organizações criminosas que exploram mulheres de várias maneiras, descartando-as quando não são mais úteis ou para intimidar instituições sociais que lutam pelos direitos das mulheres em escala global (BODELÓN, 2013).

A coexistência de elementos tradicionais e modernos nesse contexto tem aumentado a vulnerabilidade dos grupos mais desfavorecidos, especialmente mulheres jovens que vêm de origens econômicas precárias e são imigrantes. Muitas vezes, a falta de recursos financeiros, acesso à informação e desemprego contribui para a preferência por esse tipo de crime (BODELÓN, 2013). O feminicídio não é apenas uma questão de definição legal, mas também está intrinsecamente ligado a complexas dinâmicas sociais e econômicas que precisam ser abordadas em uma perspectiva mais ampla e interdisciplinar.

3.2  Evolução do feminicídio

Ao longo da história, tem sido evidente que as relações entre homens e mulheres foram permeadas pela desigualdade, submissão das mulheres aos pais e maridos, e pela imposição de papéis tradicionalmente limitados a serem donas de casa e mães, independentemente de suas próprias aspirações. Neste contexto, a sociedade frequentemente controlava o pensamento feminino de maneira machista, relegando as mulheres a um papel estritamente doméstico, mesmo após avanços nos direitos das mulheres ao longo do tempo. Essa visão perpetuava uma atitude misógina nas sociedades, onde as conquistas de direitos das mulheres eram muitas vezes ignoradas, resultando em uma persistente subjugação do gênero feminino, tornandoas vítimas de uma cultura de posse masculina (MELLO, 2015).

É importante destacar que a violência contra a mulher no Brasil possui raízes profundas na herança de uma sociedade com bases escravocratas e em um modelo de colonização que perpetuou a visão da mulher como objeto de uso pelos homens (DINIZ, 2015).

A misoginia exacerbada não se limita apenas ao patriarcado, mas também está relacionada a diversos fatores que contribuem para a violência contra as mulheres. A impunidade nesses casos é uma questão significativa, dando aos agressores uma sensação de imunidade, em parte devido à falta de punição efetiva por parte do Estado, que historicamente era composto predominantemente por homens (MELLO, 2015).

Em resposta a esse cenário, em 2015, a presidente Dilma Rousseff sancionou a chamada Lei do Feminicídio, oficializada como a Lei nº 13.104/2015, com o propósito de combater a impunidade na violência contra as mulheres (BRASIL, 2015). Esta legislação alterou o Código Penal, classificando o homicídio de mulheres como circunstância qualificadora do feminicídio, além de incluir o feminicídio na lista de crimes hediondos, conforme o artigo 121 do Código Penal e o artigo 1º da Lei nº 8.072 de 1990. A Lei nº 13.104/2015 estabelece penas mais severas para o assassinato de mulheres que envolvam violência doméstica e familiar, menosprezo ou discriminação com base no gênero (BRASIL, 2015). A pena pode variar de 12 a 30 anos de prisão, podendo ser aumentada em casos específicos, como quando o crime é cometido durante a gravidez, até três meses após o parto, ou quando a vítima é menor de 14 anos, maior de 60 anos, deficiente, ou quando descendentes da vítima testemunham o crime (BRASIL, 2015).

Vale ressaltar que o crime de feminicídio não se limita simplesmente à vítima ser do sexo feminino; a motivação de gênero é um elemento essencial. Antes da Lei do Feminicídio, não havia diferenciação na punição do homicídio praticado contra mulheres com base no gênero. A pena era aplicada de forma generalizada, tratando o homicídio como um crime comum ou com uma qualificadora genérica relacionada a motivações superficiais ou banais (BRASIL, 2015).

Além disso, o feminicídio pode ocorrer em dois contextos distintos: o íntimo, envolvendo homens com os quais a vítima tem ou teve alguma relação íntima, e o não íntimo, onde o agressor não possui esse tipo de relação com a mulher. O feminicídio por conexão refere-se a situações em que mulheres são assassinadas ao tentar intervir para evitar que um homem cometa um crime contra outra mulher, independentemente da relação entre a vítima e o agressor (PEREIRA, 2015).

3.3  Naturezas jurídicas da qualificadora do feminicídio

As qualificadoras são elementos presentes em infrações criminais que resultam em penas mais graves do que as estabelecidas para as categorias simples, e o feminicídio é uma dessas circunstâncias agravantes aplicadas ao crime de homicídio (GRECO, 2017). Após a promulgação da Lei nº 13.104, de 9 de março de 2015, que regulamenta o homicídio contra a mulher no Brasil, doutrina e jurisprudência passaram a discutir a natureza jurídica das qualificadoras do homicídio. Isso ressalta a distinção entre doutrina e jurisprudência, tanto subjetivamente relacionadas aos motivos e pessoas do agente quanto objetivamente associadas ao método de cometer o crime e ao tipo de violência empregado (GRECO, 2017).

Os elementos constitutivos do crime de homicídio, incluindo suas qualificadoras, podem ser classificados como de natureza subjetiva ou pessoal, ligados aos motivos e pessoas do agente, ou objetiva ou real, relacionados ao método de cometer o crime e ao tipo de violência empregado (GRECO, 2017). No caso do homicídio contra a mulher, conhecido como feminicídio, a natureza é subjetiva, uma vez que a violência de gênero não é uma forma de crime em si, mas sim um motivo para cometê-lo. A qualificação se torna objetiva quando se refere ao método ou meio de cometer o crime (BIANCHINI, 2016).

A violência doméstica e familiar, bem como os sentimentos de desprezo ou discriminação em relação à condição da mulher, não constituem uma forma de crime em si, mas sim um motivo para o crime, tornando o feminicídio uma qualificadora de natureza subjetiva (BARROS, 2015). A qualificadora do homicídio feminino é subjetivo, relacionado ao domínio interno do agente, que é a motivação ligada ao gênero feminino, e não é uma qualificação objetiva relacionada aos meios ou à forma de execução (CAVALCANTE, 2015).

A Lei nº 13.104 de 2015 não trouxe mudanças substanciais na natureza do crime de homicídio, uma vez que o homicídio privilegiado pode ser identificado ao retirar a qualificadora de motivo fútil ou torpe, que é subjetiva. A Comissão do Conselho de Sentença não entende que o crime possa ser considerado qualificado com base em motivo fútil ou torpe (BITENCOURT, 2012). A natureza da qualificadora do homicídio contra a mulher é objetiva, argumentando que o comportamento está relacionado ao gênero e, por ser mulher, apoia a tese de que é uma qualificadora subjetiva por motivos desprezíveis ou inúteis e, portanto, não tem relação com a motivação do homicídio (NUCCI, 2016).

3.4  Legislação e Políticas de Gênero

No Brasil, a legislação relacionada à proteção das vítimas de feminicídio é abordada principalmente pela Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006) e pela Lei do Feminicídio (Lei nº 13.104/2015). A Lei Maria da Penha é um marco importante na proteção das mulheres em situações de violência doméstica, e a Lei do Feminicídio agravou as penas para homicídios cometidos em contexto de violência de gênero. Ambas as leis visam a prevenção, punição e erradicação da violência contra as mulheres, reconhecendo a gravidade desses crimes (PEREIRA, 2022).

No contexto de proteção às crianças afetadas pelo feminicídio, o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) é um instrumento importante. O ECA estabelece diretrizes para a garantia dos direitos das crianças, e isso inclui a proteção das crianças que testemunham ou são afetadas indiretamente pela violência doméstica, como o feminicídio. Ele determina que a garantia do melhor interesse da criança deve ser priorizada em todas as ações e decisões judiciais, levando em conta a sua integridade física e emocional (SEGATO, 2016).

Em Rondônia, as leis e políticas relacionadas à proteção das vítimas de feminicídio seguem a legislação federal. O estado tem a responsabilidade de implementar as políticas públicas que visam prevenir, atender e punir casos de violência de gênero. É importante destacar a atuação do sistema de justiça, como o Ministério Público e o Poder Judiciário, que desempenham um papel fundamental na aplicação das leis e na proteção das vítimas (DA SILVA; RAMOS, 2022).

A proteção das crianças afetadas pelo feminicídio em Rondônia também segue as diretrizes estabelecidas pelo ECA. A rede de proteção à criança e ao adolescente no estado trabalha para assegurar que essas crianças recebam apoio psicossocial e que sejam amparadas em termos de segurança, buscando minimizar os traumas decorrentes da exposição à violência doméstica. Programas de conscientização e educação nas escolas são uma parte importante das políticas voltadas para a sensibilização das crianças sobre a violência de gênero e seus direitos (CAMETÁ et al. 2022).

3.5  Proteção das Crianças Órfãs

O sistema de justiça em Rondônia lida com casos envolvendo crianças órfãs devido ao feminicídio de forma abrangente, considerando o melhor interesse da criança como princípio fundamental. O Tribunal de Justiça de Rondônia desempenha um papel central nesse processo. Em casos de feminicídio em que as crianças perdem suas mães, o tribunal é responsável por tomar decisões relacionadas à guarda, custódia e medidas de proteção (RODRIGUES et al. 2021).

A decisão sobre a guarda das crianças é geralmente tomada com base no princípio do melhor interesse da criança, levando em consideração fatores como o ambiente mais estável e seguro para o desenvolvimento da criança, o vínculo com outros membros da família e a capacidade de cuidar e prover para as necessidades da criança. Isso pode resultar na guarda sendo concedida a parentes próximos, como avós ou tios, ou em casos extremos, a adoção por famílias aptas. Em situações de risco iminente para a criança, medidas de proteção imediatas são implementadas para garantir sua segurança. Isso pode envolver o acolhimento institucional temporário, com o objetivo de assegurar que a criança não esteja em perigo (RASCOVSKI; D’AURIA, 2023).

As autoridades judiciais e os órgãos de proteção à criança em Rondônia trabalham em estreita colaboração para monitorar o bem-estar das crianças órfãs e tomar medidas adequadas de acordo com a evolução das circunstâncias. A prioridade é sempre garantir um ambiente seguro e estável para as crianças afetadas pelo feminicídio. O sistema de justiça em Rondônia age de maneira diligente para cumprir essa missão, com decisões judiciais que visam o melhor interesse das crianças e medidas de proteção que asseguram que elas recebam apoio adequado em momentos tão difíceis (DO NASCIMENTO, 2020).

3.6  Herança e Pensão Alimentícia

Nos casos de feminicídio, a questão da herança e da pensão alimentícia é tratada com sensibilidade pelo tribunal em Rondônia, especialmente quando crianças são afetadas. A legislação brasileira estabelece que os direitos sucessórios e a pensão alimentícia são importantes para garantir o bem-estar das crianças após a perda de suas mães (WIECKO, 2017).

Quando a vítima do feminicídio deixa bens e patrimônio, o tribunal em Rondônia deve garantir que a sucessão seja tratada de acordo com as leis vigentes. As crianças têm direito a uma parte da herança, o que é frequentemente determinado com base no Código Civil e nas regras de sucessão. O tribunal supervisiona o processo de partilha da herança, garantindo que a parcela correspondente às crianças seja devidamente protegida e administrada em seu benefício. Esses recursos podem ser utilizados para garantir a educação, saúde e bem-estar das crianças, bem como para atender às suas necessidades básicas (PEREIRA, 2022).

A pensão alimentícia é crucial para garantir o sustento das crianças após a perda da mãe devido ao feminicídio. O tribunal em Rondônia pode determinar que o autor do feminicídio, se identificado e condenado, seja responsável por pagar pensão alimentícia em favor das crianças. Isso é feito levando em consideração a capacidade financeira do devedor, as necessidades das crianças e o princípio do melhor interesse dos menores. O tribunal monitora rigorosamente o pagamento da pensão e pode tomar medidas legais para garantir que as crianças recebam o apoio financeiro necessário para seu bem-estar e desenvolvimento (RODRIGUES et al. 2021).

O sistema judiciário em Rondônia busca proteger os direitos das crianças e garantir que os recursos herdados e a pensão alimentícia sejam usados em seu benefício. É um processo essencial para fornecer apoio financeiro e garantir que as crianças tenham acesso a recursos que lhes permitam crescer em um ambiente seguro e saudável, apesar das circunstâncias adversas (CAMETÁ et al. 2022).

3.7  Apoio Psicossocial e Comunitário

As iniciativas de apoio psicossocial e comunitário desempenham um papel vital na vida das crianças órfãs, proporcionando-lhes o suporte necessário para lidar com as complexas questões emocionais, sociais e psicológicas que enfrentam devido à perda dos pais. Esses programas variam em sua natureza e abrangem uma gama diversificada de serviços. Muitas vezes, eles são oferecidos por organizações não governamentais, agências governamentais e instituições de caridade. A comunidade local desempenha um papel crucial no fornecimento desse apoio, criando um ambiente seguro e acolhedor para as crianças (DA SILVA; RAMOS, 2022).

A coordenação dessas iniciativas com o sistema de justiça é essencial para garantir que as crianças órfãs recebam a assistência abrangente de que precisam. Quando as crianças estão envolvidas em processos judiciais, como guarda, adoção ou questões de tutela, é fundamental que o sistema de justiça esteja ciente das redes de apoio disponíveis. Isso envolve compartilhar informações e estabelecer mecanismos de colaboração entre as agências de assistência social, organizações de apoio à infância e o sistema judicial (SEGATO, 2016).

É importante que os profissionais do sistema de justiça tenham treinamento adequado para entender as necessidades específicas das crianças órfãs e como essas necessidades podem ser atendidas em parceria com as iniciativas de apoio psicossocial e comunitário. A colaboração entre essas partes pode ajudar a determinar as melhores soluções para o bem-estar das crianças, equilibrando questões legais com o apoio emocional e social necessário (PEREIRA, 2022).

As iniciativas de apoio psicossocial e comunitário desempenham um papel vital na vida das crianças órfãs, proporcionando-lhes o suporte necessário para lidar com a perda dos pais. A coordenação eficaz com o sistema de justiça é essencial para garantir que essas crianças recebam assistência abrangente, equilibrando as questões legais com o apoio emocional e social necessário para seu bem-estar geral (WIECKO, 2017).

4  DISCUSSÃO

O feminicídio, que é o assassinato de mulheres por razões de gênero, tem deixado um número alarmante de vítimas indiretas, as crianças órfãs. O estudo aponta para a necessidade de uma abordagem mais sensível e abrangente por parte do sistema judiciário em Rondônia, considerando não apenas a responsabilização dos agressores, mas também o amparo e a proteção das crianças que perdem suas mães devido a esse crime. Verificou-se que o Tribunal de Justiça de Rondônia desempenha um papel fundamental na garantia da justiça e na punição dos culpados, mas os resultados indicam a importância de uma abordagem multidisciplinar que leve em consideração o impacto psicossocial profundo que o feminicídio tem sobre as crianças órfãs.

Para Segato, (2016) a ausência materna deixa cicatrizes emocionais profundas, afetando o desenvolvimento cognitivo e emocional dessas crianças. Portanto, a pesquisa sugere que o tribunal deve colaborar estreitamente com serviços de assistência social, psicólogos e profissionais de saúde para garantir que as crianças recebam o apoio necessário. A prevenção do feminicídio é a melhor forma de evitar que mais crianças se tornem vítimas indiretas dessa violência de gênero. Portanto, os resultados destacam a importância da cooperação entre o sistema judiciário, as instituições de assistência social e a sociedade em geral para combater eficazmente o feminicídio e proteger as crianças órfãs que sofrem suas consequências devastadoras.

Os dados analisados revelam que o feminicídio não é apenas um problema de violência contra a mulher, mas também um problema que afeta profundamente a vida de crianças que perdem suas mães de forma trágica e traumática. A discussão se concentra em três pontos cruciais. A responsabilização dos agressores é fundamental para a justiça e para dissuadir futuros crimes. Contudo, a discussão revela que é necessário ir além da punição e considerar o impacto sobre as crianças. O tribunal deve adotar medidas que garantam não apenas a condenação dos agressores, mas também o apoio e a proteção das vítimas indiretas, as crianças.

Segundo Wiecko (2017) o feminicídio deixa cicatrizes emocionais profundas nas crianças órfãs, afetando seu bem-estar psicossocial e seu desenvolvimento. Portanto, a colaboração entre o sistema judiciário, os serviços de assistência social, psicólogos e profissionais de saúde é essencial para fornecer o suporte adequado a essas crianças e mitigar os efeitos traumáticos do feminicídio em suas vidas.

A pesquisa demonstra que a raiz desse problema está no machismo e na desigualdade de gênero, e, portanto, a prevenção deve ser uma prioridade. Políticas públicas que visam à conscientização, à educação e ao combate ao machismo são essenciais para evitar que mais mulheres se tornem vítimas e, consequentemente, que mais crianças se tornem órfãs devido ao feminicídio. O feminicídio não é apenas um problema de justiça criminal, mas também um problema social que afeta a vida de crianças inocentes e que requer uma resposta holística e preventiva.

5  CONSIDERAÇÕES FINAIS

O Tribunal de Justiça desempenha um papel fundamental na punição dos agressores e na busca da justiça, mas os resultados deste trabalho ressaltam que a justiça não pode se limitar à punição dos culpados. A abordagem multidisciplinar e sensível é essencial para abordar as necessidades das crianças órfãs. O tribunal deve trabalhar em estreita colaboração com serviços de assistência social, psicólogos e profissionais de saúde para garantir que essas crianças recebam o apoio necessário para lidar com o trauma e as consequências do feminicídio em suas vidas.

É necessário enfatizar a importância da prevenção do feminicídio. Políticas públicas que promovam a conscientização, a educação e o combate ao machismo são cruciais para atacar a raiz do problema. A prevenção é a melhor forma de evitar que mais mulheres se tornem vítimas e, por consequência, que mais crianças percam suas mães devido a esse crime.

As considerações finais deste estudo enfatizam a necessidade de uma abordagem integrada que leve em consideração tanto a justiça como o bem-estar das crianças, juntamente com a prevenção como um componente crucial da solução. É imperativo que o sistema judiciário, as instituições de assistência social e a sociedade em geral trabalhem em conjunto para combater eficazmente o feminicídio e proteger as crianças órfãs que sofrem suas consequências devastadoras. A justiça deve ser acompanhada pela compaixão e pelo compromisso de criar um futuro mais seguro e igualitário para todas as mulheres e suas famílias em Rondônia.

O feminicídio não é apenas uma questão jurídica, mas uma manifestação clara das desigualdades de gênero profundamente enraizadas na sociedade. Essa triste realidade deve nos incitar a uma ação contínua e coordenada. O trabalho do Tribunal de Justiça, embora crucial, é apenas uma peça do quebra-cabeça. Para garantir um progresso significativo na proteção das mulheres e na prevenção do feminicídio, é necessário um compromisso duradouro de toda a sociedade. Isso inclui educar a sociedade sobre a igualdade de gênero, promover a denúncia de casos de violência e apoiar iniciativas que ofereçam recursos para as vítimas, bem como para as crianças órfãs.

A solução para o problema do feminicídio não será rápida, nem fácil, mas é uma responsabilidade coletiva. A justiça, o apoio às vítimas e a prevenção devem ser abordados em conjunto, e apenas por meio de uma abordagem abrangente e sustentada poderemos esperar ver um futuro onde as crianças não se tornem vítimas indiretas do feminicídio. Essa é uma missão moral e social que deve mobilizar todos os setores da sociedade em Rondônia e em todo o mundo.

REFERÊNCIAS

BARROS, Francisco Dirceu, Estudo completo do feminicídio. Editora Impetus. 2016. Disponível em: http://www.impetus.com.br/artigo/876/estudo-completo-do-feminicidio  Acesso em: 19 de outubro de 2023.

BIANCHINI, Alice. A qualificadora do feminicídio é de natureza objetiva ou subjetiva. Revista Emerj, v. 19, n. 72, p. 203-219, 2016. Disponível em: https://www.emerj.tjrj.jus.br/revistaemerj_online/edicoes/revista72/revista72_203.pdf 19 de outubro de 2023.

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal 5 Parte Especial. Saraiva Educação, 2012. Disponível em: https://books.google.com.br/books?hl=ptBR&lr=&id=BdRiDwAAQBAJ&oi=fnd&pg=PT34&dq=BITENCOURT,+Cezar+Roberto.+Tratado+de+Direito+Penal+5+Parte+Especial.+Saraiva+Educa%C3%A7%C3%A3o,+2012&ots=AJJahteBMM&sig=QVTVZwqjynLGLDKzn7FrgvNdi-c Acesso em: 19 de outubro de 2023

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1Acadêmica. Curso de Direito. profjessicafarias@gmail.com. Artigo apresentado ao Centro Universitário Aparício Carvalho, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Direito, Porto Velho/RO, 2023.

2Professor Orientador. Professor Mestre, do curso de Direito. E-mail: guilhermealexandre.adv@gmail.com