O SISTEMA DE SEGURIDADE SOCIAL E O DIREITO A SAÚDE

THE SOCIAL SECURITY SYSTEM AND THE RIGHT TO HEALTH

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8121916


Clara Heinzmann1
Cleverson Aldrin Marques2
Vitor Hugo Heinzmann Gomes da Silva3


RESUMO

O estudo realiza uma análise do sistema da seguridade social, que de acordo com art. 194 da Constituição Federal, compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar o direito relativo à saúde, à previdência social e à assistência social. O direito a saúde é considerado um direito social e para garantir efetividade dos direitos sociais, o art. 3º, III da Constituição Federal determinou como objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades sociais. Para tanto, o Estado deve assegurar o acesso a níveis dignos de subsistência, aplicando seus recursos e direcionando as suas ações suplementares de nutrição, habitação, educação, saúde, reforço de renda familiar e outros programas de relevante interesse social à melhoria da qualidade de vida. Assim por meio de uma pesquisa bibliográfica e documental, o presente trabalho aborda o direito a saúde no contexto da seguridade social, destacando que, pelo seu caráter de universalidade, e conforme disposição da Constituição Federal, os diretos sociais são muito mais que normas programáticas, são direitos subjetivos do indivíduo oponíveis principalmente do Estado, que tem o dever de fornecer as prestações diretas e indiretas que a Constituição Federal garante. Entre os direitos sociais, previstos na Constituição Federal de 1988 encontram-se os direitos integrantes da seguridade social, destacando-se em especial, o direito à saúde e por ser um direito social prestacional, exige do Poder Público a realização de atividades de políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Palavras-chave: Seguridade Social. Direito a Saúde. Direitos Sociais.

ABSTRACT

The study performs an analysis of the social security system, which according to art. 194 of the Federal Constitution, comprises an integrated set of actions initiated by public authorities and society, aimed at ensuring the right to health, social security and social assistance. The right to health is considered a social right and to ensure the effectiveness of social rights, art. 3, III of the Federal Constitution established as fundamental objectives of the Federative Republic of Brazil, the eradication of poverty and the reduction of social inequalities. To this end, the State must ensure access to decent levels of subsistence, applying its resources and directing its supplementary actions in nutrition, housing, education, health, reinforcement of family income and other programs of relevant social interest to improving the quality of life. . Thus, through a bibliographical and documentary research, the present work approaches the right to health in the context of social security, highlighting that, due to its universal nature, and according to the Federal Constitution, social rights are much more than programmatic norms, they are subjective rights of the individual that can be relied upon mainly from the State, which has the duty to provide the direct and indirect benefits that the Federal Constitution guarantees. Among the social rights provided for in the Federal Constitution of 1988 are the rights that are part of social security, especially the right to health and, as it is a social benefit right, it requires the Public Power to carry out social policy activities and economic ones aimed at reducing the risk of disease and other injuries and universal and equal access to actions and services for their promotion, protection and recovery.

Keywords: Social Security. Right to health. Social rights.

1. INTRODUÇÃO

A Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948 prescreve que todo homem tem direito a um padrão de vida que seja capaz de assegurar para si e sua família, saúde, bem-estar, alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis. Assim, no século XX, no segundo pós-guerra, foram ampliadas as responsabilidades do Estado em relação aos direitos sociais, entretanto, essas reponsabilidades já eram eminentes ao Estado no século anterior. Em função da desigualdade que existe no meio social torna-se indispensável, portanto, que o Estado também consagre um conjunto de direitos destinados justamente à obtenção, tanto quanto possível, da desejada igualdade material entre as pessoas, por meio dos direitos sociais.

Os direitos sociais caracterizam-se como liberdades positivas de observância obrigatória em um Estado Democrático de Direito, tendo por finalidade a melhoria da condição de vida dos hipossuficientes. Assim, a despeito de beneficiarem todos os indivíduos, os direitos sociais destinam-se precipuamente a proteção dos hipossuficientes e dos mais fragilizados, ou seja, aqueles dependentes em maior grau das prestações materiais promovidas pelo Estado.

Pelo seu caráter de universalidade, e conforme disposição da Constituição Federal, os diretos sociais são muito mais que normas programáticas, são direitos subjetivos do indivíduo oponíveis principalmente do Estado, que tem o dever de fornecer as prestações diretas e indiretas que a Constituição Federal garante. Entre os direitos sociais, previstos na Constituição Federal de 1988 encontram-se os direitos integrantes da seguridade social.

Dentre os direitos sociais encontram-se aqueles que garantem a proteção social por meio de um sistema integrado de ações, nos termos do art. 194 da Constituição Federal. O referido sistema foi denominado seguridade social que compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos à saúde, à previdência social e à assistência social. É, portanto, um sistema de proteção social que abrange os três programas sociais de maior relevância: a previdência social, a assistência social e a saúde.

A previsão constitucional da saúde como “direito de todos e dever do Estado”, constante do art. 196, revela a pretensão tendente à sua universalização e, consequentemente, impõe ao Estado a responsabilidade pela sua, implementação. Isso implica, além das obrigações traduzidas em serviços e ações a cargo do Poder Público, também a responsabilidade estatal quanto à regulamentação, fiscalização e controle da assistência à saúde exercida pela iniciativa privada. A responsabilidade em matéria de saúde, entretanto, não se exaure no Estado, estendendo-se também às pessoas em geral, às unidades familiares, às empresas e à sociedade. Assim, a saúde é segmento autônomo da Seguridade Social que tem a finalidade mais ampla de todos os ramos protetivos porque não possui restrição de beneficiários e o seu acesso também não exige contribuição dos beneficiários.

2. O DIREITO A SAÚDE NO CONTEXTO DA SEGURIDADE SOCIAL

O estudo analisa o sistema da seguridade social, de acordo com art. 194 da Constituição Federal, compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar o direito relativo à saúde, à previdência social e à assistência social.

2.1 Direitos sociais na Constituição Federal de 1988

Com os movimentos reivindicatórios do século XIX, as liberdades formais abstratas se tornam insuficientes, passando a ser complementadas por outros direitos, que receberam a denominação de direitos sociais, como a assistência social, a saúde, a educação, o trabalho, que consubstanciam as condições necessárias para o efetivo gozo de liberdades materiais concretas. Não se trata apenas de garantir liberdade frente ao Estado, mas sim de assegurar que ela será alcançada também por intermédio de sua atuação. Desse modo, os direitos sociais são encarados por uma perspectiva positiva, de imposição de deveres ao Estado e da sociedade,4 que deverá promover ações concretas para efetivar a igualdade material dos cidadãos.

No chamado constitucionalismo social, os Estados de uma forma geral, passaram a apresentar uma nova fase em que as Constituições de vários países começam a tratar dos direitos sociais, trabalhistas e econômicos, incluindo o direito à saúde como direito social.

Na Alemanha, a Constituição de Weimar, em 1919, previa que ao Estado incumbia a obrigação de prover a subsistência do cidadão alemão, caso não pudesse proporcionar-lhe a oportunidade de ganhar a vida como um trabalhador produtivo. Assim os direitos sociais deveriam ter por objeto não uma abstenção, mas uma atividade positiva do Estado, pois direitos como: educação, saúde, trabalho, previdência social entre outros, só se realizariam por meio de políticas públicas ou programas de ação governamental.

O art. 85 da Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948 prescreve que todo homem tem direito a um padrão de vida que seja capaz de assegurar para si e sua família, saúde, bem-estar, alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis.

Assim, no século XX, no segundo pós-guerra, foram ampliadas as responsabilidades do Estado em relação aos direitos sociais, entretanto, essas reponsabilidades já eram eminentes ao Estado no século anterior.

Porém, o simples reconhecimento dos direitos fundamentais nem sempre é suficiente para que os indivíduos possam efetivamente gozá-los. Em função da desigualdade que existe no meio social torna-se indispensável, portanto, que o Estado também consagre um conjunto de direitos destinados justamente à obtenção, tanto quanto possível, da desejada igualdade material entre as pessoas, por meio dos direitos sociais.

Os direitos sociais caracterizam-se como liberdades positivas de observância obrigatória em um Estado Democrático de Direito, tendo por finalidade a melhoria da condição de vida dos hipossuficientes. Assim, a despeito de beneficiarem todos os indivíduos, os direitos sociais destinam-se precipuamente a proteção dos hipossuficientes e dos mais fragilizados, ou seja, aqueles dependentes em maior grau das prestações materiais promovidas pelo Estado.

Para garantir efetividade dos direitos sociais, o art. 3º, III da Constituição Federal determinou como objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, a erradicação da pobreza e a redução das desigualdades sociais. Para tanto, o Estado deve assegurar o acesso a níveis dignos de subsistência, aplicando seus recursos e direcionando as suas ações suplementares de nutrição, habitação, educação, saúde, reforço de renda familiar e outros programas de relevante interesse social à melhoria da qualidade de vida.

A Constituição Federal de 1988 prevê os direitos sociais, entre os quais o direito à saúde. Os direitos devem ser garantidos a todas as pessoas, sem distinção de raça, religião, credo, idade ou sexo.

Saulo Lindorfer Pivetta observa que “os direitos sociais envolvem um aspecto político inquestionável, relacionando as funções e deveres do Estado e define as formas de organização social e a concepção da vida” (PIVETTA, 2014, p. 26).

Pelo seu caráter de universalidade, e conforme disposição da Constituição Federal, os diretos sociais são muito mais que normas programáticas, são direitos subjetivos do indivíduo oponíveis principalmente do Estado, que tem o dever de fornecer as prestações diretas e indiretas que a Constituição Federal garante. Entre os direitos sociais, previstos na Constituição Federal de 1988 encontram-se os direitos integrantes da seguridade social, conforme a seguir:

2.2. Seguridade social

Como visto no item anterior a Constituição Federal de 1988 assegura o exercício dos direitos sociais, os quais tem por objetivo atingir a igualdade material e a justiça social.

Dentre os direitos sociais encontram-se aqueles que garantem a proteção social por meio de um sistema integrado de ações, nos termos do art. 194 da Constituição Federal. O referido sistema foi denominado seguridade social o qual compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos à saúde, à previdência social e à assistência social.5 A seguridade social está pautado nos princípios previstos no art. 194, parágrafo único, bem como no art. 195, caput e § 5º da Constituição Federal.

2.2.1. Princípios da seguridade social Universalidade de cobertura e do atendimento

O princípio da universalidade de cobertura e do atendimento está previsto no art. 194, parágrafo único, inciso I, da Constituição Federal e tem a finalidade fazer com que as pessoas e todas as situações que demandem intervenção estatal sejam atendidas, entre as quais, a área da saúde, como forma de proteger todas as situações geradoras de necessidades.

O princípio da universalidade, tanto em seu aspecto subjetivo (todas as pessoas), como no seu aspecto objetivo (situações a serem atendidas) constitui um ideal a ser alcançado. Em razão desse princípio, todos devem ter acesso aos benefícios e serviços do sistema de seguridade social.

A universalidade da cobertura está relacionada à garantia do máximo de cobertura aos chamados riscos sociais, enquanto que a universalidade do atendimento da seguridade social está relacionada às pessoas, aos sujeitos atendidos. Porém, a efetividade do princípio da universalidade não significa necessariamente a proteção igualitária de todos, pois a proteção se dará com base nas particularidades sociais em que se encontra envolvido o indivíduo.

Entretanto somente haverá a universalidade quando todos os cidadãos e todas as situações de necessidade tiverem cobertura, porém, como não será possível à proteção igualitária a todos os indivíduos, haverá a necessidade da aplicação do princípio da seletividade, que levará em conta os riscos ou as necessidades de maior abrangência social merecendo cobertura da seguridade social.

Seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços

Pelo princípio da seletividade, previsto no art. 194, parágrafo único, inciso III, da Constituição Federal, devem ser selecionadas as pessoas e as situações que terão prioridade no atendimento e na cobertura, assim, revela-se a seletividade, como uma contenção provisória da universalidade (PIERDONÁ, 2023).

O princípio da seletividade prevê que deve ser levado em consideração os riscos ou necessidades de maior abrangência social que merecerão cobertura da seguridade social e os benefícios e serviços adequados que farão frente a esta cobertura, cabendo ao legislador definir os benefícios e serviços cuja prestação propicie melhores condições de vida à população.

A seletividade é um instrumento a serviço das finalidades fixadas no Texto Fundamental. O momento da seletividade está situado no estágio da elaboração legislativa. Orientando a intenção normativa, que se expressa nas finalidades a serem atingidas, cabe ao legislador definir os benefícios e serviços cuja prestação propicie melhores condições de vida a população. (BALERA, 2016, p. 86).

O art. 194, parágrafo único, inciso III, da Constituição Federal, prevê ainda, o princípio da distributividade que têm por objetivo balizar quais são os grupos populacionais que terão prioridade de acesso a esses benefícios e serviços, na medida da necessidade de cada um. Quanto maior a necessidade, maior será a cobertura dos benefícios e serviços da seguridade social, como esclarece Sérgio Pinto Martins:

A distributividade implica a necessidade de solidariedade para poderem ser distribuídos os recursos. A ideia da distributividade também concerne à distribuição de renda, pois o sistema, de certa forma, nada mais faz do que distribuir renda. A distribuição pode ser feita aos mais necessitados, em detrimento dos menos necessitados, de acordo com a previsão legal. A distributividade tem, portanto, caráter social (MARTINS, 2015, p. 79).

Pelo princípio da seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços, serão escolhidas as situações que terão prioridade de atendimento na seguridade social.

Uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais

O princípio da uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais está previsto no art. 194, parágrafo único, inciso II, da Constituição Federal e significa que as prestações da seguridade social serão idênticas para toda população urbana e rural, independentemente do local onde residem ou trabalhem. Wagner Balera sustenta que a “uniformidade significa identidade. Existirão prestações idênticas para toda a população, independentemente do local onde residam ou trabalhem as pessoas. Equivalente quer dizer ‘de igual valor’. Significa, pois, que os benefícios não serão distintos entre as populações protegidas” (BALERA, 2016).

A partir da Constituição Federal de 1988, a saúde não é mais dirigida apenas aos trabalhadores e seus dependentes, mas a todos os cidadãos, independentemente do exercício profissional ou mesmo de sua classificação, ou seja, não há qualquer diferença entre as populações urbanas e rurais.

Por meio do princípio da uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais, essas devem receber do sistema, idêntico grau de proteção social, fato que ocorre especialmente no subsistema da saúde. Isso porque na previdência social há diferenças estabelecidas na Constituição Federal em relação ao segurado especial, conforme determina o art. 195, § 8º, bem como há a redução da idade por aposentadoria por idade, em relação a todos trabalhadores rurais (parte final do inciso II do § 7º do art. 201 também da Constituição Federal).

Irredutibilidade do valor dos benefícios

A irredutibilidade do valor dos benefícios está prevista no art. 194, parágrafo único, IV da Constituição Federal. O referido princípio garante a irredutibilidade do valor nominal da prestação. Ou seja, não permite a redução do valor do benefício. Entretanto o referido preceito, não garante a manutenção do valor real, a qual é dirigida apenas à área de previdência social (art. 201, § 4º da Constituição Federal), enquanto a irredutibilidade do valor do benefício aplica-se a toda a seguridade social.

Equidade na forma de participação no custeio

O princípio da equidade na forma de participação de custeio está previsto no art. 194, parágrafo único, inciso V, da Constituição Federal.

Em relação ao conceito de equidade na forma de participação no custeio Marisa Ferreira dos Santos defende que não há propriamente, correspondência entre equidade na forma de participação no custeio e o princípio da capacidade contributiva, devendo-se considerar, pelo princípio da equidade no custeio, não somente a capacidade econômico-financeira do sujeito passivo, mas, principalmente, a atividade por ele exercida, assim, “quanto maior a probabilidade da atividade exercida gerar contingências com cobertura, maior deverá ser a contribuição” (SANTOS, 2020, p. 137).

Há íntima relação entre este princípio, o da isonomia e o da capacidade contributiva, devendo ser aplicadas alíquotas iguais para contribuintes na mesma situação fática, e alíquotas desiguais para contribuintes em situação desigual.

Zélia Luiza Pierdoná entende que pelo princípio da equidade é “permitida a cobrança de valores dos usuários das prestações de seguridade social, na medida da sua própria renda ou de sua família” (PIERDONÁ, 2023, p. 63).

Diversidade da base de financiamento

O princípio da diversidade da base de financiamento está previsto no art. 194, parágrafo único, inciso VI, da Constituição Federal e visa a efetividade dos direitos de seguridade social na medida em que determina diversas bases de financiamento e não apenas as contribuições sobre a folha de salário da empresa e do trabalhador. Nesse contexto Zélia Luiza Pierdoná esclarece que:

O constituinte, além de ter criado um sistema amplo de proteção social, que visa proteger a todos, em todas as situações de necessidade, criou meios para garantir a sua efetivação, na medida que determinou a ampliação de seu custeio, estabelecendo a exigência de diversas bases para o financiamento da seguridade social (PIERDONÁ, 2023, p. 65).

O modelo de financiamento para a seguridade social está definido no art. 195 da Constituição Federal, pelo qual toda a sociedade, de forma direta e indireta, é responsável mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, bem como das contribuições sociais previstas no próprio art. 195 e no art. 239 da Constituição Federal, isso demonstra que a própria constituição estabeleceu pressupostos para a diversidade da base de financiamentos. O objetivo principal da diversidade da base de financiamento é garantir a efetividade da proteção social. Para Zélia Luiza Pierdoná, “a diversidade também permite a universalidade do custeio, que está expressamente prevista no caput do art. 195, quando preceitua que toda a sociedade financiará a seguridade social” (PIERDONÁ, 2023, p. 39).

Caráter democrático e descentralizado da gestão

O princípio do caráter democrático e descentralizado da gestão está previsto no art. 194, parágrafo único, inciso VII, da Constituição Federal. De acordo com o referido preceito constitucional a gestão deve ter caráter democrático e descentralizada da administração mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados, dos representantes e do governo nos órgãos colegiados. O texto original do inciso VII, do art. 194, da Constituição Federal, previa a “participação da comunidade, em especial de trabalhadores, empresários e aposentados”.

Na redação do preceito constitucional do art. 194 da Constituição Federal, não foram incluídos os usuários que não se enquadram nas categorias acima. Por exemplo, os beneficiários da assistência social, usualmente, não se enquadram em nenhuma das categorias. No caso dos usuários da saúde, estes podem ou não se enquadrar.

Em razão da falta de unidade do sistema, o art. 198 e o art. 204 da Constituição Federal estabelecem preceitos que revelam o citado princípio. O art. 198, caput, da Constituição Federal, determina que “as ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único”, que tem, como uma das suas diretrizes, a “descentralização, com direção única em cada esfera de governo”. A direção do Sistema Único de Saúde deve ser única e exercida pelo Ministério da Saúde no âmbito da União Federal, pelas Secretarias de Saúde ou órgãos equivalentes na esfera dos Estados, Distrito Federal e Municípios6.

Em relação à assistência o art. 204, I, II da Constituição Federal, esta determina que:

Art. 204. As ações governamentais na área da assistência social serão realizadas com recursos do orçamento da seguridade social, previstos no art. 195, além de outras fontes, e organizadas com base nas seguintes diretrizes: I – descentralização político-administrativa, cabendo a coordenação e as normas gerais à esfera federal e a coordenação e a execução dos respectivos programas às esferas estadual e municipal, bem como a entidades beneficentes e de assistência social; II – participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis.

Interpretando a saúde, como um dever do Estado deve-se compreender o Estado como poder público, que abrange União, Estados, Distrito Federal e Municípios, permitindo ao poder público mais próximo a execução das políticas públicas adequadas à necessidade da população local, o que garante a descentralização da saúde.

Solidariedade

O Princípio da Solidariedade segue dois objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, previstos no art. 3º, I e IV da Constituição Federal, que determinam a construção de uma sociedade justa e solidária e a redução das desigualdades sociais e regionais.

Além dos incisos do art. 3º, que tratam da solidariedade, como um princípio geral, este também é extraído dos preceitos constitucionais atinentes à solidariedade na seguridade social prevista nos art. 194, parágrafo único, e o art. 195, caput da Constituição Federal. De acordo com Zélia Luiza Pierdoná:

No que tange à seguridade social, os artigos 194 e 195 da Constituição demonstram que a solidariedade é à base da proteção social brasileira. O caput daquele artigo estabelece que as ações de seguridade social são de responsabilidade tanto dos Poderes Públicos quanto da sociedade, revelando a solidariedade no que tange à execução das ações protetivas. O caput do artigo 195 preceitua que o financiamento da seguridade social é de responsabilidade de toda a sociedade. O princípio da solidariedade desempenha um papel fundamental na seguridade social, a qual, por ter um caráter universal, proporciona proteção a todos aqueles que estão em situação de necessidade (PIERDONÁ, 2023, p. 22).

A solidariedade, além de desempenhar um papel fundamental na seguridade social, representa um dos pilares do Estado brasileiro, na medida em que permite a construção de uma sociedade livre, justa e solidária e possui um caráter universal, proporcionando a proteção a todos aqueles que estão em situação de necessidade.

Custeio prévio

O art. 195, § 5º, da Constituição Federal estabelece que “nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total”. Pelo preceito constitucional, não haverá saída (prestações de saúde, previdência e assistência), sem que haja a entrada de receitas que possibilitem os pagamentos das referidas prestações, ou seja, poderão ser criadas, majoradas ou estendidas prestações de seguridade social somente se houver recursos para tanto. Isso significa que o sistema protetivo não proporcionará benefícios sem que haja a contrapartida financeira (PIERDONÁ, 2023). Assim, o princípio do custeio prévio revela a decisão política de ampliar ou não o sistema protetivo, aliado à capacidade de financiamento da sociedade relacionada à proteção social.

Na saúde, o Ministério da Saúde, gestor das políticas públicas, é o responsável pela elaboração de uma tabela (Sistema de Gerenciamento da Tabela de Procedimentos, Medicamentos e Órteses, Próteses e Meios Auxiliares de Locomoção do SUS – SIGTAP), na qual estão previstos todos os procedimentos, medicamentos, bem como outros materiais disponibilizados pelo Sistema Único de Saúde.

Todavia, a fonte de custeio dos benefícios e serviços da seguridade social constitui um limitador à concessão de prestações de seguridade social e, portanto também da saúde. Quando uma prestação não prevista em lei é concedida, sem indicar de forma prévia a fonte de custeio, a mesma poderá gerar o comprometimento da integridade do sistema.

2.3. Áreas componentes da seguridade social

A Constituição Federal de 1988 instituiu um sistema de seguridade social abrangente, incluindo saúde, previdência e assistência social em um modelo de proteção social moderno e solidário (AITH, 2017).

2.3.1 Saúde

A saúde foi reconhecida pela Constituição Federal, do art. 196 ao art. 200, os quais fornecem a base jurídica da proteção ao direito à saúde. O art. 198, caput, I a III dispõe sobre os princípios básicos que devem reger as ações e serviços públicos de saúde. Os arts. 196 e 197 determinam os deveres do Poder Público. O art. 200 define a organização e a competência do Sistema Único de Saúde. O art. 198, §§ 1º, 2º e 3º determinam os patamares mínimos de financiamento das ações e serviços públicos de saúde. E o art. 199, por sua vez, define os critérios de participação da iniciativa privada na assistência à saúde.

A saúde é conceituada no art. 196 da Constituição Federal, como um “direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”7.

O aspecto, “direito de todos”, trata da ideia de universalidade, e ao aspecto de “dever do Estado”, equivale ao “dever dos poderes públicos na implementação da saúde”, ressaltando-se que o referido dever não é exclusivamente estatal.

Nesse sentido o entendimento de Davi Antônio Gouvêa Costa Moreira:

A previsão constitucional da saúde como “direito de todos e dever do Estado”, constante do art. 196, revela a pretensão tendente à sua universalização e, consequentemente, impõe ao Estado a responsabilidade pela sua, implementação. Isso implica, além das obrigações traduzidas em serviços e ações a cargo do Poder Público, também a responsabilidade estatal quanto à regulamentação, fiscalização e controle da assistência à saúde exercida pela iniciativa privada. A responsabilidade em matéria de saúde, entretanto, não se exaure no Estado, estendendo-se também às pessoas em geral, às unidades familiares, às empresas e à sociedade, conforme previsão constante do art. 2º, § 2º, da Lei nº 8.080/90 (MOREIRA, 2015, p. 98).

Paulo Vitor Bergamo Braga destaca que, além do art. 196, o art. 198, II, ambos da Constituição Federal, previu que as ações e os serviços de saúde deverão ser prestados mediante um atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais:

Essas duas previsões, as principais do regramento constitucional-sanitário, acabaram por ampliar a garantia do direito à saúde no país, alargando tanto a universalidade subjetiva, quanto a universalidade objetiva, que trata do conjunto de ações e serviços de saúde. A constituição consagra dessa forma, uma completa assistência, protegendo todas as pessoas de todos os riscos (BRAGA, 2017, p. 56).

O art. 3º da Lei 8.080/90 trata dos níveis de saúde que expressam a organização social e econômica do país, tendo a saúde como determinantes e condicionantes, entre outros, a alimentação, a moradia, o saneamento básico, o meio ambiente, o trabalho, a renda, a educação, a atividade física, o transporte, o lazer e o acesso aos bens e serviços essenciais.

O art. 5º da Lei 8.080/90, estabelece que cabe ao Sistema Único de Saúde identificar e divulgar os fatores condicionantes e determinantes da saúde, para que, com vista ao acesso universal e igualitário às ações e aos serviços de saúde, possam formular a política de saúde, destinada a promover, nos campos econômico e social, a inclusão das pessoas, da família, das empresas e da sociedade nas atividades de prestação desses serviços.

Zélia Luiza Pierdoná explica que o direito à saúde, por ser um direito social prestacional, exige do Poder Público a realização de atividades, que no caso do citado direito é de todas as esferas do governo, seja federal, estadual, distrital ou municipal, haja vista as disposições do art. 23, II da Constituição Federal:

Por ser um direito social, o direito à saúde é um direito prestacional, exigindo, portanto, a realização de tarefas pelo Poder Público. No caso da saúde brasileira, será de todas as esferas de governo: federal, estaduais, distrital e municipais, de forma unificada, haja vista o preceito do art. 198 da Constituição Federal, o qual estabelece que as ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de forma descentralizada, com direção única em cada esfera de governo, com atendimento integral, no qual será priorizada a prevenção, sem prejuízo da recuperação e, finalmente, com a participação da comunidade (PIERDONÁ, 2023. p. 48).

As ações e serviços de saúde, de acordo com o art. 197 da Constituição Federal, são de relevância pública, cabendo ao Poder Público dispor, por meio de lei, sobre a regulamentação, a fiscalização e o controle, devendo a sua execução ser realizada diretamente ou por meio de terceiros e também por pessoa física ou jurídica de direito privado. Assim, é possibilitada a assistência à saúde pela iniciativa privada, podendo, tais instituições participarem de forma complementar do Sistema Único de Saúde, mediante contrato de direito público ou convênio,8 (Lei nº 8.080/90 – Lei Orgânica da Saúde e Lei nº 9.656/98 que disciplina os planos privados de assistência à saúde).9

2.3.2. Previdência Social

A previdência social é uma área da seguridade social e é composta por um conjunto de princípios, regras e instituições destinadas a estabelecer um sistema de proteção social, mediante contribuição, que tem por objetivo proporcionar o mínimo necessário ao segurado e a sua família, conforme leciona Sérgio Pinto Martins:

A previdência social consiste, portanto, em uma forma de assegurar ao trabalhador, com base no princípio da solidariedade, benefícios ou serviços quando seja atingido por uma contingência social. Entende-se, assim, que o sistema é baseado na solidariedade humana, em que a população ativa deve sustentar a inativa, os aposentados. As contingências sociais seriam justamente o desemprego, a doença, a invalidez, a velhice, a maternidade, a morte etc. (MARTINS, 2015, p. 209).

A Constituição prevê a previdência obrigatória e a previdência complementar. A obrigatória tem como pressuposto o exercício de atividade remunerada e a contraprestação direta do segurado, por meio de contribuições sociais, tendo natureza profissional/contributiva. A previdência complementar, prevista no art. 202 e nos §§ 14 a 16 do art. 40 da Constituição Federal é organizada de forma autônoma em relação à previdência obrigatória, sendo a previdência complementar de cunho facultativo.

A obrigatória por sua vez, subdivide-se em regime geral e regime dos servidores. Os preceitos aplicáveis ao regime geral são estabelecidos no art. 201 e do regime dos servidores no art. 40 ambos da Constituição Federal. Por meio da proteção obrigatória o Estado viabiliza a todos os trabalhadores o acesso à previdência, garantindo-lhes proteção nas situações de necessidade elencadas no art. 201 da Constituição Federal, como por exemplo, morte, idade avançada, invalidez, entre outras.

De acordo com Zélia Luiza Pierdoná, “a proteção previdenciária obrigatória apresenta limites, que inclusive podem ser os mesmos no Regime Geral e nos Regimes Próprios, haja vista as disposições do art. 40, § 14, da Constituição Federal” (PIERDONÁ, 2023, p. 33).

2.3.3. Assistência Social

A assistência social encontra-se prevista nos arts. 203 e 204 da Constituição Federal e é o meio pelo qual é possível efetivar-se o princípio da universalidade, na medida em que a previdência atende aos trabalhadores e a assistência atende os demais necessitados.

O art. 203, da Constituição Federal de 1988, preceitua que a assistência social “será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social”. A assistência social, nos termos dos incisos do referido artigo, objetiva a proteção à família, à maternidade, à infância, adolescência e à velhice, o amparo às crianças e adolescentes carentes, a promoção da integração ao mercado de trabalho, a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária e, por fim, a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.

A responsabilidade pela execução da assistência social é de todos os entes federativos, nos termos do art. 23, II, da Constituição Federal.

No que diz respeito ao programa de apoio à inclusão e promoção social, o parágrafo único do art. 204 da Constituição Federal, faculta aos Estados e ao Distrito Federal vincular, em seus orçamentos, receitas tributárias à assistência social, especificamente, até cinco décimos por cento de sua receita tributária líquida, ao programa de apoio à inclusão e promoção social.

2.3.4. Financiamento da seguridade social

Para garantir a proteção social, a Constituição Federal prevê meios que correspondem ao financiamento da seguridade social, cuja responsabilidade, conforme o caput do art. 195 é de toda a sociedade que o faz de forma direta e indireta.

Para Zélia Luiza Pierdoná, no que tange a forma indireta de financiamento, esta “é efetivada pela destinação de recursos do orçamento fiscal e pela parcela dos recursos dos concursos de prognósticos promovidos pelo Poder Público destinada à seguridade social” (PIERDONÁ, 2023, p. 26).

Já a forma direta de financiamento trata da responsabilidade de participação da sociedade por meio de contribuições sociais, as quais estão arroladas nos arts. 195 e 239 da Constituição Federal, além de outras fontes, que poderão ser instituídas via competência residual, prevista no § 4º do art. 195, e por meio de previsão decorrente do poder constituinte reformador.

No caso da saúde, no que tange ao financiamento indireto, é efetivado nos termos § 2º do art. 198, com redação dada pelas Emendas Constitucionais nº 29 e nº 86 que será objeto de estudo no item 2.3.2.

Em relação ao financiamento direto, conforme referido acima, é efetuado por meio das contribuições sociais cuja receita também se destina a saúde. A seguir serão tratadas de forma sucinta as mencionadas contribuições:

Do empregador, da empresa e da entidade a ela equiparada sobre a folha de pagamento, sobre a receita ou faturamento e sobre o lucro

De acordo com a Constituição Federal as contribuições do empregador, da empresa e das entidades a ela equiparada incidem sobre: a) folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, à pessoa física que lhe preste serviço, mesmo sem vínculo empregatício; b) a receita ou o faturamento e; c) o lucro.

Assim, quanto à materialidade as contribuições da empresa incidem sobre, a remuneração paga, devida ou creditada aos segurados e demais pessoas físicas que lhe prestem serviços, mesmo sem vínculo trabalhista; sobre a receita ou faturamento além do lucro, que é a base de cálculo de dois tributos: o imposto de renda da pessoa jurídica e a contribuição social sobre o lucro líquido (DIAS, 2020).

Do trabalhador e dos demais segurados da previdência social

De acordo com a redação do art. 195, II, da Constituição Federal, serão obrigados ao pagamento das contribuições sociais “o trabalhador e dos demais segurados da previdência social”. Marisa Ferreira dos Santos observa que:

Os segurados são sujeitos passivos da relação jurídica de custeio, do qual participam em razão do disposto no art. 195, II, da CF. Estão obrigados ao pagamento das contribuições previstas nos arts. 20 e 21 do PCSS, conforme se enquadrem como segurados empregados, empregados domésticos e trabalhadores avulsos (art. 20) e segurados contribuintes individual e facultativo (SANTOS, 2020, p. 36).

Portanto, a expressão trabalhadores abrange todas as formas de prestação de serviços, ou seja, é todo aquele que presta serviços, seja como empregado, seja por conta própria, seja para outrem mesmo que sem vínculo empregatício (MACHADO, 1992, p. 104).

Receita de concursos e prognósticos

O art. 195, III, da Constituição Federal, estabelece que sobre a receita de concursos                      de   prognósticos   haverá   contribuição.   Regulamentando   o    referido dispositivo constitucional, o art. 26 da Lei 8.212/1991, preceitua que “constitui receita da seguridade social a renda líquida dos concursos de prognósticos, excetuando-se os valores destinados ao Programa de Crédito Educativo” (MARTINS, 2015, p. 2019). Segundo a definição de Sérgio Pinto Martins, “concurso é competição, certame.

Prognóstico tem sentido de previsão, predição. Concurso de prognóstico envolve a previsão por uma pessoa do resultado do concurso. Envolve o valor sorte” (MARTINS, 2015, p. 120).

Do importador de bens ou serviços do exterior

O art. 195, IV da Constituição Federal, estabelece a competência para instituir contribuição do importador de bens e serviços do exterior. De acordo com Wagner Balera, a intenção do Fisco, com a instituição da referida contribuição, é o tratamento isonômico entre a tributação dos bens produzidos e serviços prestados no país “que sofrem a incidência da Contribuição para o PIS-PASEP e da COFINS, e os bens e serviços importados de residentes ou domiciliados no exterior, que passam a ser tributados com as mesmas alíquotas dessas contribuições” (BALERA, 2016, p. 45).

Do produtor, do parceiro, do meeiro e do arrendatário rurais e do pescador artesanal

De acordo com o art. 195, § 8º da Constituição Federal, “o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rural e o pescador artesanal, bem como os respectivos cônjuges, que exerçam suas atividades em regime de economia familiar, sem empregados permanentes, contribuirão para a seguridade social mediante a aplicação de uma alíquota sobre o resultado da comercialização da produção e farão jus aos benefícios nos termos da lei”.

No momento em que o produtor rural, o parceiro, o meeiro, o arrendatário rural e o pescador artesanal comercializam o produto, estes demonstram a sua capacidade contributiva.

Contribuições para o Programa de Integração Social (PIS) e para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (PASEP)

A Contribuição do PIS-PASEP, prevista no art. 239 da Constituição Federal é vinculada, especificamente, ao financiamento do seguro desemprego e do abono anual previsto do referido dispositivo constitucional.

Registra-se que nos termos do art. 201, III da CF a proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário é incluída na proteção previdenciária, motivo pelo qual as contribuições para o PIS-PASEP são contribuições para a seguridade social.

Outras contribuições

Como visto acima, a Constituição Federal estabeleceu os pressupostos de diversas bases de cálculo para as contribuições, nos incisos do art. 195, bem como no art. 239, no qual recepcionou as contribuições do PIS/PASEP e as destinou também à seguridade social. Além disso, no § 4º do art. 195 permitiu a criação de novas fontes, por meio de lei complementar.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Constituição Federal de 1988 assegura o exercício dos direitos sociais, os quais tem por objetivo atingir a igualdade material e a justiça social. Dentre os direitos sociais encontram-se aqueles que garantem a proteção social por meio de um sistema integrado de ações, nos termos do art. 194 da Constituição Federal. O referido sistema foi denominado seguridade social que compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos à saúde, à previdência social e à assistência social. Desta forma, a seguridade social está pautado nos princípios previstos no art. 194, parágrafo único, bem como no art. 195, caput e § 5º da Constituição Federal.

Nesse sentido o princípio da universalidade de cobertura e do atendimento tem a finalidade fazer com que as pessoas em todas as situações que demandem intervenção estatal sejam atendidas, entre as quais, a área da saúde, como forma de proteger todas as situações geradoras de necessidades. O princípio da universalidade, tanto em seu aspecto subjetivo (todas as pessoas), como no seu aspecto objetivo (situações a serem atendidas) constitui um ideal a ser alcançado. Em razão desse princípio, todos devem ter acesso aos benefícios e serviços do sistema de seguridade social.

A universalidade da cobertura está relacionada à garantia do máximo de cobertura aos chamados riscos sociais, enquanto que a universalidade do atendimento da seguridade social está relacionada às pessoas, aos sujeitos atendidos. Porém, a efetividade do princípio da universalidade não significa necessariamente a proteção igualitária de todos, pois a proteção se dará com base nas particularidades sociais em que se encontra envolvido o indivíduo.

Por ser um direito social, o direito à saúde é um direito prestacional, exigindo, portanto, a realização de tarefas pelo Poder Público. No caso da saúde, a responsabilidade será de todas as esferas de governo: federal, estaduais, distrital e municipais, de forma unificada, haja vista o preceito do art. 198 da Constituição Federal, o qual estabelece que as ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de forma descentralizada, com direção única em cada esfera de governo, com atendimento integral, no qual será priorizada a prevenção, sem prejuízo da recuperação e, finalmente, com a participação da comunidade.


4Não só do Estado, exemplo disso é o preceito do art. 194, caput da Constituição Federal: “ações dos poderes públicos e da sociedade”.
5A seguridade social como a rede protetiva formada pelo Estado e particulares, com contribuições de todos, incluindo parte dos beneficiários dos direitos, no sentido de estabelecer ações positivas no sustento de pessoas carentes, trabalhadores em geral e seus dependentes, providenciando a manutenção de um padrão mínimo de vida digna, além de garantir saúde para todos.
6BRASIL. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Sistema Único de Saúde. Brasília: CONASS, 2023, p. 24.
7Art. 196 da Constituição Federal.
8Art. 197 da Constituição Federal dispõe que: são de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado.
9BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Lei 8.080, de 19 de setembro de 1990.
Disponível em: conselho.saude.gov.br/legislação/lei8080.htm. Acesso em: 03 mar 2023.

REFERÊNCIAS

AITH, Fernando Mussa Abujamra. Efetivação do direito à saúde em seus múltiplos caminhos. Novas institucionalidades para a solução de conflitos em saúde. In: BUCCI, Maria Paula Dallari; DUARTE, Clarice Seixas (Org.). Judicialização da saúde: a visão do poder executivo. São Paulo: Saraiva, 2017.

BALERA, Wagner. A seguridade social na constituição de 1988. 8 ed. São Paulo: Ltr, 2016.

BRAGA, Paulo Vitor Bergamo. Judicialização, assistência farmacêutica e argumentação, Análise da jurisprudência do TRF da 3ª Região. In: BUCCI, Maria Paula Dallari; DUARTE, Clarice Seixas (Org.). Judicialização da saúde: a visão do poder executivo. São Paulo: Saraiva, 2017.

BRASIL. Ministério da Saúde. SIGTAP. Sistema de Gerenciamento da Tabela de Procedimentos, Medicamentos e OPM do SUS. Disponível em: http://sigtap.datasus.gov.br/tabela-unificada/app/sec/inicio.jsp Acesso em: 20 mai. 2023.

BRASIL. Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde. Lei 8.080, de 19 de setembro de 1990. Disponível em: conselho.saude.gov.br/legislação/lei8080.htm. Acesso em: 22 abr. 2023.

BRASIL, Planalto. Constituição Federal. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 10 abr. 2023.

BRASIL. Conselho Nacional de Secretários de Saúde. Sistema Único de Saúde. Brasília: CONASS, 2023.

DIAS, Eduardo Cunha. A reforma da previdência e o regime de contribuição das empresas. Revista Dialética de Direito Tributário. 42. março de 2020.

MACHADO, Hugo de Brito. Contribuições sociais. In: Martins, Ivens Gandra da Silva (coord.). Caderno de Pesquisa Tributária. São Paulo: Resenha Tributária. V. 17, 1992.

MARTINS, Sérgio Pinto. Direito a seguridade social: custeio da seguridade social – Benefícios – Acidente de trabalho – Assistência social – Saúde. 35. ed. São Paulo: Atlas, 2015.

MOREIRA, Davi Antonio Gouvêa Costa. A concretização do direito fundamental à saúde e a judicialização do acesso a medicamentos: em busca de parâmetros adequados para a tutela judicial, Rio de Janeiro: Lumem Juris 2015

PIERDONÁ, Zélia Luiza. A proteção social na constituição de 1988. Disponível em: http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/16475-16476-1-PB.pdf. Acesso em: 08 mai. 2023.

PIERDONÁ, Zélia Luiza. O sistema de seguridade social brasileiro. Disponível em: http://www.conpedi.org.br/wp-content/uploads/2016/03/Vol.-6-Madrid.pdf. Acesso em: 05 mai. 2023.

PIVETTA, Saulo Lindorfer. O direito fundamental à saúde: regime jurídico, políticas públicas e controle judicial. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014.

SANTOS, Marisa Ferreira dos. Direito previdenciário esquematizado. 3. ed. de acordo com a Lei n. 12.618/2012. São Paulo: Saraiva, 2020.


1Doutora em Desenvolvimento Rural Sustentável pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE. Mestre em Direito pelo Centro Universitário de Maringá – UNICESUMAR. Especialista em Direito Civil e Processual Civil pela Unível Centro Universitário – UNIVEL.
2Doutor em Desenvolvimento Rural Sustentável pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE. Mestre em Direito pelo Instituto Presbiteriano Mackenzie – MACKENZIE. Especialista em Direito do Trabalho pela Universidade do Norte do Paraná – UNOPAR.
3Advogado. Especialista em Direito Médico pela Faculdade Verbo Educacional – VERBOEDU. Especialista em Direito Tributário pela Universidade Anhanguera – ANHANGUERA.