REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10116963
HAJLI, Sandra Maalouli1
Resumo
Este artigo apresenta uma análise do Novo Museu de Acrópole, (Grécia,1990), de autoria do arquiteto Roberto Loeb, com foco na circulação e percurso. A premissa é que o arquiteto explora esse sistema, como elemento ordenador e gerador do partido arquitetônico, para criar espaços variados, cheios de possibilidades e descobertas, que se revelam durante a promenade architecturale. O objetivo é investigar as estratégias projetuais adotadas no projeto. Palavras-chave: concurso, projetos não construídos, análise gráfica Abstract
1-Introdução
A pesquisa em curso, tem como objetivo analisar os projetos de concurso não construídos do arquiteto Roberto Loeb com foco no sistema de circulação. O percurso consolida-se como um instrumento fundamental de leitura e escrita do espaço, capaz de revelar as estratégias projetuais, conceitos, programa e partido, adotados pelo arquiteto, (…) mecanismos, procedimentos, paradigmas, e procedimentos formais que persistem nos trabalhos dos arquitetos, ferramentas que eles usam para dar forma às suas construções. (MONEO, 2004, p.2), valores que refletem na estrutura intelectual e constroem novas ideias. Dessa forma, no âmbito da arquitetura os projetos não-construídos são como vestígios de histórias deixados pelo caminho, a identificação das estratégias projetuais a partir da análise de plantas, cortes e outros desenhos torna-se fundamental para o pleno entendimento do projeto e contribuem para uma maior compreensão do conjunto de sua obra. Graduado em 1965 na Faculdade de Arquitetura Mackenzie, o caráter visionário é uma característica intrínseca de Loeb. Em suas primeiras pesquisas propôs uma arquitetura pneumática, com materiais infláveis que não tem que ver com a construção real, a ideia do efêmero, não raro ressurgem de forma parcial ou reinterpretada na sua obra edificada ou não, como um arquiteto Stalker , busca no caminhar um modo de ver, mas sobretudo de criar paisagens.
Esse turbilhão de ideias encontra nos concursos de arquitetura a base legitimadora para um mundo de possibilidades, na busca da excelência e conhecimentos. (…)o concurso vale a pena: ele leva o profissional à reflexão e ao exercício de ideias, cria novos repertórios. Independentemente do resultado o concurso é uma oportunidade para pensar temas complexos. (LOEB2014,p.299) Participar de concursos é uma prática tradicional entre os arquitetos que perdura há mais de 2500 anos, tendo como marco referencial o concurso de projetos para a construção do Parthenon, realizado no ano 448 A.C por Péricles
.“O Conselho de Atenas decidiu erguer na Acrópole um memorial de guerra, porém, de uma forma inovadora, foi solicitado aos artistas para desenvolverem e submeterem a sua melhor proposta” (de HILDE, de HAAN e HAAGSMA, 1998, p.9)
Na Encyclopédie Méthodique (1801), Quatremère de Quincy, escreve o verbete “concurso”, entendido pelo autor como instrumento crítico e emergente da arte e arquitetura, incorporando as transformações políticas e sociais ocorridas na França no início do século XIX. (…) A ambição ou o desejo de ser o primeiro, essa força que move os artistas, se degenera facilmente em inveja. Essa paixão que se alimenta sobretudo das preferências particulares perderá seu lado maligno se pudermos abrir o combate em uma arena pública, para que as diferenças entre os artistas e suas obras não seja o resultado de alguma espécie de favor ou de predileção; (QUINCY, apud SOBREIRA, 2018, p.33)
Este artigo, tem como objetivo investigar o projeto apresentado no Concurso Internacional do Novo Museu de Acrópoles (NAM), promovido no ano de 1989 pelo Ministério da Cultura da Grécia em parceria com a União Internacional de Arquitetos (UIA) em Paris e da UNESCO, motivado pela ideia de a Grécia recuperar os frisos do templo do Parthenon, retirados do seu local original pelo Lord inglês Elgin no fim do século XVIII.
O Museu proposto por Roberto Loeb e equipe , a partir de um estudo cuidadoso do entorno e sua história, é uma releitura contemporânea dos teatros Dionysos e Herodes. O arquiteto cria espaços de circulação que conectam os ambientes internos e externos do edifício na malha urbana e sugere a possibilidade de expansão do museu, como será visto adiante. A partir do registro sistemático do conjunto da obra do arquiteto entre 1965-2021 a pesquisa identificou 284 projetos, construídos ou não. (graf.1.) Desses, foram elaborados 43 projetos para concursos (15%) (graf.1.a), sendo 12 projetos desenvolvidos para concurso nacional (28%), 22 projetos para concurso privado (51%), 7 projetos elaborados para concurso internacional (16%) e 2 projetos para concurso municipal (5%), (graf.1.c) sendo premiado em 12 projetos (30%), (graf.1.d).
Constatou-se que o arquiteto Roberto Loeb participou ativamente de concursos de arquitetura, nacionais e internacionais, públicos e privados. Nos anos de 1980, a União Internacional dos Arquitetos (UIA), incentivou a adoção de concursos internacionais, sobretudo para enfatizar o exercício da arquitetura contemporânea e seu papel na sociedade. Neste período Loeb participou dos concursos para o Parc La Villette(França,1982); Indira Gandhi National Centre of Arts (India,1986); Biblioteca de Alexandria (Egito,1989) Le Murate (Italia, 1987); Novo Museu de Acrópoles (Grécia,1990); Waterfront (Estados Unidos,1987); Nova Capital da Alemanha,(1991).
A partir da análise do material gráfico, disponibilizado pelo arquiteto, foi possível identificar algumas características, não só do ponto de vista da forma e espaço ,mas principalmente a questão da circulação envolvendo aproximação ao edifício, acessos, percursos internos e externos, visuais, decorrentes de um conceito e um partido bem definido pelo arquiteto: (i)
E.Elementos de circulação
Fonte: elaborados pela autora 2021
a definição de múltiplos volumes para atender futuras expansões sem interferir na ideia do conjunto edificado (43%); (ii) a valorização do sistema de circulação e percurso como elemento ordenador e gerador do projeto, rampas (62%), passarelas e percursos aéreos (71%); (iii) acentuados contrastes entre formas, escalonadas (31%), curvilíneas, sobrepondo planos, destacando elementos; (iv) a hibridização de diferentes elementos geométricos: arcos, circulo, triangulo, esfera; (v) qualificação dos espaços: praças(57%), espelho d’água (50%), integração com a paisagem, áreas de contemplação (40%)(Graf. e)
Os procedimentos metodológicos adotados na realização da pesquisa envolveram as seguintes etapas:
i)Levantamento sistemático de todo o material iconográfico em sites como Research Gate, Publish or Perish, Web of Science, Plataforma Sucupira Google Acadêmico: publicações em revistas especializadas de arquitetura (212); jornais (5); livros (1); prêmios (37); palestras e exposições (12) artigos acadêmicos, teses de doutorado e dissertações de mestrado (127), portfolio impresso (1), lista de projetos (1) vídeo e materiais veiculados em meio digital (34).
ii)Levantamento in loco do material físico existente no acervo do arquiteto entre 1965-2021: Foram digitalizadas 5664 imagens entre pranchas, croquis, desenhos, projetos construídos ou não realizados, maquetes, material de exposições em bienais de arquitetura, mostras de arquitetura, exposições do arquiteto, desenhos e projetos desenvolvidos no período de Fig. 2; pranchas originais do acervo do arquiteto, imagens tratadas pela autora, maquete 3d desenvolvida para análise do projeto. estudante no Mackenzie (1964), fotografias de projetos construídos ou não de autoria da fotógrafa e artista visual Lucia Mindlin Loeb, totalizando 336 pastas.
iii) informações obtidas com o arquiteto a partir de entrevistas;
iv) levantamento de informações sobre o concurso do Novo Museu de Acrópole em sites, artigos academicos, com destaque para o livro raro, adquirido no ebay no interior da Inglaterra: Filippopoulou, E. (ed). 1991. The New Acropolis Museum – International Architectural Competition (in Greek and English). Athens: Ministry of Culture,apresenta a diversidade das 438 propostas submetidas para o concurso de 1990.(fig.3a)
v) Tratamento das pranchas originais do acervo do arquiteto;(fig.2)
vi) Redesenho bi e tridimensional utilizando o software Revit, construção da maquete e impressão 3D (FDM) e para renderização o software Lumion auxilia nas imagens foto realistas e o Photoshop e In design para o acabamento final.(fig.2)
vii) análise do projeto do percurso e circulação por meio de sequência de imagens e desenhos, como num storyboard, simulando a experiência vivenciada do movimento no museu
Importantes estudiosos tais como, Ana Tagliari; Wilson Flório(2022); Alberto Sdegno(2011); Larry Sass; Nicholas Webb e André Brown(2011); Andrzej Zarzycki(2006); Alejandro Lapunzina(2001); Takehiko Nagakura entre outros são referencias para a pesquisa.
Este artigo está organizado em cinco partes: i- introdução; ii- contexto e história do concurso do NAM; iii-circulação e percurso; iv- A experiência do “passeio arquitetônico” no Novo Museu de Acrópoles; v- discussão e considerações finais.
2- Contexto e História
2.1. A odisseia do NAM
A relação entre, o simbolismo cultural e a alusão da poética nacionalista através do patrimônio arquitetônico, constituem a narrativa dos trinta e quatro anos que separam as quatro competições para o Novo Museu de Acrópole (NAM). “Acrópole” é, deve-se notar, um termo ocidental estabelecido para o que na Grécia é conhecida como “A Rocha Sagrada da Acrópole”. A transformação do nome em um signatário livre e desvinculado no pensamento ocidental, há muito ameaçam arrancar o significado da Rocha Sagrada e de sua particularidade incorporada na sociedade e cultura grega. (LOUKAKI,1997).
Tais ameaças têm provocado periodicamente resistência por parte dos gregos, cujas lutas para construir um Estado e forjar um senso de identidade política, econômica e artisticamente nacional têm sido estritamente ligadas à interpretação de seu patrimônio arquitetônico e arqueológico.
Os concursos nacionais de 1976 e 1978 promovidos pelo Ministério da Cultura da Grécia, para a construção do novo museu no distrito de Makriyanni não tiveram sucesso em encontrar uma solução formal e conceitual, não apenas devido à natureza do local em relação ao programa de construção, mas também pela falta de informações apresentadas.
Em 1987, com o título de Patrimônio Mundial da Unesco da “Acrópole de Atenas”, foi organizada a terceira chamada para o projeto do novo museu em 1989, fomentada pela ideia de a Grécia recuperar os frisos do templo do Parthenon, retirados do seu local original pelo Lord inglês Elgin no fim do século XVIII.
O concurso se tornou um evento verdadeiramente internacional ligando a construção do NAM ao quadro da UIA-UNESCO, responsável pela organização do concurso que acabou sendo anulado, pois no local destinado a construção do museu (Makriyanni), foram descobertas ruínas de um assentamento urbano.
No ano 2000, o Ministério da Cultura procedeu à abertura de um quarto concurso internacional, e mais uma vez o embate público se mostrou inevitável, chegando a ser questionado pela imprensa local a falta de transparência, considerando que a competição se tratava de uma atribuição direta aos vencedores, segundo Stavros Xarchakos 2002. (Jornal Oficial das Comunidades Europeias, C277E/10614.11.2002)
O projeto vencedor de Bernard Tshcumi Architects e Michael Photiadis Architects, para o Novo Museu da Acrópole, apesar de construído, não chegou a um consenso da sociedade. Ao contrário da intervenção do arquiteto grego Dimitris Pikionis em 1954, no projeto conhecido como Paths (caminhos), que envolveu a retirada da estrada asfaltada e sua substituição por uma trilha, ligando a Acrópole até a colina de Philopappos, considerada congruente com a estética grega predominante. O arquiteto tem nas pedras o seu material principal, o caminho, possui grande valor na sua síntese espaço-temporal, na relação respeitosa entre a imagem, a identidade e a memória do lugar. Para Tzonis e Lefaivre, no caso de Pikionis a poesia converge com a arquitetura que torna o trabalho humano natural, real e objetivo. (TZONIS, LEFAIVRE, 1981)
2.2 O concurso internacional do NAM de 1989
O concurso foi anunciado em 16 de maio de 1989 pelo Ministério da Cultura em parceria com a União Internacional de Arquitetos (UIA) em Paris e da UNESCO. Dividido em duas etapas contou com 1.270 inscrições de 52 países sendo 156 equipes formadas por arquitetos gregos. Ao final foram submetidos 438 projetos de 41 países. A primeira etapa encerrada em 28 de abril de 1990, premiou vinte e quatro estudos dos quais dez foram selecionados para a segunda etapa. Em 10 de novembro de 1990, a segunda etapa pôs fim à competição com a premiação dos três primeiros colocados e uma menção especial.
O edital indicou três possíveis locais nas proximidades da Rocha Sagrada para a construção do NAM, na tentativa de apaziguar os ânimos das associações gregas que se opunham à construção: i) o distrito de Makryianni, inserido no tecido urbano, com uma área total de 24.150 m²; ii) o distrito de Dionysos, próximo da colina Philopappos, com uma área total de 5.895 m²; iii) o distrito de Koile, na colina Philopappos (Templo das Musas-Museion) com uma área total de 25.434 m².
O programa de necessidades fornecido pela organização da competição previa, 8.800 m² de área de exposições, sendo que a maior galeria deveria ser dedicada as Esculturas do Parthenon que deveriam ser devolvidas pelo Museu Britânico ao Governo Grego; ii) instalações para visitantes; iii) áreas para eventos culturais (sala multiuso e galeria para exposições periódicas); iv) oficinas de restauro e conservação; v) lojas arqueológicas; vi) áreas administrativas; vii) estacionamento.
Segundo a comissão internacional dos jurados, composta por oito estrangeiros, seis gregos e estava prevista a participação de jurados da Associação Grega de Arquitetos, que não participaram, por se oporem à competição: i) as propostas apresentadas demonstram que não houve unanimidade quanto a escolha do local, mas a mesma estava diretamente ligada ao partido adotado; ii)o programa fornecido poderia ser modificado de acordo com as exigências da proposta dos arquitetos, mas a maioria dos concorrentes seguiram o programa fornecido, iii) do ponto de vista tipológico, prevaleceram as tendências da arquitetura contemporânea, todas as soluções foram respeitadas pelo júri desde que o arquiteto conseguisse levar suas ideias a uma conclusão satisfatória,(1991). Em primeiro lugar, a equipe de Lucio Passarelli e Manfredi Nicoletti (Itália)(fig3.a); em segundo lugar a equipe formada por Tasos Biris, Dimitris Biris, Panos Kokkoris e Eleni Amerikanou (Grécia), (fig.3.b); O terceiro prêmio para Raimund Abraham (Áustria – EUA), e a menção especial para Chi Wing Lo e Panagiota Davladi (Grécia).( FILIPPOPOULOU ,1991)
Fig. 3; Filippopoulou, E. (ed). 1991. The New Acropolis Museum – International Architectural Competition (in Greek and English). Athens: Ministry of Culture. Projeto Loeb p.342
3- Circulação e Percurso
Ao desenvolver os projetos eu faço uma simulação do percurso, um passeio imaginário, como seu eu me transformasse em um pequeno ser, andando pelos espaços, não é que eu vou desenhando imediatamente uma forma e depois eu encaixo a circulação, é claro que está relacionado com a topografia, a orientação do sol, com a necessidade do cliente, mas eu procuro qualificar os espaços para as pessoas vivenciarem diferentes percepções. (LOEB,2021)
É possível analisar a circulação e o percurso no projeto de arquitetura a partir de critérios funcionais, conceituais e perceptivos. Analisar, implica vivenciar a obra, seja por meio de desenhos, fotos, modelos tridimensionais, textos, é a ideia da promenade architecturale, que nos faz compreender a intenção do arquiteto.
O exercício analítico de um projeto por meio de desenhos ressaltam características físicas, técnicas, conceituais, simbólicos. O desenho, representa aquilo que não pode estar presente … Ele funciona no intervalo entre o pensamento e a coisa, provocado tanto pela ausência da arquitetura quanto por sua presença. (ALLEN,p.73).
Importantes autores, desenvolveram métodos de análise gráfica com diferentes aproximações, seja de ordem geométrica (conceitos), seja de ordem topológica (características espaciais e perceptivas), tais como: Geoffrey Baker(1991), Francis D.K. Ching (2015), Simon Unwin(2015), Clarke e Pause (1997), entre outros.
A pesquisadora Ana Tagliari (2018), utiliza o termo Modelos Conceituais de Percurso, para diferentes tipos de circulação e percurso em momentos distintos da história da arquitetura: i) -Modelo conceitual de circulação clássica Beaux-Arts: Marche. O movimento pelo edifício que faz o usuário perceber a enfilade, ou sequência e organização dos ambientes, geralmente compartimentados; ii)- Modelo conceitual de circulação na Arquitetura Moderna: apreciar o espaço como um todo, num sistema de circulação presente num espaço amplo, fluído e desobstruído; iii)-Modelo conceitual de circulação no período da Pós-Modernidade: Os espaços e ambientes são descobertos de maneira a criar surpresas e descobertas, quadro a quadro, estimulando a curiosidade e percepções; iv)-Modelo conceitual de circulação na Arquitetura Contemporânea: A pluralidade e diversidade são características marcantes deste período. Portanto, identificamos uma mistura entre conceitos Modernos e Pós-Modernos na abordagem da circulação, unindo a fluidez e domínio do espaço da promenade com as descobertas quadro a quadro do período pós-moderno.
Com a pretensão de uma compreensão mais abrangente das intenções do arquiteto, a investigação do projeto não construído do NAM, valeu-se do uso de modelos tridimensionais e simulações digitais, que permitiu gerar imagens renderizadas a partir de percursos preestabelecidos, de modo que a sequência de imagens apresentada ofereça noções sobre as relações espaciais entre os diferentes ambientes, fundamental para compreender a organização temporal dos espaços concebidos pelo arquiteto.
4- A experiência do “passeio arquitetônico” no Novo Museu de Acrópoles
O projeto proposto por Loeb não se limitou ao programa do museu, uma vez que a liberdade de escolha entre três locais fornecido pela organização da competição, foi considerado pelo arquiteto como uma oportunidade de explorar, para além da circulação do edificio do NAM, uma solução de circulação urbana que liga os tres distritos ao monte sagrado de Acropoles. Makryianni (NAM), Dyonisos (Centro de Visitação) e Koile (Estacionamento e Terminal de Visitantes).
O principal objetivo desta proposta de projeto seria valorizar a região e regenerar áreas isoladas e fragmentadas que se formaram durante o crescimento urbano da cidade. Em seu ambicioso projeto, dada a dificuldade do contexto historico e paisagistico, o arquiteto idealizou a construção de um sistema de transporte elétrico leve, que acompanha o perfil topografico da colina de Koile e se conecta ao distrito de Dionysos.(fig.4 implantação linha vermelha)
A implantação de um estacionamento em Koile contribui para organizar o fluxo de veículos e onibus de turismo, para proteger as esculturas da degradação gerada pela poluição, mas também outro aspecto importante, que pode ser considerado para a escolha do local, é o fato de ser o único sem ligação visual direta com Acrópole. Dessa forma, ao longo do trajeto percorrido pelo bonde elétrico em direção ao Centro de Visitação em Dyonisos, os usuários são contemplados com surpresas e encantos da paisagem circundante, que se descortinam gradualmente, culminando na aparição imponente do Parthenon. (fig.4 perspectiva linha vermelha)
Junto ao estacionamento arborizado foi proposto um edificio de estrutura metalica e cobertura arqueada com fechamento em cobre, acessado por rampas e elevadores que conectam o terminal de passageiros e pontos de saida dos onibus e carros. No piso inferior se encontram os vestiarios, uma cafeteria e escritorios administrativos, e no piso superior, a estação do bonde elétrico que interliga a Colina de Philopapos a Dyonisos. (fig.4implantação área verde)
Para os visitantes que chegam de carro ou ônibus, e estacionam em Koile, além do transporte coletivo que conectam a Colina Philapoppos ao centro de visitantes em Dionysos, eles tem a opção de caminhar pelas trilhas idealizadas por Pikonis (1954) que aludem aos jardins japoneses, conhecidos por proporcionar diferentes sensações dos que experimentam o trajeto, passando pelo centro de visitação e terminando em Acrópole. (fig.4 implantação linha azul petróleo)
Fig.4 Desenhos de Implantação , plantas e perspectivas retirados do acervo do arquiteto Roberto Loeb, 2021. Legenda de cores: laranja: NAM; amarelo:Centro de Visitação; verde: Estacionamento. Vermelho:circulação vertical (rampas e escadas e elevadores, bonde elétrico); Azul claro: percursos, azul petróleo percurso existente.
O Centro de Visitantes em Dionysos, foi concebido como um elemento chave para organizar a rede de circulação e os serviços de apoio aos turistas. O conjunto é composto por um edifício longo na forma de um centípede, de estrutura metálica aparente sobre pilotis, formando uma marquise que abriga a estação de bondes elétricos que transporta os visitantes do estacionamento situado em Koile e vice-versa. No primeiro andar com acesso por escadas, rampas e elevadores está o novo restaurante Dionysos e tambem um salão para visitantes especiais (VIP e jornalistas).
O antigo restaurante transformado em uma área de serviço se liga ao novo edifício por uma passarela de metalica. A cobertura arqueada do restaurante, com fechamento em vidro, permite visualizar os templos de Acrópoles seja de dentro do restaurante ou seja da varanda, que se estende ao longo do edifício. No nível da grande praça, foram instalados contêiners metálicos pintados com cores brilhantes, para abrigar os serviços de apoio ao turista como, vestiarios, lojas, cafeteria, enfermaria, estacionamento de bicicletas, aluguel de carros elétrico entre outros. Essas estruturas foram pensados pela possibilidade de uma rapida expansão. (fig.4 implantação área amarela)
A partir do centro de visitação, Loeb planejou duas rotas para o museu, com a renovação do uso das vias urbanas Dionysious Aeropagitou, Chatzichristou e Mitseon, transformadas em caminhos de pedestres. Ao longo de sua extensão o trajeto ocorre sobre um desenho de piso de concreto entremeado com pedras, onde foram criadas áreas de descanso protegidas pela vegetação para tornar o passeio mais confortavel. (fig.4.0 implantação linha azul claro)
Continuando a caminhada podemos avistar partes do NAM, que se alteram a medida que nos aproximamos ou mudamos de direção, devido a sua forma circular, que nos conduz a diferentes campos de visão, com descobertas graduais ao longo do percurso.(fig.5.0)
Seguindo pela Rua Chatzichristou,(A) nos deparamos com o novo museu, que parece reler as formas tradicionais dos anfiteatros gregos(B). Embora nascendo do contexto, o arquiteto propôs uma nova versão, dotada de grande vivacidade(C), expressa principalmente pela volumetria em balanço escalonada (D)e pela composição da fachada(E), com fechamentos e aberturas cuidadosamente planejados de modo a evitar a luz direta proveniente do sul(F).
A segunda rota é realizada pela via Dionysious Aeropagitou (G) até alcançar a rua Mitseon(H), a visão que se tem é admirável, uma monumentalidade onírica que se configura no conjunto de edifícios, organizados diante da topografia(I). Uma profusão de conexões interliga os volumes(J), formado por um contínuo ir e vir, pois, tudo flui através das rampas, elevadores panorâmicos (K) e pelas passarelas aéreas com vista simultânea da Acrópole, da cidade e das galerias.(L)
Caminhando ao longo da rua Mitseon(M), somos conduzidos ao acesso principal do museu, através de um piso inclinado resguardado por um muro curvilíneo e sob uma grande varanda sombreada, formada pelo escalonamento dos pisos sobrepostos(N) , interrompido por uma abertura de vidro, (O) que conduz ao foyer de entrada, destacado pelo vazio criado pela sucessão de mezaninos.
Fig.6 Acesso e percurso em direção ao pátio central. Images elaboradas pela autora 2021
Pode-se notar com nitidez a importância dos materiais empregados, as relações de altura e proporção, a direção de deslocamento pelo espaço para criar expectativas e surpresas aos visitantes. (Fig.6A)
Internamente, o visitante pode escolher entre os vários caminhos horizontais e verticais, que se entrelaçam de forma livre e independente.A partir do atrium central, podemos observar dois volumes cilindricos que abrigam as escadas de emergencia (B) e no espaço mais proeminente do edifício o vazio em forma triangular contém os elevadores panorâmicos. (C) Seguindo o percurso pode-se acessar o pátio central aberto(D), que funciona como local tanto de passagem, como de permanência e convivência. O espaço é contido pelo muro curvo, de onde escorre a água em cascata. (E) A topografia permite criar a escadaria, que reforça o carater do anfiteatro pensado para para pequenos espetáculos, paralelo ao muro uma rampa ladeada por espelhos dágua conduz os visitantes à Acrópole (F) e ao fundo a cafeteria.(G)
Ainda nesse espaço que faz lembrar a cavea de um teatro grego,(H) uma treliça metálica grandiosa, se configura como um brise(I), que emoldura a fachada curva envidraçada, interrompida pelas empenas que se estendem pelo pátio(J), criando áreas com diferentes incidências de luz. Acima é possível observar a passarela e a rampa aérea, que conecta os edifícios, (K) e o poço que permite apenas intuir as dimensões dos subsolos(L). A fachada não é mais um limite, não existe mais distinção entre o que é interno e o que é externo, forma-se um novo espaço entre as partes.
Fig.7 percurso pelas galerias do terreo, primeiro e segundo pavimentos. Images elaboradas pela autora 2021
No mesmo piso, partindo do atrium central, o olhar se abre para os ambientes internos(fig 7A). O jogo de percepções se ativa no deslocamento temporal do percurso, revelando quadro a quadro, o desenho cuidadoso dos pilares ritmados(B), os visuais proporcionados por vazios entre pisos(C), por mezaninos, a alternância de transparência e opacidade, contração e dilatação dos pavimentos.
Nas extremidades do edifício estão localizadas as rampas(D), que proporcionam um fluxo contínuo pelas exposições(E). Cada pavimento evoca uma vibração perceptiva unica(F), seja pelas nuances da luz ática difundida sobre os materias(G), seja pelo percurso pictórico (H) idealizado para livre contemplação dos espaços, que nos conduz ao ultimo pavimento.(I)
Chegando pelo elevador panorâmico(fig.8A), iniciaremos o percurso aéreo(B) por uma passarela resguardada pelas duas empenas de concreto(C), configurada por um caminho linear que conduz ao acesso da galeria do primeiro anexo.(D) Esse trajeto oferece diferentes campos de visão, sobretudo pelo contraste entre a opacidade e transparencia dos materiais. (E) O edifício é caracterizado por uma concha de concreto que se fecha para a Rua Makryianni, e na face oeste o fechamento em vidro, possibilita observar as obras dispostas ao longo das paredes, ou olhar para o museu e para o pátio central durante o deslocamento externo.(F) Durante este percurso pode-se avistar o segundo anexo(G), que se conecta por meio de uma passarela curvilínea, proporcionando continuidade visual e espacial.(H)O volume da galeria do anexo dois foi disposto paralelo ao Phartenon(I). Esta conformação espacial oferece aos visitantes uma visão ampla e direta da Acrópole, garantindo que as obras sejam visualizadas de forma simultanêa no museu e na Rocha Sagrada.(J)
No trecho final do percurso em direção ao edifício principal, os visitantes são contemplados com a vista para a Acrópole, Dionysos e de Koile. (K) Ainda no mesmo piso,(L) a articulação
Fig.8 Percurso terceiro pavimento, anexo 1 e 2, rampa e passarela aérea. Imagens elaboradas pela autora 2021 por meio de uma rampa aérea(M) que leva ao centro de Estudos da Acrópole(N) localizado no primeiro pavimento, tem a capacidade de suscitar emoções espaciais e perceptivas, que enfatizam a dimensão da experiência sensível do caminhar.(O)
4.0- Desenhos de Análise Grafica do Sistema de Circulação do NAM
Fig.9.Desenhos de Análise do Sistema de Circulação. Legenda: vermelho circulação vertical; azul circulação horizontal.
Desenhos de Análise dos Acessos.
Discussão
Como foi possível notar o arquiteto Roberto Loeb possui estratégias projetuais que se revelam quando se realiza a análise do projeto.
Primeiramente observa-se a definição de múltiplos volumes como estratégia projetual e compositiva para estabelecer conexões entre espaços e ambientes e assim destacar a circulação.
O destaque dado aos elementos de circulação valoriza este sistema como um item do programa, rampas internas, externa e aérea, passarelas elevadas, escadas circulares e elevadores panorâmicos, que de modo rico e articulado proporcionam dinamismo a composição plástica e espacial.
A implantação do NAM em dois níveis, cria o anfiteatro, a praça e a rua, em analogia aos elementos da cultura tradicional, integrando o museu a malha urbana. Os acessos variados, por meio de rampas, passarelas e escadas acontecem nos segmentos das curvas de forma diagonal, denotam uma continuidade espacial. Outra característica marcante é a exploração de formas variadas, escalonadas, curvilíneas, sobrepondo planos, destacando elementos, para criar um edifício com soluções espaciais e volumétricas originais.
A eleição da forma curvilínea proporciona em seu arranjo a descoberta paulatina do espaço, que se desdobra continuamente durante o percurso; as empenas delimitam os espaços e molduram a paisagem valorizando os pontos focais; as formas escalonadas valorizam o jogo de luz e sombra, cheios e vazios, ritmos e proporções entre os elementos construtivos. O arquiteto enriquece a experiência visual e sensorial do pátio central com espelhos d’agua, empenas cegas, brise, rampa, escada, jardim, além do vazio de onde é possível observar os dois subsolos e os elevadores panorâmicos.
Observa-se o cuidado do arquiteto com o conforto ambiental, a partir da orientação do edifício, a luz direta proveniente do sul foi evitada, enquanto a fachada norte é protegida por uma treliça metálica, afastada do corpo principal, formando um imenso mosaico no interior do museu, com nuances de luz e sombras, opacidade e transparência, e os reflexos sobre as paredes e piso que se entrelaçam para definir o espaço.
O NAM é um sistema de vazios sobrepostos, ligados por passarelas curvilíneas e rampas, que cruzam os espaços abertos das praças e ruas, em um confluir contínuo do exterior para o interior e vice versa, para criar diferentes visuais e enquadramentos, integrando o edifício ao tecido urbano. Essa estratégia projetual define a poética de percurso de Roberto Loeb, como elemento ordenador e gerador do projeto, vindo ao encontro da essência desta pesquisa: circulação e percurso.
Roberto Loeb, combina a excelência técnica a uma visão humanista, o material e o imaterial, a realidade e a utopia, numa inevitável pluralidade de interpretações.
5- Considerações Finais
(…)O conceito adotado, permite a ampliação do museu através da criação de diversos edifícios anexos, de variadas dimensões, formas e localizações, acessadas por um sistema de passarelas. Procuramos interpretar o que imaginávamos ser um museu moderno e contemporâneo. Um edifício grandioso, rico em espaços, volumes e vistas que abrigarão um dos mais importantes patrimônios da humanidade. A construção como definida, permite a integração de fragmentos que se formaram durante o crescimento da cidade, para criar uma variedade de espaços e usos. Tal exemplo é oferecido pela Acrópole. (memorial descritivo do NAM,LOEB, 1990)
A articulação dos ambientes e dos visuais, assim como a valorização de uma arquitetura mais sensorial, explorada nas suas múltiplas camadas sensíveis e simbólicas, foram cuidadosamente planejados pelo arquiteto a partir de conceitos e estratégias projetuais, identificados na análise gráfica com foco na circulação e percurso em arquitetura.
O movimento e a circulação são prerrogativas do projeto contextualista de Loeb, que considera o edifício como parte integrante do tecido urbano, correspondendo as intenções descritas no memorial descritivo.
O deslocamento pelo espaço cria um entrelaçado de visão e movimento que se descortina paulatinamente, quadro a quadro, com vários elementos, materiais e imateriais. Acreditamos que este projeto tem maior relação com o modelo conceitual de percurso e abordagem do sistema de circulação da pós-modernidade.
Diante de projetos não edificados, o uso de modelos tridimensionais e simulações digitais possibilita vivenciar a riqueza, a subjetividade e a profundidade do edifício, é a ideia do “passeio arquitetônico”, que nos faz compreender a intenção do arquiteto. O projeto do NAM transcende o espaço físico, ao caminhar pelo museu o imaginário passa a ser a presença
oculta de todos os acontecimentos, não é possível separar percepção, lembrança ou fantasia … as rampas e passarelas aéreas nos faz sonhar com o voo.
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1Doutoranda na Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo sandra@samba.arq.br Resumo