O RACISMO ESTRUTURAL NO SISTEMA DE JUSTIÇA CRIMINAL BRASILEIRO: IMPACTOS NAS DECISÕES JUDICIAIS NO ÂMBITO DO PROCESSO PENAL 

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10049771


Laura Beatriz Guedes Bastos1
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Mariana Faria Filard2


RESUMO 

O presente estudo se concentra na análise do racismo estrutural no sistema de justiça criminal brasileiro, com destaque para as decisões judiciais no âmbito do processo penal. A motivação para esta pesquisa surgiu da necessidade de compreender como as disparidades raciais se manifestam no sistema de justiça criminal brasileiro e como o judiciário lida com essas questões. O racismo estrutural é um fenômeno profundamente enraizado na sociedade, afetando todos os aspectos da vida, inclusive o sistema de justiça criminal. Portanto, conduzimos uma revisão bibliográfica e uma análise de decisões específicas para contextualizar as práticas judiciais. Este estudo tem como objetivo analisar decisões judiciais em casos relacionados ao racismo estrutural, identificando tendências, desafios e possíveis melhorias, ressaltando a importância de um sistema de justiça criminal sensível às questões raciais, desempenhando um papel crucial na busca por uma sociedade mais justa e igualitária. Ao entender e expor as questões relacionadas ao racismo estrutural, esperamos inspirar ações que promovam a justiça e a inclusão em todos os níveis do sistema legal. 

Palavras-chave: Racismo Estrutural. Sistema de Justiça Criminal Brasileiro. Decisões Judiciais.

ABSTRACT

The present study focuses on the analysis of structural racism in the Brazilian criminal justice system, with emphasis on judicial decisions within the scope of the criminal process. The motivation for this research arose from the need to understand how racial disparities manifest themselves in the Brazilian criminal justice system and how the judiciary deals with these issues. Structural racism is a deeply rooted phenomenon in society, affecting all aspects of life, including the criminal justice system. Therefore, we conducted a literature review and an analysis of specific decisions to contextualize judicial practices. This study aims to analyze judicial decisions in cases related to structural racism, identifying trends, challenges and possible improvements, highlighting the importance of a racially sensitive criminal justice system, playing a crucial role in the search for a more just and egalitarian society. By understanding and exposing issues related to structural racism, we hope to inspire action that promotes justice and inclusion at all levels of the legal system. 

Keywords: Structural Racism. Brazilian Criminal Justice System. Judicial Decisions.

INTRODUÇÃO 

O racismo é uma questão social profundamente enraizada na história da humanidade, e suas manifestações estruturais se tornaram uma fonte persistente de desigualdades ao longo dos séculos. Desde os tempos coloniais, a exploração e a dominação de povos por meio da colonização foram justificadas com base em conceitos de superioridade racial, criando um legado de discriminação que ecoa na sociedade contemporânea. No âmbito brasileiro, a análise crítica desse fenômeno se torna ainda mais premente, especialmente quando direcionada ao sistema de justiça criminal do país. 

O sistema muitas vezes perpetua estereótipos e preconceitos, resultando em tratamentos distintos com base na cor da pele. Negros e negras enfrentam desproporcionalmente discriminação, encarceramento em massa e menor acesso à justiça, evidenciando a necessidade urgente de transformações que garantam equidade e igualdade perante a lei. 

Atualmente, o racismo estrutural continua a moldar a vida de muitos, refletindo-se em disparidades socioeconômicas, violência racial e acesso desigual a oportunidades. É fundamental compreender como esse fenômeno se manifesta em diferentes aspectos da sociedade, incluindo o sistema de justiça criminal brasileiro, que não está imune à influência nefasta do preconceito racial. 

Mediante o exposto, torna-se evidente a relevância deste estudo, na medida em que visa analisar como a discriminação racial permeia as práticas e decisões dentro desse sistema, e como as instituições judiciais abordam e combatem o racismo estrutural no contexto brasileiro. 

Partindo desses pressupostos, estruturou-se a seguinte problemática: No sistema de justiça brasileiro há padrões de discriminação racial nas decisões judiciais, tais como criminalização seletiva de determinados grupos étnicos, aplicações desproporcionais de penas para pessoas de diferentes raças ou desigualdade no tratamento e acesso à justiça para pessoas brancas e não brancas? 

A hipótese de trabalho considera que a jurisprudência atual do sistema de justiça criminal brasileiro reflete a presença de racismo estrutural, que se manifesta em decisões judiciais discriminatórias e em tratamento diferenciado para pessoas de diferentes raças e etnias. A análise das decisões judiciais atuais poderá indicar a presença de padrões que evidenciem a desigualdade racial no sistema de justiça criminal, tais como a criminalização seletiva de determinados grupos étnicos, o aumento do encarceramento em massa da população negra, a sub-representação de juízes e advogados negros e a desproporcionalidade das penas aplicadas a pessoas de diferentes raças. 

O objetivo geral desse trabalho foi de analisar as decisões atuais do sistema de justiça criminal brasileiro para identificar como o racismo estrutural se manifesta nas decisões judiciais. Os objetivos específicos foram: Demonstrar como a questão do racismo estrutural ocorreu ao longo da história e como isso afeta na sociedade de hoje; Identificar como a questão do racismo estrutural é abordada nas decisões atuais do sistema de justiça criminal brasileiro, identificando se há reconhecimento e enfrentamento do problema por parte do judiciário brasileiro; Compreender, por meio da análise de decisões judiciais, os principais tipos de discriminação racial presentes no sistema de justiça criminal brasileiro, como a criminalização seletiva de grupos étnicos, a desigualdade no tratamento de pessoas brancas e não-brancas, a aplicação desproporcional de penas, entre outros. 

Na referida pesquisa utilizou-se como material a legislação e os estudos jurídicos existentes que foram amplamente utilizados como fonte de pesquisa, abrangendo artigos científicos, livros, teses, dissertações e outros materiais relevantes. 

Assim, este estudo foi estruturado conforme descrito abaixo, fazendo parte dele também a introdução e a conclusão. O primeiro capítulo desta monografia explora a complexa teia do racismo estrutural. Ao abordar suas origens históricas, manifestações contemporâneas e o impacto na sociedade atual, busca-se compreender a raiz do problema que permeia a justiça criminal brasileira. 

No segundo capítulo, a análise se volta para a discriminação racial arraigada no sistema de justiça criminal do Brasil. Examina-se os efeitos intergeracionais dessa discriminação e explora-se perspectivas de mudanças, buscando desvendar as injustiças que persistem.

Finalmente, o terceiro capítulo deste trabalho direciona o foco para a abordagem do racismo estrutural nas decisões judiciais do sistema de justiça criminal brasileiro. Neste contexto, examina-se a função do poder judiciário na luta contra o racismo estrutural, destacando como as decisões judiciais podem ser um instrumento poderoso para promover a equidade e a justiça racial. Além disso, avalia-se o impacto de decisões que, infelizmente, são marcadas por preconceito racial, enfatizando a importância da atuação do Judiciário na promoção de um sistema de justiça verdadeiramente equitativo e inclusivo.

1. O RACISMO ESTRUTURAL 

Em primeiro lugar, é essencial compreender que o racismo é a discriminação enraizada em atitudes sociais negativas, que foram internalizadas e aceitas como normais nas estruturas sociais e políticas, atribuindo valor à cor da pele, origem étnica e outras características físicas, favorecendo a população branca em detrimento das demais. 

Ao considerarmos a ideia de que as estruturas sociais de uma sociedade estão impregnadas de racismo, fica evidente que o racismo não se configura como uma exceção ou algo atípico no seu funcionamento, mas sim como parte integrante e cotidiana dessa sociedade. Os comportamentos individuais e as ações institucionais são, assim, resultados desse processo que perpetua a discriminação sistemática de grupos sociais inteiros, como resumo Almeida (2019, pág 47), “as instituições são racistas porque a sociedade é racista”. 

O racismo estrutural é composto por práticas, comportamentos, situações e expressões comuns no cotidiano da população, que, mesmo sem intenção racial explícita, promovem a discriminação baseada em raça. Envolve qualquer teoria, crença, ideologia ou conjunto de ideias que estabelecem uma ligação causal entre as características físicas ou genéticas de indivíduos ou grupos e suas habilidades intelectuais, culturais e traços de personalidade, incluindo o falso conceito de superioridade racial. 

Esse racismo estrutural é o racismo que está presente na própria estrutura social, é uma forma arraigada de discriminação que permeia as instituições, normas e práticas de uma sociedade, perpetuando desigualdades com base na raça. De acordo com Silvio Almeida em seu livro Racismo estrutural: 

Consciente de que o racismo é parte da estrutura social e, por isso, não necessita de intenção para se manifestar, por mais que calar-se diante do racismo não faça do indivíduo moral e/ou juridicamente culpado ou responsável, certamente o silêncio o torna ética e politicamente responsável pela manutenção do racismo. A mudança da sociedade não se faz apenas com denúncias ou com o repúdio moral do racismo: depende, antes de tudo, da tomada de posturas e da adoção de práticas antirracistas.

Seguindo essa concepção, o racismo possui uma natureza estrutural, influenciando e moldando as relações sociais, e, por conseguinte, a formação do sujeito. Nessa perspectiva, as pessoas enfrentam diariamente restrições na dinâmica de suas vidas devido à sua raça (Almeida, 2019). 

É importante ressaltar que a abordagem estrutural da concepção do racismo busca compreender a maneira como a sociedade está organizada, oferecendo uma análise mais abrangente dos vários elementos envolvidos nesse fenômeno. 

Esse tipo de racismo penetra em nossas subjetividades, pois o internalizamos e aceitamos como algo inalterável e imutável ao longo do tempo. Além disso, busca compreender e mitigar os efeitos segregacionistas presentes em nossa organização, instituições e estruturas sociais, de modo a parecer uma “ordem natural da realidade”. 

Logo, o racismo estrutural é uma parte enraizada culturalmente e engloba todas as formas genéricas de racismo. Isso implica que não pode ser considerado separado do comportamento social, pois faz parte integrante da cultura humana, manifestando-se através de ações conscientes ou inconscientes, como o uso de linguagem específica, expressões, gestos e outros comportamentos enraizados em nossos hábitos há muito tempo. 

Um sistema que concede vantagens a determinados grupos raciais, enquanto oprime outros é mais do que simples atos individuais de preconceito. Essas disparidades estão embutidas em políticas, economia, educação, saúde e outras esferas da vida, marginalizando sistematicamente indivíduos e comunidades racialmente diversas. 

Dessa forma, podemos compreender que o racismo vai além de ações intencionais e individuais, sendo um processo enraizado onde as pessoas, muitas vezes de forma inconsciente, reproduzem pensamentos discriminatórios. Silvio Almeida (2018) destaca que quando alguém acusado de racismo alega um mal entendido, há verdade nisso, pois o racismo se manifesta em lacunas, mal entendidos e no não dito. 

É nesses espaços não explícitos que o racismo consegue se tornar parte da normalidade e se tornar banalizado. Além desse, Bersani (2018, p. 193) faz uma importante reflexão:

[…] Por corresponder a uma estrutura, é fundamental destacar que o racismo não está apenas no plano da consciência – a estrutura é intrínseca ao inconsciente. Ele transcende o âmbito institucional, pois está na essência da sociedade e, assim, é apropriado para manter, reproduzir e recriar desigualdades e privilégios, revelando-se como mecanismo colocado para perpetuar o atual estado das coisas. 

Acerca disso, o professor Silvio Almeida (2019) leciona que, para a visão estrutural, “as instituições são apenas a materialização de uma estrutura social ou de um modo de socialização que tem o racismo como um de seus componentes orgânicos”. 

Em termos mais claros, o autor argumenta que o racismo não surge de instituições individualmente racistas, mas que essas instituições refletem o racismo por fazerem parte de uma sociedade permeada por essa mentalidade. Elas reproduzem essa prática porque estão imersas em um contexto em que o racismo é normalizado. 

Portanto, se bastasse uma reforma de consciência ou educação, lendo livros, para que em algumas gerações as pessoas deixassem de ser racistas, o problema seria mais simples. No entanto, não é assim que funciona, pois o racismo persiste no que não é dito e no mal entendido, resistindo a simples soluções. 

Consequentemente, podemos inferir que a ideologia racista é intrinsecamente arraigada no subconsciente dos indivíduos desde sua infância, sendo moldada pela ideologia predominante do grupo. Nesse cenário, os indivíduos internalizam as discrepâncias raciais através de um sistema de ideias que reforça a percepção de que a discriminação, juntamente com a violência, desigualdade e os distintos privilégios associados à raça, são elementos comuns (Almeida, 2019). 

Para combater o racismo estrutural, é crucial reconhecer sua existência e trabalhar para desmantelar as fundações que o sustentam, promovendo equidade e inclusão. Isso implica em reformas profundas em políticas, práticas institucionais e na mentalidade coletiva, visando garantir igualdade de oportunidades para todos, independentemente de sua origem étnica. 

Outrossim, é fundamental fomentar o diálogo intercultural, educar sobre a história e experiências das comunidades racialmente marginalizadas, e incentivar uma postura ativa na denúncia de discriminação e no apoio às vítimas do racismo. O engajamento contínuo de toda a sociedade é crucial para alcançar uma verdadeira transformação e erradicar o racismo em todas as suas formas. 

1.1 ORIGENS HISTÓRICAS DO RACISMO 

Os alicerces do racismo estrutural foram estabelecidos durante o período colonial, onde a vinda dos portugueses trouxe uma falsa necessidade de escravização humana, quando hierarquias raciais foram concebidas para justificar a exploração e subjugação dos povos colonizados, quando a exploração e a dominação de povos por meio da colonização eram justificadas com base em noções de superioridade racial. 

Teóricos como Stuart Hall (2003) argumentam que o racismo estrutural nasceu das hierarquias raciais estabelecidas pelos colonizadores, perpetuadas através de estereótipos e narrativas que sustentavam a ideia de inferioridade de determinados grupos étnicos. 

Dessa forma, o racismo emerge da tentativa de estabelecer uma hierarquia social fundamentada em características biológicas. Algo intrigante é como, por algum motivo, determinados indivíduos ganham o poder de influenciar a vida dos demais seres humanos. Essa forma de dominação remonta a uma das relações humanas mais antigas, manifestando-se de diversas maneiras, com destaque para a discriminação étnica e racial. 

A vinda dos negros para o Brasil ocorreu de maneira intensiva. Estima-se que entre 1550 e 1855, aproximadamente quatro milhões de escravos foram importados para o país, a maioria deles jovens do sexo masculino. Além disso, o sistema escravagista era justificado através do discurso religioso cristão, que defendia a punição dos negros para convertê-los ao cristianismo. 

Pessoas negras eram desumanizadas, consideradas sem alma, o que servia de justificativa para as diversas atrocidades cometidas. As jornadas de trabalho eram extremamente exaustivas, reduzindo significativamente a expectativa de vida dos escravos. Adicionalmente, a população branca impunha sua dominação por meio de castigos físicos, intensificando o sofrimento dos escravos (Fausto, 1996).

Segundo Hall (2003), o racismo estrutural teve início durante o período de colonização, quando as hierarquias raciais foram estabelecidas para justificar a exploração e a subjugação dos povos colonizados. Ele ressalta que a imposição de estereótipos racistas e a construção de narrativas de inferioridade foram fundamentais para a perpetuação do racismo estrutural ao longo da história. 

Davis (1981), por sua vez, destaca a relação entre o racismo estrutural e a escravidão. Ela argumenta que a escravidão foi um dos principais sistemas que estabeleceram as bases do racismo estrutural, pois categorizou as pessoas com base na cor da pele e as tratou como propriedades, negando-lhes sua humanidade. A autora ressalta que as estruturas sociais e políticas desenvolvidas durante esse período perpetuam a desigualdade racial. 

Em 13 de maio de 1988 a escravidão foi abolida no Brasil com a chamada “Lei Áurea”. Entretanto, a abolição da escravidão trouxe consigo a liberdade legal, mas, sob a perspectiva social, os ex-escravos e suas gerações posteriores permaneceram subjugados, conforme argumentado por Marcussi: “Por mais que tenha havido a conquista da liberdade jurídica e relativa mobilidade social ascendente para alguns africanos e seus descendentes, é inegável que eles, como um todo, sempre ocuparam os lugares mais baixos da hierarquia social brasileira, em relação aos portugueses e seus descendentes radicados no Brasil”. 

Além disso, a abolição não veio acompanhada de direitos, recursos ou medidas reparatórias que pudessem efetivamente promover uma transformação na vida desses indivíduos após mais de três séculos de escravidão, como aponta Souza (2003), nem “os antigos senhores, na sua imensa maioria, o Estado, a Igreja, ou qualquer outra instituição, jamais se interessaram pelo destino do liberto”. 

Dessa maneira, uma ampla parcela da população se encontrou desprovida de perspectivas econômicas, educacionais e, até mesmo, habitacionais. Estavam alheios aos seus próprios direitos e marginalizados pela sociedade em um sentido amplo. (Oliveira, 2020). O legado do passado continuou a se refletir na segregação espacial, na limitação de oportunidades e na persistente discriminação racial, exigindo esforços contínuos para reverter essa realidade e buscar uma verdadeira igualdade.

Ainda assim, após o fim da escravidão, no Brasil, surgiu o mito da “democracia racial”, o que dificultou ainda mais a percepção das práticas discriminatórias. Esse mito buscava retratar o país como uma nação miscigenada e sem conflitos sociais, promovendo a ideia de convivência pacífica entre diferentes raças. Esse projeto tinha como objetivo não apenas moldar a imagem do Brasil internacionalmente, mas também manter a estabilidade interna ao minimizar os conflitos raciais existentes. 

Com essa forma de arguemento tornou ainda mais dificil de se enxergar o racismo brasileiro, inclusive para o próprio sujeito negro reconhecer-se enquanto peça marginalizada da sociedade, um fator primordial para que se promovesse algum tipo de luta social por mudança (Oliveira, 2020). 

Após o término da escravidão, os escravos libertos, como anteriormente mencionado, foram deixados à própria sorte nas cidades em crescimento, em busca de emprego. Nessa nova dinâmica, o preconceito racial tornou-se um obstáculo constante, pois estereótipos foram usados para justificar a exclusão dos ex-escravos no mercado de trabalho. Assim, aquele que “durante quase quatro séculos foi o único trabalhador da sociedade brasileira, passou a ser considerado preguiçoso, ocioso, de má índole para o trabalho” (Moura, 1983). 

É importante destacar que muitas vezes se tem uma concepção equivocada de que o Brasil nunca teve leis segregacionistas e racistas. No entanto, até chegarmos aos avanços legislativos atuais, que discutiremos em breve, e que ainda são inadequados, existiram outras leis em vigor, incluindo: Decreto nº 145, de 11 de junho de 1893, que determinava a prisão de mendigos, vagabundos, vadios capoeiras e desordeiros em colônias fixadas pela União ou pelos estados.1 

Podemos destacar também o decreto nº 3475, de 4 de novembro de 1899, onde negava o direito a fiança a réus vagabundos ou sem domicílio e autorizava incursões policiais sem controle judicial, especialmente em regiões onde havia mais negros.2 

Resumidamente, a situação social dos negros após a abolição é interpretada à luz da herança do período anterior. O preconceito e a discriminação racial, bem como a falta de preparo cultural para assumir plenamente sua condição de cidadãos e trabalhadores livres, já que eram frequentemente vistos como ex-escravos, resultaram na marginalização e na desclassificação social dos negros. Essa realidade persiste ao longo de várias gerações (Gonsalez e Hasenbalg, 1982, p. 86). 

Por outro lado, o país promoveu a imigração europeia, reforçando a política estatal de “embranquecimento” da população brasileira, com o objetivo de tornar o Brasil independente mais “europeu” a qualquer custo (Mattoso, 1983, p. 224). Portanto, o imigrante estrangeiro era visto como o modelo ideal de colonizador, caracterizado por sua suposta superioridade e perseverança no trabalho, atributos que não eram associados aos descendentes de africanos. Nesse sentido, conforme asseverado por Moura (1983, p. 11-12): 

O que interessava, no entanto, através dessa tela de valores e julgamentos negativos contra o negro e favoráveis ao branco, era que o negro fosse alijado como trabalhador por ser negro, pois o ideal das classes dominantes era fazer do Brasil uma nação branca. 

Na primeira metade do século XX, de acordo com as palavras de Silva (2012, p. 45), a questão racial já havia sido abordada, originando-se de teorias racistas que promoviam a ideia do branqueamento da população brasileira. Essas teorias influenciaram políticas públicas que encorajaram a imigração europeia e promoveram a miscigenação, com o objetivo de diluir a presença do cidadão negro na composição da sociedade brasileira. 

De acordo com a ideologia do branqueamento da população, o objetivo era alcançar um padrão que se aproximasse ao máximo do branco na escala cromática estabelecida, mesmo para aqueles que não eram brancos, enquanto se distanciavam do negro, como observa Moura (1983, p. 22). Isso resultou em uma discriminação radical dos negros, tanto em termos de aparência quanto de ancestralidade, até mesmo por parte de mulatos e mestiços, graças à implementação de políticas de exclusão eficazes.

Nesse contexto, conforme observado por Souza (1983, p. 20), em nações com sociedades caracterizadas por diversas classes étnicas, como o Brasil, existe uma relação intrínseca entre a posição social e a tonalidade da pele, uma vez que “a raça desempenha um papel simbólico (em termos de valores e estratificação)”; isso possibilita a distribuição dos indivíduos em diferentes estratos da estrutura de classes, dependendo de sua aderência aos padrões raciais predominantes na classe social. Assim, quanto mais “caucasiana” for uma pessoa, maior será seu status, enquanto que, consequentemente, quanto mais “negra” for, menor será sua posição na sociedade. 

Com isso, após mais de um século desde a abolição, observamos que uma considerável parcela de pessoas negras está em ocupações que demandam menor qualificação e recebem salários inferiores. Além disso, o índice de jovens negros mortos é significativamente maior em comparação aos jovens brancos. Também é notável que o número de mulheres negras que sofrem violência ultrapassa as estatísticas referentes às mulheres brancas. 

Nesse contexto, as disparidades entre as diversas etnias no Brasil se destacam como um ponto negativo na história do país. Essa desigualdade, amplificada por estratégias de subjugação e marginalização da comunidade negra, permanece como uma das principais manifestações de falta de equidade no Brasil. 

Esse sistema foi fundamentado em estereótipos e narrativas que sustentavam a ideia de inferioridade de determinados grupos étnicos, perpetuando uma mentalidade discriminatória até os dias de hoje. A escravidão, por sua vez, foi um dos principais sistemas que consolidaram essa estrutura discriminatória, categorizando pessoas com base na cor da pele e negando-lhes sua humanidade, deixando marcas profundas na sociedade. 

1.2 MANIFESTAÇÕES CONTEMPORÂNEAS DO RACISMO ESTRUTURAL 

O racismo estrutural continua a ter impactos significativos na sociedade contemporânea. Diversos autores têm abordado os efeitos persistentes desse fenômeno em diferentes aspectos sociais, como disparidades socioeconômicas, violência racial e acesso desigual a oportunidades.

Bonilla-Silva (2003) destaca que o racismo estrutural se manifesta na forma de desigualdades socioeconômicas entre grupos raciais. Ele argumenta que essas disparidades são resultado de barreiras e obstáculos que limitam o acesso de indivíduos negros a oportunidades econômicas. O autor ressalta que o racismo estrutural perpetua taxas de desemprego mais altas, segregação ocupacional e concentração de pessoas negras em empregos de baixa remuneração. 

Collins (2000) enfatiza que o racismo estrutural também se reflete nas instituições e políticas públicas. Ela argumenta que a falta de acesso adequado a recursos econômicos, como educação, saúde e habitação, afeta negativamente as comunidades negras. A autora destaca a importância de políticas públicas que abordem as desigualdades resultantes do racismo estrutural e promovam a equidade de oportunidades. 

Neste cenário, de acordo com as conclusões de Camino et al. (2001), embora na sociedade contemporânea as manifestações de racismo flagrante sejam amplamente rejeitadas publicamente e expressamente proibidas por lei, a discriminação baseada na cor da pele ainda persiste. 

Os autores destacam que isso se torna evidente ao observar que, na maioria dos países onde a escravidão negra ocorreu, as disparidades socioeconômicas continuam a se ampliar entre pessoas de pele branca em comparação com aquelas de pele negra. Além disso, nos países considerados desenvolvidos e ex-colonizadores, são frequentemente estabelecidas várias barreiras que dificultam o acesso de trabalhadores não brancos de origem estrangeira. 

De acordo com as informações apresentadas por Lima (2017), no Censo de 2010, a maioria da população brasileira se autodeclarou como pertencente ao grupo racial negro, incluindo pretos e pardos. Nesse contexto, a autora ressalta que a chamada “democracia racial,” promovida pela mídia e pelo sistema educacional, tenta propagar a ideia de que o racismo não existe no Brasil. 

No entanto, por outro lado, nas escolas, a realidade é diferente, pois o currículo muitas vezes omite a existência das Leis nº 10.639/2003 e nº 11.645/2008, que estabelecem a inclusão da temática “História e Cultura Afro-Brasileira” no ensino oficial, com o objetivo de esclarecer a história do povo negro brasileiro e dos povos indígenas.34 

Segundo Camino et al. (2001), embora atualmente se rejeite a existência de hierarquias sociais baseadas em raças, a cor da pele ainda é usada como um símbolo de discriminação. Isso significa que o racismo persiste como uma ideologia ou discurso que justifica a discriminação social. 

No entanto, Ciconello (2008) observa que a invisibilidade em torno da população negra está começando a mudar. Há um movimento de ressignificação da identidade negra que procura superar estereótipos negativos frequentemente presentes nas relações sociais e na mídia. 

Uma grande manifestação que podemos destacar na contemporaneidade são os racismo atreladas ao futebol, para isso vamos utilizar o relatório anual de 2021 sobre discriminação racial no futebol, pois ele abrange todos os casos de racismo envolvendo atletas brasileiros, tanto em campo quanto fora dele. Este é o levantamento mais recente, criado pelo Observatório da Discriminação Racial no Futebol.5 

De acordo com o relatório, entre os anos de 2016 e 2019, foi obeservado um aumento constante nos casos de discriminação no esporte brasileiro. No entanto, em 2020, houve uma redução significativa de 50,65% em todos os tipos de incidentes de preconceito analisados neste relatório. É importante ressaltar que 2020 foi um ano atípico devido à pandemia, e a ausência de torcedores nos estádios teve um impacto significativo nessa diminuição. A presença de público nas competições no Brasil durou menos de três meses. 

No entanto, em 2021, mesmo com a maior parte do ano ocorrendo sem a presença de público, o retorno dos torcedores aos eventos esportivos revelou que igualou o recorde de discriminação e preconceito no esporte brasileiro, estabelecido em 2019, com 158 registros. Isso representou um aumento significativo de 97,5% em comparação com o ano anterior, 2020. 

Falando especificamente dos atos racistas cometidos nos estádios de futebol, somam um total de 74 casos, sendo 64 no Brasil e 10 com brasileiros no exterior. Até o fechamento do relatório, os 64 incidentes classificados como “supostos casos de racismo” (denúncias de racismo) tiveram as seguintes conclusões: em alguns casos, foram identificadas expressões racistas, mas não encontramos registros de punições efetivas. Além disso, em 5 casos, não há informações sobre possíveis medidas punitivas ou consequências para as ações realizadas. 

Entre esses casos podemos destacar o jogo Grêmio x Palmeiras ocorrido em 31/10/2021 em Porto Alegre/RG. Um vídeo surgiu nas redes sociais no qual um torcedor do Grêmio foi capturado supostamente imitando um macaco na direção de torcedores do Palmeiras. Esse incidente gerou uma série de comentários que condenaram a ação como um ato racista. 

O caso foi encaminhado para o Superior Tribunal de Justiça Desportiva. Entretanto, não foram encontradas mais informações sobre o caso. O STJD puniu o Grêmio por outro evento que ocorreu no mesmo jogo, uma invasão de campo seguida de uma briga entre torcedores, mas nada em relação ao racismo. 

A internet, apesar de sua aparente democracia e igualdade de acesso, pode ser um espaço onde preconceitos e divisões sociais são reproduzidos, de forma semelhante aos ambientes físicos, permitindo que todos que estejam conectados a ela expressem suas opiniões (Cruz, 2012). 

Um relatório feito por pesquisadores do Aláfia Lab6, destaca a recorrência de episódios semelhantes ao que aconteceu com Vinicius Júnior em 26/01/2023, evidenciando que o racismo é uma preocupação constante quando se trata de personalidades negras. 

Independentemente de suas realizações, talentos ou conquistas, o racismo frequentemente domina as discussões em torno delas. Um exemplo disso é Vini Jr, onde 52% das 50 publicações mais amplamente difundidas nas redes sociais fazem referência a incidentes relacionados ao racismo. 

Apesar de ser um incidente notável de racismo, de acordo com o relatório mencionado acima, o caso do jogador, mencionado em mais de 8 mil tweets no twitter, foi contestado por algumas pessoas que alegaram que se tratava apenas de rivalidade entre times de futebol. Cerca de 60 menções usaram o termo “mimimi” para descrever a situação como uma reclamação considerada desnecessária. 

O racismo estrutural continua a ter impactos profundos na sociedade contemporânea, perpetuando desigualdades socioeconômicas e limitando o acesso de indivíduos negros a oportunidades. Isso se reflete tanto nas instituições públicas como nas manifestações de racismo no esporte, destacado em um relatório anual de 2021 sobre discriminação racial no futebol. Mesmo quando celebridades negras, como Vinicius Júnior, são alvos de atos racistas, o racismo persiste, sendo algumas vezes minimizado como rivalidade esportiva. A internet, embora pareça democrática, muitas vezes reproduz preconceitos. É crucial reconhecer que, apesar dos avanços, o racismo ainda é uma realidade em várias facetas da sociedade. 

1.3 O IMPACTO DO RACISMO ESTRUTURAL NA SOCIEDADE DE HOJE 

Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os pretos e pardos representam 56,1% da população brasileira no ano de 2021. Conforme afirma a segunda edição do estudo Desigualdades por Cor ou Raça, o rendimento mensal típico dos A proporção de indivíduos brancos é quase o dobro da de indivíduos negros (que são categorizados como pretos e pardos), e essa disparidade cresceu no Brasil no último ano (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 2021). 

De acordo com pesquisas recentes, constatou-se que uma percentagem maior de indivíduos negros se enquadra na categoria dos mais pobres. Além disso, as pessoas negras e pardas continuam a enfrentar acesso limitado à educação, ao emprego, à segurança e aos recursos sanitários. Os dados mais recentes recolhidos em 2021 mostram que os rendimentos mais baixos registados foram observados durante este período. Especificamente, a população negra sofreu uma diminuição de rendimento de 8,9%, enquanto a população parda sofreu uma diminuição de 8,6%, sendo ambas reduções maiores em comparação com o ano anterior. Em contraste, a população branca registou uma diminuição de 6% no rendimento, de acordo com os resultados do estudo. 

Segundo a pesquisa, a renda média mensal per capita dos brancos em 2021 foi de R$ 1.866. Em contrapartida, os negros tinham renda de R$ 965, o que equivale a 51,7% da primeira.As estatísticas fornecidas abrangem o rendimento total dos agregados familiares, tendo em conta todas as fontes possíveis. Os domicílios brancos tinham rendimento médio de R$ 1.866, enquanto os domicílios pardos tinham rendimento médio de R$ 945, o que equivale a 50,6% do rendimento médio dos brancos. 

Ao avaliar apenas os rendimentos derivados do trabalho, permanece uma vantagem evidente para os indivíduos que se identificam como brancos. Especificamente, o rendimento médio dos trabalhadores brancos no ano de 2021 foi de R$ 3.099, em contraste com R$ 1.764 para os trabalhadores negros e R$ 1.814 para os pardos. 

Com base na pesquisa realizada, as diferenças entre os níveis de renda “decorrem do fato de que uma proporção maior da população negra e parda reside em faixas de renda mais baixas”. Essencialmente, há uma maior representação de indivíduos destes grupos étnicos que vivem em comunidades empobrecidas em comparação com aqueles que vivem em áreas ricas. Os dados indicam que 74,8% dos indivíduos de menor renda são pretos ou pardos, enquanto apenas 28,2% dos de maior renda pertencem a esses mesmos grupos. 

Devido a fatores sistémicos, a percentagem de indivíduos de comunidades negras e pardas que vivem abaixo do limiar da pobreza é quase o dobro da dos indivíduos brancos. Segundo estatísticas de 2021, 34,5% dos negros e 38,4% dos pardos viviam abaixo da linha da pobreza, enquanto apenas 18,6% dos brancos estavam na mesma situação. A linha de pobreza é determinada com base nos critérios do Banco Mundial de viver com menos de 5,50 dólares por dia. 

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística divulgou recentemente um relatório sobre o mercado de trabalho em 2021, que incluiu uma análise do desemprego. O relatório destaca que os indivíduos pretos e pardos vivenciam uma crise de desemprego mais grave. A taxa de desemprego da população branca era de 11,3%, enquanto a população negra apresentava uma taxa de desemprego de 16,5% e a população parda de 16,2%. 

Mesmo entre indivíduos com o mesmo nível de escolaridade, as disparidades estão presentes. No ano de 2021, os indivíduos de etnia caucasiana que não concluíram o ensino fundamental ou não tinham nenhuma escolaridade ganhavam em média R$ 9,2 por hora trabalhada, enquanto os pardos e afrodescendentes levavam para casa R$ 7,3. Aqueles que concluíram o ensino superior também enfrentaram uma discrepância. Enquanto os caucasianos recebiam em média R$ 34,4 por hora, os afrodescendentes recebiam R$ 22,9 – 66,6% do que ganhavam seus homólogos caucasianos. Os de etnia parda ganharam R$ 24,8 em comparação (72% do que foi pago aos brancos). É importante observar que esses números são exatos e não foram alterados de forma alguma. 

Estes dados foram retirados da segunda edição do estudo sobre desigualdade de cor e raça do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. A primeira foi divulgada em 2019. O levantamento utiliza dados de diversas fontes, como a Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio) Contínua 2021, a Pnad Covid-19 2020, o Enem, o Sistema de Informações sobre Mortalidade, a Pesquisa Nacional de Saúde 2019, a Pesquisa de Orçamentos Familiares 2017-2018, dentre outras. 

Esses indicadores refletem a marginalização persistente de determinados grupos étnicos. Ao longo da história, pessoas negras e pardas têm sido sistematicamente desfavorecidas, ocupando uma posição inferior na estrutura social. O processo histórico de eugenia defendido em séculos passados permitiu a perpetuação do grupo dominante no poder. Até os dias atuais, é evidente a segregação e os efeitos desse legado histórico que continua afetando essa parte da população.

2. A DISCRIMINAÇÃO RACIAL PRESENTE NO SISTEMA DE JUSTIÇA CRIMINAL BRASILEIRO 

As instituições que compõem o sistema de justiça criminal brasileiro, como as organizações policiais, o Ministério Público, a Defensoria Pública, o Poder Judiciário e o Sistema Penitenciário, apesar de regidas pela Constituição Federal e regulamentos específicos, não estão livres do racismo institucional. Em maior ou menor grau, essas instituições contribuem para a criação de regras e padrões sociais que beneficiam brancos ou grupos raciais específicos (Almeida, 2018, p. 35). 

Dessa forma, é crucial ressaltar a necessidade de compreender os elementos que influenciam o sistema de Justiça criminal em todos os seus níveis de atuação, abrangendo desde a polícia até as instâncias superiores. Isso se deve ao fato de que cada componente desse sistema contribui para a criação, reprodução e legitimação das ideologias que o orientam. Como exemplo, na polícia, é onde começa a manifestação do preconceito racial, já que é o próprio funcionário público quem preenche a categoria “raça” no Boletim de Ocorrência. Isso implica que “a categorização da cor pressupõe a existência de uma ideologia na qual a cor das pessoas tem algum significado, ou seja, dentro de ideologias raciais” (Lima, 2004). 

Conforme estabelecido na Constituição, mais precisamente nos artigos 92 a 126, é atribuição do Poder Judiciário a função de solucionar os conflitos de interesses em situações concretas, inclusive quando envolvem o Governo ou a Administração. Essa função é exercida por meio da aplicação da jurisdição, a qual é concretizada por intermédio de processos judiciais (Silva, 1996). 

Em seguida, é importante observar o art 5°, onde expõe o célebre Princípio da Igualdade entre todos: 

Artigo 5°. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pais inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e a propriedade, nos termos seguintes. (CONSTITUIÇÃO, 1988) 

Zaffaroni (2001) argumenta que uma das razões para a existência de um controle penal seletivo é a discrepância entre o poder programado e a real capacidade operativa dos órgãos do sistema penal. Se todas as condutas consideradas criminosas fossem efetivamente criminalizadas, quase toda a população seria alvo de processos e eventualmente condenada. Portanto, o sistema penal é estruturalmente projetado para que os órgãos desse sistema possam exercer seu poder seletivamente em relação a certos setores da sociedade. 

Os órgãos legislativos, ao ampliarem as tipificações penais, aumentam o arbítrio seletivo dos órgãos executivos do sistema penal. Esses órgãos executivos possuem um “espaço legal” para exercer o poder repressivo sobre qualquer cidadão, mas, na prática, eles atuam seletivamente contra aqueles que decidem punir. A própria legislação concede uma ampla margem de discricionariedade aos seus agentes, através de fatores como a falta de critérios claros para determinar a quantificação das penas, tipificações com limites difusos ou elementos de valoração subjetiva, bem como a ausência de critérios estabelecidos para a atuação das agências executivas, comparados aos órgãos judiciais. 

As sociedades liberais democráticas enfrentam, em grande medida, uma enorme desigualdade dos cidadãos perante a lei. Uma das razões desta lamentável realidade social é a distribuição desigual de influência e poder. Como resultado, as mulheres, os negros, as minorias sexuais e os imigrantes são tratados de forma diferente pela polícia e pelo sistema judicial. 

Uma coisa é certa: o poder e a riqueza influenciam a polícia e os tribunais, e os pobres, devido à falta de riqueza material, não conseguem contratar bons advogados privados, não lhes deixando escolha quando se trata de defesa. Embora o desejo de combater a corrupção nestes departamentos seja forte, a troca de interesses também é intensa. 

Para Villaça (2003), qualquer tipo de exclusão social só é possível através da dominação, seja ela política ou econômica. Dessa forma o autor entende que o mercado é o principal aparelho que causa a dominação e exclusão. Seguindo a posição de Cruz (2005, p.15): 

“[…] entendemos a discriminação como toda e qualquer forma, meio, instrumento ou instituição de promoção da distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em critérios como a raça, cor da pele, descendência, origem nacional ou étnica, gênero, opção sexual, idade, religião, deficiência física, mental ou patogênica que tenha o propósito ou efeito de anular ou prejudicar o reconhecimento, gozo ou exercício em pé de igualdade de direitos humanos e liberdades fundamentais nos campos político, econômico, social, cultural ou em qualquer atividade no âmbito da autonomia pública ou privada.” 

Para o autor acima mencionado, a discriminação assume duas formas: discriminação direta ou intencional e discriminação de facto. No primeiro modelo, existem comportamentos dos quais se pode facilmente inferir a hostilidade discriminatória, nomeadamente a intenção, o desejo de violar os direitos dos outros (Cruz, 2005). Na discriminação de facto, também chamada de discriminação inconsciente, o discriminador não tem conhecimento do dano que está causando. 

Cruz (2005, p.31) acredita que outra forma de discriminação decorre, na verdade, da política de neutralidade e indiferença do aparelho estatal para com as vítimas de discriminação. Neste sentido, as minorias não podem garantir que sejam tratadas de forma diferente devido às suas particularidades étnicas, culturais e sociais. 

Com o fim das ditaduras, os latino-americanos esperam que o Estado de direito seja consolidado, mas podemos ver que a relação entre governo e sociedade está marcada por um forte poder autoritário e ilegitimidade. Existe a expectativa de que as protecções dos direitos humanos concedidas aos dissidentes políticos sejam alargadas a outros cidadãos após o fim da ditadura. Contudo, isso não aconteceu, como podemos perceber na afirmação de Cruz (2005, p. 36): O judiciário brasileiro está longe de se posicionar eficazmente contra a discriminação ilegal. 

Segundo Mendez, O’Donnell e Pinheiro (2000, p. 11), a abordagem autoritária de seu governo não é afetada por mudanças políticas ou eleições: Nas democracias, o autoritarismo prevalece, especialmente quando embutido nas instituições de controle estatal médio. 

Telles (2003) afirma que o sistema judiciário brasileiro continua desempenhando suas funções de forma discriminatória. Como se não bastasse o comportamento racista, também assistimos a um aumento da violência policial desde a década de 1990. Os direitos políticos dos cidadãos são cada vez mais respeitados pelas autoridades policiais, mas muitos agentes continuam a utilizar a tortura como técnica de investigação, principalmente para “extrair confissões”, levando-nos a acreditar que muitas das mortes podem ter sido causadas por agentes policiais. Considere a execução sumária.

Segundo Guimarães e Huntley (2000), a repressão policial, especialmente a repressão militar, é outra ameaça aos negros. Estas práticas são desrespeitosas, especialmente porque a polícia armada pelo Estado sente que é a verdadeira autoridade porque vê os negros como os verdadeiros marginalizados. 

A investigação de Fry (2000) também observou que os negros têm maior probabilidade de serem alvo da polícia porque enfrentam mais barreiras no acesso à justiça, especialmente à justiça criminal, e têm mais dificuldade em proteger e promover os seus direitos constitucionais. 

Como apontam Guimarães e Huntley (2000), esse problema não se limita à fronteira brasileira, é um problema recorrente em todo o mundo, mas a impunidade aqui assusta as sociedades. Se encontrar um racista já é ruim o suficiente, imagine encontrar um racista “armado”. Isso é muito lamentável e lamentável para os negros. A pior coisa é além de estar sob pressão da repressão policial, há constantes ameaças de verdadeiros criminosos e elementos criminosos. 

Outro dado relevante que levantado foi por Cano, citado por Telles (2003, p. 254), utilizando informações dos Tribunais do Júri da cidade de São Paulo, onde constatou que: 

“[…] 33% dos civis mortos intencionalmente por policiais eram pardos e outros 13,3% pretos; analisando a população em geral, o total de atingidos por estes crimes passa a ser de 24% dos pardos e 4% dos pretos, o que levou o pesquisador a concluir que a polícia visava os negros para execução, especialmente aqueles mais escuros.” 

De acordo com Fry (2000), o funcionamento tendencioso do sistema de justiça criminal leva ao medo do Estado de direito como um todo, uma vez que os cidadãos desconfiam das instituições que deveriam salvaguardar os seus direitos. Tais suspeitas incluem um número excessivo de processos judiciais, corrupção judicial e falta de compreensão o sistema de justiça criminal contemporâneo pode aproximá-lo dos grupos marginalizados. 

A pesquisa de Sposato et al. (2006, p. 1) mostra que os negros são mais suscetíveis às ações da justiça criminal, partindo da premissa de que os efeitos da justiça criminal sobre os diferentes grupos sociais não são uniformes, mas seletivos. Seguindo o entendimento de Sposato et al (2006, p. 21) afirma:

“A idéia de seletividade penal nega o pressuposto de que as escolhas criminalizantes sejam tomadas por critérios impessoais e universalmente direcionados. Segundo robusta orientação criminológica contemporânea, à intervenção penal precedem opções que raramente se pautam pela preocupação de universalizar o controle social através do Direito Penal. Essa escolha dos campos em que atuarão as estâncias penais de controle é feita através de um juízo de seletividade, que opta por criminalizar algumas condutas e não criminalizar outras.” 

Segundo estudo realizado com moradores do Rio de Janeiro pelo Instituto de Religião e Centro de Pesquisa e Documentação da História Contemporânea do Brasil citado por Fry (2000), acredita-se que os negros tenham sofrido mais do que os brancos. A grande maioria dos brancos, negros e pardos afirma que os negros e multirraciais são mais perseguidos pela polícia do que os brancos. (Fry, 2000, p. 209) 

Fry (2000) cita dados coletados em pesquisa realizada por Moema Teixeira, que observou que, em 1988, 70% da população carcerária do estado do Rio de Janeiro era composta por pessoas “pretas” e “pardas” com idade de 40 anos. Porcentagem da população total. (RFJ, 2000, p. 210) 

Teixeira, citado por Fry (2000, p. 210), também realizou uma pesquisa de análise de coeficientes para o estado de São Paulo, concluindo que se os negros não constituem um quarto da população do estado de São Paulo, então eles constituem uma parcela maior da população. Mais da metade da população encarcerada do estado. 

2.1 EFEITOS INTERGERACIONAIS NA JUSTIÇA CRIMINAL BRASILEIRA 

Os efeitos intergeracionais na justiça criminal brasileira são evidentes na transmissão de desigualdades e estigmas raciais ao longo das gerações. Quando membros da comunidade negra são desproporcionalmente afetados pelo sistema de justiça criminal, suas famílias e descendentes também enfrentam os impactos desse envolvimento. 

O estigma associado ao encarceramento de familiares pode minar a autoestima, limitar as oportunidades educacionais e dificultar o acesso ao mercado de trabalho das gerações futuras. Isso resulta em uma perpetuação do ciclo de desvantagem social e da desigualdade racial, ilustrando a importância de abordar o racismo estrutural no sistema de justiça criminal em busca de uma sociedade mais justa e igualitária. 

As crianças são as mais afetadas por esse problema, especialmente aquelas que enfrentam a combinação de serem menores de idade, pertencerem a famílias de baixa renda e serem de origem negra. Esses fatores atuam em conjunto, contribuindo para a exclusão quando essas crianças ingressam na escola. 

Sobre o tema, podemos destacar as considerações de Sueli Carneiro (2005), onde diz que as estatísticas de mortalidade, morbidade e expectativa de vida para argumentar que a população negra no Brasil enfrenta uma relação intrínseca com a morte, notadamente exemplificada pelo déficit demográfico entre jovens negros devido à violência que os coloca em maior risco. 

Além disso, muitos negros e negras veem suas vidas ceifadas por mortes evitáveis, resultantes da negligência do Estado. A exclusão das oportunidades educacionais é uma peça fundamental nesse processo de marginalização social, prejudicando a mobilidade social. O sistema educacional, em grande parte, tem contribuído para a subjugação da população racialmente marginalizada, minando sua autoestima, negando seu papel como agentes do conhecimento e desvalorizando suas contribuições culturais. Esses processos são denominados de “epistemicídio.” 

De acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, entre 2016 e 2018, a taxa de analfabetismo em pessoas negras com 15 anos ou mais foi de 9,1%, enquanto a taxa entre brancos foi de 3,9%. Um exemplo claro dessa disparidade está na entrada em universidades, onde a presença de pessoas negras é notavelmente escassa. De acordo com o IBGE, apenas 46,6% dos alunos matriculados em faculdades particulares se identificam como pretos ou pardos. 

O acesso a uma educação de qualidade, que requer estudo dedicado e recursos adequados, muitas vezes não é um privilégio para pessoas negras, já que muitas delas enfrentam a necessidade de trabalhar para sustentar suas vidas. A participação em espaços de tomada de decisões só pode ocorrer com base em uma educação e formação eficazes. Na sociedade pós-moderna, a educação é um veículo de poder, mas a persistência de padrões de exclusão reflete como o racismo estrutural reforça relações de poder desiguais. 

Esse contexto continua a perpetuar um ciclo de violência e marginalização que atinge os corpos negros de forma implacável. O quadro de violência e exclusão não apenas viola direitos fundamentais, mas também restringe severamente as oportunidades e perspectivas de várias gerações dentro dessa comunidade. Esse padrão de discriminação racial, enraizado na época da escravidão, persiste como um legado do racismo estrutural, mantendo a população negra sujeita a níveis persistentes de violência e desigualdade ao longo das gerações. Moreira (2017, p. 139) diz: 

As consequências de práticas discriminatórias não afetam apenas as gerações presentes. O que chamamos de discriminação intergeracional indica que efeitos da exclusão social podem se reproduzir ao longo do tempo fazendo com que diferentes gerações de um mesmo grupo sejam afetadas por práticas discriminatórias […] primeiro, temos a existência do caráter estrutural e sistêmico da discriminação, O que possibilita a estratificação social, fenômeno que impede a inclusão e a mobilidade de grupos minoritários. Tendo em vista o fato que esses processos fazem parte do funcionamento das instituições sociais, ele preserva as desigualdades entre os diversos grupos. Segundo, o caráter intergeracional da discriminação também decorre da dificuldade de minorias, notóriamente minorias raciais, acumularem e transmitirem patrimônio para as gerações seguintes. Isso impede que as pessoas possam ter acesso a recursos financeiros em momentos cruciais da vida, principalmente naqueles momentos em que as pessoas fazem escolhas importantes sobre a vida educacional e profissional. 

Os efeitos intergeracionais na justiça criminal brasileira são profundamente preocupantes. A desproporcionalidade na prisão de indivíduos negros e a discriminação racial sistêmica criam um ciclo de desvantagem que afeta não apenas a geração atual, mas também as futuras. As crianças de famílias que enfrentaram o sistema de justiça criminal devido ao racismo muitas vezes herdam estigmas, limitações educacionais e barreiras ao emprego. Isso perpetua o ciclo de desigualdade e privação de oportunidades ao longo das gerações, sublinhando a urgência de abordar o racismo estrutural no sistema de justiça para interromper essa transmissão intergeracional de desvantagem.

Esse ciclo de desvantagem é alimentado pelo fato de que a discriminação racial no sistema de justiça criminal frequentemente recai sobre famílias e comunidades já marginalizadas, ampliando as disparidades socioeconômicas e as taxas de encarceramento entre a população negra. O impacto é sentido não apenas na falta de oportunidades educacionais e de emprego para os indivíduos afetados, mas também na erosão das perspectivas de desenvolvimento de suas famílias e comunidades. 

Logo, a desigualdade racial no sistema de justiça não é apenas uma questão de uma única geração, mas sim um legado que atravessa as fronteiras do tempo, prejudicando continuamente os indivíduos negros e suas futuras gerações. Portanto, a abordagem do racismo estrutural no sistema de justiça criminal deve incluir medidas para romper esse ciclo de desvantagem intergeracional e promover a equidade e justiça. 

2.2 PERSPECTIVAS DE MUDANÇAS 

O maior desafio atualmente enfrentado por várias sociedades da América Latina é a exclusão de muitos setores dos benefícios proporcionados pela democracia. As instituições governamentais falham em proteger os cidadãos em relação aos seus direitos básicos, frequentemente vítimas de condutas abusivas por parte de órgãos públicos, sem oferecer meios para resolver esses conflitos ou compensar as vítimas de alguma forma. 

Isso tem um impacto indireto na qualidade do regime democrático em vigor, uma vez que o sistema de justiça não consegue transformar em realidade o que está previsto na lei escrita. Conforme observado por Lopes, citado por Adorno (2002, p. 327), o problema do acesso das classes populares à justiça não se resolve apenas aumentando o número de serviços judiciários, mas requer progressivas mudanças na abordagem da função judiciária e do próprio direito. 

De acordo com Méndez, O’Donnell e Pinheiro (2000, p. 244), todos os sistemas judiciários na América Latina sofrem com a séria necessidade de modernização e adaptação aos novos desafios da sociedade, abrangendo questões que vão desde o orçamento até a infraestrutura, logística e capacitação técnica do pessoal. 

Devido ao aumento da demanda por serviços jurídicos nas últimas décadas, o sistema de justiça não acompanhou o desenvolvimento da sociedade, resultando em leis desatualizadas, falta de treinamento adequado para o pessoal, instalações precárias e equipamentos antiquados. 

Nos últimos anos, a demanda por serviços jurídicos aumentou consideravelmente, mas o sistema de justiça não evoluiu de acordo com o desenvolvimento da sociedade. Isso se manifesta claramente na presença de leis desatualizadas, falta de treinamento adequado para o pessoal, instalações precárias e equipamentos obsoletos. 

Além disso, uma barreira significativa enfrentada pelos profissionais do direito é a herança do positivismo jurídico, que impede o progresso dos procedimentos, resultando em formalismos ineficazes que dificultam ainda mais o acesso à justiça. 

Devido a esses desafios e outros, os tribunais estão perdendo a confiança da população e a credibilidade da sociedade, que sempre se viu como vítima desse processo burocrático. Nesse contexto, a comunidade internacional tem se unido para criar programas de assistência com o objetivo de facilitar o acesso à justiça para aqueles que são excluídos, não privilegiados e marginalizados. 

Graças a esses programas, os estados estão reconhecendo a precária situação da administração da justiça e o que deve ser feito para garantir o acesso a todos os cidadãos. Uma das alternativas sugeridas é a implementação de métodos alternativos para a resolução de conflitos, o que ajudaria a aliviar a sobrecarga nos tribunais devido ao acúmulo de casos e simplificaria o processo. 

Cappelletti e Garth (1988) propuseram três soluções para os problemas de acesso à justiça, que incluem a disponibilidade de assistência jurídica para a população carente, a representação dos interesses difusos e um foco mais amplo no acesso à justiça. A última solução envolve reformas institucionais e mecanismos, pessoas e procedimentos utilizados para resolver e até prevenir disputas nas sociedades modernas (Cappelletti; Garth, 1988, p. 67). 

A reforma do sistema de justiça aborda questões como a reforma policial e a criação de fóruns especializados. No Brasil, foram estabelecidos os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, Tribunais de Mediação, Conciliação e Arbitragem, bem como órgãos de proteção ao consumidor, como o PROCON. Essas iniciativas produziram resultados positivos, reduzindo o número diário de processos nos tribunais e enfatizando a celeridade nas decisões. 

Além disso, a preparação contínua dos julgadores é uma preocupação, com escolas disponíveis para atualizações constantes. O desafio é tornar a justiça universal e acessível a todos, evitando que o direito seja percebido como um privilégio. A inclusão dos marginalizados e excluídos é fundamental. 

No âmbito da reforma judicial, os direitos humanos desempenham um papel central, e as manifestações contam com o apoio da sociedade civil organizada e organizações não governamentais. Há consenso de que o sistema judiciário não é uma prioridade das elites, suspeitando-se que as propostas de reforma visam mais a abertura de mercado do que garantir o acesso igualitário aos excluídos. 

O ideal é que o funcionamento das leis conceda a todos os cidadãos os mesmos direitos, proporcionando condições iguais para buscar a justiça. A questão crucial é como considerar um Estado Democrático de Direito consolidado quando muitos cidadãos não têm acesso igualitário à reivindicação de seus direitos. 

Nos Estados Democráticos Modernos, a justiça é um direito fundamental, abrangendo dimensões políticas, civis, sociais e econômicas. No entanto, o Poder Judiciário é frequentemente visto como um serviço caro e inacessível para muitos, em vez de um direito fundamental disponível a todos os cidadãos.

3. O RACISMO ESTRUTURAL E AS DECISÕES JUDICIAIS ATUAIS NO ÂMBITO DO PROCESSO PENAL 

Ademais, a partir do que foi abordado, também é evidente que a raça tem sido usada como base para condenações, seja de maneira explícita nas decisões judiciais ou de forma implícita, o que viola o princípio de igualdade protegido pela nossa constituição atual. 

A evolução jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem se dedicado a combater o racismo estrutural, incorporando esforços nesse sentido. Recentemente, nas deliberações das turmas de direito penal do tribunal, tem sido observada uma maior atenção dada ao tema, buscando aumentar sua visibilidade. 

Um exemplo notável foi quando o tribunal fez uso da expressão “racismo estrutural” ao examinar práticas ilegais durante abordagens policiais de suspeitos, frequentemente selecionadas com base em sua raça e condição econômica pelas forças de segurança. Durante o julgamento realizado na Sexta Turma, o ministro relator, Rogerio Schietti Cruz, destacou que, como consequência da “ainda latente mentalidade escravista, cujos efeitos perduram até os dias de hoje” no Brasil, “o controle sobre os corpos negros no espaço público se acentua por meio da repressão criminal, que se volta não apenas contra condutas concretas e danosas, mas também contra condições pessoais vistas, por si sós, como perigosas e indesejáveis”. Isso ocorreu no julgamento do RHC 158.580: 

RECURSO EM HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. BUSCA PESSOAL. AUSÊNCIA DE FUNDADA SUSPEITA. ALEGAÇÃO VAGA DE ATITUDE SUSPEITA. INSUFICIÊNCIA. ILICITUDE DA PROVA OBTIDA. TRANCAMENTO DO PROCESSO. RECURSO PROVIDO. Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da SEXTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, dar provimento ao recurso ordinário, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. (STJ. Recurso Ordinário em Habeas Corpus: 158580 BA 2021/0403609-0. Relator: Ministro Rogerio Schietti Cruz. Data da Publicação: DJe 25/04/2022). 

No entanto, apesar dos esforços notáveis que o sistema judiciário tem empreendido para combater o racismo estrutural, persistem evidências de condenações injustas em que o peso da cor da pele continua a fazer uma diferença marcante. Estes casos ressaltam a necessidade urgente de reformas profundas que abordem as raízes profundas do preconceito racial, garantindo, assim, que a justiça seja verdadeiramente cega e igual para todos, independentemente da cor da pele. 

Nesse contexto, torna-se crucial analisar alguns casos em que o racismo estrutural teve um impacto significativo nas decisões do sistema de justiça criminal. 

Como ocorreu no processo número 0009887-06.2013.8.26.0114, que estava em andamento na 5ª Vara Criminal da Comarca de Campinas, no Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. A juíza, ao analisar a autoria do crime de latrocínio, afirmou que o réu foi facilmente identificado pelas testemunhas, pois, em suas palavras, ele não se encaixava no estereótipo tradicional de um criminoso, tendo pele, olhos e cabelos claros, o que o tornava menos suscetível a ser confundido. 

A decisão da juíza nesse caso parece destacar a importância de evitar estereótipos ao analisar a autoria de um crime. Ela ressalta que o réu não se encaixava no “estereótipo padrão de bandido” devido às suas características físicas, como pele, olhos e cabelos claros. Isso destaca a necessidade de uma avaliação imparcial e baseada em evidências ao julgar um caso, em vez de confiar em estereótipos ou preconceitos. 

Uma outra decisão que teve grande repercussão na internet aconteceu no processo de número 0017441-07.2018.8.16.0013, em trâmite na 1ª Vara Criminal de Curitiba, no Paraná. Neste caso, a juíza, ao condenar o réu, observou que ele era réu primário e que não havia informações sobre sua conduta social, mas que este é integrante do grupo criminoso “em razão à sua raça”. 

A divulgação da sentença, que continha uma manifestação clara de teor racista, foi feita pela advogada do sétimo réu em uma plataforma de mídia social. Após a publicação, o caso adquiriu relevância nacional. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) interveio e solicitou ação por parte do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Surpreendentemente, a Corregedoria-Geral do Tribunal de Justiça do Paraná optou por arquivar o processo disciplinar que havia sido aberto contra a juíza em decorrência das acusações de racismo. É importante observar que a atuação da Corregedoria-Geral foi ordenada pelo CNJ, que, em agosto de 2020, exigiu uma investigação mais aprofundada do caso (Consultor Jurídico, 2020). 

A decisão mencionada suscita sérias preocupações em relação à justiça e à imparcialidade. Ao associar o réu a um grupo criminoso com base em sua raça, a juíza cometeu um erro grave. Essa ação viola princípios fundamentais de igualdade e não discriminação que são essenciais em um sistema de justiça justo. 

Ninguém deveria ser associado a atividades criminosas com base em sua raça no Brasil. Se isso ocorre, não é por causa da cor da pele, mas devido ao racismo estrutural e ao mito da democracia racial que permeiam a sociedade brasileira. Conforme mencionado por Ribeiro (2018, p. 111) “muitas vezes nos dizem que fomos discriminados, insultados, violentados porque somos diferentes. Esse é um mito que precisa acabar. Não sou discriminada porque sou diferente, eu me torno diferente através da discriminação.” 

Um outro exemplo ocorreu quando um homem negro de 28 anos, chamado Lucas Morais da Trindade, foi detido em flagrante em 2018 por estar na posse de menos de 10 gramas de maconha. Ele, tristemente, perdeu a vida devido ao coronavírus em Manhumirim, uma localidade no interior de Minas Gerais. 

Em um primeiro julgamento, ele foi sentenciado a cumprir uma pena de 5 anos e 4 meses de prisão. A defesa do cidadão mineiro então impetrou três pedidos de habeas corpus ao Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), mas todos eles foram rejeitados. Essa decisão do TJMG contraria uma resolução emitida pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) a respeito de detenções durante a pandemia. Essa resolução sugere, entre outras coisas, a revisão de prisões temporárias e preventivas em casos de infrações menos graves, bem como indica que novos mandados de prisão devem ser usados apenas em situações de “máxima excepcionalidade”. 

O caso acima é mais um exemplo preocupante do que muitos consideram como racismo estrutural no sistema judiciário. A desproporcionalidade na prisão e na sentença de Lucas Morais da Trindade por portar uma quantidade mínima de maconha é alarmante. Esses eventos ressaltam como as minorias étnicas, em particular os negros, frequentemente enfrentam um tratamento desigual no sistema legal. 

Semelhantemente, uma mulher de condições financeiras limitadas foi presa por furtar um xampu e condicionador em São Paulo e ficou detida por mais de um ano. Durante sua pena, ela foi torturada por outras detentas e perdeu a visão do olho direito. O Tribunal de Justiça de São Paulo decidiu que ela deveria permanecer na prisão por pelo menos mais um ano. Sua defesa planeja levar o caso ao Superior Tribunal Federal (STF). A juíza a sentenciou a uma medida de segurança, alegando que a presa era incapaz de entender seu crime e a encaminhou para um manicômio penitenciário. O laudo psiquiátrico não considerou a tortura que ela sofreu na prisão. 

Este caso ressalta diversas questões cruciais. Primeiramente, destaca a disparidade nas consequências judiciais com base na condição financeira, onde indivíduos de “colarinho branco” que cometeram crimes financeiros em grande escala frequentemente saem impunes, enfatizando uma seletividade no sistema de justiça que parece favorecer os ricos. Em segundo lugar, a quantidade de tempo que a jovem passou na prisão, sofrendo agressões e perdendo a visão devido ao furto de itens de valor mínimo, evidencia uma notável desproporção entre a ação e as consequências. 

É importante ressaltar que de acordo com o levantamento realizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) intitulado “Perfil Sociodemográfico dos Magistrados Brasileiros” (2018), a maioria dos magistrados se autodeclara como brancos (80,3%), enquanto 18,1% se identificam como negros (16,5% pardos e 1,6% pretos), e 1,6% têm origem asiática (amarela). Apenas 11 magistrados se declararam indígenas. Isso contrasta fortemente com a composição étnico-racial da população brasileira, onde a população negra representa 56,10%. 

Embora haja várias ações afirmativas voltadas para aumentar a representatividade de pessoas negras em instituições como concursos para magistratura e vagas nas universidades, como é o caso das cotas raciais, tais medidas são cruciais dada a urgência da situação. Esperar que alguém conclua a faculdade e posteriormente seja aprovado na magistratura, o que pode levar vários anos, não é viável, pois, nesse período, muitas injustiças persistirão, e mais vidas negras serão prejudicadas e interrompidas. (Moreira; Silva, 2020) 

Assim, isso destaca que a gravidade da situação se estende para além das decisões tomadas pelos magistrados, abrangendo também a composição do sistema de justiça.

3.1 A FUNÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO NA LUTA CONTRA O RACISMO ESTRUTURAL 

No cenário atual, a discussão sobre a equidade racial e a erradicação do racismo estrutural emergem como pautas cruciais para a sociedade. Nesse contexto, o Poder Judiciário assume um papel de destaque na promoção da justiça, da igualdade e na defesa dos direitos fundamentais dos cidadãos. 

Segundo Amparo (2020), no Brasil, o Poder Judiciário foi inicialmente influenciado por teorias racistas, incluindo a teoria eugenista, que classificava o negro como inferior ao branco. Segundo essa teoria, essa inferioridade era atribuída, entre outras coisas, à diferença no peso da massa encefálica, sendo considerada como algo irremediável, independentemente das condições sociais em que o negro se encontrasse. Essa teoria sustentava que, devido à sua morfologia e fisiologia, o negro nunca poderia se igualar ao branco. 

Paralelamente, o Poder Judiciário desempenha um papel crucial na busca diária da igualdade pela população negra, uma vez que é encarregado de salvaguardar os direitos da sociedade e aplicar as normas de maneira imparcial. Contudo, a realidade muitas vezes difere desse ideal, uma vez que o sistema judicial, em vez de proteger, tem sido um dos menos eficazes em garantir os direitos da população negra. Em muitos casos, há resistência em reconhecer situações de racismo, resultando em decisões injustas que privam os negros de sua liberdade. Isso perpetua uma história de privação de liberdade da população negra, mudando apenas o cenário, de senzalas para prisões. (Moreira; Silva, 2020) 

De acordo com Amparo (2020), quando um magistrado profere decisões de cunho racistas, poderiam surgir diversas consequências legais, pelo menos em teoria. Os magistrados são protegidos quanto ao conteúdo de suas decisões, desde que estas não revelem um “intuito ofensivo”, conforme estabelece a jurisprudência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). No entanto, esse tipo de caso levanta questões éticas e disciplinares. O Código de Ética da Magistratura proíbe qualquer forma de discriminação injustificada, e a Lei Orgânica da Magistratura prevê uma gama de sanções, que vão desde advertências até aposentadoria compulsória, com avaliação caso a caso e garantindo o direito à ampla defesa.

Em vista disso, Almeida (2018) afirma que, dado que o racismo é uma parte intrínseca da ordem social, a única maneira de uma instituição lutar contra o racismo é implementar práticas antirracistas efetivas. Portanto, é responsabilidade de uma instituição comprometida com a questão racial adotar políticas internas que busquem: a) promover igualdade e diversidade em suas relações internas e com o público externo, como na publicidade; b) eliminar barreiras que dificultam a ascensão de minorias a posições de liderança e prestígio na instituição; c) manter espaços para discussões e, quando necessário, revisão das práticas institucionais; d) promover a acolhida e a resolução de conflitos raciais e de gênero. 

Além do mais, enfatiza-se a importância de incorporar a temática racial na formação inicial e no contínuo aperfeiçoamento dos magistrados brasileiros, durante os cursos preparatórios e ao longo de suas carreiras. Esta iniciativa poderia contar com a colaboração direta de grupos representativos, cujo conhecimento e experiência são fundamentais para garantir que o conteúdo das disciplinas seja minucioso e sensível à importância da história dos negros e das questões raciais. A integração desse enfoque é essencial para promover uma justiça mais equitativa e sensível às realidades raciais no Brasil. 

Portanto, ao garantir que as leis sejam aplicadas de forma justa e imparcial, o Judiciário pode desempenhar um papel crucial na responsabilização da discriminação racial e na proteção dos direitos das minorias étnicas. Além disso, ao tomar decisões que reforcem a igualdade e combatam as disparidades raciais, o Judiciário pode contribuir para a construção de uma sociedade mais inclusiva e justa. 

No entanto, para alcançar um progresso significativo na luta contra o racismo estrutural, é necessário um comprometimento contínuo e uma revisão constante das práticas judiciais, visando garantir que as ações se alinhem com os princípios de igualdade e justiça para todos. 

3.2 O JUIZ COMO AGENTE DA SELETIVIDADE 

É crucial ressaltar o papel do juiz no processo de seletividade penal, uma vez que é a sentença judicial que oficialmente declara um indivíduo como culpado e o submete ao sistema penal. Isso não apenas influencia o destino dos acusados, mas também contribui para a percepção e a realidade da desigualdade no sistema de justiça. As decisões dos juízes podem aprofundar ou amenizar as disparidades existentes, afetando diretamente a vida e o futuro dos acusados, em especial os marginalizados 

Quando discutimos o conceito de “sociedade dividida”, termo cunhado por Dahrendorf, se refere ao fato de que os juízes geralmente vêm das camadas médias e superiores da sociedade, enquanto os réus provêm predominantemente das classes sociais mais baixas. Baratta (2002) destaca as desvantagens enfrentadas por esses réus marginalizados em comparação com aqueles provenientes de estratos sociais mais privilegiados. 

Entre os fatores desfavoráveis para os indivíduos socialmente marginalizados estão a barreira linguística que os separa dos juízes e a menor probabilidade de terem acesso a advogados de renome. (Baratta, 2002) 

Outrossim, Baratta (2002) também menciona pesquisas empíricas que destacam as diferenças nas atitudes emocionais e valores em relação a indivíduos de diferentes classes sociais. Essas pesquisas indicam que os juízes, de forma inconsciente, consideram a posição social dos acusados tanto ao avaliar o elemento subjetivo do delito (dolo ou culpa) quanto na avaliação do caráter sintomático do delito em relação à personalidade do agente, o que acaba afetando a determinação da pena. Em casos que envolvem sanções pecuniárias e sanções de prisão, existe uma tendência de aplicar as últimas aos condenados das classes sociais mais baixas. 

Baratta (2002) também destaca que a razão pela qual as sanções de prisão são consideradas mais apropriadas para os acusados marginalizados é porque são menos prejudiciais para o status social já reduzido desses indivíduos e porque se alinham com a imagem convencional do que acontece com pessoas pertencentes a esses grupos sociais. Essa visão coincide com as palavras de um juiz a quem essas pesquisas foram apresentadas, o qual teria comentado que um acadêmico na prisão é algo que nunca poderíamos imaginar. 

É importante ressaltar que, embora essas pesquisas não tenham sido conduzidas no Brasil, elas ainda refletem uma faceta da realidade do sistema penal brasileiro, indicando a influência da estigmatização baseada no código social (second code), que regula a aplicação das normas penais abstratas por parte das autoridades oficiais do sistema penal. 

A atuação judicial seletiva ocorre por meio dos “espaços” nos quais entram em jogo as normas dos “second codes” dos juízes, que são moldados por suas visões de mundo e preconceitos, entre outros fatores. Dentro desses “espaços”, podemos destacar aqueles permitidos pela margem de manobra judicial na avaliação da verdade processual dos eventos, na valoração das provas e na interpretação de conceitos legais vagos ou ambíguos presentes nos tipos penais, como “dignidade” e “obscenidade”. 

A falta de parâmetros legais claros proporciona aos juízes uma ampla margem de discricionariedade, como é o caso da definição de tipos penais abertos, como os crimes culposos e os omissivos impróprios, bem como na individualização e fixação da pena. Além disso, as diferenças sociais desempenham um papel significativo na atividade judicial, influenciando a discricionariedade legal. 

3.3 O IMPACTO DE DECISÕES MARCADAS POR PRECONCEITO RACIAIS 

As condutas abusivas de cunho racial por parte de policiais, membros do Ministério Público e, principalmente, de magistrados são um grave problema que contribui para erros judiciais e mina a confiança no sistema de justiça. Quando agentes encarregados de fazer cumprir a lei e aplicar a justiça discriminam ou adotam práticas racistas, a imparcialidade e a equidade do sistema legal são comprometidas. Essas ações podem resultar na criminalização injusta de indivíduos pertencentes a minorias étnicas e prejudicar a integridade de processos judiciais. 

Da mesma maneira, é importante frisar que, em sua grande maioria, processos que envolvem erros de convencimento frágil na ação penal, especialmente aqueles motivados por decisões de cunho racistas, são revistos apenas nas cortes superiores. Isso levanta outra problemática, que é o acesso dos cidadãos pobres às cortes superiores, devido à hipossuficiência, à escassez de defensores públicos e aos altos custos desses tipos de recursos.

Nesse contexto, discute-se também se a punição do Estado nessas prisões, a soltura da pessoa e possivelmente o pagamento de uma indenização são suficientes. É importante destacar que essa indenização leva anos, e na prática, raramente é cumprida pelo Estado, servindo apenas como um valor simbólico. O Estado se utiliza dos recursos até os últimos instantes para atrasar esse pagamento, causando uma demora incalculável na reparação desse dano, que é imensurável. Além disso, é fundamental considerar reformas no sistema jurídico para promover uma justiça mais equitativa e ágil. 

Para Daniel Maidl (2016): “A prisão injusta lesa o patrimônio moral do indivíduo que deve ser ressarcido por ter sido privado não só da liberdade, mas da honra, gerada pela angústia de estar encarcerado quando sabedor da ausência do crime.” 

Portanto, quando o Estado não possui os elementos necessários para justificar a prisão do suposto criminoso e mesmo assim a faz, ou ainda, quando o Estado dispõe de possíveis elementos, mas ao final do processo é comprovado que o indivíduo foi preso injustamente, nasce, então, o direito de indenização por parte do sujeito em face do Estado. Conforme previsto no art. 5º, inciso LXXV da Constituição Federal: 

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: 
LXXV – o Estado indenizará o condenado por erro judiciário.

Assim como também diz em seu art. 37, parágrafo 6º: 

§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. 

O racismo no Brasil é um desafio enraizado na história e na sociedade, transcendendo o preconceito racial para afetar as relações hierárquicas, de gênero e econômicas. Essa persistência do racismo, desde os tempos coloniais até a atualidade, tem consequências profundas no bem-estar psicológico e emocional das vítimas. Por esse motivo, a psicologia tem concentrado esforços significativos no desenvolvimento de tratamentos destinados a mitigar os danos causados pelo racismo. 

A avaliação das consequências e traumas resultantes do preconceito levou os profissionais da psicologia a desenvolver procedimentos específicos para lidar com casos de racismo e questões relacionadas à saúde mental. Essas abordagens terapêuticas não apenas visam oferecer apoio e tratamento às vítimas de racismo, mas também têm o objetivo de promover a resiliência, a autorreflexão e o fortalecimento emocional, capacitando as pessoas a enfrentarem os desafios do racismo e a construírem uma saúde mental mais robusta em um ambiente social frequentemente adverso. 

Dessa forma, o estudo aprofundado sobre o impacto de decisões judiciais criminais marcadas por preconceito racial revela a urgente necessidade de reformas no sistema de justiça criminal brasileiro. Tais decisões não apenas perpetuam a desigualdade racial, mas também minam a confiança no sistema legal, prejudicando a credibilidade das instituições judiciárias. 

Ao evidenciar as injustiças decorrentes do preconceito racial no judiciário brasileiro, enfatiza-se a necessidade de adotar medidas para eliminar tais preconceitos, promover a igualdade de tratamento perante a lei e garantir que o sistema de justiça cumpra seu papel fundamental na proteção dos direitos de todos os cidadãos, independentemente de sua origem étnica. A busca por um sistema de justiça mais justo e imparcial deve ser uma prioridade, visando a construção de uma sociedade mais equitativa e inclusiva.

CONCLUSÃO 

Neste estudo, foi possível constatar que o racismo estrutural não é uma mera teoria, mas uma realidade que permeia cada aspecto do sistema de justiça criminal, desde a abordagem policial até o veredito final proferido pelo Judiciário. As disparidades raciais na criminalização, na prisão preventiva e nas penas impostas a réus negros demonstram a urgência de enfrentar esse problema com seriedade e determinação. 

Este estudo destaca a necessidade de reformas profundas e de ações contundentes para assegurar que a justiça seja verdadeiramente cega à cor da pele e que todos os cidadãos, independentemente de sua origem étnica, tenham igualdade de tratamento perante a lei. 

Constata-se que o racismo não é apenas uma questão de atitudes individuais, mas sim uma parte arraigada nas estruturas sociais e institucionais da sociedade. Conclui-se, conforme observado por Silvio Almeida, que “as instituições são racistas porque a sociedade é racista”. Isso implica que o racismo não é uma exceção, mas sim uma parte integrante da cultura e das normas que moldam a sociedade. 

A análise histórica realizada levou às origens do racismo estrutural, enraizado na época da colonização, quando hierarquias raciais foram criadas para justificar a exploração e a subjugação de grupos étnicos. A escravidão desempenhou um papel crucial na perpetuação desse racismo, deixando cicatrizes profundas na sociedade brasileira. 

Verifica-se, ademais, como o racismo estrutural se manifesta de forma contemporânea. Ele persiste nas desigualdades socioeconômicas, na falta de acesso igualitário a oportunidades e nas manifestações de racismo no esporte. Mesmo quando atletas negros, como Vinicius Júnior, são vítimas de atos racistas, o racismo continua a ser minimizado por alguns, disfarçado de rivalidade esportiva. 

Ademais, as disparidades socioeconômicas entre grupos raciais, a violência racial e o acesso desigual a oportunidades demonstram que ainda existe um longo caminho a percorrer na luta contra o racismo. Embora tenha havido avanços, constata-se que o racismo persiste em várias facetas da sociedade e continua a prejudicar indivíduos negros no Brasil.

É fundamental reconhecer que o combate ao racismo estrutural requer esforços contínuos. Deve-se trabalhar na desmontagem das estruturas que o sustentam, promovendo equidade e inclusão em todas as esferas da vida. Isso envolve reformas profundas em políticas, práticas institucionais e ações anti racistas na sociedade brasileira. 

Dessa forma constata-se que as instituições que o compõem não estão isentas do racismo institucional. Verifica-se que o racismo estrutural permeia cada componente desse sistema, desde a polícia até as instâncias superiores, contribuindo para a criação, reprodução e legitimação de ideologias que perpetuam desigualdades raciais. 

Como observado nas pesquisas, é inegável que o racismo interfere na aplicação do Princípio da Igualdade, preconizado na Constituição de 1988. As consequências desse racismo são profundas, resultando em uma criminalização desigual, no acesso limitado à educação e oportunidades, e na violência policial exacerbada contra a população negra. 

No entanto, conclui-se que é possível vislumbrar perspectivas de mudanças. A conscientização sobre a necessidade de reformas no sistema de justiça criminal cresce, impulsionada por esforços da sociedade civil e organizações não governamentais. Propostas de reforma, como a implementação de métodos alternativos de resolução de conflitos e a busca por maior acessibilidade à justiça, estão em andamento. 

É fundamental que o sistema de justiça reconheça sua responsabilidade em garantir o acesso igualitário à justiça e promover o respeito aos direitos humanos. A inclusão dos marginalizados e excluídos é imperativa, visando à construção de um Estado Democrático de Direito verdadeiramente consolidado, onde todos os cidadãos possam buscar justiça de maneira igualitária. Portanto, há esperança de que, com a colaboração de diversos setores da sociedade, o sistema de justiça criminal brasileiro possa evoluir rumo a uma realidade mais justa e equitativa para todos. 

Este trabalho examinou minuciosamente o impacto do racismo estrutural nas decisões judiciais no âmbito do processo penal no Brasil. A análise revelou a presença persistente de preconceitos raciais que afetam significativamente o sistema de justiça criminal, violando os princípios fundamentais de igualdade e justiça. 

Destaca-se os esforços do Superior Tribunal de Justiça (STJ) em abordar o racismo estrutural, bem como casos emblemáticos que demonstram a necessidade urgente de reformas profundas. No entanto, é importante ressaltar que, infelizmente, ainda há vários casos recentes de decisões judiciais marcadas pelo cunho racista que abalam a confiança na justiça. É inaceitável que a cor da pele continue a ser usada como base para condenações injustas e que os estereótipos influenciam as decisões judiciais. 

A discussão sobre a função do Poder Judiciário na luta contra o racismo estrutural ressaltou a importância de implementar políticas internas antirracistas, além de promover a formação contínua dos magistrados em relação a questões raciais. O Judiciário desempenha um papel crucial na promoção da igualdade e na proteção dos direitos dos cidadãos, mas precisa revisar constantemente suas práticas para alinhar-se com os princípios de justiça. 

O presente estudo também explorou o papel do juiz na seletividade penal, destacando como a posição social dos réus influencia as decisões judiciais. A pesquisa empírica ressaltou a necessidade de considerar fatores sociais e econômicos nas decisões dos magistrados, a fim de combater a desigualdade. 

Além disso, foram analisados os impactos de decisões judiciais marcadas por preconceito racial, enfatizando o grave problema de abusos de cunho racial por parte de agentes da lei. Essas ações comprometem a imparcialidade e a equidade do sistema de justiça, levando a erros judiciais que prejudicam as vítimas e minam a confiança na justiça. 

Por fim, é imperativo que o Brasil adote reformas no sistema de justiça criminal, a fim de eliminar o preconceito racial, promover a igualdade perante a lei e reconstruir a credibilidade das instituições judiciárias. A busca por um sistema de justiça mais justo e imparcial deve ser uma prioridade, visando a construção de uma sociedade mais equitativa e inclusiva. É essencial reconhecer e enfrentar o racismo estrutural em todas as esferas da sociedade, incluindo o sistema de justiça, para garantir que todos os cidadãos sejam tratados com igualdade e justiça, independentemente de sua origem étnica.


1Art. 1º do decreto n° 145 de 1893: O Governo fundará uma colonia correccional no próprio nacional Fazenda da Boa Vista, existente na Parahyba do Sul, ou onde melhor lhe parecer, devendo aproveitar, além daquela fazenda, as colônias militares actuaes que a isso se prestarem, para correcção, pelo trabalho, dos vadios, vagabundos e capoeiras que forem encontrados, e como taes processados na Capital Federal. 
2Art. 6º da decreto n° 3475 de 1899: os réos que não forem vagabundos ou sem domicilio se livrarão soltos, independentemente de fiança.
3Lei nº 10.639 de 9 de janeiro de 2003, altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira”, e dá outras providências.
4Lei Nº 11.645 de 10 de março de 2008, altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, modificada pela Lei no 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”.
5OBSERVATÓRIO DA DISCRIMINAÇÃO RACIAL NO FUTEBOL. Relatório anual da discriminação racial no futebol 2021. Porto Alegre: Museu da UFRGS, 2022. Disponível em: <https://observatorioracialfutebol.com.br/Relatorios/2021/RELATORIO_DISCRIMINACAO_RACIAL_2 021.pdf>.
6O Aláfia Lab é um laboratório de pesquisa que se concentra nas áreas que entrelaçam internet, política e sociedade. Seus projetos atuam no sentido de compreender não apenas as dinâmicas online

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