O PODER FAMILIAR NA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.8007978


Rodrigo Mendes Lopes
Orientador(a): Márcio Ferreira dos Santos
Coorientador(a): Me. Rosyvânia Araújo Mendes.


RESUMO

O objetivo é abordar a evolução da família no direito brasileiro, e focar na relação da paternidade socioafetiva e os limites do exercício do poder familiar em decorrência desta modalidade de filiação. Sendo o poder familiar o conjunto de direitos e deveres atribuídos aos pais, a pessoa e aos bens dos filhos menores, e sendo a paternidade responsável um princípio constitucional, o presente trabalho visa explorar o exercício do poder familiar nesta modalidade. Para explicar como se desenvolveu a paternidade, será feita uma análise histórica do desenvolvimento do direito de família, começando com a família canônica e terminando com as famílias modernas. Após uma breve introdução, serão estudados os princípios fundamentais do direito de família – que foram e continuam sendo cruciais para o surgimento da filiação socioafetiva e da multiparentalidade. A metodologia utilizada será a bibliográfica, com caráter teórico e explicativo, utilizando-se pesquisas bibliográficas por meio de livros, artigos, sites, leis e jurisprudência. O método será o dedutivo, com o objetivo de levantar dados e informações, e assim chegar a possíveis conclusões acerca do tema.

Palavra-chave: Paternidade Socioafetiva, Direito da família, Filiação

ABSTRACT

The objective is to address the evolution of the family in Brazilian law, and to focus on the relationship of socio-affective paternity and the limits of the exercise of family power according to this modality of filiation. Being the family power or set of rights and duties attributed to the country, to the person and to the two minor children, and being a parent responsible under a constitutional principle, or present work aims to explore or exercise family power in this modality. To explain how paternity developed, a historical analysis of the development of family law will be made, beginning with the canonical family and ending with modern families. After a brief introduction, the fundamental principles of family law will be studied – which are and continue to be crucial for the emergence of socio-affective filiation and multiparentality. The methodology used will be bibliographical, with a theoretical and explanatory character, using bibliographical research through books, articles, sites, laws and jurisprudence. The method will be deductive, with the objective of gathering data and information, and also reaching possible conclusions about the subject.

Palavra-chave: Socioaffective Paternity, Family Law, Filiação

1. INTRODUÇÃO

Este trabalho possui como escopo o estudo do Reconhecimento da Paternidade Socioafetiva pela Legislação Brasileira, e seu objetivo é analisar o reconhecimento socioafetivo pela visão da legislação brasileira e dos Tribunais Superiores.

Ao longo dos anos, a ideia de família passou por diversas modificações e interpretações. O conceito de família patriarcal vem perdendo espaço na sociedade moderna porque se pluralizou. Hoje, não podemos mais falar de um único tipo de família. A instituição familiar começou a se desenvolver mais pela afetividade do que pela adesão às rígidas regras do casamento heterossexual. A busca da felicidade, igualdade e dignidade humana desde então assumiu mais importância.

Após o surgimento das famílias abastadas, o conceito de filiação também sofreu algumas mudanças. Deixou de ser aceito que uma linhagem era formada apenas por questões genéticas e biológicas e passou a ser aceita como sendo formada a partir de um feto, como era o caso do conceito de família. Como resultado dessa premissa, temos a posse da condição de filho como um dos requisitos cruciais para o reconhecimento legal dessa relação.

O objetivo é abordar a evolução da família no direito brasileiro, e focar na relação da paternidade socioafetiva e os limites do exercício do poder familiar em decorrência desta modalidade de filiação. Sendo o poder familiar o conjunto de direitos e deveres atribuídos os pais, a pessoa e aos bens dos filhos menores, e sendo a paternidade responsável um princípio constitucional, o presente trabalho visa explorar o exercício do poder familiar nesta modalidade

O seguinte problema é levantado: A paternidade socioafetiva é fruto do sentimento de afeto adquirido pela convivência diária e consanguinidade. Diante disso, pode o pai afetivo exercer o poder familiar?

A metodologia utilizada será a bibliográfica, com caráter teórico e explicativo, utilizando-se pesquisas bibliográficas por meio de livros, artigos, sites, leis e jurisprudência. O método será o dedutivo, com o objetivo de levantar dados e informações, e assim chegar a possíveis conclusões acerca do tema.

2. DA FAMÍLIA

2.1 Conceito e Evolução de Família

É difícil uma conceituação específica restrita do direito de família, já que a entidade familiar passou e ainda passa por grandes mudanças, dessa forma é praticamente impossível conceituação sem cometer erros ou vícios.

Para Maria Berenice Dias (2015, p.33 e 34), essa definição não deve somente restringir a relação entre pais e filhos, mas sim abranger os vários institutos que a ela está relacionada, bastando que essas pessoas estejam ligadas por um vínculo sendo ele de consanguinidade, afetividade ou afinidade. A autora conclui que as mudanças ocorridas nas relações familiares não fizeram com que o conceito de direito de família declinou, mas sim consagraram de uma forma mais efetiva os interesses da pessoa humana.

Ainda em comento temos o entendimento de Flávio Tartuce (2014, p. 32-33):

O Direito de Família pode ser conceituado como sendo o ramo do Direito Civil que tem como conteúdo o estudo dos seguintes institutos jurídicos: a) casamento; b) união estável; c) relações de parentesco; da) filiação; e) alimentos; f) bem de família; g) tutela, curatela e guarda. Como se pode perceber, tornou-se comum na doutrina conceituar o Direito de Família relacionando-o aos institutos que são estudados por esse ramo do Direito Privado.

Com base no Código Civil de 1916, a família é constituída pelo marido e a esposa, depois se estende ao surgimento de seus descendentes. A visão da família com a Constituição Federal e com o Código Civil de 2002 é uma entidade formada por indivíduos, unidos por laços sanguíneos ou afinidade.

Nas antigas civilizações a família era forma com uma concepção mais naturalista, o homem tinha o intuito apenas de se reproduzir formando uma verdadeira comunidade, sendo vista a família de uma forma extensiva onde quanto mais membros uma família tivesse mais produtiva ela seria, além da formação de uma prole para que posteriormente se expandisse dando continuidade à comunidade familiar.

Com o passar do tempo houve a necessidade de criar leis para que fosse organizada a relação familiar e assim surgiu o Direito de Família, que disciplinou as relações familiares e solucionou os conflitos provenientes dela. Ao ser regularizada essa sociedade familiar tornou-se necessário conceituar o significado de entidade familiar como o pátrio poder que Pontes de Miranda, à luz do Código Civil de 1916 conceitua como: (2012, p.21)

O pátrio poder moderno é conjunto de direitos concedidos ao pai ou à própria mãe, a fim de que, graças a eles, possa melhor desempenhar a sua missão de guardar, defender e educar os filhos, formando-os e robustecendo-os para a sociedade e a vida.

Na Antiga Roma foram desenvolvidas normas mais ríspidas que fizeram da família uma sociedade patriarcal.

A família romana principalmente no poder e na posição do Homem, chefe da família, o pátrio poder tinha caráter unitário exercido por ele. Este era uma pessoa “sui juris”, ou seja, era quem chefiava todo o resto da família que vivia sob o seu comando, os demais membros eram “alieni juris”. Pelo relato de Arnoldo Wald: (2004, p.57)

A família era, simultaneamente, uma unidade econômica, religiosa, política e jurisdicional. Inicialmente, havia um patrimônio só que pertencia à família, embora administrado pelo pater. Numa fase mais evoluída do direito romano, surgiam patrimônios individuais, como os pecúlios, administrados por pessoas que estavam sob a autoridade do pater.

A família natural foi adaptada pela Igreja Católica, que transformou o casamento em instituição sacralizada e indissolúvel, e única formadora da família cristã, formada pela união entre duas pessoas de sexos opostos, unidas através de um ato solene, e por seus descendentes diretos, a qual ultrapassou milênios e predomina até os dias atuais.

Entre os Códigos Civis de 1916 e 2002, além da evolução dos costumes que determinaram o fim da indissolubilidade do casamento e a extensão do poder familiar à mulher, a Carta Magna de 1988 é um marco histórico temporal quando se estuda o Direito de Família no Brasil.

Tinha-se a noção de família patriarcal calcada somente no patrimônio, na hierarquia, sendo vista qualquer outra relação extramatrimonial que não fosse advinda do casamento como o concubinato, não tendo essas relações assegurada proteção alguma pelo Estado mesmo que nestas fossem encontrado o amor e afeto, era o que previa o código civil de 1916.

No casamento Romano existiam duas possibilidades para a mulher: ou continuava se submetendo aos poderes da autoridade paterna, ou ela entrava na família marital e devia a partir deste momento obediência ao seu marido.

De acordo com Maria Berenice Dias (2015, p. 30) a revolução industrial foi um marco importante diante que com a saída da mulher para o mercado de trabalho, alterou-se de forma significativa a constituição de família, flexibilizando a ideia de que a mulher tinha como papel somente cuidar da casa e dos filhos e ser uma fonte de reprodução.

Dessa forma a estrutura da família em nosso país nesse período ficou voltada mais para a mulher o marido e seus filhos, havendo consequentemente uma aproximação maior dos indivíduos que compunham o núcleo familiar, foi dessa forma que começou a ser mudada a visão de família como uma fonte reprodutora e ser voltada para o afeto entre seus membros.
Segundo Álvaro Villaça Azevedo, em uma palestra proferida na 16ª Reunião do Fórum Permanente sobre o Direito de Família, as suas observações foram registradas como:

O casamento de fato existiu no Direito Romano. Em 450 a.C, já dizia-se que havendo posse contínua entre homem e mulher, esta passava, após um ano de convivência ininterrupta, a fazer parte da família de seu marido, sob o poder protetivo deste ou do pai deste, conforme fosse um ou outro pater familias. O casamento era um fato, apesar das teorias contrárias. O elemento da coabitação romana era a coabitação física. Quando o marido ficava separado mais de 5 anos da mulher, sem que esta soubesse de seu paradeiro, havia o divórcio de graça, que era automático. (…) No Direito Romano, como visto, nunca houve necessidade de celebração para haver o matrimônio; nas Ordenações nós encontramos três tipos de união matrimonial: o casamento religioso católico, o casamento de fato (usos romano), e o casamento por escritura, que não era casamento civil, mas realizado por documento ad probationem tantum. Estes institutos têm quase 4.000 anos e foram torpedeados pelo nosso legislativo, no Decreto 181 de 1890. Com este decreto secularizou-se o casamento, passando a existir, somente, o casamento civil, reconhecido pelo 18 Estado. Na Constituição de 1967, mesmo depois da emenda de 1969, o artigo 175 dizia que a família era constituída pelo casamento, certamente civil, tendo a proteção do Poder Público. Um texto constitucional não pode cometer esta discriminação, dizendo como um povo deva constituir sua família. Não pode fechar os olhos à realidade. (…) A par da Constituição de 1967, a jurisprudência tentou equilibrar a situação dando direitos à concubina. Até hoje existem decisões tentando ajudá-la, como: participante de relações domésticas, prestadora de serviços do lar etc. A lei de Previdência Social equipara a concubina no concubinato adulterino à esposa, com o mesmo direito desta à pensão. O STF criou a súmula 380, que deferiu o concubinato da sociedade de fato. Além da convivência era necessária a aquisição de patrimônio comum, com esforço de natureza econômica, o que era muito difícil provar. Surgiu a Lei Nelson Carneiro, em 1994, e a lei de 1996, que é uma síntese do projeto originário do palestrante.

Uma grande transformação ocorreu no conceito de família em todo o mundo, até chegar à Família contemporânea, especialmente aquela que se encontra disciplinada no Direito Brasileiro, nunca antes reconhecida por lei. Com o disciplinamento da “União Estável”, como forma de constituição familiar.

2.2 A Família no Direito Brasileiro

Somente com a constituição de 1988 em seu artigo 226 o que antes era visto com maus olhos passou a ser melhor entendido pela sociedade, dando o devido reconhecimento à união entre homens e mulheres como uma real constituição de entidade familiar, diante da ocorrência inúmeras mudanças sociais, econômicas e comportamentais surgiu a necessidade destas relações terem uma devida regulamentação jurídica, sendo obrigado o legislador a tomar um devido posicionamento, eis assim que foram gradativamente sendo reconhecida a união estável, pela sociedade, jurisprudência e pelo Estado.

A nossa Carta Magna junto com o Código Civil aderiu à acepção restrita trazendo como conceptualização de família:

[…] o conjunto de pessoas unidas pelos laços do matrimônio e de filiação, ou seja, unicamente os cônjuges e a prole (CC, arts. 1.567 e 19 1.716) e entidade familiar a comunidade formada pelos pais que vivem em união estável, ou por qualquer dos pais e descendentes como prescreve o art. 226, §§ 3º e 4º, da Constituição Federal.

De outra senda, tínhamos a obrigação de fidelidade recíproca entre os cônjuges como requisito primordial para manutenção e como respeito ao casamento previsto no art. 1.566 código civil, sendo essa fidelidade denominada de lealdade quando se tratar da União Estável que mesmo essa diferenciação na nomenclatura entende-se que tem o objetivo de reforçar o caráter moral e ético das relações, constituindo esses deveres em restrições para muitos poderá constituir numa intervenção excessiva do estado nas relações familiares.

Entendendo estes que o dever de fidelidade deve ser uma escolha entre as partes da relação conjugal e não a ser imposta com uma obrigatoriedade, concedendo a estas uma maior autonomia tendo como reflexo gradativo um menor domínio do Estado nas relações familiares, devendo este acompanhar a evolução da sociedade, passou também a reconhecer a igualdade entre os filhos sendo estes da relação conjugal ou de relações havidas fora do casamento.

Ao longo das décadas e com a modernização no âmbito social essa ideia passou-se a ser flexibilizada pelos próprios indivíduos que compõe o tecido social, ganhando força com a emenda constitucional de número 66/2010 que teve como um do seu marco cercear a discussão de culpa para o término das relações conjugais.

Para uma melhor compreensão é importante traçar algumas considerações extraídas no estudo feito por Hélio Veiga Júnior (2012, p.5-6), no presente estudo resta comprovado a não mais responsabilidade a culpa no que tange a separação já salientado logo acima, devendo se atentar para o fato de que há duas ressalvas, uma é referente aos alimentos previstos no artigo 1.694, §2º do Código Civil, tendo como outra exceção às questões relacionadas ao nome estando disposta no artigo 1.578 do Código Civil. Porém deve-se atentar que a Emenda 66, não se aboliu o dever de respeito entre os cônjuges, devendo estes ainda prestar mútua assistência, guardar os filhos, devendo haver respeito e consideração mutuamente.

Como já salientado acima havia uma ideia muito restrita em relação à concepção de família, calcada sob uma ótica totalmente preconceituosa sendo esta constituída de marido e esposa com seus filhos, por conseguinte denominada de família matrimonial. Com esse reconhecimento da união estável também chamada de família convivencial e o reconhecimento de outras entidades familiares como família, 20 é importante ressaltar que hoje em nosso ordenamento jurídico temos algumas modalidades de entidades familiares já regulamentadas.

Dentre essas modalidades pode-se mencionar a família Monoparental consistindo no núcleo formado ente um pai ou uma mãe e seus filhos, também dentre estas temos a família Anaparental constituída sem a presença dos genitores geralmente fazendo parte desta somente os irmãos, a famosa família Homoafetiva constituída por pessoas do mesmo sexo de forma amorosa, bem como a família Mosaica que esta se constitui de filhos de genitores diferentes cada um com seus respectivos filhos que se unem e decidem constituir um núcleo familiar.

Diante do exposto fica evidente que tivemos um grande avanço no que se refere às entidades familiares todas essas fundamentadas principalmente como o elo afetivo, contudo deve-se ressaltar que nem todas ainda têm o devido reconhecimento e respaldo perante a sociedade bem como por nosso ordenamento jurídico mesmo constituindo laços de afetividade.

De fato, pode-se argumentar que a Constituição Federal de 1988 é a lei abrangente que orienta e rege o Direito Civil e seus subconjuntos, inclusive o Direito de Família, além da promessa explícita da Constituição de proteger diversas esferas de liberdade. A norma, que é substancialmente reconhecida no texto maior, reconhece, entre outras coisas, as formas de organização da família, como os pais devem se comportar, as leis matrimoniais, as uniões estáveis ​​e a propriedade.

O atual Código Civil brasileiro regulamenta uma série de questões relacionadas ao direito à família, incluindo o casamento, a unificação legal, a distribuição de benefícios, a eficácia do casamento, a dissolução do casamento, a filiação, entre outros. É um livro grande, mas devido à complexidade do assunto – relações que não são constantes – parece incompleto. Isso porque a doutrina e a jurisprudência são importantes para analisar e preencher as lacunas.

É interessante notar que a noção tradicional de um homem e uma mulher casados ​​(tanto legal quanto religiosamente), com filhos nascidos da união vivendo juntos do mesmo lado, não é mais aceita, uma vez que o casamento homoassexual e outros relacionamentos afluentes são agora reconhecidos como válido. A interpretação do STJ do acórdão do Recurso Especial n.º 182.223/SP, posteriormente publicado na Súmula n.º 364 do STJ, representou inovação nesse sentido, pois reconheceu o apartamento unipessoal como estando em situação familiar.

Três princípios fundamentais foram utilizados para construir o Código Civil de 2002: ética, sociabilidade e operacionalidade. A agregação de valor do comportamento ético-socializador é representada pela ética, principalmente pela virtude da objetividade. O aspecto social das instituições privadas, como a família, tem relação direta com sua função social. Finalmente, a capacidade operacional tem dois significados. A primeira diz respeito à simplificação e facilitação das instituições civis. O segundo sentido é o da eficácia, almejado pelo sistema de leis gerais adotado pelo CC/2002, com aquelas portas abertas deixadas pelo legislador ao requerente do direito de ser aconselhado.

Para evitar desequilíbrios nas relações que afetem os direitos e obrigações das partes envolvidas, o diploma legal, que também trata das relações patrimoniais, procura alinhar os direitos públicos e privados em posições comparáveis ​​ou idênticas à igualdade.

3. DA FILIAÇÃO E PODER FAMILIAR

3.1 O conceito de filiação

Filiação é a relação que existe entre pais e filhos que têm autoridade parental de primeiro grau e na qual se estabelecem direitos e obrigações recíprocas. A palavra “filiação” deriva da palavra latina “filiatio”, que se refere ao laço recém-criado que resulta da concórdia e do afeto familiar. Segundo Paulo Lôbo, o termo “maternidade” refere-se à relação entre mãe e filho quando ocorre na presença do pai da mãe.

De acordo com o disposto no artigo 1.597 do Código Civil, a paternidade é presumida. De acordo com o artigo citado, serão considerados pais os seguintes: os nascidos até 180 dias após o estabelecimento da compatibilidade do casal, os nascidos 300 dias após a dissolução da sociedade do casal e os nascidos de fecundação homóloga ou heterossexual. , este último desde que o parceiro consente. Além disso, antigamente se acreditava que a maternidade é, em geral, sempre certa. No entanto, não há mais certeza absoluta em relação à maternidade, pois pode haver troca ou sequestro do bebê. Por isso, é mais comum falarmos hoje em pesquisa sobre maternidade.

E foi dessa busca incessante por uma resposta definitiva sobre a paternidade e o status materno – sempre cercados de incertezas – que surgiram os testes de DNA, que acabaram por permitir determinar com precisão se o sujeito era mesmo o pai ou a mãe biológicos dessa criança em particular. Assim, com este novo método de resolução de litígios de paternidade, as presunções perderam alguma eficácia e passaram a ser utilizadas com maior frequência nas situações em que os pais recusam a realização do exame.

No entanto, como se verá na análise que se segue, passou-se a entender que em certos casos, mesmo que o teste de DNA seja negativo, se for estabelecida uma relação afluente entre pai e filho, não há possibilidade dessa ligação ser cortada. Portanto, há agora uma igualdade de descendência, em contraste com o passado, quando aqueles considerados “ilegítimos” não tinham direitos concedidos. Assim, independentemente do tipo de filiação, ambos os casos contam com a proteção integral do Estado, sempre priorizando os interesses da criança e do adolescente.

Maria Berenice Dias observa que, à semelhança de como evoluiu o conceito de família, a filiação passou a ser reconhecida pela presença de afluência entre pais e filhos.

“Ampliou-se o seu conceito de paternidade, compreendendo o parentesco psicológico, que prevalece sobre a verdade biológica e a realidade real. A parentalidade deriva do estado de filiação, independentemente de sua origem biológica ou afetiva. A ideia da paternidade está fundada muito mais no amor do que submetida a determinismos biológicos”

Como resultado, passou-se a entender que a presença de vínculos consanguíneos não era necessária para ser criança. A parentalidade continua a ser definida pela presença do afeto e do estado filial na relação.

Em decorrência desse novo entendimento de filiação e da aprovação da Lei 883/1949, que trata do reconhecimento de filhos estrangeiros, antes considerados como estrangeiros, passaram a receber direitos que antes não lhes haviam sido concedidos. Com a implementação da CF/88, passa a haver maior igualdade de filiação entre todos os filhos, sendo proibida qualquer forma de preconceito.

No entanto, o Código Civil de 2002 ainda carece de ajustes quanto à divisão de suas seções, pois ainda trata da filiação biológica e não biológica em seções separadas, a saber, “Da filiação” (artigos 1.596 a 1.606) e “Do reconhecimento das obrigações subsidiárias” artigos 1.607 a 1.617).

Com essa nova compreensão de uma conexão biológica por meio da afetividade, a noção de uma conexão biológica resultante de um casamento heteroafetivo não é mais a única reconhecida pelo sistema. Segundo Dias, os critérios jurídicos, biológicos e socioafetivos podem ser utilizados para categorizar as teorias da filiação.

Assim, os critérios legais para uma família seriam aqueles em que a presunção de paternidade paterna é esta – presunção de paternidade para um filho concebido durante o casamento, independente de fator biológico –, uma vez que não foi admitida para uma mulher casada ter filhos com outro homem. Mas, como já foi dito neste capítulo, essa previsão perdeu espaço para os testes de DNA, que têm uma taxa de precisão de 99,9% e uma margem de erro muito pequena.

A linhagem biológica, como sugere o nome, é estabelecida pela existência de consanguinidade entre ascendentes e descendentes de primeira geração.

É um fenômeno físico, eu acredito. É um ramo que surge da reprodução natural e também pode ser visto em algumas técnicas de reprodução assistida, como a fertilização homóloga, que utiliza o óvulo e o sêmen dos mesmos genitores. Em uma fertilização heteróloga, aqueles que afetaram a doação de material genético serão os pais biológicos; no entanto, não terão reconhecimento legal como país; em vez disso, seu papel será cumprido por meio de uma relação socioafetiva pelo(s) parceiro(s) da mãe ou do pai. Não importa se os pais eram casados ​​ou não, o casamento não é levado em consideração nesse tipo de ancestralidade, conhecida como biológica.

Quanto aos critérios socioafetivos, refere-se a uma relação em que não há laços de sangue, mas sim sentimentos de afeto entre pai e filho. É a forma de filiação que melhor atende às necessidades da criança e permite o controle parental devido à posse do estado de filiação. Isso permitirá uma análise mais completa desse tipo de ramificação.

3.2 Modalidades de filiação: biológica, adoção e filiação socioafetiva

As regras de filiação durante pertencem a lei desde o Código Civil de 1916 e , faziam uma clara distinção entre filiação legítima e ilegítima. Como resultado, a definição de filho legal no Código Civil Português de 1916 (Código de 1916) ficou assim definida: ” Quando os rituais solenes do casamento eram realizados, a criança que havia sido concebida antes do casamento era considerada ilegítima.

O termo “filho natural” e “filho espiritual” surgiu por causa dessa situação, em que duas pessoas mantinham uma relação sexual, mas não podiam se casar por restrição legal ou por falta de desejo expresso de fazê-lo. A lei previa que, no caso de filhos naturais, teriam direito a receber um quinto destinado ao filho legal portador do título de herdeiro.

Em relação aos filhos adúlteros, ou nascidos em relações em que uma pessoa casada tem filho com alguém que não seja seu cônjuge, bem como filhos nascidos em relações incestuosas em que os pais foram impedidos por lei de manter relações sexuais, não foram quaisquer direitos legais porque a lei não os reconhecia.

O filho ilegítimo era alvo de severa discriminação social porque poderia ter nascido de um relacionamento adúltero ou antinatural. Em muitas sociedades, a religião, com seu punho de ferro, exigia que o pai deixasse o filho no casamento, independentemente de sua vontade.

No Código Civil de 16 era ilegal adulterar, pois depois do casamento havia um dever de lealdade. Mas nessa situação, quem mais sofreu foi o filho que não teve responsabilidade pelas escolhas feitas por seus pais biológicos. Segundo os comentários de Maria Berenice Dias sobre filhos frutos de adúlteros (2007, p. 318):

“Singelamente, a lei fazia de conta que ele não existia. Era punido pela postura do pai, que se liberava do ônus do poder familiar. E negar reconhecimento ao filho é excluí-lhe direitos, é punir quem não tem culpa, é brindar quem infringiu os aditamentos legais”

Da mesma forma que o adultério era ilegal, o vício também era e, neste caso, ainda é ilegal hoje. Assim, a criança que teve uma relação ilícita e sofreu repressão pela sociedade também carecia de quaisquer direitos legais como criança. Mais uma vez, a criança foi obrigada a pagar pelos erros cometidos por seus pais.

“Assim, apenas os filhos legítimos e os filhos naturais – estes quando fossem reconhecidos voluntariamente pelos pais, ou procedesse à investigação de paternidade/maternidade – poderiam manter relações jurídicas fundadas na parentalidade, ao passo que os filhos espúrios eram excluídos de qualquer proteção já que não poderiam sequer investigar a sua parentalidade. Os argumentos que se apresentaram para justificar a exclusão eram basicamente os mesmos: a necessidade de proteção da paz doméstica; a estabilidade dos casamentos; a tradição das famílias; a repressão aos escândalos que poderiam advir do estabelecimento dos vínculos de paternidade-maternidade-filiação (RAMOS, 2008, p.22).”

Felizmente, com a chegada da Constituição Federal de 1988, diversos dispositivos legislativos foram derrubados por descumprir os princípios do recém-criado Estado Democrático de Direito e violar o princípio da dignidade da pessoa humana.

“A filiação, pois é fundada no fato da procriação, pelo qual se evidencia o estado de filho, indicativo do vínculo ou consanguíneo, firmado entre gerado e progenitores. É assim, a relação de parentesco entre os pais e os filhos, considerados na ordem ascensional, destes para os primeiros, do qual também procedem, em ordem inversa, os estados de pai (paternidade) e de mãe (maternidade) (SILVA, 1989).”

Maria Helena Diniz, professora, o conceito de parentesco pode ser visto da seguinte forma:

“Filiação é o vínculo existente entre pais e filhos; vem a ser a relação de parentesco consanguíneo em linha reta de primeiro grau entre uma pessoa e aqueles que lhe deram a vida, podendo, ainda (CC, arts. 1.593 a 1.597 e 1.618 e s.), ser uma relação socioafetiva entre pai adotivo e institucional e filho adotivo ou advindo de inseminação artificial heteróloga. (DINIZ, 2006, p.436-437)”

Como os artigos 1.565.2 e 226.7 da CF permitem que a família decida livremente sobre questões relativas ao planejamento familiar, a condição dos pais não é mais levada em consideração quando se trata de questões matrimoniais. Segundo a especialista e tutora Maria Berenice Dias:

“O reconhecimento da adoção de fato, de acordo com os princípios consagrados na CRFB e o mais moderno entendimento doutrinário, é de grande importância, na medida em que é valorizado o vínculo socioafetivo no melhor interesse da criança, relevando-se o caráter biológico e registral, com consequências, inclusive, na órbita atinente à obrigação de prestar alimentos. (DIAS, 2009, p.42)”

A lei 8.560 de 1992 trouxe uma vitória significativa na afirmação dos direitos de filiação. Por exemplo, no artigo 5º afirma-se que é proibido fazer qualquer referência à filiação no registo de nascimento, e no artigo 6º capitulação e 1º o legislador afirma que também é proibido indicar a natureza da filiação ou a fato de que a concepção ocorreu de forma não conjugal.

“Todas essas mudanças refletem-se na identificação dos vínculos de parentalidade, levando ao surgimento de novos conceitos e de uma nova linguagem que melhor trata a realidade atual: filiação social, filiação socioafetiva, estado de filho afetivo etc. Tal como aconteceu com a entidade familiar, a filiação começou a ser identificada pela presença do vínculo afetivo paterno-filial (DIAS, 2008, p.320).”

3.3 Efeito jurídicos da filiação

Como ficou evidente pelos fatos listados acima, a igualdade entre os filhos nem sempre ocorreu. A estrutura familiar tradicional era muito tradicional, com a proteção dos interesses da família imediata sempre prevalecendo sobre os dos filhos, que eram tratados com hostilidade ao se envolverem em relações extraconjugais. De acordo com o artigo 358 do Código Civil de 1916, os pais ainda poderiam reconhecer filhos extraconjugais.

Muitas vezes acontece que, por causa da prática de não registrar filhos nascidos de relações não matrimoniais, a prole acaba sofrendo as consequências. Era como se a criança não existisse, o que viola tanto o princípio da paternidade igualitária quanto a dignidade do ser humano hoje.

O princípio entrou em vigor com a promulgação da Constituição Federal em 1988. Está previsto no artigo 227, § 6º, com a seguinte tradução: “Os filhos, ocorridos ou no da relação do casamento, ou por adoço, tero os same e qualificaçes, proibidas ou quaisquer designaçes discriminatórias Relativas Como resultado, a igualdade dos filhos tornou-se absoluta, com o número onze proibindo explicitamente qualquer distinção ou discriminação dentro da família.

Os termos filiação “legítima” e “ilegítima” não são mais usados, pois hoje todos são simplesmente chamados de “filhos”, sejam eles nascidos dentro ou fora do contexto do casamento, biológica ou artificialmente, e todos têm direitos iguais. Com isso, segundo Gama, “[…] existindo a conexão jurídica entre parentalidade e filiação, todos os filhos de um mesmo genitor ou mãe têm os mesmos direitos reconhecidos na lei brasileira, sem a possibilidade de qualquer distinção”.

Segundo o autor, uma vez estabelecida a relação jurídica de filiação, todos os irmãos terão os mesmos direitos, sendo anuladas quaisquer diferenças entre eles.

Sobre o princípio da igualdade de descendência, Paulo Lobo disse o seguinte:

“É o ponto culminante da longa e penosa evolução por que passou a filiação, durante o século XX, na progressiva redução de odiosas desigualdades e discriminações, ou do quantum despótico na família. É o fim do vergonhoso apartheid legal, que impedia ou restringia direitos de pessoas que eram punidas pelo fato do nascimento”

Por fim, foi determinado que o princípio da igualdade entre os filhos proibia qualquer desvio de descendência biológica ou não biológica, uma vez que ambos são descendentes de afetividade, o que se tornou o requisito mais significativo no reconhecimento familiar.

3.4 Poder familiar

Segundo (VENOSA, 2015) a autoridade parental será de responsabilidade dos pais conduzir a educação dos filhos, possuindo sob sua guarda e companhia, sustenta e criando. O poder familiar é indisponível e transcorre da paternidade natural ou legal, o poder familiar não pode ser transferido por iniciativa dos pais para terceiros.

Art. 1634.

Compete aos pais, quanto a pessoa dos filhos menores

I- Dirigir-lhes a criação e educação;

II- Exercer a guarda unilateral ou compartilhada nos termos do artigo 1.584;

III- Conceder-lhe ou negar-lhes consentimento para casarem;

IV- Conceder-lhe ou negar-lhes consentimento para viajarem ao exterior.

V- Conceder-lhe ou negar-lhes consentimento mudarem de residência permanente para outro município

O revogado Código de Menores que permitia a transferência do pátrio poder, qual foi revogada do nosso ordenamento jurídico. Por decisão judicial, o poder dos pais na hipótese de guarda, alguns dos direitos e deveres do pátrio é atribuído ao guardião. O poder familiar é indivisível, contudo, não o seu exercício. Quando diz respeito aos pais separados, é desmembrado o exercício do poder familiar, dividindo a obrigação. O mesmo ocorre, na orientação da vida dos filhos, aos pais são atribuídos alguns deveres inerentes ao pátrio poder, no entanto, não se transfere nessa modalidade, quando se trata de família substituta.

O poder familiar também é imprescritível, ainda que por conta de as circunstâncias não serem exercidas por um familiar, trata-se de estado de imprescritibilidade, não se extingue pelo desuso. Só nas hipóteses legais, poderá terminá-los.

O código Civil de 2002 traz nos seus artigos 1.635 e 1637 a suspensão e a extinção do poder familiar.

De acordo com Sílvio de Salvo Venosa (2014, p. 148): “O julgador, ao concretizar o direito, cria a verdadeira norma para o caso sob exame, como resultado de um complexo raciocínio de aplicação e interpretação.” E, adiante complementa: “[…] aplicar e interpretar o Direito é uma operação interligada. Não há como aplicar o Direito sem interpretá-lo. A interpretação do Direito só tem razão de existir para aplicá-lo ao caso concreto.” (2014, p. 149). E, para encerrar, “O Direito, como se acentua, é dinâmico, como dinâmica é a sociedade.” (VENOSA, 2014, p. 6).

Assim como as crianças possuem um estatuto e os idosos também possuem, para assegurar que seus direitos não sejam violados. O estatuto do idoso protege o direito à convivência familiar, à dignidade e também ao cuidado. A constituição federal é base para toda a sua proteção, pois a mesma assegura que os filhos devem prestar assistência a seus pais dando aos idoso proteção especial devido a sua fragilidade. Portanto aquele que abandona fere o princípio da dignidade da pessoa humana princípio este que já foi falado. Mas não será responsável pelo idoso apenas os filhos, compreendem que cabe a qualquer familiar.

3.5 Paternidade responsável

A ideia de paternidade responsável deve ser observada tanto na criação dos filhos quanto na manutenção da família. “O sentido de gerar um filho, uma filha, de chamar alguém para a existência é uma das missões mais nobres e sublimes.””

Uma frase na questão foi escrita pelo arcebispo do Rio de Janeiro Eusébio Scheid em um artigo intitulado “Princípios para uma vida familiar feliz e harmoniosa”. O conteúdo abre a seção “Voz do Pastor” do site da arquidiocese do Rio de Janeiro.

A Constituição reiterou o princípio da igualdade ao discutir as famílias, além de afirmar que as famílias são a base da sociedade (art. 226): “Exercida igualmente por homens e mulheres “. (art. 5º do art. 226º). Ressalta o parágrafo sete do mesmo artigo: O planejamento familiar é uma decisão que o casal toma livremente e se baseia nos princípios da dignidade humana e da paternidade responsável.

O princípio fundamental da paternidade responsável é a responsabilidade, que se inicia na concepção e se estende até ao ponto em que a supervisão parental dos filhos é necessária e justificada, mantendo-se, assim, o mandato do artigo 227.º da Constituição, que nada mais é do que uma garantia.

O princípio da paternidade responsável está expressamente garantido no artigo 226, inciso 7º, da Constituição Federal.

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
(…) § 7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.”

A Lei nº 9.263/96 foi aprovada para regulamentar o inciso 7º do artigo 226 da Constituição Federal, que trata do planejamento familiar. Define planejamento familiar como “o conglomerado de medidas de regulação da fecundidade que asseguram direitos iguais ao estabelecimento, limitação ou aumento da procriação pela mulher, pelo homem ou pela família” em sua Seção 2o. Entende-se que o princípio da paternidade responsável está implicitamente incorporado ao texto desta lei.O princípio da paternidade responsável foi expressamente contemplado no artigo 27 da Lei n. os pais ou tutores da criança sem quaisquer restrições, desde que respeitado o estado de direito.

A partir daí, torna-se irrestrito o direito da criança ou do adolescente ao reconhecimento da sua condição de criança, anteriormente limitado em algumas circunstâncias pelo Código Civil de 1916 (filhos ilegítimos adulterinos e incestuosos – artigo 358 do Código Civil), e pode ser exercido a qualquer momento e mesmo diante dos pastores dos pais.

Caso o nascimento de um menor seja registrado apenas com paternidade comprovada, a certidão de nascimento oficial deve incluir a declaração da mãe sobre o pai presumido, bem como as habilitações e identificação do homem. O juiz, então, decidirá a paternidade do suposto pai após ouvir o relato do genitor sobre a paternidade alegada. Se a paternidade for reconhecida, será anotada no registro de nascimento; se for negado, o tribunal enviará os veículos ao Ministério Público para julgamento ou ao Ministério Público do Estado para assistência judiciária para o efeito. Todo este processo será conduzido à sombra da justiça.

4. EFEITOS JURÍDICOS DA PATERNIDADE SOCIOAFETIVA

A paternidade socioafetiva nos traz a diferença entre genitor e pai (incluindo mães, etc.). Há alguns anos, nem a legislação brasileira, nem a doutrina, jurisprudências, súmulas, enunciados etc., reconheciam a possibilidade de indivíduos se doarem por amor como cuidadores e ajudantes de crianças.

A compreensão do direito de família pelos tribunais está mudando constantemente com o avanço do pensamento, a flexibilidade das ideias e a subversão das culturas arraigadas das pessoas.

O texto da lei, no Código Civil de forma implícita, reconhece a paternidade socioafetiva: Art. 1.593. “O parentesco é natural ou civil, conforme resultado de consanguinidade ou outra origem.” O Legislador entendeu que a pessoa que cuida, dá carinho e está presente diariamente na rotina de outra, é o que define seu parentesco.

O entendimento do STF não foi exceção, que em seus julgados manifestou seu apoio e reconhecimento do atual “Pai de Coração”, como pode-se verificar:

“MULTIPARENTALIDADE reconhecida pelo STF: Repercussão Geral 622 – Recurso Extraordinário 898.060 (2016) a corte decidiu, por maioria, que “a paternidade socioafetiva, ‘declarada ou não em registro’, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante, baseada na origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios”.

Pode-se ver que, além de acatar a Multiparentalidade, o Supremo reconheceu que o vínculo de filiação existe independente da declaração ou não em registro. Isso mostra que ser o responsável legal de uma criança ou adolescente, vai muito além do que um mero papel registrado em cartório.

Assim, relevante se faz trazer os ensinamentos de Maria Berenice Dias (2015, p. 439-440):

“O desenvolvimento da sociedade e as novas concepções da família emprestavam visibilidade ao afeto, quer na identificação dos vínculos familiares, quer para definir os elos de parentalidade. Passou-se a desprezar a verdade real quando se sobrepõe um vínculo de afetividade. A maior atenção que começou a se conceder à vivência familiar, a partir do princípio da proteção integral, aliada ao reconhecimento da posse do estado de filho, fez nascer o que se passou a chamar de filiação socioafetiva.”

Assim, em vez de se buscar a identificação de quem é o pai ou de quem é a mãe, passou-se a atentar ainda mais ao interesse do filho na hora de descobrir quem é o seu pai “de verdade”, ou seja, aquele que o ama como seu filho e é amado como tal. (BERENICE, 2015).

O reconhecimento da paternidade pode ser feito de duas maneiras, quais sejam (OLIVEIRA, PAZZINI, 2018): o reconhecimento voluntário, que é geralmente dado aos filhos nascidos fora do casamento, porque para os filhos concebidos em uma relação conjugal, há uma presunção de paternidade. A admissão voluntária é um ato formal, voluntário, irreversível, incondicional e muito pessoal do pai. Pode acontecer na forma prevista no artigo 1609 do Código Civil. Do contrário, o reconhecimento judicial da paternidade costuma ser realizado por meio das chamadas “ações de investigações de paternidade”, cuja possibilidade de postulação é imprescritível, e que possui como legitimados ativos o alegado filho e o Ministério Público (legitimado extraordinário).

O sujeito passivo legal é o pai, ou mesmo seus herdeiros – no caso de investigação post mortem. Na fase probatória de tal conduta, ainda que não haja hierarquia entre os meios de prova para fundamentar a condenação do juiz, a revisão é, sem dúvida, a prova chave para a pretensão (realidade que será criticada oportunamente).

Por não haver a condução coercitiva do investigado, editou-se a Súmula 301 do Superior Tribunal de Justiça: “Ação Investigatória – Recusa do Suposto Pai – Exame de DNA – Presunção Juris Tantum de Paternidade”. Em ação investigatória, a recusa do suposto pai a submeter-se ao exame de DNA induz presunção juris tantum de paternidade” (STJ, 2004).

Este entendimento sumulado tornou-se objeto de lei específica – Lei nº 12.004/2009, que veio alterar a Lei nº 8.560/1992 – com a finalidade de estabelecer a presunção de paternidade no caso do suposto pai em submeter-se ao exame de DNA.

A competência para a ação de investigação de paternidade é o foro onde se localiza o domicílio do réu (desde que não cumulada com pedido de alimentos pelo autor, caso em que o foro competente passa a ser o domicílio deste).

Ainda é relevante ressaltar que a sentença proferida produz os mesmos efeitos do reconhecimento voluntário, como disposto no artigo 1.616 do Código Civil, que prevê que a sentença que julgar procedente o reconhecimento poderá ordenar que o filho se crie fora da companhia dos pais ou daquele que contestou essa qualidade. Tal disposição merece grande prestígio, pois tem o fito de preservar a saúde mental e emocional da criança.

Vale sedimentar mais um entendimento doutrinário sobre a filiação socioafetiva:

[…] Para além da posse de estado, porém, entende-se que a filiação socioafetiva requer um outro pressuposto principal: a única intenção daquela que age como se genitora fosse de se ver juridicamente instituído pai ou mãe. Assim porque nem todo aquele que trata alguém como se filho fosse quer torná-lo juridicamente seu filho. Afinal, a constituição da qualidade de pai ou mãe enseja, dentre outros efeitos, uma série de deveres jurídicos que, se não cumpridos espontaneamente, comportam, até mesmo, execução compulsória. Logo, é preciso ter cautela no estabelecimento deste parentesco socioafetivo, sob pena de – uma vez desmerecida a real vontade do pretenso ascendente – suprimir a essência, qual seja sua edificação espontânea e pura. Essa manifestação é inequívoca, então há de ser expressa ou claramente dedutível de qualquer meio de prova idôneo, particular ou público, como o testamento, por exemplo. Na dúvida, fica prejudicada a caracterização do vínculo paterno ou materno-filial socioafetivo. […] Esse é o cuidado necessário na análise das situações da posse de estado de filho, a fim de garantir que sejam fonte do elo filial socioafetivo apenas aquelas nas quais a pretensão parental dos envolvidos seja indubitável. (ALMEIDA, 2010, p. 390-391).

Assim, percebe-se que a instituição do referido instituto exige a coexistência de duas condições claras, a saber, a vontade explícita e inequívoca do designado pai ou mãe socioemocional de ser reconhecido como tal, e a configuração da denominada posse de estado de filho, compreendida como:

[…] a presença (não concomitante) de tractatus tratamento, de parte a parte, como pai/mãe e filho; nomen (a pessoa traz consigo o nome do apontado pai/mãe); e fama (reconhecimento pela família e pela comunidade de relação de filiação), que naturalmente, deve, apresentar-se de forma sólida e duradoura. (LÔBO, 2008, p. 212).

Não restam dúvidas, portanto, quanto à legitimidade da paternidade socioafetiva no Direito de Família.

Existem princípios na lei que dispõe das relações socioafetivas, como a afetividade. Este princípio está implícito na Constituição Federal. Encontram-se na Constituição fundamentos basilares da dignidade da pessoa humana, que resguardam a natureza afetiva e cultural, afastando o contexto hierárquico e biológico da família. A dignidade da pessoa humana recupera a função originária da família, ou seja, passa a ser um grupo unido por laços afetivos.

De acordo com os entendimentos de Lôbo (2015, p.66) esclarece o papel do afeto nas relações familiares:

A afetividade, como princípio jurídico, não se confunde com o afeto, como fato psicológico ou anímico, porquanto pode ser resumida quando este faltar na realidade das relações: assim, a afetividade é dever imposto aos pais em relação aos filhos e destes em relação aos filhos e destes em relação àqueles, ainda que haja desamor ou desafeição entre eles.

Entendimentos de Teixeira e Rodrigues (2009, p.38):

O princípio da afetividade funciona como um vetor que reestrutura a tutela jurídica do Direito de Família, que passa a se ocupar mais da qualidade dos laços travados nos núcleos familiares do que com a forma através da qual as entidades familiares se apresentam em sociedade, superando o formalismo das codificações liberais e o patrimonialismo que delas herdamos.

Com base nas citações, não há diferenciações discriminatórias entre filhos, já que a família necessita de afeição, baseada na tolerância entre seus integrantes, na pluralidade e na diversidade. O que realmente estabelece a filiação moderna não são os vínculos sanguíneos, e sim as relações afetivas que são formadas, levando em consideração que a realidade biológica pode não declarar a correta paternidade.

A simples existência de parentesco socioafetivo pode demonstrar as condições que formam a posse de estado de filho, como a convivência, o nome e a fama. Ao demonstrar em público a prole, é qualificada como posse de um filho, que é tratado com afeição pelo seu genitor, que emprega o nome do mesmo e é admitido como tal pela sociedade.

Teixeira e Rodrigues disserta sobre esse ditame (2009, p.38) que:

O que constitui a essência da socioafetividade é o exercício fático da autoridade parental, ou seja, é o fato de alguém, que não o genitor biológico, desincumbir-se de praticar as condutas necessárias para criar e educar os filhos menores, com o escopo de edificar sua personalidade, independientemente de vínculos consangüíneos que geram tal obrigação legal.

Ademais, ensina Tânia da Silva Pereira (apud LÔBO, 2015, p. 42):

Há que se abandonar esta maior ênfase atribuída ao biologismo da paternidade, tão comum nos países latinos, e considerá-la no âmbito da proteção e carinho dedicados a alguém que, por opção, escolheu como filho. Há que se considerar, sobretudo, a ‘paternidade social’, nitidamente configurada na relação familiar decorrente da inseminação artificial e da adoção.

Outrossim, entende-se que o princípio da afetividade deve reger todas as relações familiares, haja vista o conceito atual de família não mais se restringir à filiação biológica, dando, pois, lugar à filiação socioafetiva, que é aquela caracterizada essencialmente pelo afeto existente entre pai e filho.

Competem aos pais, tanto biológicos quanto sócio afetivos, possibilitar à sua prole a convivência e desenvolvimento indispensável da afeição, fundamental para a pessoa humana. Deixando claro que o princípio da afetividade é o melhor para resolução de conflitos entre os familiares.

Também se faz necessário entender que, a solidariedade familiar através da condição da ética e da moral se materializa para o universo jurídico. Discorre Dias (2009, p.66):

(…) há o princípio da solidariedade familiar, sendo que este princípio fundamenta-se no entendimento genérico do termo, isto é, alcança o próprio amor próximo e a mutualidade, e também a dependência recíproca que cada integrante necessita verificar, assegurando também que tal princípio possua natureza nas relações de afeição.

Na concepção de Lôbo (2015, p.56):

O princípio jurídico da solidariedade resulta da superação do individualismo jurídico, que por sua vez é a superação do modo de pensar e viver a sociedade a partir do predomínio dos interesses individuais, que marcou os primeiros séculos da modernidade, com reflexos até a atualidade.

No entendimento de Gama (2008, p.74):

O princípio da solidariedade se vincula necessariamente aos valores éticos do ordenamento jurídico. A solidariedade surgiu como categoria ética e moral, mas que se projetou para o universo jurídico na representação de um vínculo que compele à oferta de ajuda ao outro e a todos.

Na Constituição Federal de 1988, através do art. 3º, inciso I, encontra-se a norma essencial para o entendimento e finalidade do princípio que tem como escopo a edificação de uma coletividade acessível, equitativa e solidária. Por motivos explícitos, tal princípio acaba refletindo nos vínculos familiares, tendo em vista que a solidariedade precisa existir nos vínculos particulares.

Faz-se clara a total vinculação deste princípio com o disciplinamento do direito de visitação dos avós aos seus netos, tendo em vista que a censura dessa relação enfraqueceria aos laços de solidariedade familiar, não sendo mais realizado o desejo da Constituição. Em face disso, pontua Lôbo (2015, p.58):

Com fundamento explícito ou implícito no princípio da solidariedade, os tribunais brasileiros avançam no sentido de assegurar aos avós, aos tios, aos ex-companheiros homossexuais, aos padrastos e madrastas o direito de contato, ou de visita, ou de convivência com as crianças e adolescentes, uma vez que, no melhor interesse destas e da realização afetiva daqueles, os laços de parentesco ou os construídos na convivência familiar não deve ser rompidos ou dificultados.

A convivência familiar revela-se como um pressuposto básico para o adequado desenvolvimento humano, capaz de influenciar de forma drástica na formação de nossa sociedade, vez que as crianças privadas deste direito, ou aquelas que trazem consigo mazelas originadas no âmbito familiar, tornam-se adultos desprovidos de valores éticos e morais, apresentando, frequentemente, condutas reprováveis, capazes de atentar contra a moral e os bons costumes.

A convivência afetiva está na relação familiar, localizada em um espaço comum. A Constituição Federal dispõe em seu art. 227, que garante à criança e ao adolescente, em meio a vários direitos, o direito ao convívio com a coletividade e a família. O Estatuto da Criança e Adolescente garante em seu art. 19 o direito, in verbis:

Art. 19 Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes.

O renomado doutrinador Lôbo (2015, p. 68), possui uma visão sobre o princípio da convivência familiar:

A convivência familiar é a relação afetiva diuturna e duradoura entre as pessoas que compõem o grupo familiar, em virtude de laços de parentesco ou não, no ambiente comum. Supõe o espaço físico, a casa, o lar, a moradia, mas não necessariamente, pois as atuais condições de vida e o mundo do trabalho provocam separações dos membros da família no espaço físico, mas sem perda da referência pelo ambiente comum, tido como pertença de todos. É o ninho onde as pessoas se sentem recíprocas e solidariamente acolhidas e protegidas, especialmente as crianças.

A concepção do autor Ferreira (2008, p. 9) em relação à questão dispõe que:

[…] é clara a preocupação do Estado em resguardar o convívio entre os familiares, pois é através do seio da harmonia familiar que cada ente é constitucionalmente protegido. Assim, sob a garantia do Estado, livre estarão os parentes legitimados, seja em linha reta ou colateral, para exigir reciprocamente a convivência familiar

Adjunto ao princípio da dignidade da pessoa humana, o convívio com a família é essencial para um progresso aperfeiçoado de cada integrante da família, principalmente quando se aborda a convivência com outros integrantes da família, a exemplo dos avós. É nesta direção que se encontra o entendimento de Lôbo (2015, p. 53):

O direito à convivência familiar não se esgota na chamada família nuclear, composta apenas pelos pais e filhos. O poder Judiciário, em caso de conflito, deve levar em conta a abrangência da família considerada em cada comunidade, de acordo com seus valores e costumes. Na maioria das comunidades brasileiras, entende-se como natural a convivência com os avôs e, em muitos locais, com os tios, todos integrando um grande ambiente familiar solidário. Consequentemente têm igualmente fundamento no princípio da convivência familiar as decisões judiciais que asseguram aos avós o direito de visita aos netos.

O princípio da dignidade da pessoa humana, o convívio com os familiares é fundamental para o progresso aperfeiçoado de cada integrante da família, principalmente com a convivência com outros integrantes da família como, por exemplo, os avós. Entendimento de Lôbo (2015, p.69)

O direito à convivência familiar não se esgota na chamada família nuclear, composta apenas pelos pais e filhos. O poder Judiciário, em caso de conflito, deve levar em conta a abrangência da família considerada em cada comunidade, de acordo com seus valores e costumes. Na maioria das comunidades brasileiras, entende-se como natural a convivência com avós e, em muitos locais, com os tios, todos integrando um grande ambiente familiar solidário. Consequentemente têm igualmente fundamento no princípio da convivência familiar as decisões judiciais que asseguram aos avós o direito de visita aos netos.

A convivência familiar encontra-se inserida na classificação de direitos da individualidade da criança e do adolescente, além de estar inserido na Carta Magna.

Efeitos jurídicos decorrentes da paternidade socioafetiva

A ligação socioafetiva tem características semelhantes às da ligação biológica, pois é um tema complicado que atinge muitas áreas do direito. Ora, como o objetivo é alcançar o pleno desenvolvimento dos filhos, é justo que os direitos e obrigações da relação afluente sejam tratados de forma semelhante às obrigações consanguíneas.

É impossível que, uma vez reconhecida a relação socioafetiva, ela seja violada pelo comportamento das partes envolvidas; em vez disso, deve ter precedência sobre todas as outras circunstâncias.

Não obstante, deve haver uma expectativa doutrinal e legal quanto à paternidade afluente de que, em caso de dissolução da união, o filho não fique sem a proteção da figura paterna, especialmente naquelas situações em que a autoridade familiar do pai biológico tenha sido perdida. É uma continuação do princípio da dignidade humana

. Não seria justo alguém que perde a relação com a figura paterna, acabando com a relação da mãe com o companheiro — alguém que teve uma relação positiva e ajudou de alguma forma na formação e desenvolvimento da prole — ficar sem recursos financeiros. e apoio material, ganhando inclusive o direito de visitar ou ficar com a criança adotada.

É importante notar que, em algum momento, a criança pode acreditar que o companheiro que sua mãe tem é a figura paterna ideal que sempre desejou, proporcionando-lhe todos os atributos de um pai, mesmo que não seja biologicamente ou se, por acaso, um novo relacionamento surgir após a separação. Pode ocorrer, por exemplo, quando uma pessoa se divorcia e fica com a guarda exclusiva do filho ainda filho, levando ao surgimento de uma nova união duradoura com a presença do companheiro na vida familiar da mãe do menor.

É interessante destacar a posição de Diniz (2002) sobre o assunto, que defende que deve haver igualdade entre os coabitantes nas relações pessoais e patrimoniais, uma vez que o quadro societário para isso ainda é de coabitação e casamento convencional. Destarte, Venosa (2006) afirma o seguinte na página 292:

O reconhecimento da ancestralidade tem efeitos positivos sobre os direitos de propriedade, além de suas qualidades morais. No atual estágio de nossa gestão, os filhos reconhecidos se integraram ao restante de nós, usufruindo de direitos herdados, como a faculdade de solicitar alimentos, fazer valer seus direitos hereditários e conceder a nulidade da ação matrimonial.

Portanto, não é necessário discutir “de segurança” para descartar a conexão existente no ramo socioafetivo. Cabe a legisladores, educadores e juízes regular as responsabilidades decorrentes dessa nova formação familiar e suas consequências.

No caso Agravo em Recurso Especial nº 287774 MG, o Ministro Marco Buzzi do STJ concluiu que a criança convivia há algum tempo com o suposto pai e que a relação entre eles havia se estabelecido apesar da falta de reconhecimento da ligação estabelecida por um teste de DNA.

Dada a importância da paternidade socioafetiva, esta deve prevalecer sobre a paternidade biológica neste caso particular, com a devida consideração pela proteção do melhor interesse da criança e do potencial dano emocional que poderia resultar da ruptura dos vínculos estabelecidos.

4.1 Exercício do poder familiar na paternidade socioafetiva

A introdução de um novo companheiro resultante de uma união superveniente e diante do filho do outro estabelece o chamado estado da família do genitor ou da mãe diante de famílias recompostas ou reconstituídas, ou famílias monoparentais formadas, ainda que por adoção. É uma instituição comum devido à recorrência de novas uniões, uma vez que a busca anterior da felicidade havia colocado em futilidade as uniões preconcebidas.

Essas relações entre pais e filhos exigem situações que precisam de melhor regulamentação legal. Notadamente, quando as primeiras previsões sobre o presente e o futuro dessas relações preconizam, em primeiro lugar, a plena eficácia do princípio fundamental da proteção integral da criança e do adolescente, bem como os mecanismos de ordem pública que efetivamente assegurem essa proteção.

Nosso atual arcabouço legal é inadequado para a tarefa de estabelecer o status familiar do padrasto pela necessidade premente de cumprir sua delimitação pessoal que os distingue da paternidade ou maternidade socioafetiva, ou de colocá-los, por outro lado, em uma forma híbrida do padrasto ou madrasta, em posição igual e compatível com a do pai ou da mãe, acrescentando o elemento afeto como elo. Por fim, esse déficit normativo se reflete na ausência de referências jurídicas e expressivas ao amor e ao noivado, valores intrínsecos à legalidade das relações, mesmo quando seus termos substantivos estão fora da alçada da lei, e não apenas no legalidade da relação como ela existe atualmente.Podemos ver que:

“(i) a um, a configuração jurídica do marido da mãe ou da esposa do pai, enquanto apenas formalizada pela relação imediata na perspectiva limitada das relações de convivência com os enteados, conduzidas por uma simples afinidade parental, não implica, em ato imediato, a inferência do elemento socioafetivo, que se constrói ou não, no decurso do tempo.

Na verdade, a relação que existir será apenas civil, ou como consta do artigo 1.595 do Código Civil, por pura ficção jurídica, uma relação de afinidade sem maiores implicações. O pai continua em seu status de terceira classe e não tenta assumir o papel de pai substituto, começando como nada mais do que um membro expectante de um grupo familiar próximo que fazia parte do arranjo original do relacionamento. Ou seja, o padrasto não constitui, no tempo e na maneira, uma “paternidade instantânea” com direitos e obrigações próprias. No entanto, há uma conexão legal que, na maioria das vezes, permite a inclusão da obrigação dos pais de fornecer alimentos aos filhos em razão do parentesco, conforme sustenta Maria Berenice Dias no artigo 1.694 do Código Civil;

(ii) a dois, o padrasto, mesmo não detendo maiores vínculos de afeto, não poderá, a eximir-se de uma eventual sócio paternidade, atuar sem exação dos deveres mínimos de apego e de proteção, sob pena de incidir em posições de manifesta desafeição, o que não se coaduna com os princípios de respeito e de solidariedade aos enteados.”

Nada impede, como anteriormente aconselhado, a possibilidade de transferência do poder familiar, sempre tendo em vista o interesse superior da criança. Em contrapartida, a transferência da autoridade parental significa, com especial destaque, o reconhecimento mais eficaz e persuasivo de uma sociedade multiparental, ao mesmo tempo que transfere para o padrasto/madrasta as mesmas responsabilidades parentais que são atribuídas aos progenitores. Um exercício competitivo onde todos atuarão em benefício da criança e dos vinculados, sejam eles de poderes pessoais ou compartilhados

As primeiras tentativas nesse ordenamento foram feitas com a lei francesa de 4 de março de 2002, que trata do envolvimento de terceiros na vida das crianças, e, com maior destaque, com o ordenamento jurídico inglês, que tratou severamente a questão ao institucionalizar o papel do padrasto.

Por outro lado, lembre-se de decretos legais como os da França, Reino Unido e Holanda que também estabelecem mecanismos voluntários para a imposição de obrigações para o filho alheio.

Além disso, refira-se que o artigo 2.009, 1, “f” do Código Civil português atribui a responsabilidade pela alimentação “ao pai e à mãe, em relação aos menores que são, ou eram, da responsabilidade do mágico à época de sua morte.”

Outros fatores importantes são levados em consideração no plano de distribuição de responsabilidade parental para incluir o terceiro, como o cuidador quase parental ou substituto dos pais (se apropriado ou não), todos os quais exigem uma previsão legislativa mais ampla.

Em Direitos Civis. Em Famílias (2011), Paulo Lobo faz referência ao artigo 1.687, inciso “b”, do Código Civil Alemão (BGB), que confere ao pai e à mãe o direito de decidir conjuntamente sobre assuntos da vida cotidiana do filho, um acordo comum com o outro progenitor. Tais circunstâncias são caracterizadas na doutrina Wilfried Schluter como o exercício de um “pequeno direito de guardião”.

5. CONCLUSÃO

De tudo o que veio à tona, conclui-se que o reconhecimento da paternidade socioafetiva na legislação brasileira se desenvolveu de forma muito importante, com foco em despriorizar a paternidade biológica e colocar o pai relevante de forma primitiva, gerar amor e carinho.

Esse aspecto traz muitos benefícios porque, como visto, a doutrina em direito de família reconhece esse modelo patriarcal, mostra inovações sobre a multiparentalidade e enfatiza que os pais biológicos não excluem os pais sociais, mesmo no nascimento ou no registro, para não mencionar questões de herança. Também indica o reconhecimento da paternidade socioafetiva post mortem, passível de ação judicial e declarada para fins sucessórios, evidenciando assim o interesse do pai em declarar à sociedade o vínculo sócio emocional com o autor antes de sua morte.

Por fim foi verificado o entendimento dos Tribunais como solucionador dos conflitos, entendimentos esses que reconhecem o estado de posse do filho, o interesse do pai e do filho socioafetivo em serem conhecidos na sociedade como um parentesco ainda que não seja consanguíneo.

Diante de todo o exposto, conclui-se que a paternidade socioafetiva vem em primeiro lugar da paternidade biológica que muitas vezes é desligada do amor, cuidado e dedicação. O pai socioafetivo é muito importante para a formação do indivíduo em sua personalidade, pois estabelece para a sociedade o vínculo familiar, impossibilitando neste liame, qualquer tipo de preconceito e desconstituição do pai socioafetivo.

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