REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10023454
Lisandra Hernández Montard1;
Neide Barrocá Faccio2;
Lester Puntonet Toledo3.
Resumo
O presente artigo aborda o patrimônio arqueológico da província de Cienfuegos, Cuba, a partir da síntese das principais pesquisas arqueológicas que lhe atingem, as quais são o resultado da vida profissional do historiador e arqueólogo cienfueguero Marcos Evelio Rodriguez Matamoros. O mesmo reflete sobre a gestão provincial do patrimônio arqueológico, apontando a importância do labor desenvolvido pelo Centro Provincial de Patrimônio Cultural no uso sustável do patrimônio pela sociedade que o detém, expondo que a união de uma legislação coerente e rigorosa no trabalho com o patrimônio arqueológico, várias décadas de educação estética das comunidades nesta temática e a existência de pessoal capacitado na gestão patrimonial na província de Cienfuegos criam o contexto apropriado para uma adequada e eficaz gestão do patrimônio arqueológico provincial.
Palavras-chave: patrimônio arqueológico; gestão patrimonial municipal.
Abstract
This article deals with the archaeological heritage of the province of Cienfuegos, Cuba, based on the synthesis of the main archaeological investigations carried out on it, which are the result of the professional life of the Cienfuegos historian and archaeologist Marcos Evelio Rodríguez Matamoros. It reflects on the provincial management of archaeological heritage, pointing out the importance of the work carried out by the Provincial Center for Cultural Heritage in the sustainable use of heritage by the society that owns it, exposing that the union of coherent and rigorous legislation in working with archaeological heritage , several decades of aesthetic education of communities on this topic and the existence of personnel trained in heritage management in the province of Cienfuegos create the appropriate context for adequate and effective management of the provincial archaeological heritage.
Keywords: archaeological heritage; municipal heritage management.
Introdução
Em Cuba, segundo a Lei № 1 de 1977, cabe ao Ministério de Cultura precisar declarar os bens que formam parte do patrimônio cultural da nação. A Lei № 2 de 1977, dispõe sobre os monumentos nacionais e locais e o Decreto № 55 de 1979, constitui o regulamento a da Comissão Nacional de Monumentos, como órgão vinculado ao Ministério da Cultura e adscrito ao Conselho Nacional de Patrimônio Cultural, sendo encarregada de zelar pelo patrimônio arqueológico da nação (GOC, 1977, 1977a, 1979).
A Comissão Nacional de Monumentos é composta por 11 membros permanentes2, além de representantes do Ministério da Cultura. Esta concebe como responsabilidade de seu Secretário Executivo – quem ocupa o cargo de Diretor/a do Patrimônio Cultural do Ministério da Cultura – cuidar da conservação e guarda da documentação; e assegurar que sejam exercidos controles adequados para os estudos, projetos, inventários, fiscalizações de obras e demais funções de natureza técnica que lhe sejam confiadas (GOC, 1979).
Segundo a divisão político administrava do país, em 16 províncias, cada província terá uma Comissão Provincial de Monumentos, composta do mesmo jeito que a comissão nacional, pelas representações provinciais dos organismos nacionais e representantes do governo provincial, sendo o Secretário Executivo da Comissão Provincial de Monumentos o Diretor/a do Centro Provincial de Patrimônio Cultural (CPPC) da província em questão, quem terá as mesmas funções que seu homologo nacional (GOC, 1979).
Neste contexto, cabe à Comissão Nacional de Monumentos a toma de decisões sobre a forma de gestão a ser implementada em cada sítio ou monumento arqueológico do país, o qual se faz tendo em consideração a proposta de gestão emitida pela Comissão Provincial de Monumentos, a qual pertence o sítio o monumento arqueológico em questão. Porém, a tomada de decisões se faz por uma equipe multidisciplinar, que contempla as visões: do governo, das universidades, da empresa construtora, da proteção ambiental exercida pelo Instituto de Desenvolvimento e Uso Florestal, do planejamento físico de uso do solo e dos especialistas de turismo.
Os aspectos técnicos e metodológicos do trabalho com o patrimônio arqueológico são abordados pela equipe de funcionários do CPPC da província em questão, que realiza um ditame técnico e emite um informe com seu parecer sobre cada sítio ou monumento arqueológico a ser mencionado na Comissão Provincial de Monumentos. Este informe é apresentado na Comissão Provincial de Monumentos por seu Secretário Executivo, que dirige o CPPC, sendo uma pessoa formada na área patrimonial, que reúne em seu Gabinetes de Monumentos e Sítios Históricos os arqueólogos e gestores patrimoniais especializados na realização e socialização da pesquisa arqueológica, tendo a seu cuidado o cadastro de sítios arqueológicos e as planilhas de inventários arqueológicos da província.
Assim, o modelo cubano apresenta uma marcada centralização, pois a tomada de decisões legais é realizada unicamente pela Comissão Nacional de Monumentos, enquanto constitui uma gestão transversal, pois parte do estudo feito pelos funcionários do CPPC com a comunidade implicada, quem gera um informe técnico-metodológico baseado no trabalho comunitário, que apresenta a alternativa de gestão proposta para o sítio ou monumento arqueológico segundo a visão da prefeitura municipal e das comunidades envolvidas.
Cuba, enfoca sua gestão na melhoria da qualidade de vida da população local que circunda os sítios e monumentos arqueológicos, para o qual as prefeituras municipais contam com o assessoramento técnico e metodológico da equipe de arqueólogos e gestores patrimoniais do CPPC da sua província e dos especialistas que laboram nos museus municipais, existindo convênios entre o Ministério de Educação, o Ministério de Educação Superior e o Ministério de Cultura, para a visitação dos discentes de todos os níveis de ensino à rede de museus do país, e uma inclinação dos governos provinciais a favorecem a vinculação dos sítios e monumentos arqueológicos a projetos turísticos e de desenvolvimento local.
Na província de Cienfuegos, com mais de sete décadas de pesquisas arqueológicas, são conhecidos 187 sítios arqueológicos (Figura 1), os quais se encontram inventariados pelo CPPC, tendo o privilégio histórico ser o território no qual, Fray Bartolomé das Casas e Pedro de Rentería, vislumbrarem o papel que poderiam desempenhar para a emancipação física e espiritual dos aborígenes, renunciando a suas possessões e se dedicando integralmente à defesa dos aborígenes da América.
Figura 1: Localização dos sítios arqueológicos da província de Cienfuegos
Fonte: Os autores
As pesquisas arqueológicas na província foram desenvolvidas, primeiramente, pelas equipes de aficionados da arqueologia de Jagua, Jabacoa, Guamá e Caonao, até a fundação do CPPC em 1980, momento no qual se regularizou metodologicamente a pesquisa arqueológica na província.
Cabe mencionar que ditas equipes de aficionados eram compostas de arqueólogos, geógrafos, museólogos, bibliotecários, historiadores, professores e outros profissionais sensibilizados com o patrimônio cultural que trabalhavam nas instituições culturais e educacionais da província, por esta razão, sempre se preocuparam em socializar, na comunidade, os resultados de suas pesquisas, tendo realizado diversas ações de educação patrimonial, nas quais destaca o grupo Jagua como equipe multidisciplinar com maior abrangência de área e público na realização e socialização da pesquisa arqueológica.
Dentro das pesquisas realizadas na província ressalta o labor do historiador e arqueólogo Marcos Evelio Rodriguez Matamoros, líder do grupo de aficionados Jagua, membro da Comissão Provincial de Monumentos de Cienfuegos e profissional vinculado ao CPPC e a Universidade de Cienfuegos, como personalidade da cultura3 de grande prestígio na área arqueológica.
O labor deste historiador e arqueólogo poderia resumir-se em 45 anos de carreira profissional como arqueólogo e professor universitário, dedicada à pesquisa dos sítios arqueológicos da província e o desenvolvimento de ações de educação patrimonial em comunidades, escolas, e instituições culturais da província. Sendo suas publicações exemplares únicos em conteúdo que serviram aos pesquisadores da área e a comunidade em geral para conhecer o patrimônio arqueológico cienfueguero. Ressaltando em sua obra o desenho das distinções “Roseta”4 e “Premio Jagua”5 com fundamentação na cultura aborígene cienfueguera desvelada pela pesquisa arqueológica.
Com base neste labor, o CPPC de Cienfuegos inaugurou no ano 2019 o “Gabinete de Arqueologia Marcos Evelio Rodriguez Matamoros” como parte de sua estrutura institucional, sendo a equipe deste gabinete a responsável pela pesquisa arqueológica na província.
A província de Cienfuegos
A província de Cienfuegos localiza-se na porção centro-sul da ilha de Cuba aos 22º 34’ e 21º 49’ de latitude norte e os 80º 17’ e 80º 06’ de longitude. Limita-se ao norte com as províncias de Villa Clara e Matanzas, ao este com as províncias de Villa Clara e Santi Spíritus, ao sul com o Mar Caribe e a oeste com a província de Matanzas, tendo uma área de 4188,61 km² e uma população de 407 695 habitantes (ONEI, 2022).
A província, conhecida pelos cubanos como a “Perola do Sul” por sua limpeza e beleza, é composta de sete municípios: a sede provincial Cienfuegos, Palmira, Lajas, Rodas, Abreus, Cumanayagua e Aguada.
Na província de Cienfuegos existem quatro grandes unidades de relevo: a planície de Cienfuegos, a planície de Manacas, as alturas de Santa Clara e as montanhas de Trinidad. Grandes planícies predominam na zona oeste e central. Na direção norte, o relevo é ondulado na direção leste, montanhoso – devido à presença das montanhas de Trinidad, onde se localiza o ponto mais alto da província, o Pico San Juan, com 1140 m. Estas montanhas apresentam uma grande variedade de características naturais, como cordilheiras, picos, cachoeiras, vales, cavernas, entre as quais se destaca a gruta Martín Inferno, por possuir uma das maiores estalagmites do mundo, com 50,0 m de altura e 30 m em seu maior diâmetro.
Ao sul, o relevo é delineado pelo Mar do Caribe, com costas abrasivas e cumulativas, com a combinação de enseadas e piscinas naturais em um litoral rochoso com praias de areia branca e uma baía de bolsa. As correntes de superfície mais importantes são os rios Damují, Caunao, Arimao, Salado, San Juan, Hanábana, Yaguanabo, Hanabanilla, Cabagán e Río Hondo.
Predominam ali solos marrons com carbonatos e marrons sem carbonatos. Existem vários depósitos minerais: ágata, pedra decorativa, argila, pirita, calcopirita e outros materiais de construção. Encontra-se, também, uma jazida de calcário recristalizado em operação na área de Real Campina (REY, 2016).
Seu clima responde às condições tropicais de Cuba, modificadas pela influência das massas de águas, oceânicas, latitude e altitude. Na estação meteorológica da cidade de Cienfuegos, a temperatura média máxima é de 30,4°C e a mínima média é de 20,4°C. Sua precipitação média anual é de 1457 mm. 74,4% da área total da província é agrícola e deste 22,0% se destina à cana-de-açúcar; 40,8% a pastagens e forragens; e 13,1% a culturas temporárias. A área florestal representa 17,5% e a área de água 2,2% da área total (REY, 2016).
O principal setor econômico é o industrial: a indústria açucareira conta com 5 empresas açucareiras e usinas de derivados como: fábricas de álcool fino, rum, papel e produtos para ração animal. A indústria elétrica é dona da termelétrica. A indústria de combustíveis é representada pela refinaria de petróleo, a de maior capacidade do país. Além, disso, existem no território importantes indústrias como: óleo-hidráulica; o estaleiro; a fábrica de contêineres de polietileno; a fábrica de cimento; a fábrica de bebidas, a fábrica de refrigerantes e água mineral Ciego Montero; a fábrica de tabaco trançado; dois polígrafos combinados; a empresa de carnes; a fábrica de laticínios Escambray e a fábrica de glicose e cereais.
A província desenvolve o turismo em três áreas fundamentais: turismo urbano (capital provincial), ecoturismo (maciço montanhoso) e turismo de saúde (banhos medicinais e termais de Ciego Montero). Cienfuegos possui 9 hotéis, dos quais 5 são de turismo internacional, 2 aldeamentos turísticos: Yaguanabo e Guajimico; três áreas de cabanas: Playa Inglés, Rancho Luna e Rancho Club; parque de campismo; agência imobiliária e área de lazer e descanso em Boca Ambuila – bem como outras ofertas extra-hoteleiras: campo de caça, delfinário, centros gastronômicos especializados, Jardim Botânico e a casa do rum e do tabaco.
A sede provincial fica a 246 km da capital da república. As principais estradas são o Circuito Sul da Rodovia Central, que corta a província de oeste a sudeste, e a Rodovia Nacional, que atravessa seu extremo norte. Um ramal ferroviário conecta vários lugares habitados importantes com a Ferrovia Central de Cuba. Existem 8 terminais de ônibus, 5 estações ferroviárias, 48 correios, porto internacional e aeroporto internacional.
A província possui 267 assentamentos, 41 urbanos e o restante rural, com uma população urbana de 81,1% e uma densidade populacional de 96,5 habitantes/km. Possui 41 creches, 216 escolas primárias, 38 escolas secundárias básicas, 13 institutos pré-universitários, 18 politécnicos, 3 centros de ensino superior, 17 escolas de educação especial e 14 escolas de educação de adultos, 1 escola de artes, 1 escola formadora de professores, além de outros centros educacionais (ONEI, 2022).
Na província funcionam 4 hospitais, 20 policlínicas e 388 consultórios do médico da família, para 100% da população atendida pelo serviço de saúde e uma taxa de mortalidade infantil de 3,9 por mil/nascidos. O centro histórico provincial, localizado no município de Cienfuegos, ostenta a categoria de Patrimônio Cultural da Humanidade, outorgada no ano 2005 pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) por constituir o primeiro e excecional exemplo de um conjunto arquitetônico representativo das novas ideias da modernidade, higiene e ordem no planeamento urbano desenvolvido na América Latina do século XIX (UNESCO, 2005; ONEI, 2022).
Sítios arqueológicos da província de Cienfuegos: sínteses dos principais resultados das pesquisas do professor e arqueólogo Marcos Evelio Rodriguez Matamoros
As evidências arqueológicas achadas nesta província indicam que, há séculos, este território, nomeado Jagua pelos indígenas, foi povoado por comunidades paleolíticas, mesolíticas e neolíticas. Estas comunidades gozavam de um ambiente natural paradisíaco e privilegiado, que proporcionava não só uma alimentação variada, mas também recursos vitais em alguns casos com excedentes.
Neste território, devido à natureza predominantemente calcária do maciço orográfico de Guamuhaya, abundam as cavidades de diferentes dimensões, que foram utilizadas pelos indígenas para satisfazer as suas necessidades habitacionais e funerárias. Ao mesmo tempo, a densa floresta montanhosa fornecia-lhes as matérias-primas necessárias para sua economia natural; a região era habitat de uma fauna rica e variada, útil para o consumo humano através da caça, captura e coleta; e o intenso escoamento superficial da região abastecia os indígenas com água doce.
O primeiro contato indo-hispânico em Jagua, nome indígena da atual Província de Cienfuegos, deu-se em 1509, quando o cartógrafo espanhol Sebastián de Ocampo se abrigou numa aldeia indígena em Jagua durante sua viagem marítima para fazer a primeira cartografia da Cuba. Este contato marcou o início do processo de dissolução do regime da Comunidade Primitiva no território, começando uma disputa em que a população indígena foi submetida de forma sangrenta e inescrupulosa aos desígnios de ambiciosos colonizadores.
Na província de Cienfuegos são conhecidos 187 sítios arqueológicos. Descobertas arqueológicas atestam a presença de grupos paleolíticos no centro-oeste da província, nos municípios de Rodas e Abreus, associados à rede fluvial comandada pelos rios Damují, Jabacoa, Anaya e Hanábana. Exemplos destes sítios arqueológicos são: Pau Liso, Três Bocas, Siguaraya, o Portal, as Glórias e San Ignacio (MATAMOROS, 2015).
A descoberta de resíduos ligados a cavernas e abrigos rochosos, como artefatos esculpidos em pedra com espécimes macro-líticos frequentes, indicam que são resíduos de bandos de caça. Um aspecto observado em todos esses sítios arqueológicos é a natureza mineralógica do material explorado: o calcário silicificado, com grãos mais ou menos grossos e com maior ou menor grau de impurezas, mas que sempre foi propício à obtenção de macro-lascas e macro-lâminas (MATAMOROS, 2000).
Nestes sítios arqueológicos, os artefatos menores frequentemente aparecem feitos de outras variedades de rochas siliciosas – como calcedônia e ópalo – e estão sempre localizados próximos a vastos depósitos naturais de rochas siliciosas. Também aparecem grandes núcleos, lascas e lâminas, assim como exemplares com entalhes de formas e tamanhos variados que indicam uma especialização industrial em função do processamento da madeira e outras fibras vegetais para a fabricação de instrumentos de artes de caça e pesca (MATAMOROS, 2000).
Entende-se por comunidades mesolíticas aquelas comunidades que, mesmo na fase de economia de apropriação, enfatizaram a exploração dos recursos marítimos, para os quais adaptaram seu equipamento lítico e de conchas. Podemos afirmar que as comunidades mesolíticas de Cienfuegos fizeram da concha a matéria-prima por excelência para a fabricação de toda uma série de instrumentos de produção, utensílios domésticos e artefatos ligados à cosmovisão mágico religiosa.
Estas comunidades faziam uso das cavernas tanto como habitação ou abrigo temporário, como também para sepultamentos e rituais. No entanto, tiveram que construir casas rústicas com matérias-primas vegetais, segundo indicam seus vestígios arqueológicos. No caso do sítio arqueológico Cayo Caracol, localizado na parte oriental da baía de Cienfuegos e próximo da foz do rio Caonao, existem evidências que sustentam a hipótese da construção de moradias sobre plataformas sustentadas por estacas em zonas pantanosas.
Esses grupos mesolíticos faziam uso extensivo de rochas siliciosas para a fabricação de instrumentos de trabalho, mas sua tipologia difere marcadamente dos grupos do Paleolítico pela maior exploração de núcleos de tamanho médio e predominância de lascas sobre lâminas. As ferramentas obtidas são muito variadas, sendo observados: raspadores, tampas, facas, buriles, perfuradores, pontas e outros, destinados a trabalhar diferentes matérias-primas como madeira, couro, fibras, osso, concha, carne e pedra. Entre os achados pertencentes a estes grupos, ressaltam discos de simetria perfeita que, em alguns casos, possuem dimensões mínimas, razão pela qual são designados como microesferas (MATAMOROS, 2015).
Segundo pesquisas baseadas em exumações e materiais ósseos, os costumes funerários desses grupos incluíam enterrar os cadáveres em cavernas e abrigos de pedra. Existia uma relativa complexidade no processo, que reflete-se na presença de sepultamentos coletivos, verdadeiras necrópoles, com sepultamentos primários e secundários, sepultamentos residuais e a inegável presença das chamadas oferendas mortuárias – que constituem elementos a ter em consideração, no que diz respeito à sua preocupação com a conservação dos restos mortais de seus parentes e um respeito enfático pelo mundo além da morte.
Em Cienfuegos, existem cinco sítios arqueológicos pertencentes às comunidades do mesolítico tardio, onde as comunidades praticaram uma agricultura incipiente, da qual obtiveram benefício limitado, em comparação com as comunidades agrícolas do neolítico. Nos sítios arqueológicos Lagunillas, Cayó Guarín, Palmarito, Carmita e Santa Marta é possível encontrar umas poucas ferramentas que indicam alguma prática agrícola, assim como grande número de ferramentas empregadas para a coleta e a caça (MATAMOROS, 2015).
Em Cienfuegos existem 16 sítios arqueológicos pertencentes às comunidades neolíticas, quase todos localizados a menos de quatro quilômetros da costa. Este fenômeno é justificado pela grande dependência das comunidades agrícolas do mar e de seus produtos. A pesca e a captura marítima foram atividades básicas da economia desses grupos, por isso podem ser identificados ossos de várias espécies de peixes, quelônios, crustáceos e um mamífero aquático conhecido como peixe-boi. Além disso, como resultado da atividade de captura na costa, também são abundantes os restos de diferentes espécies de crustáceos.
Além das múltiplas referências dos cronistas espanhóis do século XVI, sobre a agricultura dos aborígenes deste território, as evidências arqueológicas demonstram amplamente a prática desta atividade entre aqueles: o machado petalóide, os raspadores de concha ou cabeçuda (Figura 2) e o buren. Todos testemunhos dos momentos cruciais nos processos agrícolas e tecnológicos relacionados com a indústria da mandioca: preparação da semeadura, descascamento das raízes (colheita) e cozimento da mandioca (consumo) (MATAMOROS, 2009).
Figura 2: Raspadores de concha ou cabeçuda do sítio Vega.
Fonte: Os autores
Segundo as pesquisas arqueológicas, eram sítios com povoamento permanente de comunidades neolíticas: Cayo Ocampo, Cántabria, Abra de Castellón, Loma do Convento, Ojo de Água e Ponta Barreira. Todos estes apresentam um contexto arqueológico rico e variado e um grande número de fogões. São sítios com povoamento não permanente: Ponta Ladrillos, a Legua, Santa Martina e Calicito. Estes locais que eram simples paradas ou acampamentos nos quais os indígenas praticavam algum tipo de atividade econômica, sem permanência estável ou prolongada no local – a julgar pelo pequeno tamanho dos locais e a menor variedade e quantidade de objetos que aparecem no contexto (MATAMOROS, 2009).
Em Cienfuegos, existe uma referência histórica, que devemos a Bartolomé das Casas, que descreve como observou os índios construir currais ou viveiros de peixes, tartarugas e outras espécies marinhas, aproveitando-se das águas rasas de certas enseadas, às quais se fechavam em suas bocas por meio de paliçadas construídas com estacas, cipós e redes, dentro das quais criavam ditos animais; A captura era feita por meio de redes, recolhendo apenas os espécimes necessários para a ocasião e devolvendo o restante ao reservatório (MATAMOROS, 2000).
No município de Rodas, localiza-se o “Complexo Rupestre Pau Liso – As Glorias”, um grupo de sítios arqueológicos com manifestações de arte rupestre que abrange a caverna Pau Liso, a caverna das Três Bocas, a gruta da Siguaraya, a aba o Portal e a gruta as Glorias.
As primeiras informações sobre estes sítios datam do ano de 1987, com a confirmação da existência de gravuras rupestres na gruta Pau Liso, o que indicou a necessidade de explorações meticulosas em outras cavernas da região, verificando assim quatro novos sítios com arte rupestre: a caverna das Três Bocas e a aba o Portal, com presença de gravuras e pinturas rupestres e a gruta da Siguaraya e gruta as Glorias, com presença de gravuras rupestres.
As gravuras rupestres do Complexo Pau Liso – As Glorias (Figura 3) foram executadas pela técnica de incisão. Os fabricantes utilizaram objetos pontiagudos e duros (provavelmente osso ou pedra) para produzir motivos e desenhos riscados na rocha calcária das paredes da caverna, muito mais macios do que o do instrumento utilizado. Esta operação produziu listras muito finas e rasas (MATAMOROS, 2009).
Figura 3: Desenhos de algumas das gravuras rupestres do Complexo Pau Liso – As Glorias
Fonte: MATAMOROS, 2009
Neste complexo, onde localizam-se 15 dos 25 motivos identificados na Cuba, foram identificados os motivos: retas, linhas paralelas, linhas com secantes, linhas quebradas, linhas cruzadas, linhas convergentes, linhas com secantes angulares, perpendiculares a uma linha, curva aberta, curva convergente, oval, quadrado, ângulo, losango e triângulo. (MATAMOROS, SELLÉN, 2001).
Quanto ao estilo das gravuras rupestres, podemos afirmar que é geométrico e abstrato, a grande maioria com desenhos muito complicados, com tendência a cruzar as linhas, cruzando-se ambas perpendicularmente no caso das retas, como obliquamente em casos de intersecção entre linhas ou entre linhas e curvas (MATAMOROS, SELLÉN, 2001).
Nestas gravuras rupestres, ressalta o fato do notável equilíbrio que pode ser percebido em todos os desenhos, nos quais existe uma proporção bem concebida e alcançada entre os motivos do mesmo desenho ou entre os desenhos, quando são agrupados na mesma área formando painéis (MATAMOROS, 2009).
Na gruta da Siguaraya foi descoberto que, durante um breve período de tempo na manhã de cada 21 de dezembro, um raio de sol penetra obliquamente através de um furo aberto no teto, para iluminar totalmente uma gravura rupestre localizada numa parede da gruta. Obviamente, o desenho esculpido na pedra tinha o propósito de marcar o momento exato do solstício de inverno, talvez para iniciar certas atividades de natureza econômica ou ritual, sem dúvidas de grande importância para os autores anônimos. Tal gravura é um “marcador” ou “calendário” solar muito primitivo e simples (MATAMOROS, SELLÉN, 2001).
As pinturas rupestres, observadas na caverna das Três Bocas e a aba o Portal; não parecem ter relação estilística com as gravuras rupestres também presentes nelas. Devido ao seu mau estado de conservação, o que expressamos a este respeito não pode ser considerado definitivo.
Ê apreciável um certo grau de seletividade nas áreas das cavernas para pintar esses desenhos, na aba o Portal. Todas as pinturas rupestres se refletem no teto da cavidade, na parte mais iluminada pela luz natural, enquanto as gravuras rupestres localizam-se em outra galeria estreita e escura. Na caverna das Três Bocas, as pinturas rupestres parecem evitar as gravuras rupestres ainda que se localizem na mesma galeria ou na mesma parede.
Em todos os casos estudados destas pinturas rupestres, a cor identificada é o preto, aparentemente obtido pela mistura de pó de carvão ou fuligem com gordura animal ou algum suco vegetal com propriedades aglutinantes. Seu estado de conservação é precário, estando a maior parte dos desenhos parcialmente apagados, o que torna difícil definir seu desenho original. Nelas prevalecem motivos geométricos de relativa simplicidade estrutural e ar naturalista, mas que admitem algumas propostas de interpretação, como os casos de figuras de borboletas ou o desenho antropomórfico que representa o rosto de um personagem.
Quanto aos autores dessas obras, podemos afirmar que, nos sítios com presença só de gravuras rupestres, as demais evidências arqueológicas correspondem apenas à cultura Paleolítica – como são um complexo picador feito de uma crista calcária recristalizada de 57 centímetros de comprimento por 47 centímetros de largura e 13 quilos de peso; uma ferramenta de lasca maciça, de 35 centímetros de comprimento por 23 centímetros de largura e 7,5 quilogramas de peso; e um machado em construção, de 35 centímetros de comprimento e cinco quilos de peso. Ferramentas que exigiam uma forte constituição física para criá-los e utilizá-los como a dos caçadores-coletores que ocuparam este território entre oito mil e dez mil anos antes de nossa era (MATAMOROS, SELLÉN, 2001).
No entanto, naqueles locais onde compartilham espaço as gravuras e pinturas rupestres, elementos peculiares das culturas paleolítica e mesolítica também compartilham o contexto arqueológico. Tais descobertas dá-nos argumentos para pensar que as pinturas rupestres sejam obra de um povo mesolítico, de coletores-caçadores, de maior desenvolvimento econômico e social do que seus predecessores do paleolítico.
Quanto os artefatos decorados da província de Cienfuegos, existem evidências de que, tanto os artefatos cerimoniais como os de uso pessoal, exibem uma escultura refinada e notável simetria bilateral. No sítio Cantábria, foram encontradas próteses de concha embutidas em ídolos de madeira; contas cilíndricas de pedra para colares, com e sem decoração; amuletos de pedra (Figura 4) e conchas; fragmentos de espátulas vômicas de osso; olivas sonoras de diversos tamanhos; e uma peça de pedra – talvez quartzito – decorada com incisões e desenhos em relevo, que lembra uma peça de xadrez (MATAMOROS, 2013).
Figura 4: Amuletos de pedra do sítio Cantábria
Fonte: Os autores
Ressaltam, dentro da escultura indígena do território o amuleto antropomórfico pendente, do sítio Santa Martina, feito de pedra; e a lâmina de concha decorada geometricamente do sítio Cayo Carenas (Figura 5), peças únicas de arte escultórica de pequeno formato.
Figura 5: Lâmina de concha decorada geometricamente do sítio Cayo Carenas
Fonte: Os autores
No caso da lâmina de concha decorada geometricamente do sítio Cayo Carenas, esta foi cortada com grande precisão pelo artesão indígena, para conseguir, após a aplicação de outras técnicas como abrasão, incisão e fundição uma peça com notáveis valores artísticos e estéticos (MATAMOROS, 2013).
A história de Cienfuegos está repleta de herança aborígene. Os históriadores locais Pablo L. Rousseau e Pablo Diaz de Villegas referem-se, em sua obra, à presença de indígenas ainda em tempos após a fundação da colônia Fernandina de Jagua em 1819. Segundo textos/crônicas da época, citados pelos autores alguns índios conviveram com os fundadores de origem europeia, como o caso de uma índia convertida à fé católica, conhecida por seu nome e sobrenome castelhano (como Francisca Mendoza), que vivia e trabalhava como doméstica na família Jáuregui até sua morte em 1830; e o caso do idoso indígena Yana, um aborígene solitário que morava numa pequena ilhota na baia e morreu aos 90 anos (ROUSSEAU, VILLEGAS, 1919).
Segundo os históriadores, os primeiros colonos de sobrenome Jáuregui, que habitaram o território, coletaram uma série de lendas e descrições do modo de vida das comunidades tribais que habitaram os arredores da Baía de Jagua, passando, de uma geração a outra desta família, esse conhecimento. Uma dessas lendas é a Lenda de Guanaroca, que expressa uma visão do mundo indígena local muito difundida na cultura de Cienfuegos – já que, na atualidade, todo cienfueguero conhece esta lenda, existindo na província a lagoa Guanaroca e a escultura Guanaroca em sua homenagem (ROUSSEAU, VILLEGAS, 1919).
Existem abundantes evidências materiais da passagem e permanência dos espanhóis na região de Jagua desde inícios do século XVI até 1819 – como os vários locais de resíduos na província onde materiais europeus foram recuperados (faiança, metais e vidro); associados a materiais aborígenes, além da descoberta de artefatos indígenas com formas europeias (Figuras 6 e 7) ou artefatos indígenas confeccionados com materiais europeus, estes últimos constituem indícios inquestionáveis de uma coexistência mais ou menos prolongada entre indígenas e europeu. Exemplos destes sítios com vestígios arqueológicos que indicam coexistência são: Ojo de Água, Loma do Convento, Cayo Ocampo e Rancho Club (MATAMOROS, 2013).
Figuras 6 e 7: Compasso de cartografia náutica do século XVI modificado como amuleto indígena do sítio Loma do Convento
Fonte: Os autores
O sítio “Cayo Ocampo” constitui os restos do povoado indígena no qual, o cartografo espanhol Sebastián de Ocampo conviveu pacificamente com a população indígena durante seu percurso marítimo ao redor de Cuba, a fim de criar um mapa da mesma: também é o lugar onde o conquistador Diego Velázquez escreveu sua primeira carta aos reis de Espanha, relatando os fatos da conquista da ilha de Cuba (MATAMOROS, 2015).
No sítio “Loma do Convento”, declarado monumento nacional no ano 2022 por possuir evidências arqueológicas que testemunham o intercâmbio cultural hispano-aborigen, ao ser a localização da encomenda de Bartolomé das Casas e Pedro de Rentería nos anos 1514 a 1515, foram achados materiais líticos, de concha e diversas cerâmicas, sendo o sítio de agricultores-ceramistas melhor conservado da província (MATAMOROS, 2002; 2015).
Nas proximidades do bairro conhecido como Caunao, onde pressupõe-se morava o cacique Jagua, foram detectados vestígios arqueológicos que, embora alterados por trabalhos agrícolas, oferecem material de contexto muito tardio como ferramentas indígenas feitas em fragmentos de garrafas de vidro industriais, cuja fabricação remonta ao ano de 1750 (MATAMOROS, 2013).
Segundo o critério de historiadores e arqueólogos várias foram as condições que coincidiram em Jagua para propiciar a sobrevivência dos povos indígenas naturais desta região, até tempos muito tardios, permitindo que uma parte importante de seus elementos socioculturais fossem transmitidos oralmente até a fundação da Vila de Jagua em 1819. Dentre estas condições ressaltam: as densas florestas que existiam em torno da baía e as áreas remotas de muito difícil acesso para os colonizadores espanhóis com os meios de transporte da época; e a presença, em Jagua, de Bartolomé das Casas e Pedro de Rentería, dois espanhóis com uma visão diferente que aportarem novos conhecimentos para os indígenas e os ensinaram como sobreviver aos europeus, por meio de uma tática que evitou o contato próximo com os colonizadores (ROUSSEAU, VILLEGAS, 1919).
Na província de Cienfuegos existe, também, evidência de uma construção megalítica, localizada nas proximidades da caverna das Três Bocas. Trata-se de uma grande rocha ou laje de calcário biogênico, de forma triangular ou trapezoidal, cuja extremidade mais estreita repousa no solo, enquanto é sustentada por mais duas rochas pequenas da mesma natureza, que fazem a extremidade mais larga elevar-se acima do terreno, cujo declínio progressivo é em direção à boca da caverna.
A rocha principal ou maior tem aproximadamente 2,25 metros de comprimento e 1,80 metros de largura. Sua extremidade mais estreita mede 0,36 metros, enquanto a mais largo tem aproximadamente 1,40 metros. A espessura da rocha é de aproximadamente 0,40 metros em média e seu eixo longitudinal é sensivelmente direcionado para o norte magnético, fato verificado com a bússola (MATAMOROS, 2009).
Sua inclinação é ligeiramente superior a 17 °, sem atingir 18 ° acima do horizonte, o qual foi verificado por meio de uma mira colocada no plano ou na face superior da grande laje. Se levarmos em conta que a ascensão reta da Estrela Polar ou Alfa da Ursa Menor é de 22 °, esse grau de aproximação é fortemente marcante, levando em consideração as múltiplas acomodações que essa estrutura deve ter sofrido em sua execução intencional (MATAMOROS, 2009).
A gestão do patrimônio arqueológico na província de Cienfuegos: labor do Centro Provincial de Patrimônio Cultural (CPPC)
Na província de Cienfuegos, o CPPC, fundado em 1980, tem a seu cargo o Gabinete de Monumentos e Sítios Históricos, o Registro de Bens Culturais e o Gabinete de Arqueologia Marcos Evelio Rodrigues Matamoros, além de atender a rede de museus da província composta de 15 museus: Museu Provincial; Museu das Artes “Palácio Ferrer”; Museu Histórico Naval; Museu Irmanas Giral; Museu a Fortaleza; Museu Municipal de Abreus; Museu Municipal de Aguada; Museu Municipal de Cruces; Museu Municipal de Cumanayagua; Museu Municipal de Lajas; Museu Municipal de Rodas; Museu Municipal de Palmira; Museu Etnográfico de Montanha; Museu de Clandestinidade e Museu de Sítio (dedicado a plantas medicinais).
A equipe multidisciplinar do CPPC realiza um acompanhamento de cada construção ou reforma construtiva projetada pelo estado, tanto na zona urbana como rural, a qual é notificada aos mesmos, contando com a presença de um arqueólogo no terreno.
No caso das construções privadas, que neste caso refere-se à construção de uma vivenda por uma pessoa natural, o Instituto de Planificação Física (IPF) notifica ao CPPC o momento em que ocorrerá a preparação do terreno para a construção, com a finalidade de ter um arqueólogo presente, de tal forma que se corrobore a não existência de materiais arqueológicos na área. Caso contrário, o arqueólogo presente na preparação do terreno poderá identificar e resgatar os materiais arqueológicos da forma correta ou deter a obra para a realização de escavações arqueológicas.
Nos casos de resgate do patrimônio arqueológico, este é preservado na rede de museus de província ou no Gabinete de Arqueologia “Marcos Evelio Rodrigues Matamoros”, nas exposições ou reservas técnicas.
A equipe do CPPC, conta em seu Programa de Desenvolvimento Cultural6, com um programa de capacitação que prevê o aprimoramento da equipe na área arqueológica. São ministrados, na província e na capital da república – Havana -, cursos e oficinas de temas de patrimônio arqueológico, por especialistas de nível nacional e internacional.
Com o intuito de contribuir com a educação patrimonial do povo cienfueguero e preservar o legado aborígene da província o CPPC desenvolve uma série de ações, nas quais se incluem capacitações em temas de arqueologia. Ainda que possam ser aprimoradas constantemente, são efetuados todos os anos, o que segue:
- Programa de visitas das escolas ao museu provincial: este programa inclui todos os níveis educacionais da província e todas as escolas da mesma, compreendendo que as turmas de estudantes façam uma visita guiada por o museu;
- Programa de visitas das escolas dos diversos municípios aos museus municipais: este programa inclui que todas as escolas de cada município tenham um programa de visitas a seu museu municipal, assegurando que os estudantes do município se familiarizem com a história da localidade mediante uma visita guiada pelo museu;
- Programação especial nos meses de julho e agosto: Nestes dois meses, que correspondem às férias escolares de todos os níveis educacionais, o CPPC é a rede de museus da província desenvolve uma programação orientada à recreação de crianças e jovens, desenvolvendo cursos e oficinas vinculados ao patrimônio provincial;
- Capacitação a funcionários da Polícia Nacional Revolucionaria sobre a identificação de evidências e sítios arqueológicos;
- Capacitação a funcionários do “corpo de guarda-bosques”, sobre a identificação de evidências e sítios arqueológicos;
- Capacitação a funcionários do Ministério de Ciência, Tecnologia e Médio Ambiente de Cuba (CITMA) que realizam pesquisas ambientais em toda a província, incluindo a zona da costa, sobre a identificação de evidências e sítios arqueológicos;
- Capacitação a médicos forenses do Hospital Provincial “Gustavo Alderegia Lima”, sobre a identificação de restos humanos aborígenes e identificação de restos de animais pertencentes ao período histórico da “comunidade primitiva”, ou vinculados com as populações aborígenes;
- Capacitação da equipe de criminalística da Polícia Nacional Revolucionária, sobre a identificação de restos humanos aborígenes e identificação de restos de animais pertencentes ao período histórico da “comunidade primitiva”, ou vinculados com as populações aborígenes;
- Realização de conferências nas comunidades onde existem sítios arqueológicos para socializar os conhecimentos existentes sobre estes, nas quais a população local tem contato direito com diversas peças arqueológicas.
Com a realização destas ações, o CPPC assegura, em grande medida, que os funcionários públicos e privados, vinculados a atividades que possam redundar na descoberta de novas evidências ou sítios arqueológicos, possuam a preparação adequada para reconhece-los e informar à equipe do CPPC destes achados. Cada capacitação tem um ajuste do conteúdo, segundo o perfil de trabalho das pessoas a quem será ministrada.
A vinculação dos estudantes ao museu municipal de seu território e ao museu provincial contribui para a sua sensibilização com o patrimônio arqueológico, presente na sala de comunidade primitiva de cada museu, promovendo o valor do patrimônio arqueológico.
Também, a socialização dos conhecimentos existentes sobre os sítios arqueológicos com a população local, além de contribuir à sua sensibilização com o patrimônio arqueológico, implica a toda a comunidade -diversos grupos etários- na preservação do legado indígena da localidade e valoriza o patrimônio arqueológico, ao ser inserido na cotidianidade destas populações.
A equipe do Gabinete de Arqueologia “Marcos Evelio Rodrigues Matamoros”, além de ter um inventário atualizado dos sítios arqueológicos da província7 e os achados produzidos neles, conta com uma biblioteca digital de catálogos das coleções arqueológicas e históricas, no qual são agrupados os achados segundo una característica em particular em cada catálogo. Exemplos deste trabalho são o catálogo de machados, o catálogo de moedas de prata e o catálogo de frascos de vidro.
Esta equipe tenta incluir em sua rotina as novas técnicas ou resultados relevantes dos pesquisadores da área e desenvolve o projeto “A história bajo nossos pês”, o qual se foca na socialização da pesquisa arqueológica em trabalhadores do setor construtivo –tanto público como privado- e famílias que empreendem remodelações de suas vivendas. Este projeto conta em seus resultados com mais de cinquenta avisos ao CPPC de achados arqueológicos em obras construtivas que não requerem a presencia de um arqueólogo segundo a legislação patrimonial vigente, nos quais a população sensibilizada com este patrimônio detém a obra e resguarda os materiais até a pronta chega da equipe arqueológica do gabinete, quem resgata adequadamente os materiais e peças encontradas para seu posterior estudo.
Considerações finais
Na província de Cienfuegos, com mais de sete décadas de pesquisas arqueológicas e 187 sítios arqueológicos conhecidos, o CPPC aposta na sensibilização da população sobre o patrimônio arqueológico e a valorização do mesmo mediante a promoção de sua importância nas comunidades, bem como sua vinculação com projetos de desenvolvimento local, o qual é feito mediante um rigoroso trabalho metodológico e científico que promove o constante aprimoramento dos recursos humanos e a implementação das novas técnicas de pesquisa da área.
O CPPC procura a vinculação de todos os atores sociais no trabalho patrimonial, criando uma imbricação entre instituições culturais, instituições educacionais, governo local, projetos locais, trabalhadores privados e comunidades, a fim de gerir adequadamente o patrimônio arqueológico, sob a premissa de que este patrimônio pertence a toda a nação.
Um importante passo neste labor foi a criação do Gabinete de Arqueologia “Marcos Evelio Rodrigues Matamoros”, o qual aportou um novo espaço para a exposição arqueológica e consolidou uma equipe multidisciplinar8 que preserva, pesquisa e difunde o patrimônio arqueológico em toda a província, com base na inserção dos conhecimentos provenientes da arqueologia na cotidianidade das populações atuais que habitam os antigos territórios das comunidades indígenas.
Visualizando-se que, na província, a união de uma legislação coerente e rigorosa no trabalho com o patrimônio arqueológico, várias décadas de educação patrimonial nas comunidades e a existência de pessoal capacitado e especializado na área da pesquisa e gestão patrimonial, cria-se o contexto apropriado para uma adequada e eficaz gestão do patrimônio arqueológico.
Assim desde as pesquisas de grupos aficionados a arqueologia até a criação do CPPC e posteriormente de seu Gabinete de Arqueologia, há existido uma combinação de respeito às leis patrimoniais e compromisso social com a difusão dos conhecimentos resultantes da pesquisa arqueológica por parte dos funcionários do sector cultural e educacional, que possibilitou levar este conhecimento à população cienfueguera, logrando apresentar-lhes as conexões culturais que os unem e assim sensibilizar-lhes com o legado indígena presente em seu território.
1O presente trabalho foi publicado com apoio financeiro do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).
2Os 11 membros permanentes são: Presidente designado pelo Ministério da Cultura, um Secretário Executivo, quem é aquele que ocupa o cargo de Diretor de Patrimônio Cultural do Ministério da Cultura e um representante designado pelos chefes de cada uma das seguintes organizações: Ministério da Construção; Ministério da Educação; Ministério da Educação Superior; Academia de Ciências de Cuba; Instituto Nacional de Turismo; Instituto de Planejamento Físico do Conselho Central de Planejamento; Instituto Nacional de Desenvolvimento e Uso Florestal; Instituto de História do Movimento Comunista e da Revolução Socialista de Cuba; e Organização que reúne arquitetos cubanos.
3Marcos Evelio Rodriguez Matamoros foi membro da Comissão Provincial de Monumentos de Cienfuegos; da União de Historiadores, Escritores e Artistas de Cuba (UNEAC); da Sociedade Espeleológica de Cuba; da Associação Cubana de Artesãos e Artistas (ACAA); e do Grupo Cubano de Investigadores do Arte Rupestre (GCIAR). Master em História e Antropologia Sociocultural.
4Mais alta condecoração outorgada pela Direção Provincial de Cultura em Cienfuegos a personalidades não cienfuegueras por suas contribuições ao desenvolvimento cultural de Cienfuegos.
5Mais alta condecoração outorgada pela Direção Provincial de Cultura em Cienfuegos a intelectuais cienfuegueros por seus aporte à cultural local ao longo da vida.
6O Programa de Desenvolvimento Cultural é o documento reitor do trabalho da instituição num período de cinco a dez anos, este apresenta os objetivos de trabalho e metas a alcançar pela instituição em cada uma de suas áreas de trabalho.
7O modelo do inventário dos sítios arqueológicos inclui: número no mapa; nome do sítio; província; município; área; folha cartográfica; filiação cultural; coordenadas; categoria de proteção; propriedade; acessibilidade; estado de conservação; integridade; uso atual; uso anterior; tipologia; identificação; controle; e breve caracterização.
8A equipe é composta de arqueólogos, historiadores, licenciados em estudos socioculturais, pedagogos e sociólogos.
Referências bibliográficas
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UNESCO. Decisions of the 29th sesión of the World Heritage Committe. Durbam, South Africa, 2005.
1Pós-Doutoranda em Geografia da FCT – UNESP ̸ Bolsista Cnpq. E-mail: lisilhm@gmail.com1;
2Livre Docente da FCT – UNESP. E-mail: neide.faccio@unesp.br
3Diretor do Gabinete de Arqueologia do CPPC de Cienfuegos. E-mail: patrimonio@azurina.cult.cu