O PAPEL DA INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL NA CONDUÇÃO DE VEÍCULOS DE CARGA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th10248291642


Fabia Demarqui Albertoni Volpe
Orientador: Profa. Dra. Thaiz Ferraz Borin


RESUMO

A inteligência artificial (IA) é uma área da ciência da computação que busca criar máquinas e sistemas capazes de realizar tarefas que normalmente exigem inteligência humana. A IA tem diversas aplicações em vários setores da sociedade, entre eles o transporte rodoviário de carga (TRC). O TRC é um dos principais modais de transporte no Brasil e no mundo, responsável por movimentar milhões de toneladas de mercadorias todos os anos. No entanto, o setor enfrenta diversos desafios, como a baixa eficiência, o alto custo, o impacto ambiental, e a insegurança com alta taxa de acidentes fatais. A IA pode contribuir com o desenvolvimento do TRC, oferecendo soluções que visam melhorar a gestão, a operação, a sustentabilidade do transporte de cargas e a segurança por meio da análise do comportamento dos motoristas e dos veículos, através de redes neurais (RNAs), sistemas integrados que coletam e analisam dados como velocidade, aceleração, frenagem, consumo de combustível e reconhecem a aptidão do motorista por meio de características faciais como olhos, boca e expressões. Esses dispositivos são capazes de auxiliar os motoristas durante as viagens, por meio de alertas de colisão sonoros ou visuais, controle adaptativo de velocidade e oportunidades de melhoria, evitando acidentes. Em acidentes envolvendo veículos conduzidos por IA, a perícia pode recorrer à registros e dados coletados pelos próprios sistemas de inteligência do veículo. Para tanto, os perítos devem estar capacitados e obter expertise adicional em tecnologias de IA e sistemas de RNAs, assim como estar atualizados sobre avanços tecnológicos e suas regulamentações específicas relacionadas à condução autônoma e IA aplicada em veículos.

Palavras-chave: Inteligência Artificial; Veículos de Carga; Acidentes de trânsito; Perícia Criminal.

ABSTRACT

Artificial intelligence (AI) is an area of ​​computer science that seeks to create machines and systems capable of performing tasks that normally require human intelligence. AI has several applications in various sectors of society, including road freight transport (RTC). RCT is one of the main modes of transport in Brazil and worldwide, responsible for moving millions of tons of goods every year. However, the sector faces several challenges, such as low efficiency, high cost, environmental impact, and insecurity with a high rate of fatal accidents. AI can contribute to the development of RCT, offering solutions that aim to improve the management, operation, sustainability of freight transport and safety by analyzing the behavior of drivers and vehicles, through neural networks (ANNs). These integrated systems collect and analyze data such as speed, acceleration, braking, fuel consumption and, recognize the driver’s aptitude through facial features such as eyes, mouth and expressions. These devices are capable of assisting drivers during journeys, through audible or visual collision alerts, adaptive speed control and improvement opportunities, avoiding accidents. In case of AI-driven vehicles accidentes, criminal experts can use records and data collected by the vehicle’s own intelligence systems. To this end, criminal experts must be trained and obtain additional expertise in AI technologies and ANNs systems, as well as be up to date on technological advances and their specific regulations related to autonomous driving and AI applied to vehicles.

Keywords: Artificial Intelligence; Cargo Vehicles; Traffic Accidents; Criminal Expertise.

1.   Introdução

A partir da década de 1950, o modal rodoviário definido como um sistema de transporte de mercadorias e pessoas realizado por meio de rodovias, utilizando veículos como caminhões, ônibus, carros e motos; foi consolidado como o principal meio de transporte no Brasil. O governo da época de Juscelino Kubitscheck, com a intenção de libertar o país da dependência agrícola e torná-lo uma nação industrializada, viu a necessidade de expandir a indústria automobilística no país. Assim, além da construção da nova capital brasileira, Brasília, houve também a construção de 12.169 quilômetros de rodovias federais e a pavimentação de 7.215 quilômetros de estradas. E, o crescimento industrial ganhou grande impulso até os anos 1980, onde um vigoroso desenvolvimento da indústria modificou profundamente a estrutura econômica do país. Como consequência, a urbanização alterou significativamente a sociedade brasileira e com o aumento das rodovias, também houve um incremento no fluxo de trânsito e, nos acidentes (Silva & Leigh, 1995; Campos & Lima, 2019).

Em 2008, os acidentes de trânsito foram considerados a décima principal causa de óbitos no mundo, sendo que o número anual de mortes ultrapassou a marca de 1,3 milhões de pessoas decorrente dos acidentes de trânsito, deixando cerca de 500 milhões com algum tipo de lesão, em todo o planeta (Ferraz et al., 2012 apud Campos & Lima, 2019).

No Brasil em 2019 foram contabilizados circulando na malha rodoviária 1.934.478 veículos de carga de autônomos, de empresas e cooperativas, sendo registrados o total de 69.206 acidentes em rodovias federais no ano anterior (CNT, 2019 apud Campos & Lima, 2019), Em 2020, houve ainda no Brasil 187.888 internações de pessoas envolvidas em acidentes de trânsito. E, um aumento de 10% em 2021 em comparação com o ano anterior (Czerwonka, 2022). Nos países desenvolvidos, o excesso de velocidade é responsável por 30% dos acidentes e mortes no trânsito, enquanto nos países em desenvolvimento, essa porcentagem sobe para 50%. Isso destaca o grande desafio da perícia criminal de acidentes de trânsito, em determinar as velocidades dos veículos envolvidos nas colisões, sua trajetória, vítimas, prejuízos e perdas, validando a necessidade de tecnologias que atuem na prevenção desses acidentes. (Gurgel et al., 2015).

Um número de acidentes cada vez maior tem sido observado nas rodovias brasileiras devido sua grande utilização e flexibilidade, por se tratar de um modal em boas condições, com características para transportar produtos de vários tamanhos, para diferentes distâncias, indicado principalmente à indústria e suas mercadorias de maior valor agregado (Barat, 2007; Keedi, 2011 apud Campos & Lima, 2019).

O crescimento econômico nos últimos anos e a expansão do mercado externo brasileiro, fez com que a demanda no setor rodoviário aumentasse ainda mais, acarretando na necessidade de melhorias na sua infraestrutura, para a solução de problemas existentes e preparando o Brasil para futuros crescimentos logísticos e tecnológicos como a implantação de inteligência artifical (IA) na condução de veículos de carga visando a diminuição de acidentes de trânsito e perdas humanas e materiais (CNT, 2014).

1.1  Justificativa

A velocidade dos veículos é uma das principais causas de acidentes de trânsito em todo o mundo, incluindo o Brasil. O desrespeito aos limites de velocidade estabelecidos e a condução em alta velocidade aumentam significativamente o risco de acidentes e suas consequências graves (WHO, 2018).

A alta velocidade afeta negativamente o tempo de reação do condutor, reduz a capacidade de manobras evasivas e aumenta a distância de frenagem, dificultando o controle do veículo. Além disso, o impacto de uma colisão em alta velocidade é mais severo, causando lesões mais graves e aumentando a probabilidade de fatalidades. Isto porquê, em via de regra a velocidade do veículo, na maioria dos acidentes, está incompatível com as condições da via (Martins et al., 2018).

Para combater os acidentes relacionados à velocidade, diversas medidas têm sido adotadas, incluindo a implantação de radares e fiscalização eletrônica, campanhas de conscientização e educação para o trânsito, além de ações voltadas para o planejamento e projeto de vias mais seguras, assim como, o desenvolvimento de tecnologias inovadoras aplicadas ao veículos como IA visando mais segurança aos condutores no tráfego rodoviário (Sánchez-Marín et al., 2007).

2.   Objetivos
2.1  Geral

Este trabalho tem por finalidade revisar a literatura abrangendo a aplicação da IA na condução autônoma de veículos de carga como, caminhões e ônibus, mostrando como essa tecnologia revolucionária de extrema importância pode otimizar o transporte de mercadorias, proporcionando eficiência e segurança sem precedentes.

2.2  Específicos

Revisaremos especificamente os benefícios e os malefícios da IA na condução dos veículos de carga e sua ação na prevenção de acidentes e suas outras áreas de atuação na logística modal rodoviária, focando o papel da perícia criminal.

3.   Metodologia para Pesquisa

Como metodologia de pesquisa utilizamos uma revisão de literatura que consistiu em uma busca de livors e artigos científicos de revisão de literatura específica, disponíveis em bibliotecas físicas e digitais como, pubmed, biblioteca virtual em Saúde (bireme), scielo, teses.usp e universidades locais, buscando os descritores: Inteligência Artificial; Veículos de Carga; Acidentes de trânsito; Perícia Criminal.

Foram critérios de exclusão do estudo, artigos publicados em outras línguas que não fossem português ou inglês; que não fossem publicados na íntegra, que não estivessem disponíveis gratuitamente no momento da busca do estudo; ou ainda, os que não tratassem da temática específica do estudo.

4.   Revisão de Literatura
4.1 Logística e Transporte

O trânsito de veículos no Brasil e sua estruturação é caracterizado por desafios e questões complexas que afetam a segurança e a fluidez das vias. O país possui uma grande frota de veículos em circulação e enfrenta diversos problemas, como infraestrutura precária, falta de planejamento urbano adequado, imprudência dos condutores e falta de fiscalização eficiente. Esses fatores contribuem para uma alta taxa de acidentes rodoviários no país (Andrade et al., 2014).

De acordo com dados de 2019 do Ministério da Saúde, o Brasil está entre os líderes mundiais em número de mortes por acidentes de trânsito, registrando 30 mil mortes por ano (DATASUS, 2021). Essa estatística alarmante não apenas causam perdas humanas e sofrimento às famílias envolvidas, mas também geram impactos econômicos significativos em termos de custos médicos, reabilitação e danos materiais.

Diversos fatores contribuem para a alta taxa de acidentes rodoviários no Brasil. A infraestrutura inadequada, como estradas mal conservadas, falta de sinalização adequada e insuficiência de vias de tráfego, aumenta significativamente o risco de acidentes. Além disso, a imprudência dos condutores é um fator determinante, manifestada pelo excesso de velocidade, desrespeito às leis de trânsito, uso de álcool e drogas, e a falta de uso de equipamentos de segurança. Esses elementos, combinados, criam um cenário desafiador para a segurança no trânsito no país (Andrade et al., 2014; Narciso & Mello, 2017).

É importante ressaltar que existem esforços e políticas em andamento para melhorar a segurança no trânsito no Brasil. O país tem investido em campanhas de conscientização, educação para o trânsito e implementação de leis mais rigorosas. Além disso, a aplicação de tecnologias e sistemas de segurança, como a implementação de radares, fiscalização eletrônica e o avanço na adoção de sistemas de assistência à condução (ADAS) em veículos, pode contribuir para a redução dos acidentes (Narciso & Mello, 2017).

Os sistemas ADAS, por exemplo, incluem tecnologias como frenagem automática de emergência, alerta de colisão frontal e controle adaptativo de cruzeiro, que ajudam a evitar acidentes e melhorar a segurança dos veículos. A IA também está sendo aplicada para somar a essas iniciativas, oferecendo tecnologias avançadas que podem sobrepor deficiências humanas, como a detecção de fadiga do motorista, reconhecimento de padrões de tráfego e navegação mais eficiente (Andrade et al., 2014).

Essas medidas, aliadas a um esforço contínuo para melhorar a infraestrutura rodoviária e a fiscalização do trânsito, têm o potencial de criar um ambiente mais seguro nas vias brasileiras. A combinação de educação, tecnologia e regulamentação é fundamental para reduzir a alta taxa de acidentes e promover um trânsito mais seguro para todos (Narciso & Mello, 2017).

O transporte rodoviário desempenha um papel crucial na logística e na economia, especialmente em países como o Brasil, onde a malha rodoviária é extensa e a flexibilidade é essencial. No entanto, suas limitações, como capacidade de carga, impacto ambiental, segurança e dependência da infraestrutura, precisam ser gerenciadas com políticas públicas eficazes e investimentos contínuos em infraestrutura e tecnologia. Soluções como a adoção de tecnologias de IA para a condução de veículos de carga e a melhoria da manutenção das estradas são essenciais para aumentar a eficiência e a sustentabilidade deste modal de transporte.

4.2  Acidentes de Trânsito

Os impactos negativos do aumento da frota de veículos nas ruas refletem na tendência crescente e ininterrupta do número de fatalidades no trânsito. Segundo Bastos et al. (2015), em 2011 ocorreram cerca de 43.000 acidentes fatais no Brasil, dado que quando comparado ao número de fatalidades no conjunto dos 27 países membros da União Europeia, cuja população é cerca de duas vezes maior e tem uma área geográfica duas vezes menor, apresenta um aumento significante de 40%, indicando que o Brasil apresenta 52,30 fatalidades por bilhão de quilômetros rodados por veículos, número 10 vezes maior à maioria dos países europeus.  . Com o aumento constante do número de veículos nas ruas, surgem diversos desafios e problemas que afetam diretamente a segurança viária e a qualidade de vida da população.

Em muitos países, especialmente aqueles em desenvolvimento, a infraestrutura rodoviária é inadequada, com estradas mal conservadas e falta de sinalização adequada. A imprudência dos condutores excedendo o limite de velocidade das vias, a condução sob influência de álcool ou drogas, uso de dispositivos móveis durante a condução de veículos e o desrespeito às leis de trânsito são comportamentos comuns que aumentam o risco de acidentes. Outros fatores como a falta de aderência as campanhas de educação e conscientização no trânsito e, em programas de educação para motoristas e pedestres contribui para comportamentos inseguros. Além do que em algumas regiões, a falta de manutenção adequada dos veículos aumenta a probabilidade de falhas mecânicas que podem levar a acidentes (Bastos et al., 2015).

O Brasil enfrenta desafios significativos no que diz respeito as características gerais de segurança no trânsito como as citadas acima. Com uma das maiores frotas de veículos do mundo, o país registra altas taxas de acidentes e mortalidade nas estradas. Além das tragédias pessoais, os acidentes de trânsito têm um enorme impacto econômico, com custos associados a cuidados médicos, perda de produtividade e danos materiais (Bastos et al., 2015).

Em países desenvolvidos, como os Estados Unidos e nações da Europa Ocidental, a taxa de acidentes de trânsito tende a ser menor, devido à infraestrutura de qualidade, fiscalização rigorosa e programas extensivos de educação no trânsito (Shen et al., 2012).

Os acidentes de trânsito representam um grave problema de saúde pública tanto no Brasil quanto no mundo. A redução desses acidentes requer uma abordagem multifacetada, envolvendo melhorias na infraestrutura, campanhas de conscientização, leis rigorosas e o uso de tecnologias avançadas. Somente com esforços coordenados e contínuos será possível criar um ambiente viário mais seguro e reduzir significativamente o número de fatalidades e lesões no trânsito (Bastos et al., 2015).

4.3  Inteligência Artificial e Veículos de Carga

A abrangente aplicação da IA na condução autônoma de veículos de carga como, caminhões e ônibus, tem se mostrado como uma tecnologia revolucionária de extrema importância para a otimização do transporte de mercadorias, proporcionando eficiência e segurança sem precedentes.

Ao longo dos anos, a IA tem evoluído a passos largos, conquistando cada vez mais espaço nos veículos de carga. Sua integração nesses meios de transporte tem transformado a maneira como enxergamos o transporte de mercadorias, trazendo benefícios significativos para empresas e consumidores (Costa et al., 2020).

É essencial compreendermos o impacto da IA no contexto atual. Com a rápida evolução tecnológica, caminhões e ônibus autônomos estão se tornando uma realidade cada vez mais próxima. A IA permite que esses veículos sejam capazes de tomar decisões complexas de forma autônoma, garantindo uma condução precisa e eficiente. Além disso, essa integração da IA nos veículos de carga também contribui para a segurança nas estradas. Com a capacidade de analisar dados em  tempo  real, esses veículos podem identificar possíveis riscos e tomar medidas preventivas, reduzindo consideravelmente a incidência de acidentes (Coelho, 2023).

Portanto, entender a aplicação da IA na condução autônoma de caminhões e ônibus é fundamental para acompanhar as transformações que estão ocorrendo  no setor de transportes. Essa tecnologia tem prometido impulsionar a eficiência, a segurança e a produtividade, abrindo novas possibilidades e desafios para o futuro do transporte de mercadorias (Prado & Galbiatti, 2024).

4.4  Benefícios e Desafios da Utilização de Inteligência Artificial em Veículos de Carga

Os sistemas de IA aplicados a caminhões e outros veículos de carga têm o potencial de revolucionar a indústria de transporte, oferecendo uma série de benefícios tanto para as empresas de transporte quanto para a sociedade em geral.

Um aspecto fundamental da IA na condução de veículos de carga é a capacidade de processar grandes quantidades de dados em tempo real. Os caminhões equipados com sistemas de IA são capazes de coletar informações de sensores, câmeras e outros dispositivos para analisar o ambiente ao redor do veículo. Isso inclui a detecção de obstáculos, leitura de sinais de trânsito, reconhecimento de padrões e identificação de situações de risco. Essa capacidade de processamento permite que os veículos de carga sejam autônomos em certas situações, reduzindo a necessidade de intervenção humana (Souza & Silva, 2021).

Além disso, a IA pode ajudar na otimização das rotas de entrega. Com algoritmos avançados, os veículos de carga podem analisar informações em tempo real, como condições de trânsito, condições climáticas e padrões de demanda, para determinar as rotas mais eficientes. Isso resulta em economia de tempo, combustível e redução de emissões de gases poluentes, contribuindo para a sustentabilidade do setor de transporte de carga (Souza & Silva, 2021).

Outro aspecto importante é a segurança. Os sistemas de IA podem detectar comportamentos perigosos, como ultrapassagens arriscadas, desatenção do motorista e até mesmo sinais de fadiga. Esses sistemas podem alertar o motorista ou até mesmo tomar medidas corretivas, como aplicar os freios de forma autônoma. Com a adoção da IA na condução de veículos de carga, espera-se reduzir significativamente o número de acidentes relacionados ao transporte de carga (Almeida & Ferreira, 2020).

Por outro lado, a integração da IA na condução de veículos de carga significa uma maior dependência de sistemas complexos e tecnologicamente avançados. Podendo resultar em uma maior vulnerabilidade a falhas técnicas ou ataques cibernéticos, exigindo um alto nível de segurança e proteção dos sistemas (Almeida & Ferreira, 2020). Além disso, a automação proporcionada pela IA na condução de veículos de carga pode ter impactos negativos no emprego de motoristas profissionais. É necessário considerar medidas de transição para garantir a capacitação e requalificação dos profissionais afetados (Almeida & Ferreira, 2020).

A implementação da IA na condução de veículos de carga também levanta questões éticas e regulatórias. É necessário estabelecer diretrizes claras para o uso responsável da tecnologia, garantindo a segurança dos motoristas, pedestres e demais usuários das vias. Além disso, é importante promover uma transição suave entre os sistemas tradicionais e autônomos, garantindo a capacitação adequada dos profissionais envolvidos (Almeida & Ferreira, 2020).

4.5  Tecnologias-Chave em Inteligência Artificial para Condução Autônoma

As tecnologias-chave em IA usadas na condução autônoma são variadas e complexas, cada uma desempenhando um papel crucial na capacidade dos veículos de operar de forma segura e eficiente. Inicialmente para permitir que o veículo “veja” e compreenda seu ambiente, identificando objetos, pedestres, sinais de trânsito e outros elementos da via, utiliza-se uma visão computacional, que dispoe de redes neurais convolucionais (CNNs) para processar e interpretar imagens e vídeos em tempo real (Babiker et al., 2019).

Acoplado a esse sistema há o emprega redes neurais artificiais com múltiplas camadas para aprender padrões complexos a partir de grandes volumes de dados, chamado de “aprendizado profundo” (do inglês: Deep Learning), que é crucial para a tomada de decisões em situações de trânsito complexas e imprevisíveis (Carvalho, 2009).

Para melhorar a percepção do veículo em diferentes condições climáticas e de iluminação, faz-se a fusão de sensores, que combina dados de diversos sensores como câmeras, radares, LiDAR (tipo de sensor de profundidade que realiza mapeamento 3D com precisão, utilizando pulsos de laser), usando algoritmos de IA para criar uma representação precisa e abrangente do ambiente (Mohammed et al., 2020).

Sistemas de localização e mapeamento permitem que o veículo se localize com precisão e navegue em ambientes desconhecidos ou em mudança, utilizando técnicas de SLAM (Localização e Mapeamento Simultâneos, do inglês: Simultaneous Localization and Mapping) para criar e atualizar mapas em tempo real. Para o planejamento de trajetória são utilizados algoritmos de IA que calculam a rota mais segura e eficiente, considerando obstáculos, regras de trânsito e condições da via, que adaptam-se dinamicamente à mudanças no ambiente de condução. Para lidar com situações complexas de trânsito, como cruzamentos, entroncamentos ou bifurcações e ultrapassagens, utiliza-se técnicas de aprendizado por reforço e árvores de decisão para escolher as ações mais apropriadas em diferentes cenários de condução, chamados de sistemas de tomada de decisão. Associados ao um processamento de linguagem natural que permite a interação por voz entre o veículo e os passageiros, melhorando a experiência do usuário e a segurança (Mohammed et al., 2020).

Integrado a esses complexos sistemas há ainda redes 5G e comunicação V2X que facilitam a comunicação rápida entre veículos (V2V) e com a infraestrutura (V2I), melhorando a segurança e a eficiência do tráfego. Para o processamento de dados críticos localmente no veículo, reduzindo a latência e melhorando o tempo de resposta em situações críticas utiliza-se a computação de borda (do inglês: Edge Computing) e também o sistema de aprendizado federado que permite que os veículos aprendam coletivamente sem compartilhar dados sensíveis, melhorando a privacidade e a eficiência do sistema (Babiker et al., 2019; Mohammed et al., 2020).

Estas tecnologias trabalham em conjunto para criar sistemas de condução autônoma seguros e eficientes. À medida que a IA continua a evoluir, espera-se que essas tecnologias se tornem ainda mais sofisticadas, levando a níveis mais altos de autonomia e segurança na condução de veículos.

4.6  Redes Neurais Artificiais

Redes Neurais Artificiais (RNAs) aplicadas a veículos de carga são sistemas de IA inspirados no funcionamento do cérebro humano, utilizados para otimizar e melhorar diversos aspectos do transporte de cargas. As RNAs em veículos de carga funcionam processando grandes volumes de dados de entrada, aprendendo com padrões e experiências passadas, e fornecendo saídas que podem ser usadas para tomada de decisões ou automação de processos. Isso permite que os sistemas de transporte de carga se tornem mais inteligentes, eficientes e adaptáveis às mudanças nas condições operacionais (Carvalho, 2009).

Para isto são aplicados sistemas de tecnologias-chaves já descritas anteriormente organizadas em RNAs para otimização de rotas, onde RNAs podem analisar dados de tráfego, condições climáticas e outros fatores para determinar as rotas mais eficientes para veículos de carga, reduzindo tempo e custos de transporte. Para a manutenção preditiva em que é utilizado dados coletados de sensores nos veículos, para que as RNAs possam prever quando será necessária manutenção, reduzindo tempo de inatividade e custos de reparo. As RNAs podem otimizar o consumo de combustível analisando padrões de condução, carga e condições da Estrada, atuando na eficiência energética do veículo. Sistemas de assistência ao motorista baseados em RNAs podem melhorar a segurança, alertando sobre possíveis perigos ou condições perigosas na estrada. RNAs podem ajudar na gestão eficiente de frotas de veículos de carga, otimizando a utilização de recursos e melhorando a programação. Além de analisar dados históricos e tendências de mercado para prever a demanda de transporte, auxiliando no planejamento logístico. Como também, as RNAs podem ser usadas para reconhecimento de placas, inspeção de carga ou monitoramento do estado do veículo por meio do processamento de imagens pelas aplicações de visão computacional (Peixoto, 2020).

Acredita-se que com base na demanda que um veículo de carga exige, sejam utilizadas RNAs de acordo com o descrito a seguir:

Redes Neurais Feedforward (Alimentação Direta), pois são as mais comuns e versáteis, processando dados em uma direção, da entrada para a saída. E, podem ser usadas para otimização de rotas, previsão de manutenção e eficiência energética em veículos de carga (Babiker et al., 2019).

Redes Neurais Convolucionais (CNN), pois são especializadas em processamento de imagens e reconhecimento de padrões visuais. Úteis para sistemas de visão computacional em veículos de carga, como reconhecimento de placas de trânsito, detecção de obstáculos e inspeção de carga (Babiker et al., 2019).

Redes Neurais Recorrentes (RNN), que são adequadas para processar sequências de dados e prever séries temporais. E, podem ser aplicadas na previsão de demanda de transporte, análise de padrões de tráfego e otimização de consumo de combustível ao longo do tempo (Mohammed et al., 2020).

Redes Long Short-Term Memory (LSTM), um tipo especial de RNN, eficaz para aprender dependências de longo prazo. Úteis para previsões de longo prazo em logística, como planejamento de rotas e manutenção preventiva (Mohammed et al., 2020).

Redes Neurais Profundas (Deep Neural Networks), com múltiplas camadas ocultas, capazes de aprender representações complexas e podem ser aplicadas em sistemas avançados de assistência ao motorista e tomada de decisão autônoma (Mohammed et al., 2020).

Estas redes neurais podem ser implementadas em várias aplicações em veículos de carga, como sistemas de gerenciamento de frota, otimização de rotas, manutenção preditiva, eficiência energética e segurança. A escolha do tipo específico de rede neural dependerá da aplicação exata e dos requisitos do sistema em questão (Peixoto, 2020).

4.7  Segurança Viária

O tacógrafo desempenha um papel fundamental em veículos de carga, especialmente aqueles utilizados para transporte rodoviário de mercadorias. O dispositivo é um instrumento de medição que registra e armazena informações sobre o tempo de condução, velocidade e distância percorrida pelo veículo. Sua importância reside em diversas áreas relacionadas à segurança, regulamentação e gestão do transporte de carga (Brasil, 2012).

Um dos principais benefícios do tacógrafo é a promoção da segurança no trânsito. Ao registrar informações precisas sobre o tempo de condução, ele ajuda a evitar a fadiga do motorista, que é um dos principais fatores contribuintes para acidentes rodoviários. Além disso, o tacógrafo também registra a velocidade do veículo, o que auxilia no controle do cumprimento dos limites de velocidade e na identificação de comportamentos imprudentes (Fernandes & Alves, 2013).

Do ponto de vista regulatório, o tacógrafo é um equipamento obrigatório em muitos países, incluindo o Brasil, e seu uso está sujeito a normas e regulamentos específicos. Ele é utilizado para garantir o cumprimento das leis trabalhistas e de trânsito, bem como para verificar o cumprimento dos períodos de descanso obrigatórios para os motoristas profissionais. Sua utilização correta é essencial para evitar penalidades legais e assegurar a conformidade com as regulamentações vigentes, além de auxiliar na programação de rotas e horários, no cálculo de custos operacionais e na análise do desempenho dos veículos e motoristas (Santos et al., 2015).

Contudo, com a implementação de IA na condução de veículos, o tacógrafo anteriormente analógico e mais recentemente digital ganhou um aliado na monitorização da condução e desenpenho do veículo com a implementação de RNAs na segurança viária.

As RNAs contribuem significativamente para a segurança dos veículos de carga de várias maneiras, esses sistemas avançados de assistência ao motorista (ADAS), onde a RNAs podem processar dados de sensores em tempo real para detectar objetos, pedestres e outros veículos na estrada, permitem alertar o motorista sobre possíveis colisões ou situações perigosas, além de auxiliar em manobras como mudança de faixa (Andrade et al., 2014).

Auxiliam no monitoramento do motorista, no qual RNAs podem analisar imagens do motorista para detectar sinais de fadiga, distração ou sonolência. O sistema pode emitir alertas ou recomendar pausas quando necessário, reduzindo o risco de acidentes causados por erro humano. Atuam ainda na previsão de condições de tráfego e rota, as RNAs podem analisar dados históricos e em tempo real e, prever congestionamentos e condições perigosas na estrada, permitindo o planejamento de rotas mais seguras e eficientes. São eficientes na detecção de manutenção preditiva, pois as RNAs podem analisar dados dos sensores do veículo para prever falhas mecânicas antes que ocorram. Isso reduz o risco de acidentes causados por problemas mecânicos e aumenta a confiabilidade do veículo (Soares, 2023).

Quanto à otimização de carga, as RNAs podem calcular a distribuição ideal da carga no veículo, melhorando a estabilidade e reduzindo o risco de tombamentos. Fazem ainda a análise de comportamento de condução, no qual as RNAs podem analisar padrões de condução para identificar comportamentos de risco e fornecer feedback para melhorar a segurança. Atuam também nos sistemas de frenagem inteligentes, pois as RNAs podem otimizar os sistemas de frenagem, ajustando-os às condições da estrada e à situação de emergência.  E, utilizando a visão noturna e em condições adversas, por meio de processamento de imagens de câmeras especiais, as redes neurais podem melhorar a visibilidade do motorista em condições de baixa luminosidade ou mau tempo (Pacheco, 2023).

Estas aplicações de RNAs em veículos de carga contribuem para aumentar significativamente a segurança nas estradas, reduzindo o risco de acidentes e melhorando a eficiência do transporte de cargas.

4.8  Impactos que ocorrem na vida do cidadão e das empresas devido aos acidentes de trânsito

A responsabilidade civil em acidentes de trânsito no Brasil refere-se à obrigação de reparar os danos causados a terceiros decorrentes de acidentes automobilísticos. Essa responsabilidade está prevista no Código Civil brasileiro (Lei nº 10.406/2002) e pode ser aplicada tanto nos casos de culpa quanto nos casos de responsabilidade objetiva (Brasil, 2002).

No sistema de responsabilidade civil por culpa, é necessário comprovar que o causador do acidente agiu com negligência, imprudência ou imperícia para que seja responsabilizado pelos danos causados. Nesse caso, a vítima precisa demonstrar que o condutor do veículo agiu de forma inadequada, violando as normas de trânsito ou adotando comportamentos imprudentes que levaram ao acidente (Venosa, 2015).

Já no sistema de responsabilidade civil objetiva, previsto no Código Civil brasileiro, a obrigação de indenizar independe da comprovação de culpa. De acordo com o artigo 927, parágrafo único do Código Civil, o dono do veículo ou o seu condutor será responsável pelos danos causados, independentemente de culpa, nos casos em que o veículo estiver sendo utilizado para o exercício de atividade empresarial ou profissional. Nesses casos, basta a comprovação do nexo causal entre o acidente e os danos sofridos pela vítima para que o responsável seja obrigado a indenizá-la (Gonçalves, 2021).

Vale ressaltar que, em alguns casos, o próprio seguro obrigatório de danos pessoais causados por veículos automotores de via terrestre (DPVAT) pode ser acionado para indenizar as vítimas de acidentes de trânsito.

Já a responsabilidade penal nos crimes de trânsito no Brasil é regida pelo Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/1997) e por legislações complementares. Essas leis estabelecem as condutas proibidas no trânsito, bem como as penalidades correspondentes aos infratores (Brasil, 1997).

Nos casos em que há o cometimento de crimes de trânsito, a responsabilidade penal recai sobre o condutor do veículo envolvido no delito. As penalidades podem variar de acordo com a gravidade do crime e incluem desde multas e suspensão do direito de dirigir até a privação da liberdade em casos mais graves (Brasil, 2021).

Dentre os crimes de trânsito previstos na legislação brasileira, destacam-se: Homicídio culposo, quando o condutor, por negligência, imprudência ou imperícia, causa a morte de outra pessoa no trânsito. A pena para esse crime varia de acordo com a gravidade do caso e pode resultar em detenção de dois a quatro anos, além da suspensão ou proibição do direito de dirigir. Ainda há, a Lesão corporal culposa, quando o condutor causa lesões corporais em outra pessoa no trânsito, também por negligência, imprudência ou imperícia. A pena para esse crime é de detenção de seis meses a dois anos, além das penalidades administrativas aplicáveis. Também existe a infração de Embriaguez ao volante, que refere-se ao conduzir veículo sob a influência de álcool ou outras substâncias psicoativas. A pena prevista para esse crime é de detenção de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição do direito de dirigir. E por fim, também se aplica penalidade para Fuga do local do acidente, pois deixar de prestar socorro à vítima e fugir do local do acidente é considerado crime de trânsito. A pena para essa conduta varia de acordo com as circunstâncias do caso e pode resultar em detenção de seis meses a um ano, além de outras penalidades aplicáveis (Machado, 2020; Brasil, 2021).

É importante ressaltar que a aplicação das penalidades depende do devido processo legal, com direito à ampla defesa e ao contraditório. A responsabilidade penal nos crimes de trânsito é apurada por meio de inquéritos policiais e processos judiciais, seguindo os trâmites previstos na legislação brasileira (Machado, 2020).

4.9  O Papel do Períto Criminal nos Acidentes de Trânsito

A perícia de veículos envolvidos em acidentes de trânsito desempenha um papel fundamental na investigação e análise dos eventos. Essa perícia tem como objetivo identificar e documentar as evidências relacionadas ao acidente, fornecendo informações importantes para determinar as circunstâncias, causas e responsabilidades envolvidas (Kahn, 2004).

Ao realizar a perícia de veículos, alguns procedimentos devem ser seguidos para obter resultados precisos e confiáveis, como por exemplo a preservação do local do acidente. É essencial que o local do acidente seja preservado até que a perícia seja realizada. Isso inclui manter o veículo na posição em que ficou após o acidente, evitar a remoção de objetos ou peças do local e garantir a segurança de todos os envolvidos (Santos, 2013).

O registro fotográfico ou a documentação fotográfica detalhada também é fundamental para registrar o estado dos veículos envolvidos. As fotografias devem abranger diferentes ângulos, mostrando as áreas danificadas, pontos de impacto, posição dos veículos e qualquer evidência relevante no local do acidente (Silva, 2019).

Do mesmo modo, a coleta de evidências físicas, são importantes durante a perícia de veículos no local do acidente, como fragmentos de vidro, peças do veículo, marcas de frenagem e deformações na carroceria. Esses elementos fornecem informações sobre a velocidade, direção e ângulo de colisão, auxiliando na reconstrução do acidente (Santos, 2013).

Os peritos analisam os danos nos veículos para determinar a direção e a intensidade do impacto. Isso pode ser feito por meio da observação visual, medição de deformações e uso de ferramentas especializadas, como o paquímetro, para medir os danos estruturais. A verificação dos sistemas mecânicos envolvidos pelos peritos, como freios, direção, suspensão e pneus, ajudam a determinar se algum defeito mecânico pode ter contribuído para o acidente. E por fim, com base em todas as evidências coletadas e análises realizadas, é elaborado um laudo pericial detalhado. Esse documento descreve as conclusões da perícia, incluindo as causas prováveis do acidente, responsabilidades e quaisquer outras informações relevantes (Santos, 2013; Silva, 2019).

É importante ressaltar que a perícia de veículos envolvidos em acidentes de trânsito deve ser realizada por profissionais especializados, como peritos criminais, engenheiros de tráfego ou peritos de seguradoras, que possuam conhecimento técnico e experiência na área (Silva, 2019).

A diferença entre a perícia de veículos conduzidos por IA e veículos conduzidos sem IA reside na análise e investigação das informações específicas relacionadas a cada tipo de veículo. No caso de veículos conduzidos por IA, a perícia pode envolver a análise de registros e dados coletados pelos sistemas de IA. Isso inclui informações sobre o funcionamento dos sensores, câmeras, sistemas de navegação e controle autônomo do veículo. Os peritos podem examinar os registros de eventos, como a detecção de objetos, tomadas de decisões e ações executadas pelo sistema de IA durante o acidente (Marques, 2019).

Além disso, a perícia em veículos com IA pode exigir uma compreensão aprofundada dos algoritmos e sistemas de aprendizado de máquina utilizados no veículo. Os peritos podem investigar se o sistema estava devidamente treinado e atualizado, se as decisões tomadas foram coerentes com as configurações e parâmetros estabelecidos e se ocorreram falhas ou problemas técnicos no sistema durante o acidente (Marques, 2019).

Por outro lado, nos veículos conduzidos sem IA, a perícia pode se concentrar em outros aspectos, como a análise de marcas de frenagem, deformações na carroceria, danos mecânicos, avaliação das condições dos componentes do veículo e verificação de eventuais falhas mecânicas ou de manutenção. Os peritos podem examinar as condições do veículo antes e após o acidente para determinar se houve alguma contribuição direta para o ocorrido (Grillo, 2020).

Em ambos os casos, a perícia envolve a coleta de evidências físicas, registros fotográficos, análise de dados e outros elementos relevantes para a investigação do acidente. A diferença está na ênfase nas características específicas de cada tipo de veículo e nos sistemas envolvidos.

É importante destacar que a perícia de veículos com IA pode exigir expertise adicional aos perítos, em tecnologias de IA e sistemas integrados de navegação, assim como o acompanhamento dos avanços tecnológicos e regulamentações específicas relacionadas à condução autônoma e IA aplicada em veículos (Bonfim, 2019; Grillo, 2020).

5.   Regulamentação e Ética na Utilização de Inteligência Artificial em Veículos de Carga

A regulamentação e a ética na utilização de IA em veículos de carga são temas de crescente importância, especialmente à medida que essa tecnologia se torna mais prevalente no setor de transporte.

Reconhecendo a relevância dessa questão, algumas proposições legislativas como os projetos de lei, de autoria do Senador Styvenson Valentim (PL nº 5.051/2019), do Deputado Federal Eduardo Bismarck (PL nº 21/2020), e do Senador Veneziano Vital do Rêgo (PL nº 872/2021), foram recentemente apresentadas, tanto no Senado Federal quanto na Câmara dos Deputados, com o objetivo de estabelecer direções para o desenvolvimento e a aplicação de sistemas de IA no Brasil. Essas proposições compiladas no PL n° 2338/2023 pelo Senador Rodrigo Pacheco, seguem ainda em tramitassão no Senado Federal e, refletem o reconhecimento da importância de regulamentar a IA para garantir seu desenvolvimento responsável, ético e seguro no Brasil (Pacheco et al., 2023).

É fundamental estabelecer quem é responsável em casos de falhas nos sistemas de IA. Isso pode incluir fabricantes, operadores e programadores, e deve ser claramente definido nas regulamentações. As regulamentações devem garantir que os sistemas de IA sejam testados rigorosamente para evitar acidentes e garantir a segurança dos motoristas, passageiros e pedestres. Isso inclui a realização de testes em condições reais e a validação de algoritmos. Além disso, a utilização de IA em veículos de carga frequentemente envolve a coleta e análise de grandes volumes de dados. As regulamentações devem abordar questões de privacidade e proteção de dados, assegurando que as informações pessoais sejam tratadas de forma ética e segura (Pacheco et al., 2023).

As regulamentações também devem considerar o impacto ambiental dos veículos de carga equipados com IA, promovendo práticas que reduzam emissões de gases e incentivem a sustentabilidade.

Em relação a ética na utilização de IA, é essencial que os sistemas de IA sejam transparentes em suas operações. Os usuários e reguladores devem entender como as decisões são tomadas, especialmente em situações críticas. Ademais, a IA deve ser projetada para evitar preconceitos e discriminações. Isso implica na necessidade de treinar algoritmos com dados diversificados e representativos para garantir que as decisões sejam justas e imparciais. Deste modo, os desenvolvedores e operadores de sistemas de IA devem ter responsabilidade social e considerar o impacto social de suas tecnologias, assegurando que a implementação de IA em veículos de carga beneficie a sociedade como um todo (Machado & Oliveira, 2023).

Profissionais envolvidos na implementação e operação de sistemas de IA devem receber treinamento e capacitação adequados para compreender as implicações éticas e legais de seu uso. Pois, a ética na utilização de IA requer um monitoramento contínuo dos sistemas implantados para identificar e corrigir problemas que possam surgir após a implementação (Pacheco et al., 2023).

A regulamentação e a ética na utilização de IA em veículos de carga são fundamentais para garantir que essa tecnologia seja utilizada de forma segura, eficiente e responsável. A criação de normas claras e a promoção de práticas éticas não apenas protegem os usuários e o público em geral, mas também promovem a confiança na adoção de novas tecnologias no setor de transporte (Pacheco et al., 2023).

As tecnologias de IA estão revolucionando diversas áreas e prometem provocar mudanças econômicas e sociais ainda mais profundas num futuro próximo. O potencial transformador da IA é imenso, mas é essencial abordar os desafios éticos, regulatórios e sociais o quanto antes, para garantir que seu desenvolvimento e aplicação beneficiem a sociedade como um todo. No Brasil, a legislação sobre o assunto ainda está em discussão e segue em passos lentos enquanto que os países da União Europeia, bloco formado por 27 Estados, já aprovaram no ulímo mês de março a primeira lei global com regras amplas para uso e desenvolvimento dessa tecnologia (Soares, 2024).

6.   Perspectivas Futuras e Tendências Emergentes

A IA está revolucionando diversos setores, e o transporte de veículos de carga não é exceção. As perspectivas futuras e tendências emergentes da IA prometem transformar ainda mais este campo, trazendo avanços significativos em eficiência, segurança e sustentabilidade.

Segundo Breternitz (2020), os investimentos em IA no setor automobilístico têm crescido significativamente nos últimos anos. Em 2019, esses investimentos ultrapassaram a marca de um bilhão de dólares, com projeções de crescimento anual de 35% até 2026. Empresas líderes em tecnologia e automóveis, como Google, Tesla e Uber, estão na vanguarda do desenvolvimento de veículos autônomos, apresentando resultados promissores. Esse avanço é possibilitado pela aplicação de diversas tecnologias de IA e técnicas relacionadas, como RNAs, Deep learning, Clustering e Internet das Coisas (IoT), que simulam o funcionamento do cérebro humano para processar informações complexas, permitindo que os sistemas aprendam e melhorem com cada experiência registrada, agrupando dados similares para análise e tomada de decisões e conectando dispositivos para coletar e compartilhar dados em tempo real. Com o rápido crescimento dos investimentos e os avanços tecnológicos prevê-se que a IA continuará a transformar significativamente a indústria automobilística nos próximos anos.

Atualmente, a IA aplicada à condução de veículos não torna o veículo completamente autônomo, mas auxilia o motorista, com informações sobre problemas no veículo, consumo de combustível, estatísticas e, funcionalidades como monitoramento de pontos cegos, portas abertas, alertas sonoros e vibratórios de desvio de rota e outros (Mazon, 2023). Contudo, a indústria já tem apontado novas direções quanto a autonomia dos veículos, idealizando que os veículos se dirijam sozinhos, sem a intervenção humana, por meio da combinação de sensores, câmeras, radares, GPS e IA, rodando algoritmos que poderão tomar decisões acerca dos movimentos do veículo autonomamente (Breternitz, 2020). Estes veículos serão capazes de detectar pedestres, outros veículos, semáforos e condições da via, a fim de que as viagens fiquem mais seguras (Mazon, 2023). Quando esses veículos entrarem em operação regular, o US National Highway Traffic estima que os prejuízos causados por acidentes serão reduzidos em cerca de US$ 300 bilhões no período de cinco anos (Breternitz, 2020).

A análise preditiva por meio da disponibilidade de dados é o ponto central para o uso de IA com sucesso. Na medida em que mais dados vão sendo gerados, capturados e processados, poderemos desenvolver novas formas de utilizar IA para tornar o transporte mais eficiente e seguro. A implementação bem-sucedida dessas tecnologias dependerá de uma abordagem abrangente que considere não apenas os benefícios, mas também os desafios e questões éticas envolvidas. À medida que a IA continue a evoluir, espera-se que ela traga avanços ainda maiores no transporte de cargas (Mazon, 2023). As empresas que souberem aproveitar as potencialidades dessa tecnologia poderão se destacar no mercado e oferecer serviços mais eficientes, econômicos e sustentáveis.

7.   Conclusão e Considerações Finais

A taxa de acidentes envolvendo veículos de carga no Brasil é significativa, e esses acidentes podem ter consequências graves tanto para os envolvidos quanto para a sociedade em geral. A implementação de IA na condução de veículos de carga vem oferecendo recursos avançados de assistência ao motorista e sistemas de segurança, que prometem melhor logistica, desempenho e a diminuição de acidentes envolvendo esse tipo de veículos. É importante ressaltar que a tecnologia de IA pode contribuir para a prevenção de acidentes por meio de recursos como a detecção de obstáculos, o controle adaptativo de velocidade, o alerta de colisão e outros sistemas integrativos que formam as RNAs. No entanto, a adoção generalizada de veículos de carga conduzidos por IA e sua influência direta na taxa de acidentes ainda precisam ser avaliadas com mais detalhes.

Na perícia de acidentes de veículos conduzidos por IA, a perícia analiza os dados registrados pelos sistemas de RNAs, que inclui informações sobre o funcionamento dos sensores, câmeras, sistemas de navegação e controle autônomo do veículo. Os peritos podem ainda examinar os registros de eventos, como a detecção de objetos, tomadas de decisões e ações executadas pelo sistema de IA ou falhas técnicas e mecânicas durante o acidente, o que exige uma compreensão aprofundada dos algoritmos e sistemas de aprendizado de máquina utilizados no veículo, dos quais os peritos precisam estar capacitados e obter expertise adicional em tecnologias de IA e sistemas de RNAs, assim como o acompanhamento dos avanços tecnológicos e das regulamentações específicas relacionadas à condução autônoma e IA aplicada em veículos.

8.   Referencias Bibliográficas

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