REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ar10202504291539
Leandro do Nascimento¹
Resumo: O presente artigo tem como objetivo refletir sobre a atuação da Polícia Militar do Paraná no enfrentamento da violência doméstica e do feminicídio, destacando ações como a Patrulha Maria da Penha, o Aplicativo 190PR – Botão do Pânico e o Plano de Segurança PMPR para vítimas de violência doméstica. A partir da experiência prática do autor como policial militar por quase uma década, com pós graduação em Segurança Pública e Análise Criminal, e com base na metodologia de sucesso do Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência (PROERD), propõe-se a criação de um programa educativo voltado à prevenção da violência doméstica, com enfoque na promoção da igualdade de gênero e fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários. A abordagem interdisciplinar propõe uma integração entre segurança pública, educação e sociedade civil, visando a formação cidadã e a diminuição dos índices de violência de gênero no Estado do Paraná. O artigo utiliza metodologia qualitativa e bibliográfica, com base na legislação, doutrina e dados estatísticos.
Palavras-chave: Violência doméstica; Feminicídio; Polícia Militar; PROERD; Educação.
Abstract: This article aims to reflect on the performance of the Military Police of Paraná in confronting domestic violence and femicide, highlighting actions such as the Maria da Penha Patrol, the 190PR Application – Panic Button and the PMPR Security Plan for victims of domestic violence. Based on the author’s practical experience as a military police officer for almost a decade, with a postgraduate degree in Public Security and Criminal Analysis, and based on the successful methodology of the Educational Program for Resistance to Drugs and Violence (PROERD), it is proposed to create an educational program aimed at the prevention of domestic violence, focusing on the promotion of gender equality and strengthening family and community bonds. The interdisciplinary approach proposes an integration between public security, education and civil society, aiming at citizen education and the reduction of gender violence rates in the State of Paraná. The article uses qualitative and bibliographic methodology, based on legislation, doctrine and statistical data.
Keywords: Domestic violence; Femicide; Military police; PROERD; Education.
1. INTRODUÇÃO
O feminicídio configura-se como o assassinato de mulheres motivado por razões de gênero. A lei nº 13.104/2015, que alterou o Código Penal para incluir o feminicídio como circunstância qualificadora do homicídio, representa um marco no enfrentamento da violência contra a mulher no Brasil. Entretanto, a eficácia dessa norma depende da atuação coordenada entre diversos setores do Estado, com destaque para as forças de segurança pública.
No Paraná, observa-se um preocupante crescimento nos índices de violência doméstica, o que exige maior engajamento da Polícia Militar na prevenção e repressão a esse tipo de crime, visto que geralmente é o primeiro órgão a ser acionado. Neste cenário, instrumentos como a Patrulha Maria da Penha, o Aplicativo 190PR – Botão do Pânico e o Plano de Segurança PMPR demonstram avanços importantes. No entanto, é necessário ir além, ampliando e qualificando a atuação policial de forma estratégica e integrada.
Este trabalho busca refletir sobre essa situação, tomando como base a vivência prática do autor, policial militar há quase dez anos no Estado do Paraná, tendo atuado em diversas ocorrências que envolveram crimes de feminicídio ou tentativas. Pretende-se, assim, contribuir para a melhoria das iniciativas de enfrentamento à violência doméstica, propondo alternativas diante dessa grave forma de violência.
A metodologia utilizada no presente trabalho consiste na pesquisa bibliográfica, incluindo consultas à legislação, publicações oficiais sobre Patrulha Maria da Penha, Aplicativo 190PR – Botão do Pânico, Plano de Segurança PMPR, Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência (PROERD), artigos sobre o tema publicados na internet, entre outros.
2. CONCEITO E CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA DA VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER NO BRASIL
A violência contra a mulher no Brasil possui raízes históricas profundamente enraizadas em estruturas patriarcais que, por muito tempo, naturalizaram práticas de dominação e controle masculino no âmbito familiar. Até o final do século XX, os casos de agressão e assassinato de mulheres, sobretudo no ambiente doméstico, eram frequentemente tratados como questões de foro íntimo, muitas vezes desqualificados como “crimes passionais”, o que contribuía para a perpetuação da impunidade dos agressores (SOARES, 2015).
A mobilização dos movimentos feministas a partir da década de 1980 foi determinante para a construção de uma nova percepção social e jurídica acerca da violência de gênero. Essas articulações, somadas à crescente atenção internacional aos direitos humanos das mulheres – notadamente após a Convenção de Belém do Pará (1994)² –, impulsionaram o Estado brasileiro a adotar medidas legislativas e políticas públicas de enfrentamento à violência doméstica.
Nesse contexto, a promulgação da Lei nº 11.340/2006, conhecida como Lei Maria da Penha, representou um marco histórico. Reconhecendo a especificidade da violência doméstica e familiar contra a mulher, a norma estabeleceu mecanismos de prevenção, assistência e proteção, além de determinar a criação de juizados especializados, contribuindo para a visibilidade e o enfrentamento do fenômeno (BRASIL, 2006).
Apesar dos avanços, os índices de assassinatos de mulheres mantiveram-se elevados, revelando a necessidade de um instrumento jurídico específico para qualificar e punir os homicídios motivados por razões de gênero. Foi nesse cenário que sobreveio a Lei nº 13.104/2015, que inseriu o feminicídio como circunstância qualificadora do homicídio no artigo 121 do Código Penal brasileiro, além de incluí-lo no rol dos crimes hediondos.
A legislação define feminicídio como o homicídio cometido “contra a mulher por razões da condição de sexo feminino”, incluindo contextos de violência doméstica e familiar e de menosprezo ou discriminação à condição de mulher (BRASIL, 2015).
A tipificação do feminicídio buscou não apenas punir de forma mais severa tais crimes, mas também promover sua visibilidade estatística e simbólica, qualificando-os como manifestações extremas da violência de gênero. Ademais, a lei reforçou a necessidade de políticas públicas integradas de prevenção, como a ampliação da rede de atendimento, criação de casas-abrigo, centros de referência, patrulhas Maria da Penha e capacitação contínua dos profissionais da segurança pública e do sistema de justiça (WELZER-LANG, 2017).
Entretanto, mesmo com os avanços legislativos, persistem desafios significativos na identificação e investigação dos feminicídios, na estruturação de políticas públicas eficazes e na superação da cultura machista que ainda permeia muitos setores institucionais. A abordagem do feminicídio como um problema de segurança pública, saúde e justiça social, demanda uma atuação coordenada do Estado, em diálogo com a sociedade civil e os movimentos de mulheres.
Assim, a construção histórica do combate ao feminicídio no Brasil está intrinsecamente ligada à trajetória das políticas públicas de enfrentamento à violência doméstica, que refletem uma lenta, porém progressiva, transição do silêncio e da omissão para o reconhecimento institucional da gravidade dessa violação de direitos humanos.
3. A ATUAÇÃO DA POLICIA MILITAR DO PARANÁ NO ENFRENTAMENTO À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
No Estado do Paraná, a Polícia Militar desempenha função essencial no enfrentamento à violência doméstica, com a adoção de várias iniciativas de prevenção e proteção às vítimas. Dentre essas iniciativas, podemos destacar a implantação da Patrulha Maria da Penha, o Aplicativo 190PR – Botão do Pânico e o Plano de Segurança PMPR para vítimas de violência doméstica. Passamos a analisar abaixo cada uma dessas iniciativas.
3.1 Patrulha Maria da Penha
Implantada em diversas cidades do Paraná a partir de 2014, a Patrulha Maria da Penha tem como principal objetivo garantir o cumprimento das medidas protetivas de urgência, atuando de forma proativa na proteção das vítimas. A Patrulha Maria da Penha faz parte da política de Prevenção e Repressão à violência doméstica e familiar da Polícia Militar do Paraná. É composta por policiais militares, mulheres e homens, que realizam visitas preventivas pós-delito com base em boletins de ocorrência registrados tanto na Polícia Militar quanto na Polícia Civil ou motivados por denúncias anônimas recebidas de outras fontes, como do disque denúncia 181 (telefone ou site -https://www.181.pr.gov.br/).
Ainda, as equipes policiais realizam visitas de fiscalização de medidas protetivas de urgência determinadas pelo Poder Judiciário. O trabalho abarca o contato com vítimas e autores com a finalidade de instruir e orientar as partes envolvidas, evitando a reincidência de situações de violência.
A Patrulha Maria da Penha é coordenada pela Polícia Militar do Paraná e está presente em diversas cidades do Estado, contudo, em alguns municípios a Patrulha é constituída pela Guarda Municipal, onde o próprio município assume a coordenação do programa. Abaixo segue algumas cidades paranaenses que já contam com a Patrulha Maria da Penha.
a) Curitiba – Serviço realizado pela Guarda Municipal resultante da parceria entre a Prefeitura Municipal (Secretaria de Defesa Social e Trânsito) e o Tribunal de Justiça do Paraná (Coordenadoria Estadual da Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar)³.
b) Londrina – Instituída pela Lei Municipal nº 13.246/2021, a Patrulha Maria da Penha atua por meio de equipes da Guarda Municipal capacitadas para fazer os atendimentos de emergência, atuando na proteção, prevenção, monitoramento e acompanhamento das mulheres vítimas de violência doméstica no âmbito do Município4.
c) Cascavel – Os trabalhos da Patrulha Maria da Penha são realizados pela Guarda Municipal e são desenvolvidos 24 horas por dia. A Patrulha se tornou um braço amigo das mulheres vítimas da violência que podem contar com as equipes para superarem momentos difíceis e se reerguerem5.
d) Araucária – A Patrulha Maria da Penha é exercida pela Guarda Municipal de Araucária (GMA) em parceria com o 29.º Batalhão da Polícia Militar de Pinhais.
Além desses, outros municípios do Estado contam com a Patrulha Maria da Penha, como Foz do Iguaçu, Toledo, Arapongas (desde 2015-2016), Ponta Grossa, Sarandi, São José dos Pinhais, Maringá, Cascavel (desde 2017), Paranavaí (desde 2018), Apucarana e região (desde 2024), Paranaguá (desde 2019).
Nesse contexto, vale ressaltar a iniciativa da Guarda Municipal de Araucária que realizou até o dia 10 de abril de 2025, em sua sede, o 1.º Curso de Patrulha Maria da Penha. A capacitação foi voltada a profissionais da área de segurança pública do município, com a participação de guardas municipais de Campo Largo, Colombo, Fazenda Rio Grande, Pinhais, São José dos Pinhais e Telêmaco Borba, além de policiais militares do 29.º BPM de Pinhais.
Isso mostra a credibilidade dessa política de enfrentamento à violência doméstica, tanto que a juíza Débora Redmond, que participou do evento6, destacou que a iniciativa representa o compromisso renovado da rede de proteção com a dignidade da mulher e o enfrentamento à violência doméstica. A magistrada ressaltou a importância da Patrulha nesse processo de enfrentamento. “A Patrulha Maria da Penha é muito mais do que uma política pública de segurança. Ela simboliza o elo entre o poder judiciário, o sistema de justiça e as mulheres que, por tanto tempo, tiveram suas vozes silenciadas”.
A magistrada enfatizou, ainda, a importância da atuação conjunta entre os diversos órgãos e profissionais.
“Trata-se de um esforço coletivo para garantir que medidas protetivas não fiquem apenas no papel, mas sejam efetivamente acompanhadas e respeitadas. Cada decisão judicial nessa área carrega o peso de proteger vidas e evitar que mais uma estatística se transforme em tragédia”.
Diante disso, não há dúvida de que a Patrulha Maria da Penha é uma iniciativa exitosa no enfrentamento à violência de gênero, sobretudo no que tange à fiscalização das medidas protetivas. No entanto, a ausência do serviço na maioria dos municípios paranaenses, sobretudo os de menor população, revela a necessidade urgente de ampliação da patrulha para garantir proteção igualitária a todas as mulheres do Estado.
Portanto, espera-se que haja um fortalecimento da estrutura organizacional da PMPR e das Guardas Municipais, além do fomento de convênios entre os municípios e o Tribunal de Justiça para viabilizar a universalização do serviço.
3.2. O Aplicativo 190PR – Botão do Pânico
O Aplicativo 190PR – Botão do Pânico é uma ferramenta tecnológica da Polícia Militar do Paraná (PMPR) em parceria com o Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR), a Secretaria de Estado da Justiça, Família e Trabalho (SEJUF), a Companhia de Tecnologia da Informação e Comunicação do Paraná (CELEPAR) e a Assembleia Legislativa. Lançado oficialmente em março de 2021, o aplicativo visa oferecer uma resposta rápida e eficiente às mulheres vítimas de violência doméstica que possuem medidas protetivas de urgência.
O aplicativo 190PR permite que mulheres com medidas protetivas acionem a Polícia Militar de forma discreta e imediata. Ao pressionar o botão vermelho disponível na interface do aplicativo, a vítima envia um alerta à central de operações da PM, que recebe a localização geográfica em tempo real e uma gravação de áudio ambiente de até 60 segundos. Essas informações são fundamentais para que a equipe policial compreenda a situação antes de chegar ao local.
Dados da pagina eletrônica da Polícia Militar do Paraná revelam que desde a sua implementação, o Botão do Pânico tem demonstrado eficácia no combate à violência doméstica no Paraná: Somente em junho de 2021, cerca de 200 mulheres com medida protetiva já haviam utilizado o recurso. Até o final de julho de 2021, o serviço foi expandido para todo o Estado, estando disponível em todos os municípios paranaenses.
Desse modo, resta evidente que o Botão do Pânico representa um avanço significativo nas políticas públicas de enfrentamento à violência doméstica no Paraná. Sua implementação demonstra o comprometimento do Estado em utilizar a tecnologia como aliada na proteção das mulheres e na promoção de uma sociedade mais segura e justa.
Contudo, os dados mostram que muitas mulheres vítimas de violência ainda não utilizaram o Botão do Pânico, o que indica a necessidade de investir em campanhas de divulgação e aprimoramento tecnológico, além de ampliar o acesso ao aplicativo em todas as regiões do Estado, incluindo as áreas rurais, que a depender da localização da vítima e o horário da ocorrência, pode dificultar o acesso das forças de segurança.
3.3. Plano de Segurança PMPR para vítimas de violência doméstica
Além da Patrulha Maria da Penha e do Aplicativo 190PR – Botão do Pânico, a Polícia Militar do Paraná tem implementado um Plano de Segurança para as vítimas de violência doméstica.
Trata-se de uma cartilha com o passo a passo de procedimentos que pode auxiliar a vítima em situações de violência. Entre os procedimentos estão orientações para: identificar o índice de violência e abuso no relacionamento; preparar um plano de segurança para futuro episódio de violência; procedimentos no caso de decidir romper com o ciclo de violência e sair de casa; procedimentos para prevenção em caso de invasão à residência; de como agir em caso de cárcere privado, além de orientações sobre medida protetiva7.
As orientações do plano são objetivas e de fácil compreensão, e em tempos de aumento de atos de violência contra a mulher, a colocação do plano em prática, pode fazer a diferença entre a vida e a morte para dezenas de mulheres em situação de violência doméstica.
4. PROPOSTA DE MELHORIA DO ENFRENTAMENTO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA COM BASE NAS AÇÕES DO PROERD
Com base na vivência do autor como policial militar por quase 10 anos e também por conhecer a eficácia do Programa Educacional de Resistência às Drogas e à Violência (PROERD), tem-se que este programa tem muito a oferecer para a melhoria da Atuação da Polícia Militar do Paraná contra a violência doméstica.
O PROERD consiste num esforço cooperativo entre a Polícia Militar, escola e família, visando, através de atividades educacionais em sala de aula, prevenir o uso/abuso de drogas e a prática de atos de violência entre estudantes do Ensino Fundamental (5° e 7° anos).
O Programa Educacional tem por base o Projeto DARE (Drug Abuse Resistance Education), implantado em 1983, em Los Angeles/EUA, pelos Departamentos de Polícia e de Educação daquela Cidade (pedagogos, psicólogos, policiais, etc.). Atualmente, o DARE estende-se a 58 países como Austrália, México, Bolívia, EUA, Colômbia, Japão, Porto Rico, Nova Zelândia, Canadá; no Brasil, é adotado em 23 Estados e no Distrito Federal.
No Paraná o Programa Educacional já conta com mais de 21 anos de atividade, tendo formado mais de 1,7 milhões de alunos e tem revelado bons resultados. Na comemoração dos 21 anos de atuação do programa em Curitiba, o Comandante do Batalhão de Polícia Escolar Comunitária destacou que o projeto está fortalecido:
O Proerd está vinculado ao Batalhão de Polícia Escolar Comunitária (BPEC), unidade subordinada ao Comando de Policiamento Especializado (CPE). Segundo o Comandante do CPE, coronel Wagner Lúcio dos Santos, o projeto já está fortalecido, não apenas no Paraná, mas no Brasil também. “O Proerd já salvou inúmeras crianças as afastando das drogas. É muito importante esse contato da comunidade escolar com a Polícia Militar para que as pessoas saibam qual é o verdadeiro propósito da Corporação, que é levar mais segurança para a sociedade”, disse8.
De acordo com o programa, a capacitação dos Policiais Militares Instrutores envolve um treinamento de 80 horas/aula, com conteúdo específico na área de ensino e aprendizado da metodologia do DARE, que adaptada à realidade brasileira proporciona ao Policial Militar Instrutor as habilidades necessárias ao desenvolvimento do Plano de Estudos em sala de aula, garantindo a certeza da manutenção da qualidade das ações do PROERD.
Assim, a Polícia Militar é inserida, como deve ser observadas as dimensões constitucionais que lhes são atribuídas, uma Polícia Militar moderna, parceira, interativa e, sobretudo, entendendo que, aliado à preocupação com a oferta de drogas, há que se ter a devida atenção para a redução dessa demanda.
Portanto, se o PROERD é desenvolvido pela Polícia Militar do Paraná e é implementado com sucesso no enfrentamento ao uso das drogas, atuando de forma preventiva junto a crianças, adolescentes e famílias, utilizando uma metodologia pedagógica que promove o protagonismo juvenil e o fortalecimento de vínculos, do mesmo modo, tem-se que este modelo pode ser utilizado como ações formativas e comunitárias no combate à violência doméstica.
Mesmo porque, a criação de um Programa Educativo Comunitário da Polícia Militar, nos moldes do PROERD, voltado à prevenção da violência doméstica, àeducação para a igualdade de gênero e aofortalecimento dos vínculos familiares e comunitários, com envolvimento direto da Polícia Militar e de instituições parceiras, trata-se de uma iniciativa que já deu certo no próprio Estado do Paraná, inclusive em vários outros Estados do País.
Desse modo, seguindo a mesma dinâmica do PROERD, mas voltado para a prevenção à violência doméstica, seria perfeitamente possível criar um Programa Educacional de Prevenção à Violência Doméstica (PROERDVID). Nesse passo, convém relembrar que a educação é um direito de todos garantido na Constituição Federal (BRASIL, 1988), independente de idade, conforme reza o artigo 205:
“Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.”
Veja que o PROERD é um programa que ensina às crianças a resistirem às drogas, e ainda, a resistirem na prática as ofertas de certas pressões dos grupos, e de atos violentos, que nesse ponto, tem relação direta com a violência doméstica.
É certo que os pais são os atores principais quanto o assunto é violência contra a mulher, contudo, é possível incluir os pais no programa por meio da Associação de Pais e Mestres, já existentes nas escolas, além de outros projetos que podem ser implementados visando participação mais efetiva dos pais no ambiente escolar.
Assim, a ideia é envolver a família por meio da escola, e a experiência positiva da Polícia Militar do Paraná na implementação do PROERD, que contribuiu com a formação de milhares de alunos desde sua implantação em 2000, sem dúvida pode ser um facilitador para a implementação do PROERDVID.
Evidente que tal iniciativa não pode ser uma atitude isolada da Polícia Militar, deve-se buscar o envolvimento de outros atores interessados, como a Secretaria de Estado da Educação, Secretarias Municipais de Educação, Núcleos Regionais de Educação e as Escolas Particulares, além da participação efetiva da família e comunidade, sobretudo porque o enfrentamento da violência requer o engajamento de toda a sociedade.
4.1 Vantagens do PROERDVID diante do cenário atual
A criação do PROERDVID representa uma resposta proativa e inovadora diante da escalada da violência doméstica no Paraná. Dentre suas principais vantagens, destacam-se:
4.1.1 Prevenção primária eficaz: Assim como o PROERD atua na prevenção ao uso de drogas desde a infância, o PROERDVID pode atuar de forma preventiva na formação de valores sociais, trabalhando temas comorespeito, empatia, resolução de conflitos, igualdade de gênero e valorização da vida familiardesde os primeiros anos escolares.
4.1.2 Ação estruturada e com metodologia validada: Baseado em uma metodologia pedagógica e policial já consolidada no PROERD, o PROERDVID se beneficiaria de uma estrutura já testada, adaptada à realidade escolar e com eficácia comprovada, o que garantiria maior aceitação da sociedade e menor resistência institucional para sua implementação.
4.1.3 Proximidade entre polícia, escola e comunidade: O PROERDVID, ao colocar policiais capacitados em contato direto com estudantes, pais e educadores, fortalece laços de confiança e cooperação entre a Polícia Militar e a comunidade. Isso contribui para uma cultura de paz e maior efetividade nas ações preventivas e repressivas da corporação.
4.1.4 Redução da reincidência de violência doméstica no médio e longo prazo: Ao educar crianças e adolescentes sobre os riscos, as causas e os sinais da violência doméstica, o programa colabora com a quebra de ciclos intergeracionais de agressividade, contribuindo para a redução de novos casos ao longo do tempo.
4.1.5 Integração com políticas públicas já existentes: O PROERDVID pode ser integrado com outras políticas de enfrentamento à violência, como a Patrulha Maria da Penha, o Botão do Pânico e os atendimentos da rede socioassistencial, otimizando recursos e promovendo ações coordenadas entre os órgãos.
Assim, diante do crescimento dos casos de violência doméstica e feminicídio no Paraná, torna-se urgente a implementação de políticas públicas que transcendam o caráter repressivo e atuem diretamente na formação de uma nova consciência social. A proposta de criação do PROERDVID, nos moldes do bem-sucedido PROERD, representa uma estratégia promissora de prevenção primária, baseada na educação, na construção de vínculos e na valorização dos direitos humanos.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O enfrentamento à violência doméstica e ao feminicídio no Brasil, especialmente no Estado do Paraná, exige ações coordenadas, contínuas e estrategicamente estruturadas, envolvendo diferentes instituições estatais e a sociedade civil.
A análise realizada ao longo deste trabalho evidenciou os avanços importantes promovidos por iniciativas da Polícia Militar do Paraná, juntamente com as Guardas Municipais, como a Patrulha Maria da Penha, o Aplicativo 190PR – Botão do Pânico e o Plano de Segurança PMPR para vítimas de violência doméstica. Tais políticas públicas demonstram o potencial das forças de segurança na proteção de mulheres em situação de vulnerabilidade.
Contudo, ainda que relevantes, essas iniciativas não são suficientes para erradicar a violência de gênero, cuja raiz está fortemente enraizada em uma cultura patriarcal historicamente consolidada. A ausência de cobertura universal da Patrulha Maria da Penha, bem como a necessidade de maior divulgação e capacitação para o uso adequado do Botão do Pânico, indica que há importantes lacunas a serem superadas.
Neste sentido, propõe-se a criação de um Programa Educacional de Prevenção à Violência Doméstica (PROERDVID), inspirado na metodologia bem-sucedida do PROERD. A atuação preventiva e pedagógica da Polícia Militar, em parceria com escolas, famílias e demais instituições, pode contribuir para a formação de uma cultura de respeito, igualdade de gênero e não violência, fortalecendo vínculos comunitários e promovendo transformações sociais significativas.
A experiência prática do autor como policial militar e também conhecedor do PROERD reforça a viabilidade dessa proposta. A implementação do PROERDVID representaria não apenas o cumprimento do papel constitucional da Polícia Militar como força de prevenção, mas também a afirmação de um compromisso ético e social com a proteção da vida das mulheres.
Dessa forma, conclui-se que o aprimoramento das políticas públicas de enfrentamento à violência doméstica no Paraná passa, necessariamente, pela articulação entre repressão qualificada, acolhimento das vítimas, capacitação permanente das forças de segurança e educação preventiva. Tais ações, integradas e sustentadas por uma abordagem intersetorial, podem efetivamente contribuir para a redução da violência doméstica no Estado do Paraná, bem como servir de incentivo para os demais Estados do País com vista a construção de uma sociedade mais justa, igualitária e segura para todas as mulheres.
²Decreto nº 1.973, de 1º de agosto de 1996. Promulga a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher, concluída em Belém do Pará, em 9 de junho de 1994. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1996/d1973.htm. Acesso em: 23 abr. 2025.
³Patrulha Maria da Penha. Disponível em: https://www.curitiba.pr.gov.br/servicos/patrulha-maria-da-penha-telefone-153/7. Acesso em: 24 abr. 2025.
4Patrulha Maria da Penha. Disponível em: https://temlondrina.com.br/cidade/patrulha-maria-da-penha-em-londrina-passa-a-ser-garantida-por-lei-municipal/. Acesso em abr. 2025.
5Patrulha Maria da Penha. Disponível em: https://cascavel.atende.net/cidadao/noticia/patrulha-maria-da-penha-festas-de-fim-de-ano-aumentam-casos-de-violencia-contra-a-mulher.Acesso em: 24 abr. 2025.
6Curso de Patrulha Maria da Penha. Disponível em: https://g1.globo.com/pr/parana/especial-publicitario/municipio-de-araucaria/araucaria-noticias/noticia/2025/04/10/araucaria-promove-curso-para-profissionais-de-seguranca-sobre-a-lei-maria-da-penha.ghtml. Acesso em 24 abr. 2025.
7Disponível em: https://www.pmpr.pr.gov.br/Pagina/Patrulha-Maria-da-Penha. Acesso em 24 abr. 2025.
8Disponível em: https://www.pmpr.pr.gov.br/Noticia/Proerd-comemora-21-anos-de-atuacao-no-Parana-com-entrega-de-medalhas-em-Curitiba. Acesso em 23 abr. 2025.
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¹Licenciado em Letras pela Faculdade Anhanguera de Ponta Porã-MS. Pós Graduado “Lato Sensu” em Segurança Pública e Análise Criminal pela Faculdade UNINA-PR. E-mail: leandro@hotmail.com.