O DIREITO DAS CUSTODIADAS TRANSEXUAIS E TRAVESTIS DE CUMPRIREM PENA EM UNIDADES PRISIONAIS COMPATÍVEIS COM O GÊNERO FEMININO: A INSEGURANÇA JURÍDICA COMO FATOR DE VIOLAÇÃO DE DIREITOS 

THE RIGHT OF TRANSSEXUAL AND TRANSVESTITE PRISONERS TO SERVE THEIR SENTENCE IN PRISION UNITS COMPATIBLE WITH THE FEMALE GENDER: LEGAL UNCERTAINTY AS A FACTOR IN THE VIOLATION OF RIGHTS

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ar10202411150049


Giulliano Carneiro Costa¹
Cleverton Reikdal²


Resumo

A presente pesquisa tem como objetivo analisar como o uso de normativos jurídicos baseados exclusivamente na diferença sexual biológica gera uma situação de insegurança física, moral e mental para mulheres transexuais e travestis que cumprem pena em regime fechado no sistema prisional brasileiro. Constatou-se que o exercício do direito de escolha do estabelecimento prisional não é compatível com a legislação nacional voltada à proteção da dignidade da pessoa humana, uma vez que o Estado deve reconhecer que a identidade de gênero não é uma escolha, mas sim uma parte intrínseca do ser humano. Por meio de uma análise jurídica e social, o trabalho aborda como a ausência de diretrizes claras para alocação de pessoas travestis e transexuais em estabelecimento prisional compatível, assim como a morosidade do Judiciário brasileiro em analisar temas sensíveis, gera uma insegurança jurídica que contribui para a violação de direitos dessas custodiadas. Inicialmente será abordado a relação sistema carcerário com as pessoas transexuais e travestis. Na sequência será abordada a evolução dos direitos e os instrumentos legais de proteção das pessoas transexuais e travestis em privação de liberdade. Por fim, é apresentado como a insegurança jurídica acerca do tema viola direitos fundamentais e expõe as custodias a situações de completo desrespeito ao princípio da dignidade da pessoa humana e o direito a não tortura.   

Palavras-chave: Sistema Prisional. Transexuais. Travestis. Insegurança Jurídica. Violação de Direitos.

Abstract

The aim of this research is to analyze how the use of legal regulations based exclusively on biological sexual difference has created a situation of physical, moral and mental insecurity for transsexual women and transvestites serving time in the Brazilian prison system. It was found that exercising the right to choose the prison is not compatible with national legislation aimed at protecting the dignity of the human person, since the state must recognize that gender identity is not a choice, but an intrinsic part of being human. Through a legal and social analysis, the paper addresses how the absence of clear guidelines for the placement of transvestites and transsexuals in compatible prisons, as well as the slowness of the Brazilian judiciary in analyzing sensitive issues, creates legal uncertainty that contributes to the violation of the rights of these prisoners. Initially, the relationship between the prison system and transsexuals and transvestites will be discussed. Next, the evolution of rights and the legal instruments for protecting transsexuals and transvestites in detention will be addressed. Finally, it will be presented how legal uncertainty on the subject violates fundamental rights and exposes custodians to situations of complete disrespect for the principle of human dignity and the right not to be tortured. 

Keywords: Prision System. Transsexual. Transvestites. Legal Insecurity. Violation of Rights

INTRODUÇÃO

No contexto jurídico brasileiro, garantir o direito das pessoas transexuais e travestis de cumprirem pena em estabelecimentos prisionais condizentes com sua identidade de gênero é uma questão de relevância e complexidade, pois envolve a proteção de direitos fundamentais e o desafio de adaptar o sistema prisional às necessidades específicas de dignidade e segurança. Este artigo se propõe a examinar, a partir de pesquisa bibliográfica e análise de jurisprudências, como a insegurança jurídica pode impactar os direitos dessas pessoas, gerando riscos de violações. Ao discutir decisões judiciais e interpretações legais, o estudo visa contribuir para o avanço de diretrizes que assegurem condições de dignidade e respeito às identidades de gênero nos espaços de privação de liberdade.

O sistema prisional brasileiro, comumente marcado pela superlotação e por condições degradantes, apresenta riscos e desafios especialmente graves para pessoas transexuais e travestis e para gestores das unidades. Aquelas enfrentam não apenas as condições adversas das prisões, mas também uma intensa vulnerabilidade à violência, seja ela física, psicológica ou sexual, devido à falta de respeito à sua identidade de gênero. Enquanto estes enfrentam a ausência de normativos jurídicos que assegurem ações administrativas efetivas num tratamento específico às pessoas transexuais e mulheres travestis.

A existência de algumas normas não é suficiente para garantir todos os direitos fundamentais dessa população. O não cumprimento da Resolução CNJ nº 348/2020, que determina que essas pessoas possam escolher o local de cumprimento de pena conforme a identidade de gênero autodeclarada, expõe as transexuais e travestis a contextos inseguros, agravando sua situação de vulnerabilidade e pouca, ou nenhuma ação, enquanto política pública, é tomada por parte da gestão pública que vise modificar esse contexto. Neste artigo, portanto, examina-se a evolução e as limitações jurisprudenciais sobre esse direito, discutindo como ele surge e como a insegurança jurídica em torno da alocação dessas pessoas nas unidades prisionais apropriadas impacta diretamente na proteção e dignidade dos indivíduos, em consonância com a necessidade de condições seguras e adequadas no sistema prisional brasileiro.

As pessoas travestis e transexuais representam historicamente um grupo vulnerável e marginalizado socialmente, vítimas constantes da discriminação e da violência nos mais variados contextos. Essa vulnerabilidade se intensifica quando essas pessoas estão sob a tutela do Estado recolhidas no sistema carcerário, ambiente no qual as violações de direitos humanos, no âmbito geral, e a negação da identidade de gênero é uma constante.

A relevância deste estudo reside na necessidade de compreender os obstáculos que impedem a plena garantia dos direitos das pessoas transexuais e travestis no sistema prisional. Ao evidenciar as violações ocorridas e as persistentes desigualdades, busca-se estimular a adoção de medidas concretas para garantir a efetivação do direito à identidade de gênero no contexto carcerário.

1. Pena, sistema carcerário e as pessoas transexuais e travestis 

A pena é a sanção à disposição do Estado para que o criminoso retribua o injusto causado à sociedade e, mais especificamente, à vítima. Portanto, tem a pena o caráter retributivo ao delito perpetrado e, não obstante, está presente na pena também o caráter pedagógico, que se traduz na prevenção a novos crimes, ou seja, cabe a pena desencorajar o cometimento de novos atos infracionais. “Ninguém pode negar que a pena é um mal que se impõe como consequência de um delito. A pena é, sem dúvida, um castigo”3.

“Essa obviedade da prisão, de que nos destacamos tão mal, se fundamenta em primeiro lugar na forma simples da privação de liberdade4“. Para uma sociedade que tem a liberdade como um bem pertencente a todos na mesma medida, seria a prisão a pena por excelência, aquela que teria o mesmo preço para todos, o castigo igualitário?5

Dentre os tipos de pena que se pode impor à pessoa condenada estão as restritivas de liberdade, que se dividem em: reclusão, que é destinada a crimes mais graves, sendo cumprida em regime fechado, semiaberto ou aberto. Geralmente, sua execução ocorre em estabelecimentos de segurança máxima ou média; detenção, que é aplicada para condenações mais leves e não permite o início do cumprimento em regime fechado. Normalmente, é cumprida em regime semiaberto, em locais como colônias agrícolas ou industriais, ou em regime aberto, em casas de albergado ou estabelecimentos adequados e; prisão simples, prevista na Lei de Contravenções Penais, é aplicada para condutas consideradas contravenções, que são infrações penais de menor gravidade. Seu cumprimento ocorre sem o rigor do regime penitenciário, em estabelecimentos especiais ou em seções especiais de prisão comum, sempre em regime aberto ou semiaberto, sendo esses os únicos permitidos para a prisão simples6.

Portanto, o encaminhamento da pessoa condenada ao local de cumprimento da pena se dará em razão da pena aplicada.

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5, inciso XLVIII7, assegura que a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo8 da pessoa apenada. Nessa mesma linha segue o inciso XLIX9, que assegura aos presos o respeito à integridade física e moral. 

No entanto, quando se fala de cumprimento de pena e sistema carcerário brasileiro, não é incomum dispositivos constitucionais, legais e infralegais serem negligenciados, inclusive pelo próprio Judiciário, como é o caso da superlotação, a precariedade da saúde dos detentos, desrespeito a princípios Constitucionais e, mais especificamente, o caso das pessoas transexuais condenadas a pena restritiva de liberdade.

 O Anuário Brasileiro de Segurança Pública 202310, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, mostra que o Brasil tem 832.295 pessoas privadas de liberdade no sistema penitenciário (826.740) e sob custódia das polícias (5.555), o equivalente a 409,9 presos para cada 100 mil habitantes. O Sistema Penitenciário dispõe de 596.162 vagas, o que gera um déficit de 230.578 vagas (1,4 presos por vaga), considerando apenas aqueles privados de liberdade no sistema penitenciário (826.740). O anuário, na tabela 76 (p. 278), apresenta o total de pessoas privadas de liberdade por tipo de estabelecimento e sexo, mostrando que das 826.740 pessoas privadas de liberdade, 781.481 são do sexo masculino e 45.259 do sexo feminino. O levantamento considera somente o sexo biológico, ignorando a identidade e expressão de gênero e demonstrando o estado de invisibilidade a que as pessoas transexuais e travestis estão submetidas.

Tomás11 explora três formas fundamentais de reconhecimento na sociedade: o amor, o direito e a estima social, cada uma desempenhando um papel essencial no desenvolvimento da identidade e do autovalor. O reconhecimento afetivo, dado nas relações familiares e de amizade, oferece um alicerce emocional, importante para o autorrespeito e o desenvolvimento pessoal. A ausência desse reconhecimento pode levar a uma perda de autoestima e de autovalorização.

No segundo modelo, o reconhecimento jurídico, encontramos o direito civil, que protege a pessoa e lhe garante autonomia, o direito político, que permite a participação ativa na democracia, e o direito social, assegurando uma distribuição justa dos recursos. Cada uma dessas dimensões carrega consigo uma luta histórica: os direitos civis e políticos foram consolidados nos séculos XVIII e XIX, enquanto os direitos sociais continuam a ser uma batalha que busca mais justiça e inclusão. A falta de reconhecimento em qualquer uma dessas esferas gera sofrimento: a exclusão dos direitos civis causa humilhação, a ausência dos direitos políticos traz frustração, e a exclusão dos direitos sociais leva à marginalização social.

O terceiro modelo de reconhecimento é a estima social, que se relaciona com o valor que os outros atribuem às nossas contribuições e habilidades no âmbito comunitário. Esse reconhecimento contribui para o desenvolvimento de uma identidade que integra o respeito mútuo e o valor compartilhado. Quando este reconhecimento é negado, as pessoas podem internalizar uma imagem negativa de si mesmas, o que gera indignação e o desejo de buscar dignidade.

Esse processo demonstra como a invisibilidade social emerge quando algum tipo de reconhecimento é negado a um indivíduo, causando um profundo sentimento de desprezo social. A percepção que alguém tem de si próprio é moldada pelo olhar do outro, e, sem esse reconhecimento, a pessoa sente que seu valor social é desconsiderado. Em resumo, cada um desses modelos de reconhecimento, afetivo, jurídico e social, é essencial para a construção de uma imagem positiva e valorizada de si mesmo na sociedade.

Segundo França12, o ambiente das carceragens, por natureza, já favorece uma convivência que pode fomentar a violência entre detentos. Essa situação é ainda mais agravada quando se considera o preconceito enfrentado pela comunidade LGBT. O estigma social que essas pessoas enfrentam fora das prisões se torna ainda mais intenso no ambiente prisional, onde são frequentemente vítimas de discriminação e violência, gerando uma situação de maior vulnerabilidade e risco à sua integridade física e psicológica.

As prisões brasileiras derivam de um modelo disciplinar onde predomina a regra do confinamento e punição13. Trata-se de um modelo no qual a estrutura é institucionalmente hierarquizada. No entanto, há também regras paralelas que são estabelecidas pela própria população carcerária, que funcionam como uma rede indireta de poder14. Esse sistema paralelo de poder e hierarquização reserva as camadas mais baixas e desprezíveis para travestis e transexuais, em especial quando estão inseridas em ambientes masculinos15. O modelo binário16 predomina e as travestis e transexuais estão sujeitas a esse controle, no qual os juízes têm o poder de determinar quem é homem e quem é mulher. Em regra, essa “seleção” se baseia em critérios arraigados e construídos a partir de mitos, estigmas e transfobia, permitindo que travestis e transexuais sejam alocados em ambientes incompatíveis com seu gênero17.

Estudos feitos por ONG’s18 demonstram que o Brasil é um país extremamente violento e perigoso para a população LGBT, e o ambiente prisional intensifica essa vulnerabilidade. Nos presídios, a população LGBT enfrenta segregação e discriminação: há a separação de utensílios, como pratos e copos, e, em alguns casos, a proibição de comunicação com pessoas gays, especialmente em locais controlados por facções como o PCC. Mulheres transexuais sofrem ainda mais com a violação de direitos, pois não têm seu nome social ou identidade de gênero respeitados e, geralmente, não recebem tratamento hormonal adequado19.

A violência dentro dos presídios contra essa população ocorre de várias formas: desde a recusa de compartilhar objetos até agressões físicas, cortes de cabelo forçados em mulheres trans20 e abusos de ordem moral e sexual. Em situações de rebelião, pessoas LGBT frequentemente são alvos principais, o que ressalta a gravidade da situação e a necessidade de políticas efetivas para proteger e assegurar dignidade a todos os indivíduos no sistema carcerário21.

Em 2020 o governo federal publicou uma pesquisa22 inédita sobre a população LGBT no sistema carcerário mostrando que travestis e transexuais sofrem constantemente com a violência dentro das prisões masculinas. As violências relatadas são: emocionais, físicas, sexuais e tortura específica da condição de gênero. A publicação trouxe o relato de uma mulher trans, de 41 anos, presa em um dos maiores presídios masculinos de São Paulo. De acordo com seu relato, em sua primeira noite na prisão foi encaminhada para uma cela com 12 homens, local em que foi estuprada a noite toda, relatando ainda que ao longo da sua permanência na prisão era comum ser estuprada no banheiro23.

Pode-se entender o estupro como um problema cultural no Brasil que é alimentado por uma estrutura de pensamento que coloca o homem em uma condição de superioridade e dominação em relação a mulher. “A cultura do estupro, por sua vez, faz parte de um sistema maior, o patriarcado. E é esse sistema maior que reforça a cultura do estupro”24.

De acordo com Silva25, no sistema de pensamento do patriarcado, o homem se coloca na condição de dominador, acreditando na sua superioridade em relação à mulher, que é tratada como dominada.

O Anuário Brasileiro de Segurança Pública 202326 registrou que em 2022 ocorreram 74.930 estupros (estupro e estupro de vulneráveis), uma taxa de 36,9 estupros para cada 100 mil habitantes. Os dados mostram que em 2022 houve um aumento de 8,77% em relação a 2021. O Anuário destaca que os números de 2022 foram os maiores já registrados na série histórica. A informação preocupa ainda mais por saber que esses são apenas os casos notificados às autoridades policiais, representando então uma apenas uma fração da violência sexual vivenciada por pessoas de todas as idades.

O cenário cruel e desumano do sistema carcerário brasileiro se configura em um ambiente de constante afronta aos direitos fundamentais, a rotina de sofrimento se traduz em verdadeira tortura e alimenta um processo de desumanização, que recai com maior intensidade sobre travestis e transexuais. Além da imposição da perda da dignidade, o sistema impõe até mesmo a perda das características de gênero dos travestis e transexuais que dependem de tratamento hormonal, que eram interrompidos quando eram recolhidos ao cárcere.

De acordo com o Dossiê TransBrasil27, relatos demonstram que há situações em que pessoas recolhidas, durante a triagem ao ingressarem no presídio, informam aos profissionais de saúde sobre suas demandas de gênero, especificamente sobre o uso de hormônios femininos. Embora tenham sido ouvidas com atenção, os pedidos não foram atendidos devido à alegada falta de especialistas para esse tipo de tratamento. Como resultado, as mulheres transexuais, transgênero e travestis não têm acesso aos hormônios, o que provoca sofrimento emocional e mudanças físicas para características masculinas, levando ao uso descontrolado de antidepressivos.

2. Evolução dos direitos e instrumentos legais de proteção das pessoas transexuais e travestis no sistema carcerário

As pessoas travestis e transexuais representam historicamente um grupo vulnerável e marginalizado socialmente, vítimas constantes da discriminação e da violência nos mais variados contextos. Essa vulnerabilidade se intensifica quando essas pessoas estão sob a tutela do Estado recolhidas no sistema carcerário, ambiente no qual as violações de direitos humanos, no âmbito geral, e a negação da identidade de gênero é uma constante.

A proteção dos direitos das pessoas transexuais e travestis tem sido uma questão de grande relevância no ordenamento jurídico brasileiro, resultado de uma longa trajetória histórica em prol da igualdade de direitos28.

A trajetória de proteção dos direitos desse grupo é marcada por lutas e conquistas significativas. Na década de 1970, surgiram as primeiras organizações de defesa dos direitos LGBT, que enfrentavam o crescente cenário de discriminação e de violência contra essa comunidade. Nos anos 1990, ocorreram os primeiros avanços legislativos, com a inclusão de orientação sexual na legislação trabalhista e previdenciária29.

O movimento LGBT, na década de 1990, começa a se evidenciar na organização política e social do Brasil, ganhando força e se destacando no trabalho da defesa dos direitos humanos e sexuais30.

Em 1992 é criada no Rio de Janeiro a Associação de Travestis e Liberados (ASTRAL), pioneira na América Latina. Em meio à repressão e à constante ameaça da violência policial, um grupo se uniu buscando força e refúgio nos encontros promovidos pelos Instituto Superior de Estudos da Religião para a prevenção de doenças sexualmente transmissíveis e AIDS31. Era o ponto de partida de um movimento que enfrentaria as normas e lutaria por reconhecimento e dignidade: o Movimento Travesti e Transexuais no Brasil32.

 Em 1993 o grupo avançou consideravelmente em direção à articulação nacional com a organização do I Encontro Nacional de Travesti e Liberados (hoje Encontro Nacional de Travestis e Transexuais), reunindo 95 pessoas de cinco estados brasileiros. Esse foi um marco histórico que impulsionou a proliferação de grupos e organizações locais ao longo da década de 199033. No ano de 2000, a luta incansável por direitos e visibilidade culminou na criação da Articulação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA), que define o movimento como composto por travestis e transexuais, pessoas que apresentam identidade de gênero distinta daquela designada no nascimento com base no sexo genital34.

 A luta por direitos ganhou mais visibilidade, movimentos sociais, ativistas e instituições intensificaram a pressão por mudanças no ordenamento jurídico para assegurar a igualdade de direitos. Um marco importante nesse contexto foi a criação do Programa Sem Homofobia, em 2004, com o objetivo de promover a cidadania e a inclusão social da comunidade LGBT35.

A alteração do Decreto nº 5.397/2005, em 2005, permitiu a inclusão de representantes de entidades e organizações não governamentais de lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros no Conselho Nacional de Combate à Discriminação. Já em 2010 o Decreto nº 7.388/2010 transformou esse conselho em Conselho Nacional de Combate à Discriminação e Promoção dos Direitos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (CNCD/LGBT), com essa alteração o Conselho que tratava também de temas ligados à igualdade racial e direitos indígenas passou a ter foco na população LGBT36.

O judiciário brasileiro tem mostrado uma evolução significativa em relação aos direitos da população LGBTI, abordando questões ligadas à orientação sexual e identidade de gênero. Inicialmente, essas minorias enfrentaram severas discriminações, tanto em relação à orientação sexual quanto por identidade de gênero, envolvendo travestis e transexuais. No entanto, decisões recentes têm promovido maior reconhecimento e proteção dos direitos dessas minorias, destacando o avanço da jurisprudência no combate à discriminação e na promoção da igualdade de direitos37.

A título de conquista jurisprudencial podemos citar:

i) União de pessoas do mesmo sexo como entidade familiar constitucionalmente protegida (tema enfrentado pelo Supremo Tribunal Federal – STF na ADPF 132 e ADI 4277, pelo Superior Tribunal de Justiça – STJ no REsp 1.183.378/RS e pelo Conselho Nacional de Justiça – CNJ na RES. 175/2013.);
ii) Adoção conjunta por casais de pessoas do mesmo sexo (o STF, assim como o STJ, já havia tratado do tema por conta de laudos de assistente social e psicólogo que atestaram a ausência de prejuízos para crianças e adolescentes pelo fato de serem criados por casal de pessoas do mesmo sexo. O STJ, em duas oportunidades, destacou a inexistência de prejuízo a partir de estudos de órgãos especializados no tema por meio do Resp. 1.281.093/SP de 2013, e Resp. 889.852/RS de 2010. No STF o tema foi tratado no RE 615.261/PR de 2010 e RE 846.102/PR de 2015). 
III) Direito de não ser discriminado nas forças armadas. STF – ADPF 291. (O Código Penal Militar trazia em seu artigo 235 o chamado “crime de pederastia”, relativo à prática de ato libidinoso, homossexual ou não”, nas dependências das Forças Armadas. Apesar da redação do artigo, em tese, ser não-discriminatória, por abarcar também atos libidinosos heterossexuais e, portanto, tratar de uma proteção da hierarquia e da disciplina castrenses, não foram recepcionados pela Constituição de 1988 as expressões “pederastia ou outro” e “homossexual ou não”, contidas no nomen iuris e no caput do art. 235 do Código Penal Militar);
IV) Direito de pessoas transgênero ao respeito à sua identidade de gênero. STF, ADI 4275 e RE 670.422/RS. (em 2018 o STF julgou a ADI 4275, que abordava o direito de transgênero de alterar registro civil sem mudança de sexo, foi aprovada pelo Plenário a teste proposta pelo relator, para fim de repercussão geral, nos seguintes termos: 

1 O transgênero tem direito fundamento tem direito fundamental subjetivo à alteração de seu prenome e de sua classificação de gênero no registro civil, não se exigindo para tanto nada além da manifestação de vontade do indivíduo, o qual poderá exercer tal faculdade tanto pela via judicial como diretamente pela via administrativa. 2 Essa alteração deve ser averbada à margem do assento de nascimento, vedada a inclusão do termo “transgênero”. 3 Nas certidões do registro não constará nenhuma observação sobre a origem do ato, vedada a expedição de certidão de inteiro teor, salvo a requerimento do próprio interessado ou por determinação judicial. 4 Efetuando-se o procedimento pela via judicial, caberá ao magistrado determinar, de ofício ou a requerimento do interessado, a expedição de mandados específicos para a alteração dos demais registros nos órgãos públicos ou privados pertinentes, os quais deverão preservar o sigilo sobre a origem dos atos.38

V) Discriminação na doação de sangue a homens que faze sexo com outros homens. STF, ADI 5543. 

EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. DIREITO CONSTITUCIONAL. ART. 64, IV, DA PORTARIA N. 158/2016 DO MINISTÉRIO DA SAÚDE E ART. 25, XXX, “D”, DA RESOLUÇÃO DA DIRETORIA COLEGIADA – RDC N. 34/2014 DA ANVISA. RESTRIÇÃO DE DOAÇÃO DE SANGUE A GRUPOS E NÃO CONDUTAS DE RISCO. DISCRIMINAÇÃO POR ORIENTAÇÃO SEXUAL. INCONSTITUCIONALIDADE. AÇÃO DIRETA JULGADA PROCEDENTE39.

VI) Limites à liberdade de expressão. Discursos de ódio e a criminalização da lgbtfobia 40. STF, MI 4733 e ADO 26.

EMENTA: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM MANDADO DE INJUNÇÃO. DEVER DO ESTADO DE CRIMINALIZAR AS CONDUTAS ATENTATÓRIAS DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS. HOMOTRANSFOBIA. DISCRIMINAÇÃO INCONSTITUCIONAL. OMISSÃO DO CONGRESSO NACIONAL. HOMOTRANSFOBIA COMO RACISMO POR RAÇA. INJÚRIA RACIAL COMO ESPÉCIE DE RACISMO. PRECEDENTES. ATOS DE HOMOTRANSFOBIA PRATICADOS CONTRA MEMBROS DA COMUNIDADE LGBTQIA+ CONFIGURAM INJÚRIA RACIAL. OBSCURIDADE. EMBARGOS ACOLHIDOS41.

VII) A luta por uma educação inclusiva (não-discriminatória) nas escolas. STF, ADI 5668. Processo com votação prevista para início em 21/06/2024 e término em 28/06/2024. Voto do Relator, Min. Edson Fachin:

Ante todo o exposto, acolhendo o pedido da inicial, julgo parcialmente procedente a presente ação direta para dar interpretação conforme a Constituição ao art. 2º, III, da Lei Federal nº 13.005/2014 (Plano Nacional de Educação), a fim de que reconhecer a obrigação, por parte das escolas públicas e particulares, de coibir as discriminações por gênero, por identidade de gênero e por orientação sexual, coibindo também o bullying e as discriminações em geral de cunho machista (contra meninas cisgêneras e transgêneras) e homotransfóbicas (contra gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais)42.

Apresentado o avanço jurisprudencial, será tratado agora dos principais instrumentos jurídicos de proteção das pessoas LGBT, sigla que também contempla as pessoas travestis e transexuais. Em alguns casos o instrumento trará proteção para todo o grupo, em outros será específica ao tratar das pessoas travestis e transexuais. Essa explicação se torna necessária em razão deste trabalho ter como foco as pessoas travestis e transexuais.

A Constituição Federal de 1988 garante às pessoas em privação de liberdade o cumprimento da pena em estabelecimento distinto, levando em consideração a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado, além de assegurar o respeito à integridade física e moral dessas pessoas. Na mesma linha segue o Código Penal ao estabelecer em seu art. 38 que “o preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a todas as autoridades o respeito à sua integridade física e moral43”. Em relação à Lei de Execução Penal, há uma preocupação com a integração social do condenado, nesse sentido seu art. 1º diz que a “execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado44”.

Sobre à população travestis e transexuais em privação de liberdade, apesar de continuarem em situação de risco, houve avanços no contexto dos instrumentos jurídicos de proteção. É incontestável que a implementação desses instrumentos foi fruto dos esforços conjuntos que conseguiram definir parâmetros e métodos de monitoramento preventivo dedicados a essa comunidade, tanto no cenário nacional quanto internacional45.

 No âmbito nacional, esses esforços fizeram com que surgissem instrumentos destinados aos direitos específicos da população LGBT privada de liberdade. Dentre esses instrumentos podemos destacar: 

i) Resolução Conjunta CNPCP/CNCD nº 1, de 15 de abril de 2014, que estabeleceu o direito ao chamamento pelo nome social, de acordo com o gênero (Art. 1º); que as mulheres transexuais devem ser tratadas com igualdade perante as outras mulheres (Art. 4º); direito de usar cabelo e roupas de acordo com sua expressão pessoal de identidade de gênero (Art. 5º); direito à visita íntima para a população LGBT em situação de privação de liberdade (Art. 6º); direito a atenção integral à saúde, atendidos os parâmetros da Política Nacional de Saúde Integral de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais – LGBT e da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde das Privadas de Liberdade no Sistema – PNAISP (Art. 7º); continuação do tratamento hormonal e acompanhamento de saúde (Art. 7º, parágrafo único); auxílioreclusão aos dependentes, incluindo cônjuge/companheiro(a) do mesmo sexo (Art. 11). 
ii) Resolução CNJ nº306/2019, que trata da retificação de documentos a pedido da pessoa ou da defesa;
iii) Resolução CNJ nº248/2020, que estabelece atendimento psicológico e psiquiátrico visando a prevenção ao suicídio, tratamento ginecológico, urológico e endocrinológico paras as pessoas transexuais, travestis e intersexo (Art. 11); garantia de oportunidade educacional e de trabalho, proibindo atividades que causem humilhação em virtude da identidade de gênero (Art. 11)46.

Reservada a devida importância a todos os avanços citados acima, para o objetivo deste trabalho cabe apontar a Resolução Conjunta nº1, de 15 de abril de 2014, como um marco no avanço na garantia de direitos da pessoa transexual e travesti dentro do ambiente carcerário, já que o sistema prisional brasileiro se configura como o maior desafio para as instituições que lutam pelos direitos humanos desse grupo e a Resolução Conjunta nº1 estabeleceu parâmetros de acolhimento para esse público.

 A mencionada Resolução foi o primeiro instrumento a estabelecer que as pessoas transexuais masculinas e femininas fossem encaminhadas para as unidades prisionais femininas. Por outro lado, deu tratamento diferenciado aos travestis, trazendo como avanço apenas o oferecimento de espaços de vivência específicos.

Porém, em unidades prisionais masculinas.

Em 13/10/2020 o Conselho Nacional de Justiça – CNJ editou a Resolução nº 348/2020, com a seguinte Ementa: “estabelecendo diretrizes e procedimentos a serem observados pelo Poder Judiciário, no âmbito criminal, com relação ao tratamento da população lésbica, gay, bissexual, transexual, travesti ou intersexo que seja custodiada, acusada, ré, condenada, privada de liberdade, em cumprimento de alternativas penais ou monitorada eletronicamente”47.

Conforme estabeleceu o Art. 4º da Resolução nº348/2020 o reconhecimento da pessoa como parte da população LGBT, portanto incluídos o transexual e o travesti, passou a ser por autodeclaração é caberá ao magistrado colhê-la em audiência. A Resolução estabelece ainda que magistrado ao ser informado que se trata de pessoa pertencente à população LGBT deverá informá-la da possibilidade de autodeclaração48. Conforme preconiza a Resolução, “pessoa autodeclarada transgênero, incluídas as travestis, auto identificadas com homem ou mulher, devem ser questionadas sobre a preferência pela custódia em unidade feminina, masculina ou específica, caso exista na região. Definida a unidade, podem opinar acerca da preferência pela detenção no convívio geral ou em alas ou alojamentos específicos, onde houver. Por sua vez, pessoas autodeclaradas parte da população gay, lésbica, bissexual ou intersexo devem ser indagadas acerca da preferência pela custódia no convívio geral ou em alas ou celas específicas”49.

3. Insegurança Jurídica e a violação de direitos das pessoas transexuais e travestis

Como apresentado no Capítulo anterior deste trabalho, a Resolução Conjunta CNPCP/CNCD nº 1, de 15 de abril de 2014, se tornou um marco referencial na luta pelos direitos das pessoas transexuais e travestis no sistema penitenciário. A referida Resolução estabeleceu importantes parâmetros de acolhimento de pessoas LGBT em privação de liberdade no Brasil, em especial para as pessoas transexuais masculinas e femininas, ao determinar que fossem encaminhadas para unidades prisionais femininas, e para as pessoas travestis, e ao estabelecer o oferecimento de espaços de vivência específicos para travestis e gays privados de liberdade em unidades prisionais masculinas, apesar de considerarmos que o tratamento correto seria o mesmo oferecido aos transexuais.

Faz-se necessário destacar que a resolução foi emitida em conjunto entre a Presidência da República e o Conselho Nacional de Combate à Discriminação – CNCD, configurando, portanto, um ato normativo federal, já que o CNCD foi criado pelo decreto nº 3.952/0150

 Ainda é comum observar o descumprimento da Resolução nº 348/2020 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que estabelece diretrizes para assegurar a igualdade de gênero e direitos da população LGBTI no âmbito do sistema de Justiça. Como já abordado, a resolução visa garantir o respeito aos direitos e à identidade de gênero, orientando o tratamento adequado a pessoas transexuais e travestis, especialmente no sistema prisional e durante processos judiciais. Apesar de seu caráter normativo, persistem casos em que essas diretrizes não são devidamente aplicadas, comprometendo a proteção e o respeito à dignidade dessas pessoas no contexto jurídico. Como exemplo podemos citar os seguintes casos:

I) STJ – HABEAS CORPUS: HC 861817 SC 2023/0375894-751

HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. ESTABELECIMENTO PRISIONAL ADEQUADO. LIBERDADE SEXUAL E DE GÊNERO. DIVERSIDADE DE GÊNERO. PRINCÍPIO DA IGUALDADE MATERIAL. PRESÍDIO FEMININO COM ESTRUTURA PARA RECEBER MULHER TRANSGÊNERO. ESCOLHA DA PESSOA PRESA. 1. A determinação do local do cumprimento da pena da pessoa transgênero não é um exercício de livre discricionariedade da julgadora ou do julgador, mas sim uma análise substancial das circunstâncias que tem por objeto resguardar a liberdade sexual e de gênero, a integridade física e a vida das pessoas transgênero presas, haja vista que o art. 7º da Resolução CNJ n. 348/2020 determina que a referida decisão “será proferida após questionamento da preferência da pessoa presa”. Assim, o órgão estatal judicial responsável pelo acompanhamento da execução da pena não deve ter por objeto resguardar supostos constrangimentos das agentes carcerárias, pois, para isso, o Estado tem outros órgãos e outros instrumentos, que, inclusive, utilizam a força e a violência; e, por isso, é objetivo do Judiciário resguardar a vida e a integridade físicas das pessoas presas, respeitando a diversidade de gênero e a liberdade sexual. 2. O Supremo Tribunal Federal (STF), em 2019, em razão da diversidade de gênero e da igualdade material, havia concedido medida cautelar na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 527, para que pessoas presas transexuais e travestis com identidade de gênero feminino possam escolher cumprir a pena em estabelecimentos prisionais femininos ou masculinos. Assim também determina o art. 8º da Resolução CNJ n. 348/2020.3. É dever do Judiciário indagar à pessoa autodeclarada parte da população transexual acerca da preferência pela custódia em unidade feminina, masculina ou específica, se houver, e, na unidade escolhida, preferência pela detenção no convívio geral ou em alas ou celas específicas.4. Habeas corpus concedido para, restabelecendo a primeira decisão do órgão judicial de primeira instância, determinar que seja expedido o alvará de soltura, e que seja mantida a prisão domiciliar da paciente.
(STJ – HC: 861817 SC 2023/0375894-7, Relator: Ministro JESUÍNO RISSATO DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJDFT, Data de Julgamento: 06/02/2024, T6 – SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 15/02/2024)

ii)  STF – MEDIDA CAUTELAR NA RECLAMAÇÃO: Rcl 60580 SP52

Ementa: EXECUÇÃO PENAL. DIREITO DAS PESSOAS LGBTI. TRANSEXUAIS E TRAVESTIS. DIREITO DE OPÇÃO PELO CUMPRIMENTO DE PENA EM UNIDADES PRISIONAIS FEMININAS OU MASCULINAS.
1. Reclamação constitucional contra ato do juízo da Unidade Regional do Departamento Estadual de Execução Criminal – DEECRIM – Primeira RAJ do Estado de São Paulo, que negou a transferência da reclamante, mulher transexual, para unidade prisional feminina, ao argumento de não ter sido realizada cirurgia de transgenitalização. Contrariedade à decisão do Supremo Tribunal Federal, proferida no julgamento da ADPF 527-MC.
2. A cirurgia de transgenitalização não é requisito para reconhecer a condição de transexual. Portanto, a não realização do ato cirúrgico não é fundamento válido à negativa de transferência para unidade prisional feminina.
3. Direito das transexuais femininas e travestis ao cumprimento de pena em condições compatíveis com a sua identidade de gênero. Incidência do direito à dignidade humana, à autonomia, à liberdade, à igualdade, à saúde, vedação à tortura e ao tratamento degradante e desumano.
4. Liminar concedida para determinar a transferência da Reclamante para uma unidade prisional feminina. 
(STF – Rcl: 60580 SP, Relator: CÁRMEN LÚCIA, Data de Julgamento: 07/07/2023, Data de Publicação: PROCESSO ELETRÔNICO DJe-s/n DIVULG 07/07/2023 PUBLIC 10/07/2023)

O caso “i) HABEAS CORPUS: HC 861817 SC 2023/0375894-7, aborda um habeas corpus impetrado para garantir que uma pessoa transgênero cumpra sua pena em um local condizente com sua identidade de gênero. Atualmente em regime semiaberto, foi determinado à paciente a se apresentar em um presídio masculino, o que, segundo a defesa, desrespeita sua identidade de gênero e a Resolução CNJ nº 348/2020, que garante a escolha do estabelecimento prisional conforme a identidade de gênero. A Defensoria Pública argumenta que a revogação da prisão domiciliar e o encaminhamento para uma unidade inadequada são ilegais e ferem direitos fundamentais53.

 Já o caso ii) STF – MEDIDA CAUTELAR NA RECLAMAÇÃO: Rcl 60580 SP, trata-se uma reclamação constitucional contra decisão da Unidade Regional do Departamento Estadual de Execução Criminal (DEECRIM) da Primeira RAJ de São Paulo, que negou a transferência da reclamante, uma mulher transexual, para unidade prisional feminina com o argumento de que ela não realizou cirurgia de transgenitalização. Alega-se que essa decisão contraria entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADPF 527-MC.

Em ambos os casos as decisões desconsideraram não apenas a autodeclaração de identidade de gênero como critério, conforme determina a Resolução Nº 348, de 13/10/2020, em seu Art. 4º, mas, também, o direito da pessoa em ser reconhecida pelo Estado a partir da sua identidade de gênero. A resolução estabelece que o reconhecimento da pessoa como parte da população LGBTI será feito exclusivamente por meio de autodeclaração, que deverá ser colhida pelo magistrado, mas também deve ser interpretada em conjunto com os demais direitos da população LGBT que é de ter sua orientação sexual e identidade de gênero devidamente reconhecidas pelo Estado sem que seus representantes possam exercer qualquer decisão teratológica sobre o que eles entendem, individualmente, sobre o qual é o gênero da pessoa e que existe apenas uma forma de expressá-lo, sob o ônus de fortalecer o solipsismo da cisgeneridade no Brasil. A identidade de gênero não é uma escolha e não deve ser confundida com a autodeclaração, aquela é uma das formas de existência do corpo humano no espectro do gênero e esta é uma manifestação jurídica de que a pessoa está disposta à se expor ao contexto jurídico e nas circunstâncias prisionais que ela pertence a população LGBT. Tem-se, por fim, que a autodeclaração é uma “saída de armário com efeito jurídico”, enquanto o reconhecimento da identidade de gênero é um direito fundamental da pessoa e um dever-constitucional do Estado, que não devem ser confundidos.

Considerações finais

O estudo realizado no presente trabalho demonstra que as decisões judiciais sobre a destinação de pessoas transexuais e travestis para unidades prisionais compatíveis com seu gênero revela uma falta de uniformidade e clareza nos critérios aplicados, refletindo insegurança jurídica e violação de direitos. As divergências entre decisões que consideram, ou não, a autodeclaração de identidade de gênero para a definição do local de cumprimento de pena não apenas fragiliza a segurança jurídica, mas expõe essas pessoas a riscos de violência física e psicológica, contrariando normas que buscam assegurar dignidade e segurança. Portanto, é imperativo a necessidade de adoção de diretrizes coesas, baseadas nos normativos vigentes para garantir um tratamento justo e seguro, respeitando a identidade de gênero e os direitos humanos fundamentais.

Observou-se que as decisões judiciais sobre o local de cumprimento de pena para pessoas transexuais e travestis ainda carecem de coerência e respeito pleno aos direitos humanos. Essa ausência de uniformidade nos critérios judiciais e a falta de políticas públicas unificadas sobre o tema geram insegurança jurídica, elas colocam em risco a dignidade e a segurança dessas pessoas e impedem uma atuação da administração dos presídios de maneira assertiva e legal, indo contra normas como a Resolução nº 348/2020 do CNJ, que orienta a escolha do estabelecimento prisional com base na identidade de gênero autodeclarada, independentemente de alterações corporais.

A resistência de alguns tribunais em adotar tais diretrizes reforça o desafio contínuo de efetivar os direitos humanos no sistema carcerário brasileiro, agravando a vulnerabilidade das pessoas transexuais e travestis. Em última instância, um sistema judicial que não assegura o direito básico à identidade de gênero como fator de proteção e respeito à dignidade pessoal compromete os princípios fundamentais de justiça e igualdade. A implementação coerente dessas normas é, portanto, essencial para a construção de um sistema prisional que respeite os direitos humanos, garantindo segurança e integridade para todos os indivíduos, independentemente de sua identidade de gênero.


³NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal. 17. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2021. p.309
⁴FOUCAUT. Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão; tradução de Raquel Ramalhete. 42. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014. p. 224
⁵FOUCAUT. Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão; tradução de Raquel Ramalhete. 42. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2014. p. 143
⁶Reclusão x Detenção x Prisão Simples. Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios. Disponível em: https://www.tjdft.jus.br/institucional/imprensa/campanhas-e-produtos/direito-facil/edicao-semanal/reclusaox-detencao-x-prisao-simples. Acesso em: 10 de ago. de 2024.
⁷BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XLVIII – a pena será cumprida em estabelecimento distinto, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: de jun. de 2024.
⁸Sexo diz respeito às características biológicas e anatômicas que a pessoa apresenta, associadas ao feminino ou masculino. No senso comum, o sexo é um rótulo que o médico nos dá ao nascer, de acordo com uma série de fatores fisiológicos com a genitália, os hormônios e os cromossomos que carregamos. A maioria das pessoas recebe o gênero masculino ou feminino, e é isto que geralmente aparece na certidão de nascimento.
⁹BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XLIX – é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 11 de jun. de 2024.
¹⁰FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. 17º Anuário Brasileiro de Segurança Pública. São Paulo: Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 2023. Disponível em: https://forumseguranca.org.br/wpcontent/uploads/2023/07/anuario-2023.pdf. Acesso em: 9 de jun. de 2024. p. 276
¹¹TOMÁS, Júlia. A invisibilidade social, uma construção teórica. CECS – Centro de Estudos em Comunicação e Sociedade. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/228333133_A_invisibilidade_social_uma construcao_teorica. Acesso em: 10 de jun. 2024.
¹²FRANÇA, Regina Priscilla W. Xavier. A comunidade LGBT no sistema carcerário: A responsabilidade do Estado. Revista MPC-PR. v. 7, n. 13 (2020) Disponível em: https://revista.mpc.pr.gov.br/index.php/RMPCPR/ article/view/17/15. Acesso em: 7 de jun. 2024. p. 179
¹³Dossiê trans Brasil: um olhar acerca do perfil de travesti e mulheres transexuais no sistema prisional / [coordenação Bruna Benevides]. 1. ed. – Brasília, DF: Distrito Drag: ANTRA, 2022. p. 14
¹⁴Dossiê trans Brasil: um olhar acerca do perfil de travesti e mulheres transexuais no sistema prisional / [coordenação Bruna Benevides]. 1. ed. – Brasília, DF: Distrito Drag: ANTRA, 2022. p. 14
¹⁴Dossiê trans Brasil: um olhar acerca do perfil de travesti e mulheres transexuais no sistema prisional / [coordenação Bruna Benevides]. 1. ed. – Brasília, DF: Distrito Drag: ANTRA, 2022. p. 14
15Dossiê trans Brasil: um olhar acerca do perfil de travesti e mulheres transexuais no sistema prisional / [coordenação Bruna Benevides]. 1. ed. – Brasília, DF: Distrito Drag: ANTRA, 2022. p. 14
16Um binário é qualquer coisa que tenha aspecto dual, quer dizer que seja formada por dois elementos supostamente complementares, ou por duas faces presumivelmente opostas, ou ainda por duas partes hipoteticamente distintas. Chamamos de binário de gênero qualquer classificação das categorias de identidade sexo e gênero que se dê de duas formas distintas que, por sua vez, carregam poder de maneira desequilibrada. No binário de gênero existem, e existem apenas, a mulher/feminino e o homem/masculino.
17Dossiê trans Brasil: um olhar acerca do perfil de travesti e mulheres transexuais no sistema prisional / [coordenação Bruna Benevides]. 1. ed. – Brasília, DF: Distrito Drag: ANTRA, 2022. p. 14
18Vide: Mortes violentas de LGBT+ Brasil: Observatório do Grupo Gay da Bahia, 2022, disponível em https://cedoc.grupodignidade.org.br/2023/01/19/mortes-violentas-de-lgbt-brasil-observatorio-do-grupo-gayda-bahia-2022/; Brasil lidera ranking de países que mais matam LGBQTQIA+. Maioria é de pessoas trans, disponível em: https://www.cut.org.br/noticias/brasil-lidera-ranking-de-paises-que-mais-matam-lgbqtqiamaioria-e-de-pessoas-tra-6f58
¹⁹COELHO, Andréa Luiza. Os desafios enfrentados pelas pessoas LGBTQI+ no Sistema Carcerário. Jusbrasil. 2021. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/os-desafios-enfrentados-pelas-pessoas-lgbtqi-nosistema-carcerario/1412018412. Acesso em: 10 set. 2024.
²⁰O termo trans por vezes será referenciado como termo guarda-chuva para abarcar que a pessoa é ou transexual, ou transgênero, ou mulher travesti ou não binária. Em resumo, um termo que não se pauta na assunção binária ou cisgênera da identidade de gênero.
²¹COELHO, Andréa Luiza. Os desafios enfrentados pelas pessoas LGBTQI+ no Sistema Carcerário. Jusbrasil. 2021. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/os-desafios-enfrentados-pelas-pessoas-lgbtqi-nosistema-carcerario/1412018412. Acesso em: 10 set. 2024.
²²G1 Ciência e Saúde. Estupro e tortura: relatório inédito do governo federal aponta o drama de trans encarceradas em presídios masculinos. 6 de fev. de 2020. Disponível em: https://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2020/02/06/estupro-e-tortura-relatorio-inedito-do-governo-federal-aponta-o-drama-de-transencarceradas-em-presidios-masculinos.ghtml. Acesso em: 13 de jun. 2024.
²³G1 Ciência e Saúde. Estupro e tortura: relatório inédito do governo federal aponta o drama de trans encarceradas em presídios masculinos. 6 de fev. de 2020. Disponível em: https://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2020/02/06/estupro-e-tortura-relatorio-inedito-do-governo-federal-aponta-o-drama-de-trans-encarceradas-em-presidios-masculinos.ghtml. Acesso em: 13 de jun. 2024.
²⁴SILVA, Vânia dos Santos. Patriarcado e a cultura do estupro no Brasil. Le Monde Diplomatique Brasil. 2017. Disponível em: https://diplomatique.org.br/cultura-do-estupro-no-brasil/. Acesso em: 12 de jun. 2024.
²⁵SILVA, Vânia dos Santos. Patriarcado e a cultura do estupro no Brasil. Le Monde Diplomatique Brasil. Disponível em: https://diplomatique.org.br/cultura-do-estupro-no-brasil/. Acesso em: 12 de jun. 2024.
²⁶FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. 17º Anuário Brasileiro de Segurança Pública. São Paulo: Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 2023. Disponível em: https://forumseguranca.org.br/wpcontent/uploads/2023/07/anuario-2023.pdf. Acesso em: 9 de jun. de 2024. p. 146 a 154.
²⁷Dossiê trans Brasil: um olhar acerca do perfil de travesti e mulheres transexuais no sistema prisional / [coordenação Bruna Benevides]. 1. ed. – Brasília, DF: Distrito Drag: ANTRA, 2022. p. 87
²⁸JÚNIOR, Anajarino. A evolução da proteção dos direitos das pessoas LGBT+ no ordenamento jurídico brasileiro. JUSBRASIL. 2023. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/a-evolucao-da-protecao-dosdireitos-das-pessoas-lgbt-no-ordenamento-juridico-brasileiro/1798701948#:~:text=Em%202013%2C%20foi%20aprovada%20a,a%20necessidade%20de%20autoriza%C3%A7%C3%A3o%20judicial. Acesso em: 15 de jun. 2024.
²⁹JÚNIOR, Anajarino. A evolução da proteção dos direitos das pessoas LGBT+ no ordenamento jurídico brasileiro. JUSBRASIL. 2023. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/a-evolucao-da-protecao-dos-direitos-das-pessoas-lgbt-no-ordenamento-juridico-brasileiro/1798701948#:~:text=Em%202013%2C%20foi%20aprovada%20a,a%20necessidade%20de%20autoriza%C3%A7%C3%A3o%20judicial. Acesso em: 15 de jun. 2024.
³⁰FUNDAÇÃO FHC. Direitos LGBT+: a evolução do movimento e os debates na sociedade. Disponível em: https://fundacaofhc.org.br/linhasdotempo/direitos-lgbtqia/. Acesso em: 19 de jun. 2024.
³¹VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. A Constituição de 1988 e a evolução dos direitos da população LGBTI+. Revista de Direito da Faculdade Guanambi. 2019. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/334456537_A_Constituicao_de_1988_e_a_evolucao_dos_direitos_da_populacao_LGBTI. Acesso em: 20 de jun. 2024.
³²FUNDAÇÃO FHC. Direitos LGBT+: a evolução do movimento e os debates na sociedade. Disponível em: https://fundacaofhc.org.br/linhasdotempo/direitos-lgbtqia/. Acesso em: 19 de jun. 2024.
³³FUNDAÇÃO FHC. Direitos LGBT+: a evolução do movimento e os debates na sociedade. Disponível em: https://fundacaofhc.org.br/linhasdotempo/direitos-lgbtqia/. Acesso em: 19 de jun. 2024.
³⁴FUNDAÇÃO FHC. Direitos LGBT+: a evolução do movimento e os debates na sociedade. Disponível em: https://fundacaofhc.org.br/linhasdotempo/direitos-lgbtqia/. Acesso em: 19 de jun. 2024.
³⁵JÚNIOR, Anajarino. A evolução da proteção dos direitos das pessoas LGBT+ no ordenamento jurídico brasileiro. JUSBRASIL. 2023. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/a-evolucao-da-protecao-dos-direitos-das-pessoas-lgbt-no-ordenamento-juridico-brasileiro/1798701948#:~:text=Em%202013%2C%20foi%20aprovada%20a,a%20necessidade%20de%20autoriza%C3%A7%C3%A3o%20judicial. Acesso em: 15 de jun. 2024.
³⁶FUNDAÇÃO FHC. Direitos LGBT+: a evolução do movimento e os debates na sociedade. Disponível em: https://fundacaofhc.org.br/linhasdotempo/direitos-lgbtqia/. Acesso em: 19 de jun. 2024.
³⁷VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. A Constituição de 1988 e a evolução dos direitos da população LGBTI+. Revista de Direito da Faculdade Guanambi. 2019. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/334456537_A_Constituicao_de_1988_e_a_evolucao_dos_direitos_da_populacao_LGBTI. Acesso em: 20 de jun. 2024.
38BRASIL, Supremo Tribunal Federal. STF reafirma direito de transgênero de alterar registro civil sem mudança de sexo. 2018. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=386930. Acesso em: 21 de jun. 2024.
³⁹BRASIL. Supremo Tribunal Federal – STF. Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI 5543/DF. EMENTA: Ação Direta de Inconstitucionalidade. Direito Constitucional. Art. 64, IV, da Portaria N. 158/2016 do Ministério da Saúde e Art. 25, XXX, “D”, da Resolução da Diretoria Colegiada – RDC n. 34/2014 da ANVISA. Restrição de doação de sangue a grupos e não condutas de risco. Discriminação por orientação sexual. Inconstitucionalidade. Ação Direta de Inconstitucionalidade. Ação Direta Julgada Procedente. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=4996495. Acesso em: 21 de jun. 2024.
⁴⁰LGBTfobia é a terminologia usada para abarcar todas as formas de violência contra pessoas LGBTI+ em que a motivação principal é sua identidade de gênero e/ou orientação sexual, não pode ser entendida como algo de simples motivação pessoal, é um fenômeno social, construído e consolidado através de projetos de sociedade e ser humano disseminados por instituições para criar ideologia e cultura, possui impactos em todas as áreas de vivência das pessoas, principalmente na educação e formação do ser sociável, que rebate na forma de vivências e sobrevivências no lazer, no trabalho, na saúde e etc. https://www.cidadanialgbt.ms.gov.br/lgbtfobia/
⁴¹BRASIL. Supremo Tribunal Federal – STF. Mandado de Injução – MI 4.733/DF. EMENTA: Embargos de Declaração em Mandado de Injunção. Dever do Estado de criminalizar as condutas atentatórias dos direitos fundamentais. Homotransfobia. Discriminação Inconstitucional. Omissão do Congresso Nacional. Homotransfobia como racismo por raça. Injúria racial como espécie de racismo. Precedentes. Atos de homotransfobia praticados contra membros da comunidade LGBTQIA+ configuram injúria racial. Obscuridade. Embargos acolhidos. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=4239576. Acesso em: 21 jun. 2024.
⁴²BRASIL. Supremo Tribunal Federal – STF. Ação Direta de Inconstitucionalidade – ADI 5668/DF. Voto do Relator, Min. Edson Fachin. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5148159. Acesso em: 21 jun. 2024.
⁴³BRASIL, Código Penal. Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Art. 38. O preso conserva todos os direitos não atingidos pela perda da liberdade, impondo-se a todas as autoridades o respeito à sua integridade física e moral. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm. Acesso em: 21 de jun. 2024.
⁴⁴BRASIL, Lei de Execução Penal. Lei no 7.210, de 11 de junho de 1984. Art. 1o. A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l7210.htm. Acesso em: 21 de jun. de 2024.
⁴⁵Dossiê trans Brasil: um olhar acerca do perfil de travesti e mulheres transexuais no sistema prisional / [coordenação Bruna Benevides]. 1. ed. – Brasília, DF: Distrito Drag: ANTRA, 2022. p. 33
⁴⁶BRASIL, Conselho Nacional de Justiça. Resolução no348 de 13/10/2020. Ementa: Estabelecer diretrizes e procedimentos a serem observado pelo Poder Judiciário, no âmbito criminal, com relação ao tratamento da população lésbica, gay, bissexual, transexual, travesti ou intersexo que seja custodiada, acusada, ré, condenada, privada de liberdade, em cumprimento de alternativas penais ou monitorada eletronicamente. Disponível em: https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/3519. Acesso em: 20 de jun. de 2024.
⁴⁷BRASIL, Conselho Nacional de Justiça. Resolução no348 de 13/10/2020. Ementa: Estabelecer diretrizes e procedimentos a serem observado pelo Poder Judiciário, no âmbito criminal, com relação ao tratamento da população lésbica, gay, bissexual, transexual, travesti ou intersexo que seja custodiada, acusada, ré, condenada, privada de liberdade, em cumprimento de alternativas penais ou monitorada eletronicamente. Disponível em: https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/3519. Acesso em: 20 de jun. de 2024.
⁴⁸BRASIL, Conselho Nacional de Justiça. Resolução no348 de 13/10/2020. Ementa: Estabelecer diretrizes e procedimentos a serem observado pelo Poder Judiciário, no âmbito criminal, com relação ao tratamento da população lésbica, gay, bissexual, transexual, travesti ou intersexo que seja custodiada, acusada, ré, condenada, privada de liberdade, em cumprimento de alternativas penais ou monitorada eletronicamente. Disponível em: https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/3519. Acesso em: 20 de jun. de 2024.
⁴⁹BRASIL, Conselho Nacional de Justiça. Pessoa LGBTI no Sistema Penal – Cartilha para implementação da Resolução CNJ 348/2020. Disponível em: chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2023/02/pessoas-lgbti-penal-cartilha-para-implementacao-resolucao-348-2020.pdf. Acesso em: 21 de jun. 2024.
⁵⁰BRASIL, Supremo Tribunal Federal – STF. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental – ADPF no 527, DF. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5496473. Acesso em: 22 de jun.2024.
⁵¹STJ – HABEAS CORPUS: HC 861817 SC 2023/0375894-7. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/busca?q=transfer%C3%AAncia+de+transexuais+e+travestis+para+a+penitenci%C3%A1ria+feminina. Acesso em: 22 de set. 2024.
⁵²STF – MEDIDA CAUTELAR NA RECLAMAÇÃO: Rcl 60.580 SP. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/busca?q=transfer%C3%AAncia+de+transexuais+e+travestis+para+a+penitenci%C3%A1ria+feminina. Acesso em: 22 de set. 2024.
⁵³STJ – HABEAS CORPUS: HC 861817 SC 2023/0375894-7. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/busca?q=transfer%C3%AAncia+de+transexuais+e+travestis+para+a+penitenci%C3%A1ria+feminina. Acesso em: 22 de set. 2024.

Referências das fontes citadas

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¹Graduando em Direito pela Faculdade Católica de Rondônia, Bacharel em Administração pela Universidade Federal de Rondônia, Especialista em Gestão de Negócios pela Universidade Federal de Rondônia, Especialista em Gestão de Pessoas pela Faculdade São Lucas, Porto Velho/RO. E-mail: giulliano.costa@sou.fcr.edu.br
²Graduado em Direito, Mestre em Administração Pública pela Universidade Federal de Rondônia, Doutor em Ciências Jurídicas pela UNIVALI. Professor da Faculdade Católica de Rondônia, Porto Velho/RO. E-mail: cleverton.reikdal@fcr.edu.br