REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202412251525
Lucas Pereira Ireno1
Resumo : A presente pesquisa busca demonstrar o Direito à indenização das mulheres que criam os filhos sem qualquer auxílio do pai da criança (mãe solo). Por aplicação da teoria do dano ao projeto de vida, espécie de dano existencial autônoma do dano moral. É entendido pelo Superior Tribunal de Justiça do Brasil a aplicação da responsabilidade civil nas relações de família, de modo que o abandono afetivo configura ilícito indenizável. Com isso, este trabalho busca demonstrar por meio da literatura jurídica que a ausência do pai da criança atinge a esfera jurídica da mãe solo por via reflexa ou ricochete, afetando áreas como trabalho, educação e relações pessoais, sofrendo a mãe solo redução em seus direitos fundamentais, ensejando o dever em indenizar do pai da criança ausente.
Palavras-chave: Responsabilidade civil; Dano ao Projeto de Vida; Dano reflexo; Mãe solo.
INTRODUÇÃO:
De acordo com pesquisa publicada no Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas, por Janaina Feijó [2] , entre o período de 2012 a 2022 o Brasil registrou o patamar de 11 milhões de mães solo, assim chamadas as mulheres que criam seus filhos sem o auxílio do pai das crianças e em muitos casos, sem rede de apoio familiar.
A situação é gravíssima, requerendo um esforço conjunto do poder público, seja a nível de políticas públicas de Estado ou por meio da legislação, revendo formas que protejam os direitos das mulheres e que melhore a prestação jurisdicional à população
Pois na citada pesquisa, constatou-se um aumento exponencial nos últimos 10 anos de mães que criam seus filhos sem qualquer auxílio do pai da criança, podendo ser esperado nos próximos anos um aumento neste quadro social, no caso do poder público não vir a intervir.
Entre as análises da pesquisa acerca das mães solo, observa-se questões como: submissão das mulheres a trabalhos informais que possibilite cuidar dos filhos; renda financeira precária em decorrência da má qualificação; racismos estrutural sendo mulheres pretas e pardas as principais vítimas; precarização da educação, por abandonarem a qualificação estudantil e técnica para cuidar dos filhos, isto em fase crucial da vida, entre 15 a 26 anos de idade [3] .
Diante de tal quadro social, volta-se o olhar para a Justiça, investigando institutos jurídicos do Direito material com capacidade para tutelar os direitos das mulheres. É neste sentido a proposta do presente artigo científico, levando em conta que é pacificado no Superior Tribunal de Justiça do Brasil a possibilidade da aplicação da responsabilidade civil nas relações familiares.
A responsabilidade civil é o instituto jurídico aplicado nos casos de violação de direito alheio, diferente de crime, ou seja, quando o titular de um direito ao manifestar tal faculdade ou na omissão de um dever, causa lesão ou ameaça de lesão a direito alheio. O instituto busca minimizar as perdas suportadas pela vítima, podendo ser imposta pelo poder judiciário pena pecuniária, na tentativa de reparar o ofendido.
Nesse diapasão encontra-se a questão das mães solo, mulheres que diariamente têm seus direitos constitucionais e a sua dignidade violada pelo o ex-companheiro, pai de seus filhos, que possui os fatores sociais estruturantes da sociedade ao seu favor.
Considerando as circunstâncias sociais incidentes sobre a mãe solo, podemos constatar um sobrecarregamento involuntário do seu dever de cuidado com o filho(a), restando a dúvida de qual seria o papel do genitor da criança nas circunstâncias que afetam as mães solos, diga-se, a responsabilidade civil do pai quando obrigado pela Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 em ter compromissos de agir e de cuidado para com a prole, mantém-se inerte e negligentemente.
A presente pesquisa, destina-se a problematização da possibilidade de reparação civil às mães solo, pelo reconhecimento do dano existencial, na espécie dano ao projeto de vida. Pois a ausência paterna as sobrecarrega, afetando todo os setores de suas vidas e diminuindo a qualidade de vida, possibilitando serem indenizadas pelo genitor ausente dos filhos. No que passa a demonstrar a seguir.
1. A OBRIGAÇÃO CONSTITUCIONAL E INFRACONSTITUCIONAL DOS PAIS EM PRESTAR APOIO FINANCEIRO E CONVIVÊNCIA COM OS FILHOS.
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 não restringe a liberdade das pessoas em gerar ou adotar filhos, porém, esta liberdade é condicionada pelo dever de cuidado, assistência e convivência familiar na forma do parágrafo sete do artigo 226 [4] e caput dos artigos .227 [5] e 229 [6] , daquela constituição.
Deste modo, ao conceber os filhos biológicos e também os adotivos, equiparados àqueles, os pais contraem o dever constitucional e infraconstitucional de cuidado, assistência material e psicológica, além da convivência familiar para com os filhos.
O dever de cuidado com os filhos está previsto no ordenamento pátrio em várias outras expressões linguísticas, sendo direito fundamental dos filhos crescerem em ambiente seguro, amparados em seio familiar que respeite a condição de criança, adolescente e jovem, conforme o primado do princípio da dignidade da pessoa humana artigo. 1ª, inciso III da Carta Magna de 1988, interpretado em conjunto com o princípio da proteção integral que rege o direito das crianças e adolescentes conforme o artigos.1º e 3ª [7] , ambos da Lei n. 8.069/90.
Ensina Kátia Regina Ferreira Lobo Andrade [8] , que a expressão cuidado envolve proteger os filhos, podendo ser percebida por meio do instituto jurídico da guarda, sendo a convivência e poder exercido por ambos os pais sobre os filhos, conforme determina o caput e parágrafo único do artigo.22 do ECA9 e no mesmo sentido o artigo.1634, inciso II do código civil [9] . Nas palavras da autora:
A cada genitor incumbe, portanto, exercer esse modo de ser do cuidado: ter o filho ao seu lado, protegendo-o, demonstrando amor, zelo e atenção na guarda e companhia diárias; o dever de saber onde, com quem e por que o filho menor de idade está longe de suas vistas. Devem os pais assegurar-se de que, distante dos seus olhos, o filho estará em segurança porque algum adulto o assistirá [10]
Embora o termo (cuidado) seja vago e possível de inúmeras interpretações, é possível constatar na legislação brasileira e na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça do Brasil, responsável por uniformizar o entendimento sobre a legislação infraconstitucional, possíveis balizas para seu reconhecimento, em outros subjetivos, adjetivos, verbos e locuções sendo exemplo o art. 244 do Código Penal do Brasil [11] in verbis …
Art. 244. Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do cônjuge, ou de filho menor de 18 (dezoito) anos ou inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido ou maior de 60 (sessenta) anos, não lhes proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada; deixar, sem justa causa, de socorrer descendente ou ascendente, gravemente enfermo: […]( Brasil, 1942)
Percebe-se que o legislador criminal ao instituir o tipo do abandono material no dispositivo anteriormente analisado, quis assegurar a assistência em âmbito familiar, entre cônjuges, filhos menores de idade e ascendentes debilitados ou com mais de sessenta anos de idade contida na oração “deixar de prover a subsistência”.
Explica Cezar Roberto Bitencourt sobre a figura típica que “O abandono material somente se tipifica quando o réu, possuindo recursos para prover ao sustento da família, deixa de fazê-lo propositadamente [12] ” Tal entendimento alinha-se à determinação do artigo 23 da Lei 8.069/90, pois não sofrerá a perda, nem será suspenso o poder familiar de pais carentes de recursos, medida que respeita o princípio da dignidade humana.
Como é percebido, o dever de cuidado é obrigação constitucional e legalmente prevista a ambos os pais, sendo constatado em processo judicial em contraditório, que alguns deles não praticou aquele dever a consequência será a suspensão do poder familiar conforme o artigo.129, inciso X do ECA ou a perda do poder familiar nos termos do artigo.1634 inciso. II do Código Civil, podendo vir a responder por ato ilícito indenizável.
Pois a conduta do genitor que abandona ou negligência o filho(a), deixando de prover assistência familiar e convivência com aquele, gera experienciais e pensamentos angustiantes de rejeição, solidão e desamparo econômico, pois as crianças, adolescentes e os jovens não possuindo economia própria ou no caso dos jovens, possuem dificuldades para encontrar uma colocação profissional de início na vida laboral. Dependendo de seus pais ou pessoas que lhe façam as vezes, para garantir suas sobrevivências e acesso ao mínimo que possibilite buscarem a felicidade e a auto realização, objetivos comum dos integrantes de uma família.
2. A INCIDÊNCIA DO DANO REFLEXO OU RICOCHETE NA ESFERA JURÍDICA DA MÃE SOLO
A Conduta paterna acaba por sobrecarregar os deveres da mãe solo, que terá que prover integralmente o sustento do filho(a), tendo que administrar frustrações e traumas experimentados pelo filho(a), abdicar do tempo livre e momentos de intimidade e amores para se dedicar ao cuidado e convivência com aquele, tendo que condicionar todo seu projeto de vida as variáveis que a maternidade sozinha lhe cobram.
Não por escolha própria, mas por imposição da situação, observa a pesquisa de Janaina Feijo [13] , por exemplo, a tendência das mães solo em se submeterem a trabalhos informais para poderem lidar com a maternidade solo, nas palavras da pesquisadora:
A mãe solo, ao buscar conciliar responsabilidades familiares e trabalho, tende a procurar por ocupações que ofereçam jornadas mais flexíveis. Para algumas mães, a única saída para ter flexibilidade, trabalho e rendimento é ir para a informalidade. Contudo os postos informais são caracterizados por oferecerem remunerações mais baixas e desprovidos de proteção social.
Em 2022, cerca de 45% das mães solo empregadas estavam na informalidade .15
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça do Brasil, reconhece a ilicitude da conduta paterna que deixa de prover o mínimo existencial à prole, atraindo a incidência da reparação civil por violação aos artigos 186 em conjunto com os artigos 11 [14] e 21 [15] todos do Código Civil brasileiro.
A genitora suporta sozinha a falta de assistência do outro genitor no sustento e convivência com o filho(a) condicionando todo sua rotina a maternidade sem assistência do pai da criança. Reconhecido o direito à reparação civil ao filho(a) não seria razoável nem proporcional não chegar à conclusão de que a ilicitude da conduta paterna respingou ou ricocheteou na esfera jurídica da mãe solo.
Pois na normalidade da situação, ou seja, quando os pais permanecem juntos, ambos suportam em comum o ônus e alegrias da criação dos filhos, repartindo gastos com vestuário, calçados, medicamentos, educação, lazer, alimentos e tempo de convivência, direitos tutelados pelos filhos, na forma dos artigos 227 e 229 da Constituição do Brasil de 1988, e artigo 22 da Lei 8.069/90. ( ECA).
A conduta paterna ricocheteia [16] na esfera jurídica da mãe solo, pois embora a conduta ilícita não tenha se chocado frontalmente com aquela, interfere na forma pela qual buscará se colocar no mercado de trabalho, a permanência na formação educacional entre outras.
Pois a ausência de um, significará a presença em dobro de outro, afetando em demasia o projeto de vida da mãe solo, em questões tanto econômicas quanto a própria administração do tempo. A vítima reflexa acaba por experimentar os mesmo males que a vítima principal, senão piores, por ser adulta e ter consciência que é a única responsável por si e seu filho(a). Nas palavras de Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald e Felipe Peixoto Braga Netto o dano reflexo ou ricochete é conceituado desta forma:
No dano reflexo, ou em ricochete, ocorre um prejuízo em virtude de um dano sofrido por outrem. O evento não apenas atinge a vítima direta, mas reflexamente, os interesses de outras pessoas. Daí a expressão ‘ricochete’, que significa que o dano sofrido inicialmente por um, que acaba por repercutir em outro, pelo fato de haver alguma ligação entre este e aquele [17] .
incidindo a hipótese do dano suportado pela mãe solo por via reflexa ou em ricochete, é necessário averiguar qual espécie de dano estaríamos diante, isto é, o dano moral propriamente dito? diga-se de passagem, tem-se observado na doutrina jurídica brasileira e em particular na jurisdição Trabalhista, constante menção ao dano existencial.
Esse gênero de dano se desdobra em: dano ao projeto de vida e dano à vida em relações. Na doutrina jurídica pretendem ser autônomas do dano moral, isso porque o dano puramente moral, limitaria o quantum indenizatório ao abalo sofrido, enquanto a figura nova de dano pretende analisar a situação como um todo, não só a experimentada pelo indivíduo, pois o dano ao projeto de vida, desdobra em várias decisões e comprometimentos que afetam o indivíduo por períodos de tempo elevado, quando não, até a morte. Se não, vejamos.
3 . O DANO AO PROJETO DE VIDA SOFRIDO PELA MÃE SOLO.
Primeiramente cabe explicar que o dano existencial, na espécie dano ao projeto de vida tem origem na doutrina jurídica e jurisprudencial italiana, precisamente nas pesquisas de Patrizia Ziviz precursora do debate sobre o dano existencial naquele país.
Em solo nacional pesquisas como a de Flaviana Rampazzo Soares [17] foram precursoras do debate acerca do tema, que passou a ter previsão normativa conforme o artigo 223-B [18] da Consolidação das Leis do Trabalho.
Mas o que se entende por dano existencial? observa-se na doutrina certos conceitos na definição do objeto, para Flaviana Rampazzo Soares [20] seria “a lesão ao complexo de relações que auxiliam no desenvolvimento normal da personalidade do sujeito”. Por sua vez, Flávio Tartuce [21] fala “um sacrifício nas atividades realizadoras da pessoa, ocasionando uma mudança na relação da pessoa com o que a circunda”
Ao que parece se tratar de espécie de dano imaterial, que embora não seja patrimonial, se distancia do dano puramente moral. Pois a lesão passa da pessoa da vítima alcançando suas relações pessoais e as circunstâncias sociais a sua volta, entravando a liberdade do sujeito em buscar a felicidade, ou ter acesso de maneira simples, que em situação de normalidade teria decidido ou se comportado diferentemente.
Nesse diapasão parece claro que as decisões da mãe solo são enviesadas pelo estado de abandono do filho(a) pelo genitor, afetando mais do que a normalidade razoável, por exemplo, considerando a hipótese de uma mãe e seu filho de pouca idade que é negligenciado pelo pai e não tendo aquela assistência de sua família.
Não terá escolha a não ser submeter se a informalidade ou trabalhos cuja pouca possibilidade de crescimento de carreira e ganho econômico compactuam com o horário em deixar e apanhar o filho na creche ou mesmo impossibilitando de concluir a educação regular, técnico e superior, o que impactará de modo substancial sua qualidade de vida.
Fica evidente na pesquisa de Janaina Feijó [22] que as mães sem auxílio familiar na criação dos filhos, principalmente sem a presença do genitor, necessariamente encontram dificuldade para alcançarem o mercado formal de trabalho e de concluírem a formação escolar, ao passo que o genitor não experimenta as mesmas dificuldades, pois as transfere ilicitamente a mãe solo.
A culpa stricto sensu do genitor nas dificuldades suportadas pela mãe solo é verificada na constatação de que aquela teve que abandonar os estudos para se dedicar a subsistência do filho(a) que teve que submeter a trabalhos informais para poder encaixar sua rotina ao do filho, ao ponto de verificar-se um dano in re ipsa [23]
A culpa em sentido stricto é cláusula geral no ordenamento brasileiro, que cobra certa diligência ou melhor cuidado no agir em coletividade, justamente por não ser possível a lei estipular cada conduta humana e culminar a correspondência sancionatória. Nas palavras de Sérgio Cavalieri Filho [24]
o conteúdo do dever objetivo de cuidado só pode ser determinado por intermédio de um princípio metodológico – comparação do fato concreto com o comportamento que teria adotado, no lugar do agente, um homem comum, capaz e prudente, pois o núcleo da conduta culposa, repita-se, consiste na divergência entre a ação efetivamente praticada é aquela no qual o “desrespeito a um dever preexistente[…]
Não é necessário provar que que o genitor desejou ou pretendeu causar danos a mãe solo, é decorrência lógica da assistência do genitor o praestare [25] da obrigação ( parentalidade responsável) se desdobra em benéficos naturais, sendo a ausência a anomalia social passível de censura pelo poder judiciário na forma do artigo 186 e artigo 927 ambos do Código Civil brasileiro.
Dessa forma, o direito fundamental de igualdade material da mãe solo é desrespeitado, por suportar integralmente a criação do filho(a), submetendo durante muito tempo sua busca pela felicidade as condições que melhor concilie o cuidado com o filho.
Sendo claro que o filho(a) não é fardo suportado ou mercantilizado, se não outra vítima do algoz genitor que acredita que a compatibilidade de sangue é sinônimo de paternidade, para Rui Portanova28 , a paternidade é cultural, não se garantindo pelo sangue e sim pelo agir como genitor.
A ausência afetiva implica em várias anomalias sociais, inclusive a que testemunhamos, o aumento de mulheres nos postos de trabalho informal, com poucos recursos para sobreviverem, sequer uma máquina de lavar muitas vezes possuem, é necessário responsabilizar ou culpados.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS:
A presente pesquisa buscou demonstrar, por meio da doutrina jurídica, que é possível responsabilizar o genitor ausente a indenizar a mulher que cria sozinha o filho, após o término da relação amorosa, chamadas de mãe solo.
A responsabilização civil incide de maneira reflexa ou ricochete na esfera jurídica da mãe solo, quando configurado que o genitor praticou omissão em seu dever de cuidado com a prole, não sendo necessário demonstrar o fato danoso propriamente dito nem a culpa, pois ao descumprir o dever legalmente imposto, acaba por violar os direitos da mãe solo, ou seja, culpa stricto sensu, por sobrecarregar e deturpando sua realidade social mais que o anormal.
Porém, enquanto a responsabilização incide de maneira reflexa ou ricochete, constata-se que o gênero de dano suportado pela mãe solo é diferente, pois se o filho(a) sofre dano puramente moral, dado o vínculo familiar especial com o agressor, certo que o dano da mãe solo é de outra categoria, pois afeta mais que a essência humana, desdobrando em consequências para todo o contexto social.
Sendo assim, não seria razoável condenar o genitor a pena pecuniária que repare o dano moral do filho(a) abandonado, sem chegar na conclusão que a mãe solo suportou o dano também, porém, de maneira mais ampla atingindo seu projeto de vida, em escolhas que surtam efeitos ao longo de sua vida.
O dano existencial na espécie dano ao projeto de vida surge justamente para preencher a lacuna que o dano moral deixa, possibilitando que injustiças sejam reparadas e a rigidez do ordenamento pátrio respeitada. Se por um lado parece forçoso querer responsabilizar o genitor pelos infortúnios da mãe solo, com a mesma razão, seria possível concluir que a falta de assistência do genitor na criação do filho(a) por anos, não trouxe consequências para a vida da mulher, mão solo.
A pesquisa reconhece sua ousadia em propor tal debate, suas limitações, como, a dificuldade de caracterizar a culpa e o nexo causal no caso concreto, quando não sendo reconhecido o dano reflexo a partir do dano do filho(a). É necessário pensar e debater os direitos das mulheres, afinal, as estatísticas demonstram a vulnerabilidade enraizada desse grupo social no Brasil.
Também, é conhecido que as relações familiares guardam implicações maiores, como violência de género e patrimonial, alienação parental entre outras, que não cabem serem discutidas aqui, em decorrência da limitação do objeto pesquisado, no que dá por concluída a pesquisa.
2 FEIJÓ, Janaína. Mães solo no mercado de trabalho crescem 1, 7 milhão em dez anos. Portal FGV, São Paulo, v. 18, 2023.
3 FEIJÓ, Janaína, op.cit.
4 CRFB/88 Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.§ 7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.
5 id.. Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.
6 id. Art. 229. Os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade.
7 ECA. Art. 1º Esta Lei dispõe sobre a proteção integral à criança e ao adolescente; e Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.
8 MACIE, Katia Regina Ferreira Lobo A. Curso de Direito da Criança e do Adolescente – 16ª Edição 2024 . 16. ed. Rio de Janeiro: Saraiva Jur, 2024. E-book. pág.202. ISBN 9788553621286. Disponível em: https://app.minhabiblioteca.com.br/reader/books/9788553621286/. Acesso em: 16 dez. 2024.
9 ECA. Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.
10 Código Cível. Art. 1.634. Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos filhos: I – dirigir-lhes a criação e a educação; II – exercer a guarda unilateral ou compartilhada nos termos do art. 1.584; VIII – reclamá-los de quem ilegalmente os detenha […]
11 MACIE, K.R.A.F.L.A. Op.cit., 2024, pg.203.
12 BRASIL, Decreto-Lei nº 2.848 de 7 de dezembro de 1940, institui o Código Penal do Brasil.
13 BITENCOURT, Cezar R. Código penal comentado . 10. ed. Rio de Janeiro: Saraiva Jur, 2019. p1151. ISBN 9788553615704.
14 FEIJÓ, janaina. Op, cit,.2023
15 Idem.
16 Brasil, Código Civil. Art. 11. Com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não podendo o seu exercício sofrer limitação voluntária.
17 Idem. Art. 21. A vida privada da pessoa natural é inviolável, e o juiz, a requerimento do interessado, adotará as providências necessárias para impedir ou fazer cessar ato contrário a esta norma
18 Segundo o informativo nº 560 da VI jornada de Direito Civil, as hipóteses na qual o dano ricochete, vão além das descritas no artigo 948 do Código Civil brasileiro, ou seja, de morte da vítima.
19 FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson; BRAGA NETTO, Felipe Peixoto. Curso de Direito Civil, Responsabilidade civil, 2. p. 240-241.
20 SOARES, Flaviana Rampazzo. Responsabilidade civil por dano existencial . Livraria do Advogado Editora, 2009.
21 CLT. Art. 223-B. Causa dano de natureza extrapatrimonial a ação ou omissão que ofenda a esfera moral ou existencial da pessoa física ou jurídica, as quais são as titulares exclusivas do direito à reparação.
22 SOARES, op. cit. 2009.
23 TARTUCE, Flávio, Op, cit, p.46
24 FEIJÓ, Janaína, op, cit. 2023
25 Termo em latim que para o Direito é sinônimo de dano presumido pelas circunstâncias do fato danoso.
26 FILHO, Sergio C. Programa de Responsabilidade Civil – 16ª Edição 2023 . 16. ed. Rio de Janeiro: Atlas, 2023. pág.47. ISBN 9786559775217.
27 Termo em latim que no Direito Romano indica culpa ou dolo acessório a um dever privado.
28 PORTANOVA, Rui. Ações de filiação e paternidade socioafetiva. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora , p. 21-23, 2018.
REFERÊNCIAS
CAVALIERI FILHO, Sergio. Programa de Responsabilidade Civil – 16ª Edição 2023 . 16. ed. Rio de Janeiro: Atlas, 2023.
BRASIL. [ Constituição (1988) ]. Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. 4. ed. São Paulo: Saraiva, 1990.
BRASIL. Lei 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 16 jul. 1990a.
BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil . Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, ano 139, n. 8, p. 1-74, 11 jan. 2002.
BITENCOURT, Cezar R. Código penal comentado . 10. ed. Rio de Janeiro: Saraiva Jur, 2019. E-book. p.CAPA. ISBN 9788553615704.
FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Direito Civil. Teoria geral . 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006.
FEIJÓ, Janaína. Mães solo no mercado de trabalho crescem 1, 7 milhão em dez anos . Portal FGV, São Paulo, v. 18, 2023
MACIEL, Kátia Regina Ferreira Lobo A. Curso de Direito da Criança e do Adolescente – 16ª Edição 2024 . 16. ed. Rio de Janeiro: Saraiva Jur, 2024. ISBN 9788553621286.
PORTANOVA, Rui. Ações de filiação e paternidade socioafetiva . Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2018.
TARTUCE, Flávio. Responsabilidade Civil – 5ª Edição 2023 . 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2023. pág.211. ISBN 9786559647910.
SOARES, Flaviana Rampazzo. Responsabilidade civil por dano existencial . Livraria do Advogado Editora, 2009.
1 Pós-graduando pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) , Ponta Grossa, PR. e-mail: advogadolucasireno@gmail.com