REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7158793
Autoria de:
Fernanda Gabriella Costa
Na construção do conhecimento das divindades sociais, enquanto oportunistas, os ensejos de primazia coletiva se reencontram regularmente na ficção do bem-comum, haja vista ser a repressão oculta da racionalidade humana, o propósito medidor do agir das divindades, aos quais fundamentam a tirania de modo axiomático, tendo por certo a incapacidade intelectiva expandida, estabelecida pelo senso comum de um exercício necessário.
Por conseguinte, a identificação de que as engrenagens são saciadas pela escassez do pensar, posterga a noção de reconhecimento das escolhas, estabelecendo algo já pensado, definido e replicado, como verdade absoluta.
Logo, a recognição da simultaneidade existencial de um suicídio sociopolítico, em meio à intolerância habitual, predispõe a coletividade ao sentido de humanitarismo fundamental à relevância extensiva destas condições, tendo por certo o exercício elementar do reconhecimento do mal e do bem para conseguimento dimensional da opressão duradoura e o progresso destrutivo de sua relevância simulada, mantidos pelo delírio das restrições separatistas dos coletivos, nutridor da insensibilidade relativa à desintegração comunitária.
Isto posto, alicerça a capacidade do pensar como o superpoder para além da violência expressa no colapso social, apartando o ser humano da fábula cuidadosa do tolhimento cognitivo.
De modo específico, num olhar analítico, a estruturação axiológica da virtude, enquanto meio funcional do ser vinculado ao corpo social, fundamenta o valor da estrutura pensante e evolutiva do indivíduo. Definições de uma falsa virtude e encorajamento do deleite às partículas de plenitude sociopolítica, desencadearam divindades providas do sustento da ignorância e da desumanidade, efetivadas continuamente pelo esboço egoísta da nutrição do medo e da privação da capacidade do pensar, ao qual eleva a inaptidão humana da virtude outrora apreciada como fonte da coletividade.
Apropriadamente, se denota o panorama Aristotélico, no que concerne ao ser como um incorporado à sociedade:
“A cidade é uma criação natural, e que o homem é por natureza um animal social, e que é por natureza e não por mero acidente, não fizesse parte de cidade alguma, seria desprezível ou estaria acima da humanidade […] Agora é evidente que o homem, muito mais que a abelha ou outro animal gregário, é um animal social.” (ARISTÓTELES. Política. São Paulo, SP: Martin Claret, 2007).
De maneira adequada, evidencia Aristóteles a respeito do homem como um ser político, alegando que “A polis é uma criação da natureza e que “o homem é por natureza um animal político (zoon politikon) ” (ARISTÓTELES. Política. São Paulo, SP: Martin Claret, 2007).
Efetivamente, a visão Aristotélica respalda o aspecto do ser, como entidade sociopolítica:
“Não menos estranho seria fazer do homem feliz um solitário, pois ninguém escolheria a posse do mundo inteiro sob a condição de viver só, já que o homem é um ser político e está em sua natureza o viver em sociedade” (ARISTÓTELES. Política. São Paulo, SP: Martin Claret, 2007.)
No entendimento de transitoriedade da existência, o desapego da empatia é formidoloso, propiciando uma inaptidão em si e no outro, no singular e no coletivo, de maneira sequencial.
Respectivamente, no panorama legítimo da conexão do indivíduo com a sociedade, situa-se o discernimento do autoconhecimento, de forma precedente à comunhão. Ponto substancial para o ânimo coletivo porvir.
Nesse sentido, Hannah Arendt pondera, em menção à instrução Socrática:
“O ensinamento de Sócrates significava o seguinte: somente aquele que sabe viver consigo mesmo está apto a viver com os outros. O eu é a única pessoa de quem não posso me separar, que não posso deixar, com quem estou fundido. Logo, “é muito melhor estar em desacordo com o mundo todo do que, sendo um, estar em desacordo comigo mesmo’’. (Hannah Arendt, A dignidade da política, p. 102. 3ª edição. 2002, Ed. Relume Dumará. RJ)
Decerto, o advento reflexivo da virtude, interpreta a conduta evolutiva do indivíduo, considerando seus meios de compreensão indispensáveis da coletividade para o progresso político e social. Entretanto, na trajetória humana, o egocentrismo fomenta a má-fé justificada como adequação deliberativa deste desenvolvimento e seus respectivos âmbitos.
Por conseguinte, a escassez de desenvolvimento revigora as múltiplas facetas da inércia sociopolítica, estabelecendo a fábula da liberdade.
Nessa perspectiva, Platão explana, metaforicamente, um panorama usual, precedente e corrente, do mundo e sua verdade ofertada:
“Os seres humanos têm uma visão distorcida da realidade. No mito, os prisioneiros somos nós que enxergamos e acreditamos apenas em imagens criadas pela cultura, conceitos e informações que recebemos durante a vida. A caverna simboliza o mundo, pois nos apresenta imagens que não representam a realidade. Só é possível conhecer a realidade, quando nos libertamos destas influências culturais e sociais, ou seja, quando saímos da caverna”. (Platão, O mito da caverna, A Alegoria da caverna: A Republica, 514a-517c, tradução: Lucy Magalhães. Textos Básicos de Filosofia: dos Pré-socráticos a Wittgenstein. 2a ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2000).
Desta feita, o julgamento alheio e seus dispositivos absolutos, amparam o mal redentor e o bem tão somente reproduzido irrefletidamente, vivificando a intolerância.
Em vista disso, o colapso da moral aprofunda a ideia de exatidão das deficiências inerentes ao mal-estar comum, abarcando o dever sociopolítico próprio de cada conduta humana, próspero de incontestáveis preceitos e condutas creditadas pela monomania pseudocognitiva da sociedade.
No objeto da presente análise, a identificação do mal necessário e do bem egocêntrico, reprisado continuamente, convida a uma vivência de Hannah Arendt:
“…aprendemos que o mal é algo demoníaco sua encarnação é satã aquilo que me defrontei entretanto era inteiramente diferente no entanto inegavelmente factual que me deixou a torcida foi que a constitui a superficialidade em que o agente tornava impossível retratar o mal incontestado dos seus atos e suas raízes motivos e quaisquer níveis mais profundos e a única característica notória que se podia perceber tanto em seu comportamento anterior quanto durante o próprio julgamento e um sumário de culpa que o antecedeu era algo de inteiramente negativo não é estupidez mas irreflexão.” (Arendt, Hannah, A Vida do Espírito: O pensar, o querer, o julgar. Rio de Janeiro: Ed. Relume Dumará, 2000).
Deste modo, a cegueira social obsta a apreciação política genuína, bem como solidifica a assimilação da carência de teores práticos para uma redenção reflexiva e aceitação da incompetência primária de edificação de um ser social e político, tendo em vista que a deficiência social gera a escassez do estudo analítico do bem comum político. O que concebe a reserva de domínio para entidades providas de soberania intolerante.
Partindo desta coerência, significativo se faz um fragmento de Teócrito de Corinto:
“Podem amarrar as mãos de um homem, impedindo-lhe o gesto. Podem atar-lhe os pés, impedindo-lhe o andar. Podem vazar-lhe os olhos, impedindo a vista. Podem cortar-lhe a língua, impedindo a fala. O direito de pensar, o poder de pensar, porém, estão acima de todas as violências e de todas as repressões, que nada podem contra seu exercício. Se assim o quiseram os deuses, se assim o quer a própria natureza humana, parece claro que não há abuso mais abominável que o de tentar impor limitações ao pensamento de qualquer pessoa. ” (Teócrito de Corinto- filósofo grego do século II A.D., Liberdade de Pensamento. Unicamp 2019. SP)
Decerto, o ato de pensar se designa elemento vital da composição humana, tendo por certo a percepção consecutiva de que a práxis da monomania pseudocognitiva, se justifica, sobretudo, no mascaramento da liberdade do pensar. Tal desempenho alinha o pensamento social e político com a devida essência circunscrita do tempo, ao ponto em que o benefício do tolhimento cognitivo seja respeitado e protegido.
Nesta condição, aduz Nicolau Maquiavel, que “Todos veem o que você parece ser, mas poucos sabem o que você realmente é.” (Maquiavel, Nicolau. O Príncipe. Tradução de Maria Lucia Cumo. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1996).
Logo, no ato de abandono das expectativas alheias, se desampara o sentido do temor, da estima, e, maiormente, o receio do ódio. Ao definhar a aparência da força, a satisfação do engano prospera para uma conotação de genuinidade social e de dimensão política.
Neste aspecto, Franz Kafka discorre de modo filosófico, equivalente ao ponto, notadamente:
“É impossível dizer tudo, é impossível e não dizer tudo, é impossível conservar a liberdade, é impossível não conservá-la, é impossível levar a única vida possível, quer dizer, viver junto, mas, cada qual livre.” (Franz Kafka, 1913, Diário de viagem. Ed. Relógio D’agua, 2014).
Por conseguinte, o modo de continuidade da monomania pseudocognitiva se dá espontaneamente por intermédio popular da oferta do poder. Sendo gradualmente banal e alienador, o vigor da intolerância se legitima pela fraqueza da possessão, palpável e abstrata, às quais fundam arquétipos políticos e divindades sociais, sancionando os múltiplos grupos ao ilusório controle da reflexão sociopolítica.
Derivando desta agnição, valoroso se faz a inspiração composta por Renato Russo, no impulso da letra da canção Índios, melodia captada pela apreciação da obra nietzschiana “Assim falou Zaratustra”, textualmente:
“…quem me dera ao menos uma vez, explicar o que ninguém consegue entender, que o que aconteceu ainda está por vir e o futuro não é mais como era antigamente; Quem me dera ao menos uma vez, provar que quem tem mais do que precisa ter, quase sempre se convence que não tem o bastante, fala demais por não ter nada a dizer; Quem me dera ao menos uma vez, que o mais simples fosse visto como o mais importante, mas nos deram espelhos e vimos um mundo doente…” (Renato Russo, dezembro de 1986. Álbum Dois. Gravadora EMI).
A julgar pelo conforto desconfortável da sociedade, depreende-se a participação coletiva para um gancho criativo da dimensão problemática da obediência do bem fictício, sendo a riqueza humana ausente na valentia de sua auto-aversão política e social.
O brado da sabedoria tende a motivar sobressaltos pelo fato da persuasão sociopolítica da continência humana em todos os seus âmbitos. Nada obstante, a exploração extemporânea da consciência individual, remonta a desunião fatídica do indivíduo e o seu mau, cursando o espetáculo da cura em um fenômeno temível e interessante.
Diante da ignorância humana, mediante expressão de cura alheia, Franz Kafka expressa, metaforicamente:
“…Que vitória foi quando então uma noite, diante de um círculo grande de espectadores, eu agarrei uma garrafa de aguardente desarrolhei-a segundo as regras sobre a tensão crescente das pessoas, levei aos lábios e sem hesitar, sem contrair a boca como o bebedor de cátedra, com os olhos virados à guela, transbordando eu a esvaziei de fato e de verdade. Joguei fora a garrafa não mais como um desesperado, mas como um artista. Na realidade esqueci de passar a mão na barriga, mas em compensação, porque não podia fazer outra coisa, porque é impelido pra isso, porque os meus sentidos rodavam eu bradei sem mais “Alô”. Eu rompi no som humano saltei, com esse brado dentro da comunidade humana e senti, como um beijo em todo o meu corpo que pingava de suor, o eco: Ouçam! Ele fala! (Franz Kafka, Um relatório para uma Academia, in Um médico rural, op. cit. p. 70).
De forma fértil, Hannah Arendt delineia um proveito de liberdade sociopolítica:
“…se o sentido da política é a liberdade então isso significa que nós nesse espaço temos o direito de ter a expectativa de milagres, não por que acreditemos religiosamente em milagres, mas por que os homens, enquanto puderem agir, são aptos a realizar o improvável e o imprevisível e realizam no continuamente, saibam disso ou não.” (Arendt, Hannah. A Dignidade da Política. Rio de Janeiro: Ed. Relume Dumará, 1993).
Destarte, o intermédio da consequência propõe a verdade diante da realidade, dispondo de valia no ato tenaz da reflexão, como antídoto dos espasmos de identificação dos modos de interação ou destruição do sentido humano.
Categoricamente, a resistência é o alicerce da solução e da destruição. Resistir às monomanias do falso conhecimento abate a fobia e constitui a capacidade do pensar. Resistir às curas conexas do autoconhecimento e consequente reflexão da enfermidade social obsessiva, tonifica a precariedade coletiva e fortalece o medo.
A resistência é o fulcro distribuidor dos caminhos sociopolíticos, sendo esta, lacuna inevitável para a compreensão da influência virtuosa do pensar.
Referências bibliográficas
ARISTÓTELES. Política. São Paulo, SP: Martin Claret, 2007.
Hannah Arendt, A dignidade da política, p. 102. 3ª edição. 2002, Ed. Relume Dumará. RJ.
Platão, O mito da caverna, A Alegoria da caverna: A Republica, 514a-517c, 2a ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2000
Arendt, Hannah, A Vida do Espírito: O pensar, o querer, o julgar. Rio de Janeiro: Ed. Relume Dumará, 2000
Teócrito de Corinto- filósofo grego do século II A.D., Liberdade de Pensamento. Unicamp 2019. SP
Maquiavel, Nicolau. O Príncipe. Rio de Janeiro: Editora Paz e Terra, 1996
Franz Kafka, 1913, Diário de viagem. Ed. Relógio D’agua, 2014
Renato Russo, dezembro de 1986. Álbum Dois. Gravadora EMI
Franz Kafka, Um relatório para uma Academia, in Um médico rural
Arendt Hannah. A Dignidade da Política. Rio de Janeiro: Ed. Relume-Dumará, 1993;
Nietzsche, Friedrich W. Assim Falou Zaratustra: um livro para todos e para ninguém. Rio de Janeiro: Ed. Bertrand Brasil, 1998;
Arendt, Hannah, As Origens do Totalitarismo: totalitarismo, o paroxismo do poder. Rio de Janeiro: Ed. Documentário, 1979;
Arendt, Hannah. A Condição Humana. 10º ed. Rio de Janeiro: Ed. Forense Universitária, 2000;
A Vida do Espírito: O pensar, o querer, o julgar. Rio de Janeiro: Ed. Relume-Dumará, 2000;
KANT, Immanuel. Crítica da Faculdade do Juízo. Rio de Janeiro: Ed. Forense Universitária, 1995;