O AMBIENTE COMO MAIS UM RECURSO NA PSICOTERAPIA INFANTIL

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.12658273


Patrícia de Morais Rosa
Orientadora: Prof. Me Patrícia Rutsatz
Orientadora: Psicol.Lais Matto


1.        INTRODUÇÃO 

O objetivo do trabalho é fazer integração teórico clínico realizado em meu estágio básico II na Clínica Espaço Criar. Será um estágio de observação com foco na escuta para o acolhimento no atendimento aos alunos, pais e funcionários de uma escola estadual de ensino fundamental em Porto Alegre.

A disciplina Estágio Básico II: Observação, é composta de 80 horas, divididas em duas etapas: orientação de estágio, realizada às sextas-feiras no horário das 19h às 20h30 (quinzenalmente) em grupo presencial na sala de aula da faculdade e 7h semanais de estágio na Clínica Espaço Criar localizada R. Sete Povos, 330 – sala 901 – Mal. Rondon, Canoas – RS, esta etapa que ocorre na clínica é dividia entre:

  • Teórica:  Supervisão de acolhimento ocorrendo on-line, supervisão geral, seminários e reuniões semanais sobre as atividades extras ocorrendo de forma presencial no Espaço Criar.
  • Prática:  Ocorrendo o acolhimento na Escola Estadual São Francisco de Assis, localizada Av. Princesa Isabel, 1160 – Santana, Porto Alegre – RS

O presente trabalho descreve o estágio e o funcionamento do setor de psicologia em uma clínica multidisciplinar, que atende pacientes vindos de convênios médicos, particulares e carentes de Canoas e Porto Alegre. 

O estagiário de psicologia no estágio básico acompanha os atendimentos realizados pelos estagiários do específico aos alunos das escolas, familiares e equipe de funcionários, supervisionados pela psicóloga responsável pelo acolhimento escolar Dra. Simone de Nardi. Com os dados coletados no decorrer da prática do estágio, será possível trabalhar nesta produção uma proposta de intervenção sobre a importância do ambiente “setting“ como ferramenta na terapêutica Infantil.

2.       CARACTERIZAÇÃO DO LOCAL DE ESTÁGIO E INSERÇÃO DO ESTAGIÁRIO.

2.1      Histórico da Instituição 

O Espaço Criar nasceu do profundo interesse pessoal de sua fundadora, Katya de Araújo Azevedo, pelo estudo e prática da psicanálise. Graduada pela Unisinos, mestre em Psicologia Clínica pela PUCRS e Psicanalista pela Sociedade Brasileira de Psicanálise de Porto Alegre, Katya combinou sua paixão pelo ensino acadêmico e sua dedicação à prática clínica para criar o Espaço Criar em 2013.

No início, Katya era a única psicanalista de Canoas associada à Associação Psicanalítica Internacional (IPA). Mantendo-se fiel ao tripé psicanalítico – atendimento pessoal, supervisão e estudo – e às teorias fundamentadas por Freud, ela estabeleceu o Espaço Criar como um ambiente de trocas e aprendizado. Reuniu uma equipe inicial de renomadas psicanalistas para orientar a Formação e a Clínica Psicanalítica.

Desde sua fundação, o Espaço Criar se destacou por sua abordagem multidisciplinar, integrando campos como psicologia, nutrição, fonoaudiologia, psiquiatria e psicopedagogia.

A instituição oferece estágios de Psicologia básico e profissionalizante, colaborando com Universidades de Porto Alegre e região metropolitana, proporcionando aos acadêmicos experiências individuais e em grupo, tanto online quanto presencialmente.

2.2      Atividades desenvolvidas pelos estagiários

Os estagiários possuem muitas possibilidades de aprendizado no Espaço Criar, além dos seminários que são extremamente ricos para o estudo da psicanálise, possui grupo de estudos, e em todas as atividades da parte acadêmica da clínica os estagiários podem participar, algumas totalmente gratuitas e outras com valores simbólicos, assim como a clínica oferece atendimento psicanalítico aos estágios por valores sociais.

Com a chegada da pandemia de COVID-19 em 2020, o Espaço Criar adaptouse às circunstâncias, introduzindo grupos terapêuticos online coordenados por estagiários. Esses grupos alcançaram diversos públicos, ampliando o alcance social da clínica, são eles: 

  • Contos e Encontros, um grupo terapêutico presencial realizado com as crianças da Comunidade de Aprendizagem Karuna (Turno inverso) em Canoas-RS. 
  • Escuta quem educa, um grupo terapêutico on-line destinado aos professores.
  • Grupo Conviver, um grupo presencial para mulheres que vão a semanalmente a praça central de Esteio.  

Além dos grupos, a instituição promove acolhimento aos alunos, pais e funcionários das escolas públicas conveniadas a clínica, atividades comunitárias, como eventos, cursos, campanhas, palestras e Jornadas.

O Espaço Criar também abriga comissões internas, incluindo a Comissão Criar em Cena, que organiza o Cine Debate, um evento que analisa filmes e séries sob a perspectiva psicanalítica.

A clínica conta ainda com outras três comissões: Comissão de Divulgação, Comissão Científica (responsável por atividades científicas), Comissão Social (organiza os eventos sociais e integrativos da equipe) e Comissão Cultural (propõe atividades com temas da cultura).

Recentemente, o Espaço Criar lançou o podcast “Podcriar”, dedicado a discutir temas relacionados à psicanálise, visando disseminar o conhecimento produzido. O símbolo do Espaço Criar – o infinito com um polo fechado, representando a confidencialidade e continência oferecidas pela clínica, e um espaço aberto para novas possibilidades – reflete sua missão de cuidar do bem-estar dos indivíduos, gerar conhecimento e compartilhar as potencialidades da psicologia e da psicanálise com a comunidade.

Como o próprio nome sugere, o Espaço Criar é um local em constante evolução, aberto a atualizações e inovações que contribuam para o desenvolvimento pessoal e social. O Espaço Criar é onde a psicanálise se encontra com a inovação, a comunidade se torna família, e o potencial humano floresce.

Hoje a equipe é formada por 18 estagiários de psicologia, 14 supervisores de estágio, 3 funcionárias administrativas e recepção e 39 terapeutas.

Cada atividade possui um psicólogo responsável pela supervisão dos estagiários que fazem parte do grupo ou comissão, dessa forma possibilita aos estudantes obterem uma multiplicidade de experiências enriquecendo de forma significativa o aprendizado.

2.3      Percepções Iniciais 

Fui recepcionada de forma muito positiva por toda a equipe de psicologia da clínica Espaço Criar. Meu primeiro contato foi com as psicólogas Évelin Adams, Katya de Araújo Azevedo e Lais Mattos, que são responsáveis pela seleção dos estagiários para o primeiro semestre de 2024. Logo em seguida, passei pela segunda etapa com a psicóloga Lais, que coordena o grupo de estágio básico.

Após ser aprovada nos processos de seleção, todos nós fomos convidados a nos reunir para nos conhecermos e entendermos o funcionamento da clínica e das atividades. Cada estagiário escolheu grupos e atividades de acordo com sua disponibilidade para seguir ao longo deste semestre.

Acolhimento e orientação foram oferecidos com muito cuidado e carinho, estabelecendo uma transferência positiva com nossos supervisores. Nossas reuniões semanais são momentos de estudo e debate, e para estimular os vínculos, compartilhamos café e petiscos.

Participamos do acompanhamento de triagens conduzidas por Katya e Evelin, uma experiência extremamente rica em análise e técnica. Após cada triagem, a psicóloga nos questiona sobre nossas percepções em relação ao paciente e nos orienta.

As primeiras semanas têm sido desafiadoras. Ao acompanhar os psicólogos nas triagens, me deparo com a realidade da clínica. Os pacientes chegam com problemas reais que os afligem profundamente. Não são apenas casos que lemos em seminários; são as dores pulsantes de cada ser humano que busca ajuda na poltrona de um psicólogo.

Os atendimentos às crianças na escola também representam um desafio ainda maior. Preciso colocar em prática muitas técnicas estudadas, e muitas vezes sou fortemente impactada pela história e contexto de cada aluno.

No entanto, essa oportunidade de estágio me proporciona, como estudante de Psicologia, aprendizados, reflexões e sensibilização em relação à percepção da criança como sujeito de potencialidades e ensinamentos. Além das vivências clínicas, essa experiência amplia minha compreensão sobre a prática profissional.

Os ensinamentos proporcionados por essa experiência são únicos, contribuindo tanto para o meu crescimento pessoal quanto para o aprendizado profissional. O público atendido no estágio possui características singulares que devem ser consideradas na atuação do psicólogo.

Embora o trabalho com crianças na clínica muitas vezes me coloque diante de situações frustrantes, também compreendo que enquanto psicóloga em formação faço o que está ao meu alcance, mesmo que esteja aquém das minhas expectativas. O trabalho não é em vão, pois a criança pode compreender que naquele espaço ela tem voz e é considerada. Isso transcende o que podemos considerar como impedimentos e me leva a repensar as competências e o comprometimento necessários na condição de futura profissional de psicologia, buscando apoio teórico para enfrentar os desafios que a prática impõe.

3.       ANÁLISE DA IMPLICAÇÃO 

“Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana.
Carl Jung 

Carl Jung nos lembra que, embora o conhecimento teórico e as habilidades técnicas sejam essenciais na prática profissional, é crucial reconhecer nossa própria humanidade ao lidar com outras almas humanas. Como psicólogos, podemos dominar as teorias e técnicas, mas é no encontro genuíno com o outro que fazemos a diferença. Nossas palavras, gestos e empatia podem impactar positivamente o ambiente educacional, contribuindo para o bem-estar dos alunos e de toda a comunidade escolar.

Durante o semestre passado, tive a oportunidade de realizar um estágio em um ambiente hospitalar, focando no trabalho com luto e cuidados paliativos. Diariamente, me deparei com a morte e a concretude da finitude, o que me fez refletir sobre meu próprio caminho e observar onde os caminhos percorridos pelos pacientes os levaram. Agora, estou estagiando em um cenário onde a vida pulsa, onde ela começa. Cada olhar, cada sorriso e cada abraço que recebo de uma criança acolhida traz consigo a esperança. Quando entro na sala e vejo os lábios e os olhos dessas crianças sorrindo, minha fé na prática desse ofício tão belo e significativo se renova. No entanto, também percebo a responsabilidade que carrego ao lidar com a mente e os sentimentos desses seres humanos em formação.

Trabalho em dupla com uma colega no estágio específico, aluna da Faculdade Dom Bosco, que, assim como eu, nunca havia tido experiência com o atendimento infantil. No entanto, escolhi me desafiar desde que decidi participar da seleção deste estágio, mesmo tendo recuado anteriormente diante do atendimento infantil. Sair da zona de conforto e, ao longo desse processo, me analisar como profissional em construção tem sido enriquecedor para aprimorar meus conhecimentos.

Cada dia de estágio é uma alegria e uma surpresa, um desafio diferente. Muitas vezes, os professores solicitam atendimentos específicos para alunos, e ao analisar seus comportamentos, percebo que muitos dos problemas de comportamento são, na verdade, dificuldades normais do desenvolvimento. Essas crianças frequentemente recebem rótulos de ‘problema’ simplesmente por apresentarem esses comportamentos com maior ou menor intensidade do que o esperado pelos profissionais.

Percebo desafios adicionais nessa experiência, como a carga horária dos professores, o estresse, o baixo salário e a falta de treinamento atualizado para lidar com esse novo perfil de crianças e adolescentes. O contexto em que atuo, sendo um local público com limitações financeiras, também não pode ser ignorado, especialmente quando se trata de proporcionar um ambiente adequado para o atendimento. A sala disponibilizada é simples e desprovida de elementos lúdicos, o que se torna mais um desafio. Afinal, trabalhar com crianças requer um ambiente acolhedor e estimulante como premissa básica para acessar o conteúdo necessário ao tratamento.

Esses desafios me motivam cada vez mais, pois evidenciam o quanto podemos contribuir não apenas para o indivíduo, mas também para o coletivo e o social. Mesmo diante das limitações, meu compromisso com o bem-estar das crianças me impulsiona a encontrar soluções criativas e eficazes.

4.       O AMBIENTE COMO MAIS UM RECURSO NA PSICOTERAPIA INFANTIL 

O ambiente terapêutico, também conhecido como setting, é o local onde a terapia ocorre. Ele desempenha um papel crucial no processo terapêutico, influenciando o bem-estar e a tranquilidade do paciente. 

A terapêutica infantil é um processo complexo que envolve não apenas a interação entre o terapeuta e a criança, mas também a influência do ambiente em que a terapia ocorre. O ambiente, ou setting, é um elemento crucial nesse processo, pois pode influenciar significativamente a capacidade da criança de se expressar, aprender e se desenvolver. No campo psicanalítico, o setting refere-se ao espaço proposto para promover a estruturação simbólica dos processos subjetivos inconscientes. Além do espaço físico, o setting envolve as condições técnicas básicas para a intervenção psicanalítica (BARROS, 2013).

Na terapia infantil, é essencial proporcionar um ambiente seguro e acolhedor. O terapeuta deve dispor de recursos lúdicos adequados para atender às necessidades e estágios da vida da criança, permitindo que ela se sinta à vontade para expressar seus pensamentos e emoções. Isso possibilita que a criança explore seus sentimentos mais profundos e compartilhe suas experiências de forma autêntica.

Um ambiente terapêutico eficaz deve possuir certas características que o tornem acolhedor e inspirador. Algumas dessas características podem incluir:

  • Luminosidade e Temperatura: A luminosidade e temperatura do ambiente devem ser apropriadas para a idade e necessidades da criança. Isso pode ajudar a criar uma atmosfera relaxante e confortável.
  • Decoração e Mobiliário: A decoração e mobiliário do ambiente devem ser apropriados para a idade e necessidades da criança. Isso pode incluir brinquedos, livros e outros materiais que sejam atraentes e estimulem a curiosidade.
  • Silêncio e Calma: O ambiente deve ser silencioso e calmo, permitindo que a criança se concentre no tratamento e não seja distraída por ruídos ou outras fontes de estresse.
  • Flexibilidade e Adaptabilidade: O ambiente deve ser flexível e adaptável às necessidades específicas da criança. Isso pode incluir mudanças na decoração ou no mobiliário para atender às necessidades individuais.

O ambiente pode ser utilizado como ferramenta na terapêutica infantil de várias maneiras. Algumas dessas maneiras incluem:

  • Criar uma Atmosfera Segura: O ambiente pode ser projetado para criar uma atmosfera segura e acolhedora, permitindo que a criança se sinta confortável e confiante durante o tratamento.
  • Estimular a Curiosidade: O ambiente pode ser projetado para estimular a curiosidade e o interesse da criança, ajudando a criar uma atmosfera de aprendizado e descoberta.
  • Reduzir o Estresse: O ambiente pode ser projetado para reduzir o estresse e a ansiedade das crianças, permitindo que elas sejam mais receptivas ao tratamento.
  • Aumentar a Comunicação: O ambiente pode ser projetado para aumentar a comunicação entre o terapeuta e a criança, permitindo que elas sejam mais eficazes em se entender e trabalhar juntas.

Na Escola Estadual São Francisco, a sala designada para os acolhimentos aos alunos não possuía o ambiente acolhedor e aconchegante necessário para que as crianças se sentissem à vontade. Apesar de se tratar de uma escola pública com recursos financeiros limitados, a coordenação escolar, sempre disposta a auxiliar no processo, disponibilizou um espaço com privacidade. Esse ambiente possui duas janelas que oferecem vista para o pátio, permitindo avistar as árvores e proporcionando boa luminosidade e ventilação, entretanto não era acolhedor o suficiente para a clínica infantil.

As crianças que eu e minha colega de estágio realizamos os acolhimentos são do primeiro ao quinto ano do ensino fundamental, com idades variando entre 6 e 11 anos.

Percebemos que a entrada das crianças na sala de acolhimento era marcada por diferentes reações. Algumas ficavam tensas, outras desconfortáveis e algumas demonstravam desconfiança em relação ao ambiente e a nós, duas pessoas não familiares presentes. É importante considerar essas reações para criar um ambiente acolhedor e propício ao vínculo terapêutico.

Na abordagem winnicottiana, compreendemos que o ambiente desempenha um papel crucial no processo terapêutico. Quando o ambiente não é suficientemente bom e acolhedor, a criança pode desenvolver resistência à terapia. Por esse motivo, conversamos com a coordenação da escola e obtivemos permissão para fazer algumas mudanças na sala de acolhimento, dividindo o ambiente em dois:

1) Ambiente Lúdico:

  • Colocamos piso emborrachado colorido.
  • Disponibilizamos mesa e cadeiras infantis com lápis, caneta e giz de cera.
  • Adesivamos as paredes e armário com figuras infantis coloridas, como lápis, cadernos e personagens.
  • Incluímos um quadro negro para desenhos livres e frases de acolhimento.
  • Trouxemos jogos e brinquedos guardando-os dentro do armário para que fossem usados em momentos oportunos.

2) Ambiente para Adolescentes/Adultos:

Por ser um ambiente que também faz atendimentos com os adolescentes e adultos, que são atendidos em outro dia da semana por outra equipe da clínica, não alteramos a sobriedade desta parte da sala.

Deixamos duas poltronas maiores, uma cadeira auxiliar e uma mesa do tamanho de uma classe escolar para os acolhimentos realizados podendo servir de apoio.

Os materiais de uso pessoal e gráfico ficam guardados em um armário na sala de atendimento, com as portas fechadas. O intuito do armário, assim como de uma caixa lúdica, é que esta represente o mundo interno da criança (Winnicott, 1988/1990b).

Figura1 :Ambiente Lúdico

Figura 2: Quadro para desenho e expressão

Figura 3: Sala de acolhimento com os dois ambientes: um lúdico para as crianças e outro com as poltronas para os atendimentos dos adolescentes e adultos.

Estabelecer um ambiente psíquico lúdico e acolhedor foi fundamental para garantir a continuidade do trabalho e favorecer o desenvolvimento de vínculo com as crianças. Dessa forma utilizamos recursos lúdicos como ferramentas para acessar o conteúdo emocional delas, como por exemplo material de desenho, como lápis, canetas coloridas, giz de cera e folhas brancas, jogos e brinquedos com personagens que poderiam ser identificados como as pessoas da família, ou com pessoas dos ambientes de convívio da criança. 

A utilização do ambiente lúdico e do brincar é fundamental na terapia com crianças. Por meio do brincar, as crianças expressam seus conflitos internos, elaboram emoções e desenvolvem habilidades sociais e emocionais. O ambiente lúdico oferece um espaço seguro para explorar questões difíceis, promovendo a cura e o crescimento. Terapeutas que incorporam o brincar em suas práticas reconhecem sua relevância na compreensão da mente infantil e na promoção do bem-estar.

Winnicott é conhecido por sua ênfase no “brincar” como uma parte essencial do desenvolvimento infantil e do processo terapêutico. Ele acreditava que o brincar permitia que as crianças expressassem seus conflitos internos e elaborassem suas emoções. Klein também enfatizou a importância do brincar na análise infantil. Ela viu o brincar como uma forma de simbolização e elaboração de conteúdos inconscientes. Esses autores exploraram o brincar como uma ferramenta valiosa para compreender a mente infantil e promover a cura emocional, neste contexto o ambiente entra como uma ferramenta que favorece as técnicas na terapêutica infantil.

Inspiradas na abordagem winnicottiana entendemos que além do ambiente o manejo do setting é essencial para criar um ambiente de holding (sustentação emocional). Winnicott (1955d/2000b). Assim, passamos a buscar as crianças na sala de aula e, de mãos dadas com as menores, as conduzimos até a sala de acolhimento, bem como as levamos de volta à sala de aula após o atendimento.

5.        CONCLUSÃO

O ambiente terapêutico é mais do que apenas um local físico; é um espaço que pode ser projetado para criar uma atmosfera segura, acolhedora e inspiradora. Isso é especialmente importante para crianças, que podem ser facilmente afetadas por mudanças no ambiente e podem ter dificuldade para se adaptar a novos espaços. Um ambiente terapêutico bem projetado pode ajudar a reduzir o estresse e a ansiedade das crianças, permitindo que elas sejam mais receptivas ao tratamento.

Após a intervenção, passou-se a considerar a relação analítica a partir da criação de um espaço potencial. Nesse ambiente lúdico, as crianças podem estabelecer o vínculo necessário ao processo terapêutico por meio do brincar. Esse espaço acolhedor permite que as emoções sejam canalizadas de forma positiva na experiência infantil. O setting terapêutico, cuidadosamente preparado, é fundamental para o desenvolvimento saudável das crianças, permitindo que elas construam relações e adquiram habilidades essenciais. 

A cada sessão repunha-se o material gráfico que fosse necessário, tanto por ter acabado ou por solicitação do paciente, quanto por ter sido “destruído”, quando o objeto passou a ser inutilizado pela criança que o quebra. Esse tipo de manejo visava ao estabelecimento de um setting suficientemente bom, adaptando-se a todas as necessidades do paciente. Segundo Winnicott (1942/1982), as crianças só depositarão seu ódio e agressão no meio que conhecem e confiam, pois sabem que esse ódio e violência do meio não retornará para elas. Um bom ambiente será o capaz de tolerar essa agressividade, e o adulto deve oferecer sua presença com a intenção de acolher essas demandas emocionais.

A terapêutica infantil é uma área crucial para o desenvolvimento saudável das crianças. O ambiente desempenha um papel fundamental nesse processo, proporcionando um espaço seguro e acolhedor para a exploração emocional. A relação analítica é estabelecida por meio do brincar, permitindo que as crianças construam vínculos necessários para a cura. O setting terapêutico, cuidadosamente preparado, inclui não apenas o espaço físico, mas também a dimensão psicológica da relação entre terapeuta e paciente. Essa combinação cria as condições ideais para o crescimento e a transformação. Mudanças positivas no ambiente podem resultar em evolução significativa no processo terapêutico com as crianças.

O ambiente é um elemento crucial na terapêutica infantil, pois pode influenciar significativamente a capacidade da criança de se expressar, aprender e se desenvolver. Um ambiente terapêutico bem projetado pode ajudar a criar uma atmosfera segura, acolhedora e inspiradora, permitindo que as crianças sejam mais receptivas ao tratamento e mais eficazes em se desenvolver. Ao utilizar o ambiente como ferramenta, os terapeutas podem criar um local que seja eficaz, benéfico para as crianças.

Após nossas mudanças no ambiente de atendimento infantil, percebemos uma evolução, pois muitas crianças ao entrarem na sala já sorriam e se sentavam nas cadeiras infantis, falando, querendo desenhar e brincar conosco. Ao se despedir deixavam agendado o que queriam fazer na próxima sessão.  

Dessa forma percebemos a importância do ambiente como mais um recurso na psicoterapia infantil. 

6.        BIBLIOGRAFICA

Clinica Espaço Criar – Site: <https://clinicaespacocriar.com.br/nossa-historia/> acesso em: 02 abri 2024

BARROS, G. O Setting Analítico: Situações Clínicas Especiais. Disponível em:<www.fundamentalpsychopathology.org/uploads/files/v_congresso/mr_58__gloria_barros.pdf>. Acesso em: 21 mar. 2013.

Klein, M. (1926). A técnica da análise de crianças pequenas. In A psicanálise de crianças. Obras completas de Melanie Klein. Vol. 2. Rio de Janeiro: Imago.

Winnicott, D. W. (1958/2000). Da pediatria à psicanálise: obras escolhidas. Trad. David Litman Bogomoletz. Rio de Janeiro: Imago.         

Winnicott, D. W. (2000). Aspectos clínicos e metapsicológicos da regressão dentro do setting analítico. In D. W. Winnicott (2000/1958a), Textos selecionados: da Pediatria à Psicanálise (pp. 374-392). Rio de Janeiro: Imago. (Trabalho original publicado em 1955; respeitando-se a classificação de Hjulmand, temos 1955d[1954]         

Winnicott, D. W. (1982) A criança e seu mundo. Rio de Janeiro, RJ: Imago. (Trabalho original publicado em 1942)

Winnicott, D. W. (2000b). Desenvolvimento emocional primitivo. I Winnicott, D. W. (1988). A mãe dedicada comum. In D. W. Winnicott (1988/1987a), Os bebês e suas mães. São Paulo: Martins Fontes. (Trabalho original publicado em 1987[1966]; respeitando-se a classificação Huljmand, temos 1987e[1966]) 45 

Winnicott, D. W. (1990). Natureza humana. Rio de Janeiro: Imago. (Trabalho original publicado em 1988)