O ACIDENTE DE TRABALHO E A RESPONSABILIDADE DA EMPRESA À LUZ DO DIREITO DO TRABALHO BRASILEIRO

WORK ACCIDENT AND THE COMPANY’S RESPONSIBILITY IN THE LIGHT OF BRAZILIAN LABOR LAW

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cl10202410251702


Tayrine Gabriely Slompo
Orientador: Prof. Dr. Thiago Ferreira Pavezzi


RESUMO 

Neste trabalho serão abordados os acidentes de trabalho, a evolução da legislação trabalhista no Brasil e a responsabilidade civil no contexto dos acidentes. O objetivo geral é analisar a evolução histórica dos acidentes de trabalho e a regulamentação trabalhista. Os objetivos específicos incluem a análise das condições de trabalho antes da Consolidação das Leis de Trabalho (CLT), a criação da CLT e a evolução da legislação após sua promulgação. A metodologia utilizada foi a pesquisa bibliográfica e análise de documentos legais.

Palavras-chave: Acidentes de trabalho. Legislação trabalhista. Responsabilidade civil.

ABSTRACT 

In this paper, work-related accidents, the evolution of labor legislation in Brazil, and civil liability in the context of accidents will be addressed. The general objective is to analyze the historical evolution of work-related accidents and labor regulation. The specific objectives include the analysis of working conditions before the CLT (Consolidation of Labor Laws), the creation of the CLT, and the evolution of the legislation after its enactment. The methodology used was bibliographic research and analysis of legal documents.

Keywords: Civil liability. Labor legislation. Work-related accidents.

INTRODUÇÃO  

A proteção do trabalhador é um aspecto central para a promoção de um ambiente de trabalho seguro e saudável. Historicamente, os acidentes de trabalho têm sido uma preocupação significativa, especialmente em ambientes industriais e fabris, onde o risco de lesões é elevado. Esse tema ganhou relevância à medida que o Brasil evoluiu em termos de sua regulamentação trabalhista, culminando na criação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em 1943. A importância da legislação trabalhista, principalmente no que diz respeito à segurança e saúde no trabalho, é inquestionável, já que visa garantir a proteção dos trabalhadores e a responsabilização das empresas em caso de acidentes. 

O objetivo geral deste trabalho é analisar a evolução histórica dos acidentes de trabalho e como a regulamentação trabalhista, por meio da CLT, moldou o cenário atual de proteção ao trabalhador. Especificamente, o estudo busca compreender as condições de trabalho antes da promulgação da CLT, a importância da criação dessa legislação e como as normas de segurança evoluíram após sua implementação, especialmente no que diz respeito à responsabilidade civil das empresas. 

A justificativa para a escolha deste tema reside na necessidade crescente de entender a evolução e o impacto das normas de segurança do trabalho, em um contexto em que os acidentes de trabalho continuam a ser uma preocupação importante. A segurança dos trabalhadores é, hoje, uma prioridade para empresas e órgãos fiscalizadores, sendo fundamental que os empregadores se adequem às exigências legais para garantir um ambiente laboral seguro e eficiente. 

No tópico 2, o presente trabalho abordará a origem dos acidentes de trabalho e sua regulamentação inicial, tanto em contextos internacionais quanto no Brasil, destacando como esses eventos moldaram a necessidade de leis específicas para proteger os trabalhadores. Será discutida, ainda, a situação do trabalho antes da criação da CLT, evidenciando o ambiente de desproteção e vulnerabilidade em que se encontravam os trabalhadores. 

No tópico 3, será analisada a criação da CLT como um marco histórico para as relações de trabalho no Brasil, estabelecendo direitos e obrigações que modificaram substancialmente a segurança no trabalho e a responsabilidade das empresas. A evolução da legislação após a CLT também será tratada, com destaque para as Normas Regulamentadoras (NRs) e suas implicações na prevenção de acidentes. 

O tópico 4 examinará a responsabilidade civil das empresas, enfatizando os elementos da responsabilidade, como conduta, nexo causal e dano, e como a legislação passou a responsabilizar objetivamente as empresas em casos de atividades de risco. 

Por fim, no tópico 5, o trabalho apresentará um panorama atual dos acidentes de trabalho no Brasil, os desafios que persistem, e as responsabilidades das empresas, especialmente à luz das mudanças trazidas pela Reforma Trabalhista de 2017. 

Para a elaboração deste estudo, foi utilizada a metodologia de pesquisa bibliográfica, baseada na análise de documentos legais, doutrinas, jurisprudências e estudos especializados no campo da segurança e saúde no trabalho. Essa abordagem permitiu um exame crítico e fundamentado das principais questões relativas à evolução das normas de proteção ao trabalhador e à responsabilidade das empresas nos acidentes de trabalho. 

1 O ACIDENTE DE TRABALHO 

1.1 ORIGEM E DESENVOLVIMENTO

A preocupação com os acidentes de trabalho teve início durante a Revolução Industrial, no final do século XVIII, particularmente na Inglaterra, onde as condições de trabalho nas fábricas eram extremamente precárias. Com o advento das máquinas, o risco de acidentes cresceu significativamente, mas não havia leis ou regulamentações que protegessem os trabalhadores. 

As primeiras tentativas de mitigação desses problemas surgiram no século XIX. Em 1833, a Inglaterra deu o primeiro passo com o Factory Act, legislação que buscava limitar o trabalho infantil e reduzir a jornada de trabalho, sem, contudo, focar diretamente na segurança. Ainda assim, esse marco inicial foi fundamental para o desenvolvimento de futuras normas trabalhistas. 

Na Alemanha, durante o governo de Otto von Bismarck, o Estado se tornou pioneiro ao promulgar, em 1884, a Lei do Seguro de Acidentes de Trabalho, que obrigava os empregadores a indenizarem seus empregados em caso de acidentes. 

Essa lei representou uma grande inovação, pois reconhecia o direito à proteção social e financeira dos trabalhadores acidentados. 

Seguindo a tendência europeia, a França, em 1898, aprovou a Lei dos Acidentes de Trabalho, que estabelecia a responsabilidade objetiva do empregador pelos acidentes ocorridos no ambiente de trabalho. Esse modelo de responsabilidade serviu de base para muitas legislações trabalhistas no século XX, influenciando o conceito de proteção ao trabalhador globalmente. 

1.2 NO BRASIL

No Brasil, o processo de industrialização ganhou força no final do século XIX e início do século XX. Contudo, até meados do século XX, a regulamentação sobre acidentes de trabalho era praticamente inexistente. As condições nas fábricas eram insalubres e perigosas, e os acidentes eram tratados como parte natural do processo produtivo. Trabalhadores que sofriam lesões ou incapacidades decorrentes de acidentes geralmente ficavam desamparados, sem qualquer indenização ou assistência social. 

A primeira tentativa de proteção aos trabalhadores brasileiros veio com a Lei Eloy Chaves, de 1923, que criou as Caixas de Aposentadorias e Pensões (CAPs) para os empregados das ferrovias. Embora ainda fosse limitada, a lei introduziu o conceito de previdência social no país, visando, em parte, proteger os trabalhadores contra os riscos laborais. 

1.2.1 Antes da CLT: um cenário de desproteção e vulnerabilidade 

Antes da promulgação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em 1943, o cenário trabalhista brasileiro era marcado pela falta de qualquer regulamentação ou proteção efetiva aos trabalhadores. Desde a Revolução Industrial, o Brasil acompanhou a introdução de fábricas e indústrias, especialmente nas grandes cidades do sudeste. Esse processo acelerado de industrialização trouxe consigo problemas severos para a classe trabalhadora, incluindo jornadas extenuantes, ambientes insalubres e perigosos, e a total ausência de regulamentação que garantisse a proteção do trabalhador contra os acidentes de trabalho. 

Nas fábricas brasileiras do início do século XX, a maioria dos trabalhadores era exposta a condições extremamente precárias. Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) praticamente não existiam, e as máquinas, frequentemente, não possuíam proteções adequadas. Os acidentes de trabalho eram comuns e frequentemente resultavam em incapacidades permanentes ou até mesmo mortes. Sem qualquer lei que obrigasse os empregadores a zelarem pela segurança, os acidentes eram vistos como eventos naturais, e os trabalhadores acidentados ficavam à mercê de sua própria sorte. 

Além disso, o emprego de crianças e mulheres era prática comum nas fábricas. As crianças, muitas vezes ainda em idade escolar, eram empregadas em atividades perigosas, enquanto as mulheres enfrentavam longas jornadas, sem qualquer proteção à maternidade ou a suas condições de saúde específicas. Nesse contexto, os acidentes de trabalho raramente geravam qualquer tipo de compensação ou amparo legal para os trabalhadores, que ficavam completamente desprotegidos. 

O cenário começou a mudar, de forma tímida, a partir do final do século XIX e início do século XX, com as primeiras tentativas de regulamentar o trabalho no Brasil. Em 1907, a Lei Adolfo Gordo foi a primeira legislação a tratar da limitação do trabalho infantil nas fábricas. Contudo, essas leis ainda eram insuficientes e não abordavam de forma ampla a questão da segurança e da saúde dos trabalhadores. 

1.2.2 A criação da CLT: um marco histórico 

A criação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em 1º de maio de 1943, durante o governo de Getúlio Vargas, foi um divisor de águas na regulamentação das relações de trabalho no Brasil. A CLT surgiu em um momento em que o país vivia um intenso processo de industrialização e urbanização. A pressão dos movimentos sindicais, somada à necessidade de modernizar a economia e promover a justiça social, levou o governo a consolidar as diversas normas trabalhistas dispersas em um único documento, que abrangesse todos os aspectos das relações de trabalho. 

A CLT representou um divisor de águas na história dos direitos trabalhistas brasileiros, especialmente no que se refere à segurança e saúde no trabalho. Pela primeira vez, os empregadores passaram a ser obrigados a seguir normas de segurança rigorosas, estipuladas por regulamentos como as Normas Regulamentadoras (NRs). Entre as principais exigências estabelecidas pela CLT, destaca-se a obrigação de fornecer Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) adequados para os trabalhadores expostos a riscos, assegurando que suas atividades fossem desempenhadas de forma segura. 

Esses equipamentos, que incluem capacetes, luvas, óculos de proteção e calçados especiais, passaram a ser de responsabilidade do empregador, que deve garantir tanto a sua entrega quanto o seu uso adequado pelos funcionários.  

As normas também estipulam que os empregadores devem garantir a manutenção dos equipamentos, além de promover a capacitação dos trabalhadores para que compreendam os riscos associados às suas atividades e saibam como utilizar corretamente os EPIs.  

O descumprimento dessas obrigações pode resultar em sanções por parte do Ministério do Trabalho, que realiza inspeções periódicas para verificar a conformidade com as normas de segurança.   

Pois a regulamentação também trouxe exigências específicas para os ambientes de trabalho, como a adequação das condições físicas e estruturais, a fim de garantir que seguissem padrões mínimos de segurança. Isso incluiu desde a correta ventilação e iluminação dos locais até a organização do espaço para evitar acidentes relacionados ao uso inadequado de máquinas e equipamentos. 

Essas sanções têm como objetivo garantir a conformidade dos empregadores com as normas de proteção aos trabalhadores e são aplicadas após inspeções periódicas realizadas por auditores fiscais do trabalho. Os empregadores que não cumprem as exigências podem ser submetidos a uma série de penalidades que variam de acordo com a gravidade da infração. 

As principais obrigações dos empregadores devem: 

  1. Fornecer Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) adequados e garantir que os trabalhadores utilizem esses equipamentos de maneira correta; 
  2. Manter os EPIs em boas condições, providenciando substituição quando necessário; 
  3. Adequar o ambiente de trabalho às normas de segurança, garantindo, por exemplo, a ventilação, iluminação e proteção das máquinas e equipamentos; 
  4. Oferecer treinamento contínuo aos empregados sobre os riscos das atividades e o uso correto dos EPIs; 
  5. Realizar exames médicos periódicos para monitorar a saúde dos trabalhadores, especialmente em atividades que envolvem riscos à integridade física; 
  6. Elaborar e implementar programas de prevenção, como o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA) e o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO), para monitorar e minimizar os riscos no ambiente de trabalho. 

Quando essas obrigações não são cumpridas, o empregador pode ser submetido a diferentes tipos de sanções administrativas como: 

Multas administrativas: a penalidade mais comum é a aplicação de multas que variam de acordo com a gravidade da infração e o porte da empresa. Essas multas podem ser leves, médias, graves ou gravíssimas, conforme previsto no Decreto nº 4.552/2002 (Regulamento da Inspeção do Trabalho – RIT). As multas são aplicadas quando o empregador descumpre normas de segurança e saúde, como o fornecimento inadequado de EPIs ou a falta de manutenção de máquinas.  

Embargo ou interdição: em casos de infrações graves ou que apresentem risco iminente à vida e à integridade física dos trabalhadores, o Ministério do Trabalho pode determinar o embargo de obras ou a interdição de atividades ou setores da empresa até que as irregularidades sejam corrigidas. Esse tipo de sanção impede o empregador de continuar a operação até que as condições de trabalho sejam regularizadas. 

Ação civil pública: o Ministério Público do Trabalho (MPT) pode ingressar com uma Ação Civil Pública contra a empresa infratora, exigindo a correção das irregularidades e o pagamento de indenizações coletivas por danos causados aos trabalhadores e à sociedade. 

Acordos de Ajuste de Conduta (TACs): para evitar a continuidade das infrações, o Ministério do Trabalho e o MPT podem firmar Termos de Ajuste de Conduta (TACs) com o empregador, que consistem em compromissos assumidos pela empresa para corrigir as irregularidades no ambiente de trabalho dentro de prazos estabelecidos. 

Rescisão indireta: em casos em que o empregador falha em garantir condições mínimas de segurança e saúde, o trabalhador pode solicitar a rescisão indireta do contrato de trabalho, que se configura como uma demissão provocada pela conduta inadequada do empregador. Nesse caso, o trabalhador tem direito a receber todas as verbas rescisórias como se tivesse sido demitido sem justa causa. 

Responsabilidade civil e penal: além das sanções administrativas, os empregadores podem ser responsabilizados civil e penalmente em caso de acidentes graves ou fatais. A responsabilização civil implica o pagamento de indenizações por danos morais, materiais e estéticos ao trabalhador ou à sua família. A responsabilidade penal pode ser aplicada em casos de omissão culposa, resultando em processos criminais contra o empregador ou responsáveis pela segurança. 

Essas sanções, aplicadas pelo Ministério do Trabalho, têm como objetivo forçar as empresas a adotarem medidas preventivas e garantir um ambiente de trabalho seguro e saudável, conforme estabelecido pela CLT e pelas Normas Regulamentadoras. 

O impacto dessas inovações foi significativo, contribuindo para uma redução no número de acidentes de trabalho no Brasil. Com o tempo, as empresas foram incentivadas a investir mais em programas de prevenção de acidentes e na criação de ambientes mais seguros, levando a uma mudança cultural importante no mercado de trabalho.  

Essas mudanças introduzidas pela CLT se refletiram diretamente na melhoria das condições de trabalho, promovendo uma maior conscientização dos empregadores quanto à importância da segurança no ambiente laboral. Assim, a CLT consolidou um marco legal que protege a integridade física dos trabalhadores e impõe a responsabilidade aos empregadores, criando um ambiente laboral mais justo e seguro para todos os envolvidos. 

A fiscalização das empresas foi intensificada, e o Ministério do Trabalho passou a desempenhar um papel crucial na supervisão e implementação das novas normas, realizando inspeções periódicas para garantir que os empregadores estivessem cumprindo suas obrigações.  

Além disso, a CLT estabeleceu uma série de garantias fundamentais para os trabalhadores, como a jornada de trabalho limitada a 8 horas diárias, o direito a férias remuneradas, o descanso semanal remunerado, entre outros. Essas mudanças foram essenciais para reduzir a incidência de acidentes de trabalho, pois a fadiga excessiva, decorrente das longas jornadas de trabalho anteriores à CLT, era um dos principais fatores que contribuíam para a ocorrência de acidentes graves. 

Outro ponto de destaque na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) foi a proteção especial destinada às mulheres no ambiente de trabalho. A licença maternidade, que foi estabelecida com o objetivo de permitir que as mulheres possam se recuperar do parto e cuidar de seus recém-nascidos sem perder o vínculo empregatício, marcou um avanço significativo. Esse direito, inicialmente de 84 dias, foi posteriormente ampliado para 120 dias pela Constituição Federal de 1988, o que reforçou ainda mais a proteção da mulher trabalhadora. Essa política busca conciliar as necessidades profissionais e familiares das mulheres, permitindo que possam equilibrar o retorno ao trabalho sem prejuízo ao vínculo com seus filhos. 

Além da licença-maternidade, a CLT estabeleceu a proibição de trabalhos insalubres ou perigosos para gestantes e lactantes. Essa medida é essencial para proteger tanto a saúde da mulher quanto a do feto. Trabalhos em ambientes com exposição a produtos químicos, atividades em ambientes com temperaturas extremas ou com equipamentos perigosos foram vetados para mulheres grávidas e lactantes, visando evitar riscos que pudessem comprometer a gestação ou a saúde da criança. 

A legislação trabalhista reconheceu que as condições de trabalho poderiam impactar diretamente o desenvolvimento do feto, o que demandava uma regulação diferenciada para as mulheres em fase gestacional. 

Essa proteção especial também buscou combater as discriminações que as mulheres enfrentavam no ambiente de trabalho, como a recusa de empregadores em contratar ou manter mulheres grávidas no emprego. A inclusão de garantias como a estabilidade gestacional, que impede a demissão sem justa causa desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto, foi um marco importante para assegurar que as mulheres não fossem penalizadas no mercado de trabalho por exercerem o direito à maternidade. 

Essa proteção proporcionou mais segurança no ambiente laboral e contribuiu para a construção de um cenário de maior igualdade de gênero.  

Outro aspecto relevante foi o descanso para a amamentação, garantido às trabalhadoras após o retorno da licença-maternidade. A CLT estabelece que as lactantes têm direito a dois intervalos de 30 minutos cada durante a jornada de trabalho para amamentar, o que reforça a preocupação com a saúde e o bem-estar dos bebês, sem prejudicar a continuidade da vida profissional da mulher.  

Essas disposições visam assegurar que o período de amamentação não seja interrompido por conta das responsabilidades profissionais, garantindo o direito da mulher ao trabalho enquanto preserva a saúde da criança.  

Portanto, a proteção das mulheres no ambiente de trabalho, promovida pela CLT, refletiu um avanço importante na conciliação entre as responsabilidades familiares e profissionais. A criação de políticas como a licença-maternidade, o afastamento de atividades insalubres e a estabilidade gestacional são exemplos de como a legislação buscou promover a equidade de direitos e garantir um ambiente de trabalho mais justo e seguro para as mulheres. 

1.3 EVOLUÇÃO PÓS-CLT: APERFEIÇOAMENTO DA LEGISLAÇÃO E NORMAS REGULAMENTADORAS 

Após a criação da CLT em 1943, o Brasil continuou a aprimorar sua legislação trabalhista para acompanhar as mudanças econômicas e sociais que moldavam o mercado de trabalho.  

Durante a década de 1970, o país vivenciou um crescimento expressivo em setores como a construção civil e a indústria de base, o que trouxe consigo um aumento preocupante no número de acidentes de trabalho. Em resposta a essa situação crítica, foram criadas as Normas Regulamentadoras (NRs), que estabeleceram critérios específicos de segurança para diversos setores da economia. 

As Normas Regulamentadoras detalharam de maneira mais abrangente as obrigações dos empregadores em relação à segurança no trabalho. A NR-6, por exemplo, regulamentou a obrigatoriedade do uso de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs), determinando que os empregadores não apenas fornecessem esses equipamentos, mas também garantissem que fossem utilizados de forma correta e eficaz pelos trabalhadores.  

A NR-12, por sua vez, introduziu regras claras para a segurança no uso de máquinas e equipamentos, exigindo que fossem adotadas medidas preventivas para evitar acidentes relacionados ao mau funcionamento ou uso inadequado de maquinário. 

Essas normas trouxeram uma abordagem mais técnica e sistemática para a proteção dos trabalhadores, especificando os deveres dos empregadores em setores críticos, como o industrial. A implementação dessas normas, juntamente com a intensificação da fiscalização por parte do governo, especialmente através do Ministério do Trabalho, resultou em uma melhoria gradual das condições de trabalho no país.  

A Constituição Federal de 1988 consolidou ainda mais esses direitos, ao garantir constitucionalmente o direito dos trabalhadores a um ambiente de trabalho seguro e saudável. O artigo 7º, inciso XXII da Constituição estabelece a redução dos riscos inerentes ao trabalho, com normas de saúde, higiene e segurança no ambiente laboral.  

Essa proteção constitucional foi um marco na construção de uma cultura mais robusta de prevenção de acidentes no Brasil, obrigando as empresas a adotarem uma postura mais proativa na gestão de riscos, especialmente em atividades que apresentavam maiores perigos para a saúde e segurança dos trabalhadores. 

O avanço dessas regulamentações trouxe, também, uma responsabilização mais clara dos empregadores em relação à segurança no ambiente de trabalho. A fiscalização do cumprimento das NRs se intensificou com o tempo, sendo reforçada por auditores fiscais que realizavam inspeções regulares para garantir a conformidade das empresas.  

O descumprimento dessas obrigações resultaram em sanções administrativas rigorosas, que podiam variar de multas consideráveis até a interdição de atividades em casos mais graves, como a falta de equipamentos de segurança ou a exposição dos trabalhadores a riscos extremos sem a devida proteção. 

Essas iniciativas contribuíram significativamente para uma melhora progressiva nas condições de trabalho, ao mesmo tempo em que fomentaram a consciência da importância da segurança no local de trabalho, tanto entre os empregadores quanto entre os trabalhadores. A contínua evolução das regulamentações e sua aplicação mais rigorosa serviu como base para a construção de ambientes de trabalho mais seguros e para a redução dos índices de acidentes no Brasil. 

2. A RESPONSABILIDADE CIVIL 

A responsabilidade civil em casos de acidentes de trabalho visa assegurar que o trabalhador seja indenizado pelos danos que sofreu em decorrência de sua atividade laboral. Este conceito está baseado nos princípios de justiça e reparação integral, sendo o empregador responsável por garantir um ambiente seguro e saudável. A responsabilidade civil pode ser fundamentada tanto na culpa do empregador quanto no risco da atividade desenvolvida. Para que a responsabilidade seja configurada, é essencial que estejam presentes três elementos: conduta, nexo causal e dano. 

2.1 ELEMENTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL 

2.1.1 Conduta 

A conduta refere-se à ação ou omissão do empregador que contribuiu para o acidente de trabalho. Ela pode se manifestar de forma ativa (como a adoção de práticas inseguras ou a não manutenção adequada de máquinas) ou passiva (como a omissão em fornecer equipamentos de proteção ou treinamento adequado). É a conduta que, direta ou indiretamente, expôs o trabalhador a riscos ou falhou em evitar o acidente. O empregador, ao não observar suas obrigações de proporcionar um ambiente de trabalho seguro, poderá ser responsabilizado civilmente. 

2.1.2 Nexo Causal 

O nexo causal estabelece a relação direta entre a conduta do empregador e o dano sofrido pelo trabalhador. Para que o empregador seja responsabilizado, é necessário que o acidente de trabalho seja consequência direta ou indireta de sua conduta. Assim, se o acidente ocorreu em razão de uma ação negligente ou omissiva do empregador, como o descumprimento das normas de segurança, fica caracterizado o nexo causal. O nexo causal é um dos pontos mais importantes na configuração da responsabilidade civil, pois sem ele não há como responsabilizar o empregador. 

2.1.3 Dano  

O dano é o prejuízo concreto sofrido pelo trabalhador, que pode ser de natureza material, moral ou estético: 

  • Dano material: compreende as perdas econômicas do trabalhador, como despesas médicas, medicamentos, próteses, custos com tratamento e a perda da capacidade de trabalho, total ou parcial, temporária ou permanente; 
  • Dano moral: refere-se ao sofrimento psicológico, emocional e ao abalo psíquico causado pelo acidente de trabalho. Isso pode incluir a angústia, ansiedade, humilhação ou outros sentimentos que afetam o bem-estar do trabalhador; 
  • Dano estético: está relacionado às deformidades ou alterações físicas causadas pelo acidente, como cicatrizes, mutilações ou outros traumas visíveis que afetam a integridade física e a autoestima do trabalhador. 

Esses três elementos formam a base para o reconhecimento da responsabilidade civil no contexto dos acidentes de trabalho, sendo o dano o que efetivamente quantifica a indenização devida ao trabalhador. Para que o empregador seja condenado a reparar esses danos, é essencial que a conduta tenha sido a causa do acidente e que o nexo causal esteja devidamente comprovado. 

2.2 A RESPONSABILIDADE SUBJETIVA

A responsabilidade civil, no contexto dos acidentes de trabalho, tem como objetivo garantir que os danos sofridos pelos trabalhadores sejam devidamente reparados, tanto por meio de indenizações por danos materiais quanto morais.  

Historicamente, no Brasil, a responsabilidade subjetiva foi o modelo predominante, baseado no princípio da culpa. Isso significa que, para que o empregador fosse responsabilizado, era necessário que o trabalhador ou seus herdeiros provassem que houve negligência, imprudência, ou imperícia por parte do empregador. Ou seja, a prova da culpa era fundamental para o reconhecimento do direito à reparação. 

Ao examinarmos o art. 186 do Código Civil (antigo art. 159 do Código Civil de 1916), que serve como base fundamental da responsabilidade civil e consagra o princípio de que ninguém deve causar prejuízo a outrem (neminem laedere), encontramos a seguinte disposição: 

“Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.” 

Esse dispositivo é mais preciso que o correspondente da legislação anterior, pois menciona explicitamente o dano moral, o que não era previsto de forma expressa no antigo código. A partir dessa norma, podemos extrair os elementos gerais da responsabilidade civil, que são: 

a) conduta humana (seja uma ação ou omissão); 

b) dano ou prejuízo; 

c) nexo de causalidade entre a conduta e o dano causado. 

Nos casos de responsabilidade subjetiva, o trabalhador precisava demonstrar que o empregador falhou ao adotar medidas adequadas para prevenir o acidente, como o não fornecimento de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) ou a ausência de manutenção regular em máquinas e equipamentos.  

Esse modelo se mostrou particularmente desafiador em atividades de alto risco, como a construção civil e a mineração, onde os trabalhadores estão frequentemente expostos a perigos inerentes à própria natureza da atividade. 

A principal dificuldade com o modelo de responsabilidade subjetiva era o ônus da prova, que recaía sobre o trabalhador, o que tornava difícil a obtenção de reparação. Em muitos casos, os trabalhadores não tinham os meios necessários para provar a negligência do empregador, e o processo judicial, já oneroso, tornava-se ainda mais demorado.  

Além disso, em atividades de risco acentuado, mesmo quando o empregador adotava medidas preventivas, os riscos inerentes ao trabalho ainda causavam acidentes. A necessidade de provar a culpa prolongava o sofrimento das vítimas, que muitas vezes ficavam sem a reparação adequada durante o tempo em que aguardavam o desfecho do processo. 

A jurisprudência tradicional trabalhista reforçava essa complexidade ao exigir que o trabalhador demonstrasse não apenas o dano e o nexo causal, mas também a culpa do empregador. Vejamos por exemplo:

ACIDENTE DE TRAJETO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR. RESPONSABILIDADE SUBJETIVA. AUSÊNCIA DE NEXO DE CAUSALIDADE. INDENIZAÇÃO INDEVIDA. Embora o acidente de trajeto seja equiparado ao acidente do trabalho para fins previdenciários, não importa em responsabilidade civil do empregador se não demonstrada a culpa deste pelo infortúnio, como na hipótese em comento. Consequentemente, não havendo a prova do nexo de causalidade entre o infortúnio e a conduta culposa atribuída à reclamada, não há se falar em responsabilização civil da empregadora. Mantém-se. (TRT-15 – RO: 00111651920175150127 0011165-19.2017.5.15.0127, Relator: OLGA AIDA JOAQUIM GOMIERI, 1ª Câmara, Data de Publicação: 07/02/2019). (Brasil, 2018).

Esse processo era exacerbado pela resistência de muitas empresas em admitir falhas, prolongando o litígio e dificultando a reparação efetiva. Muitos empregadores, em vez de investir em políticas de prevenção robustas, preferiam se arriscar em processos judiciais, contando com a possibilidade de não serem responsabilizados pela falta de comprovação da culpa. 

Essa realidade criou uma pressão para reformular o sistema de responsabilidade civil nos acidentes de trabalho, especialmente para atividades perigosas, que exigiam uma abordagem mais eficiente e menos dependente da prova de culpa. O surgimento da responsabilidade objetiva veio como uma resposta a essas falhas estruturais do sistema de responsabilidade subjetiva. 

Outro fator agravante era a utilização, por parte de algumas empresas, da chamada “culpa exclusiva da vítima”. Muitas vezes, os empregadores se eximiam de responsabilidade ao alegar que o acidente ocorreu por desatenção ou negligência do próprio trabalhador. Esse tipo de defesa dificultava ainda mais a obtenção de reparação, e a necessidade de combater essa tese aumentava o tempo e os custos dos processos. 

A reforma da legislação brasileira trouxe mudanças para tornar o ambiente de trabalho mais seguro e reduzir a dependência da prova de culpa. As decisões judiciais começaram a reconhecer que, em atividades de risco, a simples exposição ao perigo já implicava em responsabilidade do empregador, levando à adoção progressiva da responsabilidade objetiva. 

2.3 A RESPONSABILIDADE OBJETIVA: UMA ABORDAGEM MODERNA

Com o avanço das discussões jurídicas e a promulgação do Código Civil de 2002, o Brasil passou a adotar o modelo de responsabilidade objetiva, particularmente em atividades consideradas perigosas. A responsabilidade objetiva, prevista no art. 927, parágrafo único, do Código Civil, estabelece que o empregador será responsabilizado pelos danos causados ao trabalhador independentemente de culpa, desde que a atividade desenvolvida pela empresa seja considerada de risco. 

Esse modelo de responsabilidade se baseia na teoria do risco, segundo a qual quem se beneficia de uma atividade perigosa deve arcar com os danos que ela causa, sem a necessidade de provar a culpa.  

Assim, em atividades como a construção civil, mineração, e transporte de cargas perigosas, onde os riscos são elevados, o simples fato de o trabalhador estar exposto a esses perigos já cria a responsabilidade do empregador por qualquer acidente que ocorra. 

A responsabilidade objetiva foi um avanço significativo, pois eliminou a necessidade de o trabalhador provar que o empregador agiu com culpa. Isso acelerou o processo de reparação dos danos sofridos, tornando o sistema mais justo, especialmente em atividades em que os acidentes são frequentes e a apuração da culpa pode ser complexa e demorada.  

Esse modelo trouxe benefícios não só para os trabalhadores, mas também criou uma cultura de prevenção nas empresas, que passaram a adotar medidas de segurança mais rigorosas para minimizar os riscos inerentes às suas atividades.  

A responsabilidade objetiva, ao transferir o foco da culpa para o risco, incentivou os empregadores a investirem mais em programas de prevenção de acidentes e na adoção de novas tecnologias de segurança, além de treinamentos contínuos para os trabalhadores. 

2.4 APLICAÇÕES E CONSEQUÊNCIAS DA RESPONSABILIDADE CIVIL 

A aplicação da responsabilidade objetiva tem sido amplamente aceita pela jurisprudência brasileira, particularmente em atividades de risco elevado. Um exemplo foi o caso julgado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), no qual condenou uma madeireira a indenizar os dependentes de um operador de motosserra, que morreu após uma árvore cair sobre ele. 

O trabalhador usava equipamentos de proteção individual, fornecidos pela empresa, quando o acidente aconteceu vejamos entendimento jurisprudencial:

RECURSO DE REVISTA. ACIDENTE DE TRABALHO. OPERADOR DE MOTOSSERRA. CORTE E QUEDA DE ÁRVORE (EUCALIPTO). FALECIMENTO DO EMPREGADO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO EMPREGADOR. TEORIA DO RISCO PROFISSIONAL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAL E MATERIAL. 1. Normatizando a responsabilidade civil objetiva por danos (morais, estéticos e materiais), dispõe o parágrafo único do art. 927 do Código Civil: “Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”. 2. Sob essa perspectiva, em hipótese na qual o operador de motosserra foi vítima de queda de árvore, que lhe causou a morte, a jurisprudência deste Tribunal de uniformização vem reconhecendo a responsabilidade objetiva do empregador, não sob o enfoque da culpa, mas com apoio no risco profissional. 3. Violação, que se reconhece, do art. 927, parágrafo único, do Código Civil. Recurso de revista conhecido e provido. (TST – RR: 1356851020095120032, Relator: Walmir Oliveira Da Costa, Data de Julgamento: 18/11/2015, 1ª Turma, Data de Publicação: 20/11/2015). (Brasil, 2015).

A empresa foi condenada a pagar uma indenização significativa à família do trabalhador, pois um trabalhador que operava uma motosserra morreu após uma árvore cair sobre ele, mesmo utilizando todos os equipamentos de proteção individual (EPIs) fornecidos pela empresa. A empresa argumentou que o acidente foi uma adversidade imprevisível e que não poderia ser responsabilizada, pois seguiu as normas de segurança. 

A viúva e os dez filhos, sendo cinco menores, solicitaram R$ 650 mil em indenizações por danos morais, materiais e pensão. O Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (SC) inicialmente considerou o acidente uma fatalidade e isentou a empresa de responsabilidade, uma vez que o trabalhador estava capacitado e utilizava EPIs. 

No entanto, o TST reformou a decisão, com base na teoria do risco profissional, segundo o artigo 927 do Código Civil. O ministro relator, Walmir Oliveira da Costa, destacou que, mesmo sem culpa da empresa, a atividade de risco impõe a responsabilidade objetiva do empregador. A turma decidiu que a empresa era responsável pela indenização. 

2.5 INDENIZAÇÕES POR DANOS MATERIAIS, MORAIS E ESTÉTICOS 

Outro ponto importante na aplicação da responsabilidade civil em acidentes de trabalho é a reparação integral do trabalhador pelos danos sofridos. A indenização pode se dar por meio de compensações pelos danos materiais, morais e estéticos, dependendo das circunstâncias do acidente e do impacto causado ao trabalhador. 

  • Danos materiais referem-se aos prejuízos financeiros diretos sofridos pelo trabalhador, como despesas médicas, tratamentos, medicamentos, perda de capacidade de trabalho e perda de renda. Esses valores podem incluir tanto os gastos imediatos relacionados ao tratamento das lesões quanto os prejuízos futuros, caso o trabalhador perca a capacidade laboral permanente ou temporariamente. 
  • Danos morais estão ligados ao sofrimento psicológico e emocional causado ao trabalhador em razão do acidente. Em casos de invalidez permanente ou morte, o dano moral pode incluir o impacto emocional sofrido pela família do trabalhador, que também tem direito a ser compensado pelo sofrimento causado. Os tribunais brasileiros têm reconhecido que os danos morais são uma parte fundamental da reparação, especialmente quando os acidentes afetam a dignidade e a integridade psicológica do trabalhador. 
  • Danos estéticos referem-se às sequelas físicas visíveis deixadas por um acidente de trabalho, como cicatrizes, mutilações ou deformidades. Quando essas sequelas têm impacto direto na autoimagem do trabalhador e em sua inserção social, o direito à indenização por danos estéticos é amplamente reconhecido pela jurisprudência. 

Esse tipo de decisão contribui para fortalecer a cultura de segurança nas empresas, incentivando os empregadores a adotarem medidas preventivas rigorosas para evitar acidentes. 

Essas decisões refletem uma tendência global de maior proteção aos trabalhadores, especialmente em atividades que envolvem riscos elevados. A adoção da responsabilidade objetiva também estimula as empresas a investirem mais em segurança, uma vez que a simples exposição ao risco já pode resultar na sua responsabilização. 

Esse avanço jurídico tem sido crucial para garantir que os trabalhadores tenham acesso a reparações mais rápidas e efetivas, evitando longos processos judiciais que muitas vezes dificultavam o acesso à justiça. 

Outro ponto relevante na aplicação da responsabilidade civil nos acidentes de trabalho é a responsabilidade por danos morais. Além da compensação financeira pelos danos materiais, como despesas médicas e perda de capacidade laboral, o trabalhador também pode receber indenizações por danos morais, em casos de sofrimento psicológico e impacto na qualidade de vida.  

A jurisprudência brasileira tem reconhecido que a perda de um ente querido em acidente de trabalho, ou a própria invalidez causada por um acidente, afeta significativamente a vida da vítima e de sua família, justificando a reparação por danos morais. 

2.6 REFLEXOS NA LEGISLAÇÃO E CULTURA DE SEGURANÇA

A consolidação da responsabilidade objetiva também trouxe reflexos importantes na legislação trabalhista e na cultura de segurança no trabalho no Brasil. As Normas Regulamentadoras (NRs), especialmente a NR-6, que regulamenta o uso de EPIs, e a NR-12, que trata da segurança no trabalho com máquinas e equipamentos, são parte fundamental desse processo de conscientização e responsabilização.  

A fiscalização das condições de trabalho pelo Ministério do Trabalho e pelos auditores fiscais tem sido intensificada, promovendo uma cultura de prevenção que visa garantir a proteção integral dos trabalhadores. 

As empresas, cientes da aplicação severa da responsabilidade objetiva, passaram a investir mais em tecnologias de segurança, como sensores de prevenção de acidentes, sistemas de monitoramento de condições de risco, além de programas de treinamento contínuo.  

Esse cenário reforça a ideia de que o foco da legislação trabalhista deve ser a prevenção de acidentes, garantindo não apenas a reparação, mas também a proteção integral da saúde e segurança dos trabalhadores. 

3 ACIDENTES DE TRABALHO NA ATUALIDADE E A RESPONSABILIDADE DAS EMPRESAS 

3.1 CENÁRIO ATUAL DOS ACIDENTES DE TRABALHO NO BRASIL 

Apesar dos avanços legislativos e dos mecanismos de fiscalização, os acidentes de trabalho continuam sendo uma realidade preocupante no Brasil. Dados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) apontam que, anualmente, mais de 500 mil acidentes de trabalho são registrados no país, resultando em milhares de afastamentos, incapacidades permanentes e, em muitos casos, mortes. Entre os setores mais afetados estão a construção civil, a agricultura e a indústria de transformação, onde as atividades desenvolvidas são naturalmente mais perigosas e exigem uma atenção redobrada em relação à segurança. 

Os principais tipos de acidentes registrados nesses setores incluem quedas de altura, cortes e lacerações, fraturas, exposição a substâncias tóxicas e lesões por esforços repetitivos (LER/DORT). 

A maioria desses acidentes está diretamente relacionada à falta de treinamento adequado, ao uso inadequado ou ausência de EPIs, à manutenção deficiente de máquinas e equipamentos e à não observância das normas de segurança. Muitas empresas ainda resistem em investir adequadamente na segurança dos trabalhadores, tratando as medidas de proteção como despesas desnecessárias, o que aumenta o risco de acidentes graves.  

Nos últimos anos, o Brasil tem buscado intensificar as medidas de fiscalização e prevenção para reduzir os altos índices de acidentes de trabalho. As Normas Regulamentadoras (NRs), que detalham os procedimentos de segurança em diversos setores, têm sido revisadas e atualizadas periodicamente pelo Ministério do Trabalho para se adequar às novas realidades do mercado e às inovações tecnológicas.  

Além disso, programas como o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA) e o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO) têm sido implementados para garantir que os trabalhadores estejam protegidos contra os riscos inerentes às suas atividades. 

3.2 AS CONSEQUÊNCIAS DOS ACIDENTES PARA TRABALHADORES E EMPRESAS 

Os acidentes de trabalho têm consequências devastadoras para os trabalhadores e suas famílias. Em muitos casos, os trabalhadores que sofrem lesões graves acabam afastados de suas atividades por longos períodos, enfrentando dificuldades financeiras e, em situações extremas, incapacidade permanente para o trabalho.  

As lesões causadas pelos acidentes não afetam apenas a saúde física do trabalhador, mas também sua saúde mental, levando a casos de depressão, ansiedade e outras condições psicológicas relacionadas ao trauma vivenciado no ambiente de trabalho. 

Para as empresas, os acidentes de trabalho representam custos financeiros elevados. Além das indenizações que podem ser exigidas judicialmente, as empresas também enfrentam custos com tratamentos médicos, perda de produtividade e, em casos mais graves, danos à reputação. A gestão inadequada da segurança no trabalho pode acarretar a perda de confiança por parte dos clientes e do mercado, o que pode impactar diretamente a sustentabilidade financeira da empresa a longo prazo.  

Outra consequência importante dos acidentes de trabalho é o aumento das ações judiciais movidas pelos trabalhadores ou suas famílias em busca de reparação.  

A responsabilidade civil, como discutido anteriormente, coloca as empresas na posição de responsáveis diretos pelos danos causados aos trabalhadores, especialmente em atividades de risco.  

As empresas que não cumprem as normas de segurança podem ser condenadas a pagar indenizações vultosas, além de sofrer sanções administrativas por parte dos órgãos fiscalizadores.  

3.3 A RESPONSABILIDADE DAS EMPRESAS NA PREVENÇÃO DE ACIDENTES 

A legislação brasileira, especialmente a CLT e as Normas Regulamentadoras, impõe às empresas uma série de obrigações no que diz respeito à prevenção de acidentes de trabalho. Entre essas obrigações estão: 

  • Implementação de Programas de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA), que visam identificar e mapear os riscos presentes no ambiente de trabalho e adotar medidas corretivas para eliminá-los ou minimizá-los; 
  • Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO), que tem como objetivo monitorar a saúde dos trabalhadores por meio de exames médicos periódicos e avaliações preventivas, visando detectar precocemente qualquer problema relacionado à saúde ocupacional; 
  • Treinamentos periódicos para capacitar os trabalhadores no uso adequado dos EPIs e no reconhecimento e mitigação dos riscos associados às suas atividades; 
  • Manutenção regular de máquinas e equipamentos, a fim de garantir que estejam em pleno funcionamento e não representem perigo para os trabalhadores que os operam. 

As empresas que não seguem essas normas estão sujeitas a multas, sanções administrativas e podem ser processadas judicialmente pelos trabalhadores ou suas famílias. A fiscalização é realizada por auditores do Ministério do Trabalho, que têm o poder de inspecionar as condições de segurança e saúde nas empresas e aplicar sanções quando necessário.  

No entanto, apesar da existência dessas normas, muitas empresas ainda enfrentam dificuldades para implementar plenamente os programas de prevenção, especialmente as pequenas e médias empresas, que muitas vezes não possuem os recursos necessários para investir em segurança no trabalho de forma adequada. 

Isso ressalta a importância de políticas públicas que incentivem a adoção de medidas de segurança, bem como o fortalecimento da fiscalização para garantir o cumprimento das obrigações legais.  

3.4 IMPACTOS DA REFORMA TRABALHISTA DE 2017 NOS ACIDENTES DE TRABALHO

A Reforma Trabalhista, instituída pela Lei nº 13.467/2017, trouxe significativas alterações no regime de responsabilidade civil e na dinâmica das relações de trabalho, impactando diretamente na prevenção e na gestão de acidentes de trabalho no Brasil. Algumas mudanças importantes afetam a forma como acidentes são tratados e como a responsabilidade do empregador é vista atualmente. 

Eliminação das horas in itinere: um dos principais pontos da reforma foi a exclusão do tempo gasto no deslocamento para locais de difícil acesso, conhecido como horas in itinere, da jornada de trabalho. Antes da reforma, esse período era contabilizado como tempo de serviço e, em caso de acidentes no trajeto, o empregador poderia ser responsabilizado. Com a mudança, acidentes que ocorrem durante o deslocamento em transporte fornecido pela empresa não são mais considerados como acidentes de trabalho, o que reduz a proteção ao trabalhador nesse aspecto.  

Flexibilização das normas de segurança: a reforma promoveu a prevalência do negociado sobre o legislado, permitindo que algumas questões relacionadas à segurança do trabalho sejam negociadas por meio de convenções coletivas. Embora esse mecanismo tenha sido visto como uma forma de flexibilizar as relações trabalhistas, ele pode enfraquecer as proteções ao trabalhador, já que acordos podem reduzir ou modificar a aplicação de normas de segurança.  

Novas modalidades de contratação: A reforma introduziu novas formas de contratação, como o trabalho intermitente e o teletrabalho, que trazem novos desafios para a gestão da segurança no trabalho. No teletrabalho, por exemplo, o empregador é responsável por orientar o trabalhador sobre as medidas de segurança, mas a fiscalização das condições reais de trabalho, muitas vezes realizadas em domicílio, torna-se limitada, complicando a configuração de acidentes de trabalho nesse modelo.  

Indenizações por danos morais: Outra mudança significativa foi a imposição de limites nas indenizações por danos morais. A Reforma Trabalhista vinculou os valores das indenizações ao salário do trabalhador, o que pode resultar em compensações menores para acidentes graves, causando controvérsias sobre a adequação desse critério em garantir justiça ao trabalhador. A vinculação das indenizações ao salário pode resultar em compensações inadequadas, especialmente para trabalhadores de baixa renda, que podem não receber o valor necessário para cobrir os danos sofridos. 

Essas alterações mostram que, embora a reforma tenha modernizado vários aspectos das relações de trabalho, ela também trouxe desafios na proteção dos trabalhadores em atividades de risco. A necessidade de encontrar um equilíbrio entre a flexibilidade das relações trabalhistas e a manutenção de um ambiente de trabalho seguro se tornou ainda mais premente após a Reforma de 2017. 

4 CONCLUSÃO

De acordo com o estudo realizado, percebe-se que a evolução histórica da legislação trabalhista no Brasil desempenhou um papel fundamental na proteção dos direitos dos trabalhadores, em especial no que se refere à segurança no ambiente de trabalho. Desde o surgimento das primeiras leis de proteção até a criação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), houve um progresso significativo na regulamentação dos direitos trabalhistas, incluindo a responsabilidade civil das empresas em casos de acidentes de trabalho. 

Ao longo dos anos, a legislação continuou a evoluir, especialmente com a criação das Normas Regulamentadoras (NRs), que complementaram as disposições da CLT ao detalhar critérios específicos de segurança em diversos setores econômicos. A implementação dessas normas contribuiu diretamente para a redução do número de acidentes de trabalho e a melhoria das condições laborais no Brasil. 

No entanto, apesar dos avanços, a ocorrência de acidentes de trabalho ainda é um problema grave no país. Os dados apontam para uma alta taxa de acidentes, principalmente em setores como a construção civil e a indústria de transformação. Isso demonstra que, embora a legislação tenha se modernizado, a aplicação efetiva das normas de segurança continua sendo um desafio, especialmente para pequenas e médias empresas. 

A responsabilidade civil das empresas também evoluiu, passando da responsabilidade subjetiva, baseada na culpa, para a responsabilidade objetiva em atividades consideradas de risco. Esse avanço jurídico trouxe uma maior celeridade na reparação dos danos sofridos pelos trabalhadores, eliminando a necessidade de prova de culpa e, consequentemente, facilitando o acesso à justiça por parte das vítimas de acidentes laborais. 

A reforma trabalhista de 2017 trouxe impactos relevantes para a dinâmica da responsabilização dos empregadores. Entre as principais mudanças está a flexibilização das normas de segurança e a exclusão das horas in itinere da jornada de trabalho, o que pode reduzir a proteção dos trabalhadores em determinados aspectos. Essas alterações exigem uma análise cuidadosa dos efeitos práticos sobre a segurança no ambiente de trabalho. 

Diante dos estudos realizados, verifica-se que a responsabilidade das empresas na prevenção de acidentes de trabalho é clara e inegável. Além de seguir as normas legais e regulatórias, as empresas devem adotar uma postura preventiva e proativa, investindo em tecnologias de segurança, treinamento contínuo dos trabalhadores e manutenção adequada das instalações e equipamentos. 

Portanto, conclui-se que, para a redução efetiva dos acidentes de trabalho no Brasil, é necessário um esforço conjunto entre o poder público, empresas e trabalhadores. A fiscalização rigorosa, a conscientização sobre a importância da segurança e a adoção de boas práticas de gestão de riscos são medidas fundamentais para assegurar um ambiente de trabalho mais seguro e saudável. 

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