REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7112020
Autoria de:
João Ângelo Félix Diniz Lobato*
Deise Lucia da Silva Silvino Virgolino**
*Acadêmico de direito. E-mail: joao-angelo-diniz@hotmail.com.com. Artigo apresentado a Faculdade de Educação de Porto Velho – UNIRON, como requisito para obtenção do título de Bacharel em direito Porto Velho, 2022.
**Prof.ª Orientador(a) Especialista em direito público, administrativo e constitucional. Professor do curso de direito do trabalho. E-mail: deise.virgolino@uniron.edu.br.
RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo investigar a história da assistência social no Brasil, observando a implementação da Lei Orgânica da Assistência Social, Lei n. 8.742/1993 e as mudanças que ocorreram durante o período de pandemia do Covid-19. Esse tema observa a carência de discussão da aplicabilidade da assistência social e a viabilidade das últimas modificações na jurisprudência. O objetivo deste problema é exibir em uma narrativa histórica do assistencialismo no Brasil e as lacunas que ainda persistem apesar das mudanças recentes na lei. Proporcionará uma pesquisa bibliográfica com base nas necessidades sociais e econômicas constantes da população em situação de vulnerabilidade do país. Abordará os benefícios que atualmente são ofertados pela LOAS e os requisitos necessários para obtenção dos benefícios. As fontes primárias da investigação bibliográfica consistem em autoridades do tema, além de, artigos e dissertações científicos, na Constituição Federal (1988) e como secundárias informações obtidas nos dispositivos legais. Após a explanação histórica, abordagem da problemática do assistencialismo, a conclusão apontará a urgência em tratar esse tema em um período crítico da história da humanidade onde, o papel do governo como mediador do bem-estar social comum se faz necessário para a garantia dos direitos dos indivíduos na sociedade brasileira.
Palavras-chave: História do assistencialismo. Lei orgânica. Benefícios. Viabilidade legal.
- INTRODUÇÃO
O assistencialismo no percurso da humanidade ao longo da história sempre esteve entrelaçado coma relação trabalho e ganho, seja por meio da escravidão ou pela exploração capitalista da mão de obra. Inicialmente o papel de ajudar os pobres e miseráveis era realizado pelas igrejas e instituições filantrópicas. Podemos observar que a premissa da religião cristã após a morte de Cristo se baseia na angariação de donativos e posses para uma redistribuição dos bens pelos responsáveis buscando aplicar a equidade, no período depois de Cristo os principais dependentes de doações eram as viúvas, órfãos e deficientes.
Com o surgimento de novos regimes políticos durante a Idade Média observou-se que os mais ricos se satisfaziam em praticar filantropia em busca de salvação, e o papel desempenhado pela Igreja Católica por ser centralizador mostrava que as necessidades dos pobres era uma lacuna a ser em parte sanada. Ao avançarmos mais na história e pousarmos os olhos sobre a Revolução Industrial notamos que a desigualdade social começou a crescer conforme a exploração do trabalho se modificou de escravo para regime livre. Os detentores das riquezas agora, se manifestavam incomodados com a pobreza em que o proletariado se encontrava, eis que surge o Estado para mediar tais conflitos sociais.
O Estado sempre deve cumprir o papel de mediador para estabelecer o bem-estar social entre as diferentes classes de uma nação. No Brasil o governo começou a desempenhar esse papel por volta de 10930 e 1940, na Era Vargas foi possível trazer à tona a base ideológica do assistencialismo no país e, os atores por trás dessa história.
Por isso, essa investigação bibliográfica revisita a trajetória, implementação da Lei Orgânica da Assistência Social, Lei n. 8.742/1993, e as modificações que essa política sofreu até o ano de 2021. Ressaltando que há uma carência no acervo de materiais que abordam essa faceta do direito social no Brasil e sua atuação nos últimos noventa anos. Além de retratar a realidade do serviço social brasileiro este trabalho buscou visitar as modificações na Lei Orgânica da Assistência Social que ocorreram no período pandêmico, os benefícios que ela assiste e os critérios para que os indivíduos se tornem beneficiários dessa política.
Para que esses temas fossem explanados, o seguinte trabalho utilizou da metodologia de pesquisa bibliográfica nas ciências sociais, inicialmente foi reconhecido que existe um acervo informativo reduzido e para que a pesquisa se desenhasse, observando essa carência como ponto de partida buscou-se materiais teóricos de autores que utilizaram a perspectiva atualizada do direito além de, documentos oficiais e artigos científicos, trabalhos acadêmicos e dados obtidos nas bases históricas disponíveis.
- DESENVOLVIMENTO
É importante situarmos o Brasil no contexto histórico em que surgiu a primeira ideia de assistência social, de acordo com o Ministério Público do Espírito Santo (2000), as leis do assistencialismo brasileiro se fundamentam na caridade, filantropia e na solidariedade religiosa. Ao passo que a sociedade progride tecnologicamente e as organizações se delimitam, a visão dela também se modifica na afinidade entre as relações de trabalho e ganho, pois o governo passa a notar o proletariado há uma lacuna a ser observada que consiste no pobre e vulnerável, dessa forma um papel que antes era da igreja passa a ser institucionalizado.
2.1 Da Assistência Social No Brasil
O surgimento do assistencialismo no Brasil tem ligação direta com o cenário político daquela época, se atentarmos para o contexto traremos a memória o relato de que em 1929 ocorreu uma quebra na bolsa de valores de Nova York logo, iniciou-se uma crise internacional. À época o Brasil como o maior produtor e exportador de café açúcar do mundo dependia exclusivamente das vendas dos produtos aqui fabricados, esses produtos foram estagnados no mercado e sem compradores o país teve uma imensa dificuldade financeira, devido a crise internacional o país necessitou ser remodelado econômica e politicamente para se suster, começou então a investir no desenvolvimento industrial interno.
O excesso de mão de obra desempregada, péssimas condições de trabalho e moradia, além de uma condição digna inexistente marcavam a realidade do proletariado brasileiro. Considerando que politicamente o Brasil passava por uma reforma drástica, é inegável que o governo não possuía olhos para os indivíduos em condição de miséria por isso, as ações sociais eram exclusivamente realizadas por instituições religiosas, resumidamente a Igreja Católica.
As obras sociais no Brasil se iniciaram por volta da década de 30 como fruto das instigações cristãs da Igreja Católica, a caridade, solidariedade e altruísmo. Esse cenário perpetuou até a década seguinte, onde no ano de 1947 foi criado a Legião Brasileira de Assistência – FLBA com o alvo de acolher e suster as famílias dos pracinhas combatentes dos conflitos da 2ª Guerra Mundial. A princípio o atendimento visava as mães e crianças passando depois a englobar os vulneráveis sociais concomitante ao crescimento da FLBA (MPES, 2000).
Por meio da Legião Brasileira de Assistência houve uma oferta de ações públicas no âmbito federal, com participação dos 26 estados, para que ocorresse uma centralização dos comandos das políticas. Com essa concentração, os objetivos ficaram melhor definidos, dispostos da seguinte forma:
Assistência social;
Assistência judiciária;
Atendimento médico-social e materno-infantil;
Distribuição de alimentos para gestantes, crianças e nutrizes;
Assistências integrais a crianças, adolescentes e jovens (creches e abrigos);
Qualificação e iniciação profissional;
Liberação de instrumentos de trabalho;
Orientação advocatícia para a regularização e registro de entidades;
Programas educacionais para o trabalho;
Geração de renda;
Projetos de desenvolvimento social local (serviços de microempresas – creches, cooperativas e outros);
Assistência ao idoso (asilos e centros de convivência);
Assistência à pessoa portadora de deficiência;
Assistência ao desenvolvimento social e comunitário;
Programa nacional de voluntariado (MPES, 2000, p. 1).
É possível observar que nesse contexto a assistência social deixa de ser algo de cunho altruísta, sem coordenação, pontual e fragmentado passa a ter uma unificação de ações e alvos a perseguir. Somente com essa intervenção do Estado que as ações sociais realmente começaram a modificar o cenário de desigualdade social. Iamamoto (1999) afirma que a problemática social deve ser entendida como a soma das expressões das desigualdades da coletividade capitalista moderna, que se fundamenta na produção social, onde a apropriação dos seus resultados e bens mantém sempre particular, usurpada por uma parte da sociedade.
Sobre a Legião Brasileira de Assistência – FLBA o MPES (2000, p. 1) afirma categoricamente que “Estabeleceu ampla parceria com organizações não governamentais (cerca de 6.000), governos estaduais e municipais (cerca de 3.800 municípios), CNBB, APAEs, Pestallozzi, Caixa Econômica Federal e outros. Dispunha de um Programa Nacional de Voluntariado, com coordenação nos 26 Estados e no Distrito Federal, contando com aproximadamente 3.000 voluntários”.
O período histórico posterior ao da criação da FLBA demonstrou que os desafios da política de assistência social sempre foram gigantescos afinal, o Brasil corresponde ao sexto país mais populoso do mundo e com uma distribuição geográfica de 8.510.345,540 km² (DOU nº 38, de 23/02/2022), essas dificuldades remetem a institucionalização das ações do Estado para que de fato essa assistência social fosse um direito comum a todos os brasileiros.
O Brasil estava passando por um período de redemocratização pós ditadura, onde a transição democrática levou a população a uma busca por políticas assistenciais efetivas e viáveis. Essa busca tinha o objetivo de apresentar para a população o direito a assistência e previdência social, ou seja, seguridade social que realmente garantisse aos marginalizados e vulneráveis amparo na lei (BEZERRA, et al. 2013). Dantas (2016, p.108) diz que
Como visto, todo esse período que antecede a década de 1980 é caracterizado fundamentalmente por práticas paliativas, de caráter tutelador e assistencialista. Em contrapartida, as organizações e movimentos sociais durante o processo constituinte foram fundamentais para embate contra as truculências do autoritarismo e repressão sofridos pelos trabalhadores de forma geral. Diante dessa conjuntura, acarretam em construções de postulações normativas para garantia de direitos sociais, dentre as quais a Assistência Social.
Nesse momento da trajetória da assistência social vemos que houve uma mobilização por parte dos sindicatos, ligas operárias, profissionais liberais, intelectuais da área, proletariado e outras instituições sociais para que se construísse uma política eficiente de seguridade social, foi então apresentado a Lei Orgânica e de Política de Assistência Social em favor dos pobres e vulneráveis.
A Constituição Federal de 1988 é a divisa na história entre uma assistência social desfragmenta para uma coletividade de ações políticas, onde é denominada de política de seguridade social conforme o Art. 194 diz:
Art. 194 da Constituição Federal de 1988. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social. Parágrafo único – Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base nos seguintes objetivos: I – universalidade da cobertura e do atendimento; II -uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais; III -seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços; IV -irredutibilidade do valor dos benefícios; V – equidade na forma de participação no custeio; VI -diversidade da base de financiamento; VII – caráter democrático e descentralizado da gestão administrativa, com a participação da comunidade, em especial de trabalhadores, empresários e aposentados.
Sendo os objetivos dessa política a prestação de assistência a quem dela precisar logo, não somente os vulneráveis socioeconomicamente como, os deficientes, idosos, e os demais que se enquadram conforme o Art. 203 da Constituição Federal (1988). O Art. 204 prevê como as ações serão aplicadas e de onde os recursos serão providenciados pelo governo. Apesar da CF citar esses direitos por lei, apenas cinco anos após a promulgação é que realmente um projeto foi apresentado a fim de determinar os percalços da lei da assistência social.
O Poder Executivo quanto o legislativo foram alvos de ação direta e inconstitucionalidade por omissão, proposta pelo Procurador Geral da República ao Supremo Tribunal Federal, pois ficaram aproximadamente 05 anos após a promulgação da CF/88 sem que tivessem regulamentado a assistência social (WANDERLEY, 2014, §§ 3º).
Por isso existe uma lacuna entre a legislação vigente e a Constituição Federal (1988), os legisladores da Lei Orgânica da Assistência Social foram os percussores da aplicabilidade da assistência social, já que por meio desta lei que houve uma regularização. Na história é citado que no dia 13 de julho de 1993 foi apresentado ao Presidente da República vigente da época o projeto de lei n. 4100, que armava o aparelhamento da assistência social, posteriormente esse projeto se tornou a LOAS, Lei 8.742, de 7 de dezembro de 1993.
Posteriormente a promulgação da CF (1988), múltiplos debates e concertos ocorreram sobre o direcionamento que a legislação da assistência social. Os eventos mais impactantes para a fundamentação e que convieram para a aceitação da Lei 8742/93, foram 05 Seminários Regionais e a Conferência Nacional de Assistência Social, eventos que ocorreram nos períodos de maio a junho do ano de 1993.
Nesses eventos os promotores do debate foram: o proletariado, o Poder Legislativo (parlamentares, intelectuais da esfera social, e participantes de algumas frentes, como por exemplo: “Movimento pela Ética na Política”, da “Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentais” e do “Conselho Nacional de Segurança Alimentar”, sendo dessa base que surgiu a Lei Orgânica da Assistência Social que conhecemos atualmente. É de importância lembrar que no período de remodelagem democrática que o país vivia foi muito relevante a existência de conselhos nas esferas municipais, estaduais e nacionais coma participação direta da população, este com a intenção de escoltar e vigiar as intenções e as ações (WANDERLEY, 2014).
2.2 Da Lei Orgânica Da Assistência Social Lei Nº 8.742, De 7 De Dezembro De 1993
O principal objetivo dessa Lei é abordar a assistência social como um dever social do Estado e não uma ação altruísta, é dessa forma que todo cidadão é amparado para caso se enquadrar ser assistido socialmente pelo governo, conforme a diretriz constitucional. Essa Lei aborda de duas formas a política de assistencialismo, uma vertente é cabível para um público mais restrito e a outra vertente com uma abordagem mais ampla, antecipa a extensão da política social de maneira que assista aos mais necessitados, transformando as diretrizes para moldes mais cabíveis. A Lei Orgânica de Assistência Social – LOAS, se constitui por seis capítulos comentados a seguir (KERTZMAN, 2016).
Trata-se, portanto, de um lado de garantir direitos negados a muitas pessoas, por meio da participação em programas e projetos ou do recebimento de benefícios e serviços, e de outro, de buscar contribuir para a construção de sua autonomia. Nesse sentido, não se trata de tutelar ou prover necessidades, mas da compreensão de que a o desenvolvimento das potencialidades implica na promoção do acesso a bens e serviços e na garantia de alguns direitos básicos. Sabemos, todavia, que a efetivação desta política e a qualidade dos serviços prestados não depende apenas de sua garantia em termos legais (DANTAS, 2016, p. 109).
O primeiro capítulo aborda das Definições e dos Objetivos da assistência social, que são os mesmos antevistos na Constituição Federal (1988) sendo dito alusão à proteção, à família, à infância, à adolescência e à velhice, à habilitação e reabilitação da pessoa portadora de deficiência, reestabelecendo dignidade e possibilidade de vivência na sociedade moderna. O capítulo posterior transmite dos Princípios e Diretrizes, delimitando como fundamentos a universalização, a dignidade e a autonomia. Quando abordada as diretrizes básicas a Lei Orgânica da Assistência Social reitera a descentralização, a administração unificada em cada área do Estado e a colaboração da população no desenvolvimento e aplicação das políticas da assistência social. Dessa forma fica nítido que essa responsabilidade é do governo, mas que cada esfera inclusive a população tem um papel a cumprir para que as políticas de assistência social sejam eficientes e eficazes para coma realidade do brasileiro (BEZERRA et. al., 2013).
Os capítulos seguintes, terceiro e quarto, abordam a estrutura em que a LOAS é organizada e gerida, tendo sempre no campo de visão que esta é um sistema colaborativo e descentralizado, a coordenação da Política Nacional de Assistência Social é de responsabilidade do Ministério do Bem-Estar Social e das normativas gerais para o pleno funcionamento das entidades ligadas e demais instituições. O quarto se prende na delimitação dos benefícios e recursos fornecidos, programas atuantes, projetos aplicados na assistência social. Entre eles está o BPC – Benefício de Prestação Continuada, sendo o mais importante recurso de apoio as famílias em vulnerabilidade social que observaremos a seguir.
Por fim, os últimos capítulos desta Lei se apegam a origem dos recursos utilizados, no caso compreende-se que o financiamento da Assistência Social vem dos recursos obtidos da União, dos Estados e Munícipios, essas finanças são geridas pelo Fundo Nacional da Assistência Social – FNAS, controlado pelo CNAS. Conclui-se o sexto capítulo com as disposições gerais e transitórias da LOAS, para lidar justamente com o rearranjo dos órgãos de assistência social na esfera federal para implantação e aplicação da Lei Orgânica da Assistência Social.
2.3 Dos Benefícios
É de relevância pontuar que apesar da LOAS ser aplicada pelo Instituto Nacional de Seguro Social, e ter várias ações que são submetidas a essa autoridade, ela não consiste em um benefício de previdência ou que necessite de contribuição para sua obtenção. Ela consiste em uma política de asseguração da qualidade de vida e de acesso a dignidade para os que se encontram em um estado de vulnerabilidade social, sendo de responsabilidade do Governo e com aplicação nas três esferas: municipal, estadual e federal (TORRES, 2018).
O Benefício de Prestação Continuada corresponde a um recurso financiado pela União para pessoas em situação de vulnerabilidade socioeconômica, sendo idosos com idade igual ou superior a 65 anos e deficientes físicos incapacitados de participar e executar as funções sociais regulares, ambos devem comprovar pelos meios legais que se encontram em estado de pobreza.
O BPC consiste na prestação no valor de um salário-mínimo e não é acumulativo, e nem possui 13º salário, ele não é concedido a dependentes pós mortes, estando vinculado apenas a um Cadastro de Pessoa Física, o beneficiário também deve possuir inscrição atualizada e ativa no Cadastro Único. Quem fiscaliza, executa e realiza a manutenção desse benefício é o INSS, nesse caso a perícia para comprovação e outras burocracias também são realizadas por este (ANASTÁCIO, 2019).
Ademais, a lei 8742/93 prevê também os benefícios eventuais, essa assistência são responsabilidades dos Estados e Municípios e, esporadicamente, da União, que apontam para a proteção os cidadãos e famílias nos casos de nascimento, morte, situações de vulnerabilidade temporária e de calamidade pública, conforme ocorreu nos anos de 2020 até 2022, situações atípicas em que não se pode evitar malefícios diretos aos indivíduos. Entretanto, essa ação eventual é uma alternativa da esfera federativa, e não obrigação legal contínua como o BPC, buscando ser encaixada lei orçamentária de cada ano e de cada entidade assistente a previsão de seu pagamento e sua viabilidade.
2.4 Dos Critérios Para Enquadramento
Os critérios para obtenção do Benefício de Prestação Continuada sendo idoso são básicos, ter idade igual ou maior que 65 anos, o indivíduo deve provar a condição de pobreza ou necessidade, sendo que a renda familiar per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo; é importante citar que este de forma alguma pode ter vínculo com o regime de previdência social, ressaltando que o regime de previdência é obtido após contribuição diferentemente do BPC que é de assistência social, logo conclui-se que ele pode receber benefício de assistência médica e da pensão especial de natureza indenizatória mas jamais benefícios previdenciários. A Lei reafirma ainda alguns critérios mais simplórios como a inscrição no Cadastro de Pessoa Física, o beneficiário e os entes, e a inscrição também no Cadastro Único (ANASTÁCIO, 2019).
Já os requisitos para o deficiente físico abrangem a comprovação da deficiência e não somente a existência dela em si como também a incapacitação que esta causa na vida social do indivíduo, conforme o Art. 20 da Lei 8742/93 da Constituição Federal (1988), disposto a seguir:
§ 2o Para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, considera-se pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, o qual, em interação com uma ou mais barreiras, pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas.
Para tal averiguação desse critério o beneficiário se submete à perícia do Instituto Nacional do Seguro Social para a realização dos procedimentos burocráticos referentes a condição médica e social; deve apresentar também a comprovação da condição de vulnerabilidade socioeconômica atentando-se ao critério de renda per capita familiar ser inferior a um quatro do salário-mínimo. Não vinculação a regimes previdenciários, deve conter inscrição no CPF deste e da família também. Além do Cadastro Único estar ativo e regular. Para ambos os tipos de assistidos a revisão deste benefício ocorre a cada dois anos, ressaltando que qualquer irregularidade no cumprimento dos requisitos acarretará a suspensão ou cancelamento do Benefício de Prestação Continuada (FONSECA, 2017).
2.5 Das Alterações Realizadas Durante A Pandemia
Nesse período de instabilidade política, sanitária e econômica que o mundo foi submerso é esperado que as constituições familiares e individuais que já estavam em posições de indignidade financeira e social, seriam os mais prejudicados. Por isso, o papel que essa política de Assistência Social cumpriu foi de extremo valor para a sociedade brasileira. Ocorreram mudanças ao longo do tempo para que, houvesse uma maior flexibilização nos critérios para obtenção do principal benefício da pasta, o BPC.
Assim como a sociedade está em mudança constante, as necessidades dos indivíduos também são mutantes, elas variam de acordo com os acessos mínimos da época para asseguração da dignidade social de cada um. O critério da LOAS que ainda deve ser debatido e flexibilizado para um melhoramento da política de assistência social é o sócio econômico, nos últimos três anos ocorreram quatro mudanças significativas no regimento legal e que interferiram diretamente no acesso a assistência social.
Por outro lado, a discussão na esfera judicial quanto à flexibilização do critério econômico de forma mais adequada à realidade enfrentada pelos indivíduos em situação de vulnerabilidade social e econômica, demonstra uma clara preocupação com a efetiva diminuição das desigualdades e injustiças sociais que atingem grande parte da população do país (FONSECA, 2017, p. 28).
O texto original da Lei Orgânica da Assistência Social, Lei 8.742/1993 denota em seu terceiro parágrafo que o incapaz que deve ser assistido com o Benefício de Prestação Continuada é aquele idoso ou deficiente cuja renda per capita família fosse inferior a ¼ (um quarto) do salário-mínimo vigente. Esse critério não contabiliza diversas ações comprobatórias da fraqueza financeira das instituições familiares, por conta dessa perspectiva esses casos foram levados a esfera judicial, onde houve comprovação da vulnerabilidade e concessão por meio judicial do BPC. Essas ações abriram precedentes que justificavam questionamentos realizados pelos requerentes do benefício.
Por isso, no ano de 2020 houve uma mudança nesse critério por meio da Lei 13.981/20, essa alteração modificou esse requisito flexibilizando para que a renda máxima por beneficiário fosse de meio salário-mínimo, foi uma mudança que causou comoção na luta pelo direito assistencial no Brasil. No entanto, essa mudança persistiu apenas até o final do ano de 2020, pois ocorreu outra modificação que visou o retorno do valor máximo para um quarto de salário-mínimo dos benefícios concedidos até 31 de dezembro de 2020.
Dessa forma, os beneficiários do ano vigente estavam sujeitos a uma restrição financeira maior e os que fossem apresentar solicitação do benefício do ano seguinte permaneceram sem critério pois, o item segundo do parágrafo 3º que instituía a flexibilização para o ano de 2021 foi vetado pelo então Presidente da República Jair Messias Bolsonaro. Santos reafirma que
Não se pode perder de vista que o BPC é aquela parcela de proteção social que se consubstancia em benefício. E a CF quer que esse benefício seja a garantia da manutenção da pessoa com deficiência ou idosa que não tenha ninguém por si. E o fixou em um salário mínimo. O bem-estar social está qualificado e quantificado na CF: qualificado porque se efetiva com a implementação dos direitos sociais; quantificado porque a CF fixou em um salário mínimo a remuneração mínima e o valor dos benefícios previdenciários, demonstrando que ninguém pode ter seu sustento provido com valor inferior. Ao fixar em ¼ do salário mínimo o fato discriminante para a aferição da necessidade, o legislador elegeu discrimen inconstitucional porque deu aos necessitados conceito diferente de bem-estar social, presumindo que a renda per capita superior a ¼ do mínimo seria a necessária e suficiente para a sua manutenção, ou seja, quanto menos têm, menos precisam ter! Quantificar o bem-estar social em valor inferior ao salário mínimo é o mesmo que “voltar para trás” em termos de direitos sociais. A ordem jurídica constitucional e infraconstitucional não pode “voltar para trás” em termos de direitos fundamentais, sob pena de ofensa ao princípio do não retrocesso social […](SANTOS, 2011, p. 20)
Por fim, ficou a critério da MP 1.023/2020 que o critério socioeconômico voltasse ao requisito do texto original, sendo o BPC assistido aos indivíduos vulneráveis cuja renda per capita familiar represente valor inferior a ¼ de salário-mínimo. Absorvemos de todas essas alterações legais a necessidade de políticas públicas cabíveis na realidade da população brasileira, assim como verificação do enquadramento de cada caso para os requisitos dispostos na legislação vigente (BERCLAZ, 2021).
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Compreendeu-se que ao longo da história política do Brasil o assistencialismo sempre esteve presente de maneiras ordenadas e fragmentadas. Quando passou a ser um direito do cidadão brasileiro a assistência social se moldou de forma coordenada e mais abrangente, a participação da população com entidades que priorizaram o bem-estar social dos pobres resultou na Lei Orgânica de Assistência Social, Lei 8.742/1993. Esta tornou a assistência social uma obrigação do estado para com a população amais vulnerável, e descentralizou as ações tornando as esferas municipais e estaduais mais participativas nas decisões tomadas, um passo importante pois esses poderes estão estabelecidos mais próximos da realidade da população baixa renda. Entende-se que uma política pública efetiva e eficaz para os problemas sociais existentes, é uma política flexível e em constante mutação para adequação a realidade do brasileiro.
A Assistência Social ´hoje é um pilar que estabelece segurança social para os vulneráveis com legitimidade e legalidade, respaldada pela Constituição Federal (1988), assim como a pandemia trouxe um caos político e sanitário, as incertezas que acometem os pobres são de responsabilidade do Estado, este como supremo promotor do bem-estar social. A necessidade de debate sobre o assistencialismo e de materiais atualizados para informação de todos é algo que esse trabalho procurou apresentar, reconhecendo as vias legais como instrumentos de assistencialismo, para enfim amenizar a desigualdade social que assola o Brasil.
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