REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.11508522
Elinaldo Caetano Silva1
Mairon Uelisson Rodrigues Ferreira2
Andréia Alves de Almeida3
RESUMO
Ao longo dos anos, a Lei Maria da Penha passou por diversas alterações e atualizações, refletindo não apenas mudanças nas normas jurídicas, mas também na percepção social em relação à violência de gênero. Posto isso, o presente artigo tem como objetivo geral analisar de forma abrangente a efetividade da Lei Maria da Penha. Quanto aos objetivos específicos busca-se analisar a evolução social no que diz respeito à percepção da violência de gênero; Identificar os principais desafios enfrentados na implementação prática da Lei Maria da Penha, considerando fatores como obstáculos institucionais, culturais e sociais que podem impactar a efetividade da legislação e a proteção dos direitos das mulheres e analisar a jurisprudência dos tribunais superiores. Dessa forma a problemática da pesquisa será analisar como a evolução legislativa e social impacta a efetividade da Lei Maria da Penha na prevenção e combate à violência de gênero, e quais são os principais desafios enfrentados na implementação prática dessa legislação no contexto atual? A partir disso, os resultados demonstram que a temática tem o potencial de promover novos estudos uma vez que proporcionaram a abertura para reflexões sobre possíveis lacunas na legislação, desafios práticos na sua aplicação e oportunidades de aprimoramento. Assim, utilizou-se o método de pesquisa bibliográfica, com abordagem qualitativa e dedutiva, para desenvolver ideias de forma conceitual e interpretar os dados obtidos através de pesquisas bibliográficas, artigos científicos, teses e livros.
Palavras-chave: lei maria da penha. violência de gênero. Efetividade.
ABSTRACT
Over the years, the Maria da Penha Law has undergone various amendments and updates, reflecting not only changes in legal norms but also in social perception regarding gender-based violence. Given this, the present article aims to comprehensively analyze the effectiveness of the Maria da Penha Law. The specific objectives are to analyze social evolution in terms of the perception of gender-based violence; identify the main challenges faced in the practical implementation of the Maria da Penha Law, considering factors such as institutional, cultural, and social obstacles that may impact the effectiveness of the legislation and the protection of women’s rights; and analyze the jurisprudence of higher courts. Thus, the research problem will analyze how legislative and social evolution impacts the effectiveness of the Maria da Penha Law in preventing and combating gender-based violence, and what the main challenges faced in the practical implementation of this legislation are in the current context. From this, the results demonstrate that the theme has the potential to promote new studies since it opens up reflections on possible gaps in the legislation, practical challenges in its application, and opportunities for improvement. Therefore, a bibliographic research method was used, with a qualitative and deductive approach, to develop conceptual ideas and interpret the data obtained through bibliographic research, scientific articles, theses, and books.
Keywords: Maria da Penha Law. Gender-based violence. Effectiveness.
INTRODUÇÃO
A Lei Maria da Penha 11.340/2006, que entrou em vigor no Brasil em 2006, é um ponto de referência legal crucial na defesa das mulheres contra a violência doméstica e familiar. Seu título presta uma homenagem a Maria da Penha Maia Fernandes, que, após ser vítima de violência doméstica, tornou-se um ícone na batalha pelos direitos das mulheres.
Ao longo dos anos, a legislação passou por diversas alterações e atualizações, refletindo não apenas mudanças nas normas jurídicas, mas também na percepção social em relação à violência de gênero.
Mediante o que se expõe, a problemática será analisar como a evolução legislativa e social impacta a efetividade da Lei Maria da Penha na prevenção e combate à violência de gênero, e quais são os principais desafios enfrentados na implementação prática dessa legislação no contexto atual?
Para responder o presente problema de pesquisa definiu-se como objetivo geral: Analisar de forma abrangente a efetividade da Lei Maria da Penha, considerando a influência da evolução legislativa e social. E Investigar as principais alterações legislativas referente aos direitos das mulheres e a Lei Maria da Penha.
Já os objetivos específicos busca-se analisar a evolução social no que diz respeito à percepção da violência de gênero; Identificar os principais desafios enfrentados na implementação prática da Lei Maria da Penha, considerando fatores como obstáculos institucionais, culturais e sociais que podem impactar a efetividade da legislação e a proteção dos direitos das mulheres e analisar a jurisprudência dos tribunais superiores, especialmente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no que tange à interpretação e aplicação da Lei Maria da Penha.
Dessa forma, considerou-se as seguintes hipóteses: Acredita-se que a evolução legislativa, por meio de alterações e atualizações na Lei Maria da Penha, pode contribuir positivamente para a efetividade na prevenção e combate à violência de gênero, proporcionando instrumentos legais mais eficazes e adaptados às demandas contemporâneas; Há a hipótese de que a evolução social, marcada por mudanças nas normas culturais e na conscientização da sociedade, desempenha um papel crucial na efetividade da Lei Maria da Penha, influenciando a denúncia de casos, a percepção pública da violência de gênero e a resposta das instituições diante dessas questões.
Assim, o presente artigo justifica-se pela importância crucial da temática da violência de gênero. É importante ressaltar, que a Lei Maria da Penha representa um avanço na proteção das mulheres e por este motivo, sua efetividade requer uma análise aprofundada diante das mudanças legislativas e sociais. No cerne da contextualização, estão os conceitos fundamentais de igualdade de gênero, empoderamento feminino e a necessidade de uma abordagem multidisciplinar para lidar com as complexidades da violência doméstica. O objeto de estudo concentra-se não apenas na análise da legislação em si, mas na interseção dinâmica entre a Lei Maria da Penha, a evolução legislativa, os movimentos sociais e as transformações culturais que moldam a efetividade dessa importante ferramenta de proteção dos direitos das mulheres.
Assim, o presente artigo será dividido em três capítulos, na primeira parte do capítulo 2 intitulado o contexto histórico do direito da mulher, visa apresentar um panorama de acontecimentos, bem como, a igualdade constitucional as, no terceiro será pontuado a lei Maria da Penha como panorama geral medidas protetivas previstas na Lei Maria da Penha, e por fim o quarto capítulo que irá responder a problemática desta pesquisa apresentando o papel da lei maria da penha na redução das agressões de gênero.
Em relação a metodologia em relação à natureza da pesquisa será conduzida no formato de pesquisa exploratória e descritiva, em que se utilizará o método de pesquisa dedutiva com o propósito de realizar produção de novos entendimentos, contribuindo para o avanço do conhecimento científico.
Por outro lado, utilizou-se do método de pesquisa bibliográfica, com abordagem qualitativa e dedutiva, para desenvolver ideias de forma conceitual e interpretar os dados obtidos através de pesquisas bibliográficas, artigos científicos, teses e livros.
2. O CONTEXTO HISTÓRICO DO DIREITO DA MULHER
Ao examinar o contexto histórico, as mulheres no século XIX enfrentaram uma submissão acentuada, incumbidas principalmente das tarefas domésticas e restritas aos papéis de esposa e mãe. Fatores culturais e morais da época limitavam sua capacidade de abandonar o trabalho doméstico para buscar emprego fora de casa. Aquelas que desafiavam essa norma, optando por trabalhar ou até mesmo estudar, eram frequentemente desacreditadas e desaprovadas pela sociedade (Duarte, 2003).
De acordo com Machado (2004) era uma época peculiar e desanimadora, repleta de aspirações não reconhecidas. Há muito tempo, eu sonhava em contribuir para o mundo, mas, como éramos mulheres de poucos recursos e nascidas em determinadas posições sociais, não se considerava necessário que fizéssemos algo além de nos ocuparmos até que o momento e a oportunidade de se casar surgissem. Charlotte Despard, em memórias não publicadas, datadas de 1850.
O primeiro marco da intervenção estatal na proteção dos direitos das mulheres ocorreu em 1981, quando a República Federativa do Brasil assinou a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW)4, que entrou em vigor nacionalmente em 1984. Esta foi a primeira convenção internacional a abordar amplamente os direitos humanos das mulheres, com o objetivo de promover a igualdade de gênero e reprimir toda forma de discriminação contra as mulheres nos Estados que a ratificaram (Dias, 2019).
Como resposta aos movimentos feministas e à má qualidade do atendimento recebido nas delegacias de polícia, que muitas vezes constrangem e vitimizam as mulheres, foi estabelecida em 1985 a primeira Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) na cidade de São Paulo. Essas delegacias especializadas continuam a ser uma das principais políticas públicas de prevenção e combate à violência contra as mulheres até os dias atuais (Nascimento, 2019).
A crescente discussão sobre a igualdade de gênero resultou na inclusão, pela Assembleia Nacional Constituinte de 1988, de dispositivos constitucionais que ampliaram o princípio da igualdade para garantir a equiparação entre os sexos.
2.1 Da igualdade constitucional
Conquistados por meio de diversas lutas e revoluções, os direitos fundamentais são os que nos garantem, juridicamente, as condições básicas para vivermos com dignidade e desenvolvermos nosso potencial. Barroso (2019) define os como os direitos humanos incorporados ao ordenamento jurídico interno, representando a positivação, pelo Estado, dos direitos morais das pessoas, previstos expressa ou implicitamente na Constituição ou em documentos equivalentes.
Dessa maneira, antes da Constituição Federal de 1988, as mulheres não possuíam os mesmos direitos que os homens. Terminologicamente, os direitos fundamentais eram frequentemente descritos como sendo exclusivamente masculinos, excluindo assim os direitos das mulheres. Esse cenário reflete a colocação contínua da mulher como inferior ao homem em vários aspectos, uma realidade que persiste até os dias atuais, apesar dos esforços contínuos das mulheres para reivindicar e afirmar seus direitos (Sabag e Braz, 2020).
A Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948) marcou o início de uma jornada sem precedentes na história, ao afirmar a necessidade de respeitar a igualdade entre todos os seres humanos. Essa trajetória continuou com a Convenção para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres de 1979 e a I Conferência sobre as Mulheres de 1975, realizada pela ONU.
Esses avanços influenciaram diretamente a redação da Constituição Federal de 1988, que deu um grande passo na superação do tratamento desigual baseado no sexo, equiparando os direitos e obrigações de homens e mulheres. A igualdade constitucional é evidenciada principalmente no art. 5°, inciso I, que declara que “homens e mulheres são iguais em direitos e obrigações, nos termos desta Constituição”.
É crucial destacar que, antes da atual Constituição, as mulheres já estavam gradualmente conquistando diversos direitos, como o direito ao voto. No entanto, com a Carta Magna de 1988, houve uma consolidação da igualdade de direitos, que inclui não apenas a igualdade negativa e a não discriminação, mas também a igualdade positiva, promocional e afirmativa, que visa retirar barreiras, oferecer apoio e proteção, garantindo assim a equiparação de direitos, reconhecendo as diferenças (Sabag e Braz, 2020).
Portanto, ter igualdade de direitos não significa ter os mesmos direitos, mas sim garantir que essas diferenças não coloquem as mulheres em posição de inferioridade. Um exemplo disso é a questão da maternidade e paternidade, onde existem muitas circunstâncias que afetam as mulheres de forma diferente dos homens, considerando homens e mulheres cisgêneros (Sabag e Braz, 2020).
3. LEI MARIA DA PENHA PANORAMA GERAL
A Lei nº 11.340, mais conhecida como Lei Maria da Penha, foi sancionada em 7 de agosto de 2006, com o principal objetivo de proteger a mulher em situações de violência doméstica e familiar. Seu escopo abrange uma ampla gama de formas de violência que podem ser identificadas, indo além da agressão física. Dentre essas formas, destacam-se:
Violência Psicológica (Art. 7º): caracterizada por ameaças, constrangimento, manipulação, vigilância constante, insultos e ações que causam danos emocionais significativos na mulher (Brasil, 2006).
Violência Sexual (Art. 7º, II): na qual o agressor força a vítima a manter ou participar de relações sexuais não desejadas (Brasil, 2006).
Violência Patrimonial (Art. 7º, III): envolvendo retenção, subtração ou destruição dos materiais profissionais, documentos pessoais, bens, valores ou direitos econômicos da vítima (Brasil, 2006).
Violência Moral (Art. 7º, IV): que abrange calúnia, difamação e injúria, como acusar a mulher de traição, expor sua vida íntima e desvalorizá-la com base em seu modo de se vestir (Brasil, 2006).
Essa abrangência visa proporcionar uma proteção mais completa e eficaz às mulheres em situação de vulnerabilidade, combatendo não apenas a violência física, mas também as diversas formas de violência que podem afetar sua integridade e dignidade (Cunha e Pinto, 2021).
O Portal do Conselho Nacional de Justiça traz várias garantias determinadas pela Lei Maria da Penha dentre elas: Define e caracteriza a violência doméstica e familiar contra a mulher, estipulando as diferentes formas de violência doméstica, incluindo violência física, psicológica, sexual, patrimonial e moral. Afirma que a violência doméstica contra a mulher não está relacionada à sua orientação sexual, proibindo a imposição de penas pecuniárias, como multas ou doação de cestas básicas (CNJ, 2024).
Além disso, remove a competência dos juizados especiais criminais (Lei n. 9.099/95) para julgar casos de violência doméstica contra a mulher, modificando o Código de Processo Penal para permitir que o juiz decrete prisão preventiva quando houver ameaça à integridade física ou psicológica da mulher. Altera a lei de execuções penais para possibilitar que o juiz ordene a participação obrigatória do agressor em programas de reabilitação e educação, determinando a criação de juizados especiais de violência doméstica e familiar contra a mulher, com jurisdição em questões civis e criminais relacionadas à violência contra a mulher. Prevê aumento da pena em um terço nos casos de violência doméstica contra mulheres com deficiência (CNJ, 2024).
Cunha e Pinto (2021, p. 122) reforçam que a “violência doméstica passa a ser um agravante para aumento de pena, não sendo possível substituir a pena por doação de cestas básicas, trabalhos comunitários ou multas”. Nesta mesma toada é determinado ao agressor que se afaste da vítima, como também, de seus familiares. Importante, também comentar que no caso de dependência financeira por parte da vítima ela receberá assistência financeira.
Valéria Fernandes destaca a importância da disponibilização do atendimento através do telefone 180; na sua visão, é uma ferramenta valiosa, uma vez que pode ser usada pela própria vítima, ou, ainda, por pessoas que testemunham agressões sofridas por mulheres (Fernandes, 2022).
Um aspecto relevante da Lei Maria da Penha é sua aplicabilidade tanto pela vítima quanto por testemunhas de agressões contra mulheres. Maria Berenice Dias destaca alguns pontos importantes desta lei, incluindo a criação do juizado especializado em violência doméstica e familiar contra a mulher, visando agilizar o atendimento e resolver questões cíveis e criminais em um único tribunal. Ela ressalta também a importância das medidas protetivas de urgência, que concedem à vítima o poder de exigir que o agressor não compartilhe mais o mesmo espaço, entre outras possibilidades (Dias, 2022).
Dias (2022) enfatiza ainda que mesmo em casos de lesão corporal leve, será iniciada uma investigação e processo, independentemente da vontade da vítima. Além disso, destaca que as vítimas têm direito a assistência integral, incluindo apoio psicológico, social, médico e jurídico.
3.1 As formas de violência contra mulher
A violência doméstica contra a mulher, dentro do escopo do direito penal, não é definida por tipos específicos de crimes, já que a lista é vista como não sendo completa. Consequentemente, de acordo com o artigo 7° da Lei n° 11.340/06, fica claro que a legislação emprega a expressão entre outras, sugerindo que existem outras formas de violência além das mencionadas. Essa é a maneira como a classificação dessa forma de violência é observada:
Art. 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras: I – a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal; II – a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação; (Redação dada pela Lei nº 13.772, de 2018) III – a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos; IV – a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos 10 de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades; V – a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria. (Brasil, 2010).
Desta forma, as outras opções podem configuram violência doméstica e familiar contra a mulher, não uma determinação, somente a exposição de determinadas situações, como podemos observar na Lei n° 11.340/2006 Lei Maria da Penha, que reconhecem diversas formas de violência como a física, mesmo que a agressão não tenham deixados marcas, o uso de força física ofende a saúde do corpo da mulher. Sendo inúmeras espécies envolvendo contato físico e psicológico, envolvendo palavreados de baixo calão ofendendo sua dignidade, beliscões, socos, queimaduras, puxões de cabelos dentre outros, que ofenda sua integridade física como é disposto no artigo 129 do Código Penal:
Art. 129. Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem: Pena – detenção, de três meses a um ano. Lesão corporal de natureza grave meses a um ano. Aumento de pena § 13. Se a lesão for praticada contra a mulher, por razões da condição do sexo feminino, nos termos do § 2º-A do art. 121 deste Código: (Incluído pela Lei nº 14.188, de 2021) Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro anos). (Incluído pela Lei nº 14.188, de 2021). (Brasil, 2010).
O contato físico, no qual provoque o lesão, podendo resultar ou não lesão ou marcas no corpo, é uma das principais que ocorrem diariamente determinadas como psicológica que foi incorporada através da Convenção de Belém do Pará, também conhecida como Convenção Interamericana para prevenir, punir e erradicar a violência doméstica que está tipificada na Lei n° 11.340/06, em seu artigo 7° inciso II:
Art. 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras: II – a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, violação de sua intimidade, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação; (Redação dada pela Lei nº 13.772, de 2018). (Brasil, 2018).
A agressão emocional pode ocorrer através de ameaças, humilhações e discriminações, quando o agente sente prazer em ver a vítima sentindo-se amedrontada, aterrorizada, diminuída e inferiorizada, causando prejuízo à autodeterminação e a saúde psicológica (Dias, 2007).
As mulheres que sofrem violência poderão sofrer reflexos sobre refletir sobre sua saúde emocional como ansiedade, depressão, medos, pânico dentre outras que são graves tendo em vista que afetam a saúde psicológica da mulher, mesmo que não apresentem cicatrizes aparentes. Devemos ressaltar que a violência sexual pode se determinar que qualquer conduta que force a vítima a manter ou presenciar ou participar de uma relação sexual que não deseja e que impeça o uso de métodos contraceptivos ou que force á gravidez, a prostituição, ao casamento, aborto, seja mediante chantagem, ameaças, manipulação ou até mesmo suborno, ou também, que possa limitar ou anular o exercício de seus direitos reproduzidos ou sexuais. Desta maneira, considera-se crime de estupro quem obriga uma mulher manter uma relação sexual não desejada, conforme comenta Dias (2007, p.50) “Mesmo o delito de assédio sexual, que está ligado às relações de trabalho, pode constituir violência doméstica quando, além do vínculo familiar, a vítima trabalha para o agressor”.
Com relação á violência patrimonial que está elencada na Lei n° 11.340/06, artigo 7° inciso IV:
Art. 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras: IV – a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades; (BRASIL, 2006).
A violência patrimonial é quando o agressor se apodera ou destrói objetos pertencentes à vítima, podendo ser seus documentos pessoais ou bens, podendo ser utilizados roupas e jóias sem o consentimento da mulher.
Com relação á violência moral que é determinada no artigo 7° inciso V da Lei n° 11.340/06: “Art. 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras: V – a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria”
A violência moral encontra-se protegida pela proteção penal dos delitos contra honra, calúnia, difamação e injúria, que são denominados os delitos que protegem a honra que é cometida no âmbito familiar, configurando violência moral. A calúnia é feita pelo ofensor a vítima que é definido como crime, na injúria não há atribuição de um fato determinado, inferindo a honra subjetiva, já a calúnia se configura sempre que o agressor afirma falsamente que a vítima faz programas ou que, por exemplo, furtou seu carro.
Com isso podemos compreender os tipos de violência contra mulher, algo que não veio dos dias atuais, mas que mesmo com os avanços legislativos na sua proteção ainda há diversos casos desse tipo violência, pelo simples fato de ser mulher, ainda o nosso sistema social reflete muitos ditames ultrapassados e isso contribui para perpetuação da violência contra a mulher.
4. O PAPEL DA LEI MARIA DA PENHA NA REDUÇÃO DAS AGRESSÕES DE GÊNERO
A Lei Maria da Penha promoveu mudanças significativas no tratamento do Estado em relação à violência doméstica, operando por meio de três canais distintos. Primeiramente, elevou o custo da pena para os agressores, em segundo lugar, fortaleceu o empoderamento e as condições de segurança para que as vítimas pudessem denunciar, por fim, aprimorou os mecanismos jurisdicionais, permitindo que o sistema de justiça criminal respondesse de maneira mais eficaz aos casos de violência doméstica (Cerqueira et al., 2015).
Os agressores e as vítimas viram mudanças em seu comportamento. As vítimas sentiram-se mais seguras para denunciar, graças às medidas protetivas, enquanto o sistema judicial tornou-se mais eficiente em condenar. Isso aumentou a probabilidade de condenação para um número específico de denúncias. Assim, a Lei Maria da Penha parece ter elevado o custo esperado da punição, o que pode dissuadir os agressores (Cerqueira et al., 2015).
De acordo com o relatório “Visível e Invisível: a Vitimização de Mulheres no Brasil”, divulgado pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública em março de 2023, houve um crescimento significativo da violência contra a mulher em 2022. Os dados revelam um aumento alarmante nos casos de feminicídios, homicídios dolosos, agressões em contexto de violência doméstica, ameaças, acionamentos ao 190, assédio sexual e importunação sexual. Por exemplo, os feminicídios registraram um aumento de 6,1%, resultando em 1.437 mulheres mortas apenas por serem mulheres. Além disso, os homicídios dolosos de mulheres também apresentaram um aumento de 1,2% em relação ao ano anterior. As agressões em contexto de violência doméstica aumentaram 2,9%, totalizando 245.713 casos, enquanto as ameaças cresceram 7,2%, resultando em 613.529 casos. Os acionamentos ao 190, número de emergência da Polícia Militar, atingiram 899.485 ligações, com uma média de 102 acionamentos por hora. Registros de assédio sexual cresceram 49,7%, totalizando 6.114 casos em 2022, e a importunação sexual teve um crescimento de 37%, chegando a 27.530 casos no último ano.
O relatório destaca três hipóteses principais para explicar esse aumento: o de financiamento das políticas de proteção à mulher, o impacto da pandemia de covid-19 nos serviços de acolhimento e proteção às mulheres, e a ascensão de movimentos ultraconservadores na política brasileira. Além disso, é mencionada a teoria do backlash, que sugere que as violências contra as mulheres aumentam na medida em que avançamos em ações que promovem a igualdade de gênero, como uma reação aos papéis sociais historicamente atribuídos às mulheres.
O impacto da Lei Maria da Penha no tratamento do Estado em relação à violência doméstica é inegável. A legislação operou por meio de três canais distintos, promovendo mudanças significativas tanto no comportamento dos agressores quanto na segurança e empoderamento das vítimas.
No entanto, apesar dos avanços proporcionados pela Lei Maria da Penha, os dados apresentados no 17º Anuário Brasileiro de Segurança Pública destacam uma realidade preocupante em relação à segurança e proteção das mulheres no Brasil. O crescimento alarmante de todas as formas de violência contra a mulher em 2022 evidencia a complexidade do fenômeno e a necessidade de abordagens multifacetadas para enfrentá-lo. A Lei Maria da Penha foi um marco importante, mas ainda há muito a ser feito para garantir a segurança e a dignidade das mulheres no Brasil (IPEA, 2018).
O Atlas da Violência 2018, uma colaboração entre o Ipea e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), examina todas as formas de violência no Brasil, mas neste estudo, nos concentramos nos dados relacionados às mulheres, contribuindo para a construção metodológica até o momento.
Segundo o relatório, houve um aumento de 6,4% nos homicídios ao longo de dez anos, com 4.645 mulheres assassinadas em 2016, representando aproximadamente 4,5 homicídios para cada 100 mil brasileiras. Em 2016, Roraima teve uma taxa de 10 homicídios por 100 mil mulheres, a mais alta entre os estados brasileiros. Por outro lado, o Espírito Santo registrou a maior queda, de 43,2%, com 104 homicídios em 2016 (IPEA, 2018).
É crucial ressaltar que o relatório aborda a questão da violência contra a mulher, sugerindo que muitas mortes poderiam ser evitadas se as mulheres tivessem opções e apoio para sair de situações de violência (IPEA, 2018).
Os dados indicam que em 2016, a taxa de homicídios foi maior entre as mulheres negras, com uma diferença de 71% em comparação às não negras. Nos últimos dez anos, a taxa de homicídios para cada 100 mil mulheres negras aumentou em 15,4%, enquanto para as não negras houve uma queda de 8% (IPEA, 2018, p. 51). Em relação aos estupros, foram registrados 49.497 casos perante as autoridades policiais, mas apenas 22.918 foram registrados no Sistema Único de Saúde (SUS), menos da metade dos casos relatados à polícia (IPEA, 2018) A análise do relatório sobre Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher, conduzido pelo DataSenado em colaboração com o Observatório da Mulher contra a Violência, é destacada. Este estudo envolveu a entrevista de 1.116 mulheres brasileiras entre 29 de março e 11 de abril de 2017, marcando sua sétima edição naquele ano. Desde 2005, esta pesquisa é realizada a cada dois anos (DATA SENADO, 2017, p. 2).
De acordo com os resultados do levantamento do DataSenado (2017), inicialmente, todas as entrevistadas relataram ter conhecimento da Lei Maria da Penha (LMP), embora apenas 18% afirmaram possuir um entendimento mais profundo da lei, enquanto 77% têm um conhecimento limitado. Além disso, houve um aumento significativo no número de mulheres que relataram ter vivenciado algum tipo de violência, saltando de 18% em 2015 para 29% em 2017. É relevante notar que em 2005, esse índice era de 17% (DATA SENADO, 2017).
Em relação à eficácia da LPM na proteção das mulheres contra a violência doméstica e familiar, os dados revelam que 26% acreditam que a lei oferece proteção integral, enquanto 53% consideram que oferece apenas proteção parcial e 20% acreditam que não oferece proteção alguma. Entre as mulheres que não relataram ter sofrido violência, 17% opinaram que a lei não oferece proteção adequada, enquanto esse percentual aumenta para 29% entre aquelas que vivenciaram algum tipo de violência (p. 3). A pesquisa também investigou os tipos de violência enfrentados por essas mulheres, sendo 67% física, 47% psicológica, 36% moral, 15% sexual e 8% patrimonial. O índice que mais cresceu foi o de violência sexual, passando de 5% em 2011 para 15% em 2017. Apenas 26% das entrevistadas buscaram assistência médica devido à violência sofrida (DATA SENADO, 2017).
4.1 Os impactos positivos da lei maria da penha na sociedade
Apesar dos dados alarmantes de violência contra mulher, estudos demonstram grandes avanços na legislação os estudos de Azuaga e Sampaio (2017) estimativas disponíveis indicam que a implementação da Lei Maria da Penha resultou em uma diminuição na taxa de mortalidade de mulheres em torno de 27% e 10%, respectivamente, em comparação com o grupo de controle. Mesmo ao empregar algoritmos de seleção de variáveis diferentes, os resultados permanecem estatisticamente significativos e consistentes em direção.
É importante ressaltar que a Lei Maria da Penha, em seu artigo 8º, estabeleceu que as medidas de prevenção devem ser promovidas de forma integrada, envolvendo ações tanto dos órgãos governamentais quanto de entidades não governamentais. Essa abordagem abrangente visa garantir um controle mais efetivo no combate à violência doméstica e familiar, sendo um importante marco para a evolução da lei (Brasil, 2006).
Além disso, o inciso IV do mesmo artigo menciona a implementação de atendimento policial especializado para mulheres, com destaque para as Delegacias de Atendimento à Mulher, enquanto o artigo 14 destaca a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. Esses dispositivos têm como objetivo fornecer atenção específica e especializada às mulheres vítimas de violência doméstica e familiar, reconhecendo as particularidades de cada caso (Brasil, 2006).
A Lei Maria da Penha estabelece duas situações nas quais podem ser aplicadas medidas protetivas de urgência para salvaguardar a vítima: uma em relação ao agressor e outra em relação à vítima. Em ambos os casos, cabe ao juiz avaliar a necessidade de estabelecer tais medidas, levando sempre em consideração as circunstâncias do caso concreto. Para uma compreensão mais clara da análise dos dados estatísticos que serão apresentados posteriormente, é importante elucidar as medidas protetivas previstas na Lei Maria da Penha (Brasil, 2006).
Em 2015, uma alteração no código penal reforçou as garantias na eficácia do combate à violência doméstica, com a modificação do artigo 121 do Código Penal pela Lei 13.104/2015, que introduziu o conceito de feminicídio. O feminicídio é caracterizado como o assassinato de uma mulher em razão de seu gênero, envolvendo violência doméstica e familiar, ou menosprezo e discriminação à condição feminina (Brasil, 2006). Essa lei inclui o feminicídio na lista de crimes hediondos, conferindo-lhe um tratamento mais severo perante a justiça.
No que diz respeito à proteção dos bens da vítima, as medidas protetivas podem ser acionadas. Essa proteção se materializa por meio de ações como o bloqueio de contas, indisponibilidade de bens, restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor e prestação de caução provisória, através de depósito judicial, para cobrir perdas e danos materiais decorrentes da violência doméstica. De acordo com a lei, o juiz tem a prerrogativa de determinar uma ou mais medidas em cada caso, sendo possível substituí-las a qualquer momento por outras mais eficazes, sempre que os direitos legitimados pela Lei 11.340/06 forem violados (Brasil, 2006).
Além disso, a legislação prevê que, diante da gravidade da situação, o juiz pode adotar medidas protetivas de urgência. Entre essas medidas, estão o encaminhamento da vítima e de seus dependentes para programas de proteção ou atendimento, estabelecer o retorno da vítima e de seus dependentes ao lar após o afastamento do agressor, e fixar o afastamento da vítima do domicílio, sem que isso implique a perda de direitos relativos a bens, guarda dos filhos e recebimento de pensão. O juiz pode, a qualquer momento que julgar necessário, solicitar o auxílio da força policial para garantir o cumprimento das medidas protetivas (Ramos, 2018).
Em 2022, foi desenvolvido o Projeto de Lei nº 1.604/22, proposto pela então senadora Simone Tebet e que resultou na Lei nº 14.550/23, teve como objetivo principal esclarecer o propósito da Lei Maria da Penha: todas as formas de violência contra as mulheres no âmbito das relações domésticas, familiares e íntimas de afeto são consideradas manifestações de violência baseada no gênero, justificando assim a necessidade de proteção específica para as mulheres.
Isso se deve ao fato de que alguns julgamentos do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estavam exigindo, para aplicação da Lei Maria da Penha, a comprovação da motivação de gênero por parte do agressor ou da vulnerabilidade da vítima no caso específico. Como resultado, aspectos como disputas patrimoniais, problemas relacionados ao uso de álcool ou drogas, ou até mesmo a vulnerabilidade decorrente da idade da vítima, eram frequentemente invocados para desqualificar a violência de gênero e, consequentemente, excluir a aplicação da Lei Maria da Penha.
Em 2023, com a promulgação da Lei 14.550/2023, que alterou a Lei Maria da Penha, marcou mais um passo à frente na proteção das mulheres que são vítimas de violência doméstica e familiar. A mudança principal reside em atribuir maior credibilidade ao testemunho da vítima e permitir que, em um procedimento sumário, medidas protetivas de urgência sejam concedidas com base exclusivamente no relato da vítima. Por outro lado, para negar tais medidas, é necessário demonstrar que não há risco para a integridade física, psicológica ou moral da vítima ou de seus dependentes (Dutra, 2023).
Além disso, essa nova mudança visa reconhecer que toda forma de violência doméstica e familiar contra a mulher constitui violência de gênero. Ao adotar essa abordagem, reafirma-se que não é obrigatório comprovar explicitamente a subjugação das mulheres para aplicar o sistema de proteção delineado na Lei Maria da Penha (Dutra, 2023).
5. EFETIVAÇÃO DA LEI MARIA DA PENHA: UMA ANÁLISE CRÍTICA
A Lei Maria da Penha (LMP) representa um marco fundamental na legislação brasileira, visando combater e prevenir a violência contra a mulher. No entanto, sua efetivação ainda é objeto de amplo debate e análise. Diversos estudos têm se dedicado a examinar tanto a eficácia quanto os desafios na implementação dessa legislação.
Um estudo conduzido por Cerqueira et al. (2015) examinou os efeitos da LMP na redução da violência doméstica e constatou que a legislação contribuiu para aumentar o custo esperado da punição para os agressores, tornando mais eficiente o processo judicial de condenação. Além disso, a pesquisa apontou que as vítimas se sentiram mais encorajadas a denunciar os casos de violência, graças às medidas protetivas previstas na lei.
Outra análise relevante foi realizada por Azuaga e Sampaio (2017), os quais estimaram que a implementação da LMP resultou em uma diminuição significativa na taxa de mortalidade de mulheres. O estudo evidenciou a importância das medidas protetivas e do fortalecimento do sistema judicial na prevenção e punição dos casos de violência doméstica.
Entretanto, apesar dos avanços proporcionados pela LMP, ainda existem desafios a serem enfrentados. Um estudo conduzido por Dutra (2023) destacou a necessidade de aprimoramento na aplicação da lei, especialmente no que diz respeito à proteção das vítimas e à concessão de medidas protetivas de urgência. O autor ressalta a importância de reconhecer todas as formas de violência doméstica como violência de gênero, a fim de garantir uma resposta eficaz do sistema de justiça.
Apesar das mudanças significativas desde a implementação da Lei Maria da Penha, é crucial promover ações socioeducativas voltadas para a revitalização da mulher como cidadã de direitos.
Como mencionado por Daminiani (2017), estamos inseridos em um projeto de sociedade que valoriza a família como instituição responsável pela formação moral de seus membros, mas também é um espaço onde ocorrem muitas violações dos direitos humanos, moldando os papéis de homens e mulheres na sociedade. Portanto, a desnaturalização desse processo de dominação é uma tarefa árdua para os profissionais engajados no combate à violência.
A Lei Maria da Penha, como destacado por Daminiani (2017), tem o poder de modificar significativamente a vida das vítimas e dos agressores. Ela tipifica a violência doméstica como uma forma de violação dos direitos humanos e introduz mudanças no Código Penal, possibilitando medidas como a prisão em flagrante ou preventiva dos agressores em casos de ameaça à integridade física da mulher, além de estabelecer medidas de proteção, como o afastamento do agressor do lar e a proibição de sua aproximação física da vítima e dos filhos.
No entanto, como ressaltado por Daminiani (2017), a efetividade da Lei Maria da Penha é prejudicada pela escassez de juizados especializados no tratamento da violência doméstica e familiar contra a mulher. Essa realidade sobrecarrega os juizados criminais, resultando em acumulação e atrasos nos processos, especialmente nos municípios do interior, onde a situação se mostra mais grave.
Por outro lado, Amancio (2016) analisou o aumento global dos casos de estupro e tentativa de estupro, sugerindo que a Lei Maria da Penha pode ser considerada uma política pública que, embora não necessariamente reduza os casos de estupro e tentativa de estupro, atua na proteção dos direitos da mulher ao criar um ambiente em que elas se sintam seguras para procurar as delegacias especializadas, reduzindo os índices de subnotificação. No entanto, esse aumento também pode indicar a não efetividade da Lei Maria da Penha, refletindo uma elevação absoluta dos casos.
Garcia et al. (2013) corroboram essa visão ao analisarem a efetividade da lei e observarem que ela não conseguiu reduzir os homicídios femininos. Além disso, apontam a necessidade de esforços contínuos para promover uma mudança cultural, destacando a importância de uma atuação coordenada e efetiva entre os serviços de atendimento à mulher vítima de violência para garantir a eficácia da Lei Maria da Penha. Outro fator mencionado para explicar a falta de efetividade é a demora na implementação das medidas punitivas, o que gera a sensação de impunidade e pode estimular a ocorrência de ações violentas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Dessa forma, o primeiro capítulo deste artigo buscou abordar a evolução dos direitos das mulheres no Brasil, destacando as principais conquistas e desafios enfrentados ao longo do tempo. Iniciou-se com uma retrospectiva histórica das lutas feministas e das legislações que precederam a Lei Maria da Penha, enfatizando como essas leis refletem as mudanças sociais e culturais na percepção dos direitos das mulheres. São examinadas as barreiras institucionais e sociais que dificultaram a progressão desses direitos e como o movimento feminista foi essencial para alcançar marcos significativos.
O capítulo conclui destacando o cenário legal e social imediatamente anterior à promulgação da Lei Maria da Penha, sublinhando a necessidade urgente de uma legislação mais robusta para combater a violência de gênero.
No capítulo segundo foi apresentado um panorama abrangente da Lei Maria da Penha (Lei n.º 11.340/2006), detalhando seus principais aspectos e inovações. A legislação é contextualizada dentro do marco legal brasileiro e são exploradas as definições ampliadas de violência doméstica e familiar que ela introduz. O capítulo discute as medidas protetivas emergenciais, a tipificação de novos crimes relacionados à violência doméstica, e as alterações legislativas subsequentes que buscaram aprimorar a lei. Também se aborda a importância da Lei Maria da Penha no reconhecimento internacional e seu papel como modelo para outras legislações. A eficácia da lei é avaliada em termos de sua implementação e impacto inicial na sociedade brasileira.
No capítulo terceiro foi examinado a efetividade da Lei Maria da Penha na redução das agressões de gênero, considerando tanto os avanços quanto os desafios persistentes.
Foram analisadas estatísticas e estudos de caso que ilustram o impacto da lei na proteção das vítimas e na punição dos agressores. O capítulo discutiu a importância da conscientização social e das campanhas educativas na transformação cultural e na diminuição do silêncio em torno da violência de gênero.
Além disso, são explorados os obstáculos institucionais, como a falta de recursos para Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAMs), e os desafios culturais que dificultam a aplicação efetiva da lei em algumas regiões.
A importância da jurisprudência dos tribunais superiores na interpretação e aplicação da lei é destacada, mostrando como decisões judiciais podem influenciar a consolidação dos direitos das mulheres. O capítulo conclui apontando que, apesar dos avanços significativos, a plena efetividade da Lei Maria da Penha depende de uma abordagem multifacetada que inclui melhorias contínuas na legislação e na implementação prática.
Mediante isso, a análise abrangente da efetividade da Lei Maria da Penha, considerando a evolução legislativa e social, revela um cenário complexo e multifacetado na prevenção e combate à violência de gênero no Brasil.
Apesar dos avanços legislativos e sociais, a implementação prática da Lei Maria da Penha enfrenta diversos desafios. A insuficiência de recursos destinados à estrutura e ao funcionamento das Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAMs), bem como a falta de capacitação contínua dos profissionais envolvidos no atendimento às vítimas, são entraves significativos.
A integração entre os diversos órgãos do sistema de justiça e as redes de apoio ainda necessita de aprimoramento. Além disso, a persistência de normas sociais patriarcais e a resistência cultural em algumas regiões dificultam a aplicação efetiva da lei. Muitas vítimas ainda enfrentam estigmatização e retaliação ao denunciar seus agressores, o que desestimula a busca por ajuda. A burocracia e a demora nos processos judiciais comprometem a proteção rápida e eficaz das vítimas. Além disso, a interiorização da lei, garantindo seu alcance em áreas rurais e regiões remotas, continua sendo um desafio.
A jurisprudência dos tribunais superiores, especialmente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ), tem desempenhado um papel crucial na interpretação e aplicação da Lei Maria da Penha. Decisões significativas, que reforçam a proteção das vítimas e a responsabilização dos agressores, contribuem para a consolidação de uma jurisprudência mais alinhada com os objetivos da lei. No entanto, divergências e a necessidade de uniformização de entendimentos ainda são aspectos a serem superados.
Os objetivos deste estudo foram alcançados com sucesso: foi realizada uma análise abrangente da efetividade da lei, considerando tanto a evolução legislativa quanto às mudanças sociais. Foram investigadas as principais alterações legislativas referentes aos direitos das mulheres e à Lei Maria da Penha, analisada a evolução social no que diz respeito à percepção da violência de gênero, identificados os principais desafios enfrentados na implementação prática da Lei Maria da Penha, considerando obstáculos institucionais, culturais e sociais, e analisada a jurisprudência dos tribunais superiores no que tange à interpretação e aplicação da Lei Maria da Penha.
As hipóteses foram confirmadas. A evolução legislativa tem impactado positivamente a efetividade da Lei Maria da Penha, com inovações que aumentam a proteção às vítimas e a punição aos agressores. A evolução social, com maior conscientização e mudanças culturais, têm contribuído para a efetividade da Lei Maria da Penha. A implementação prática enfrenta desafios significativos, especialmente relacionados a barreiras institucionais, culturais e sociais.
Este estudo permitiu responder à pergunta central: analisar como a evolução legislativa e social impacta a efetividade da Lei Maria da Penha na prevenção e combate à violência de gênero, e quais são os principais desafios enfrentados na implementação prática dessa legislação no contexto atual? Visto que, a Lei Maria da Penha representa um avanço notável na luta contra a violência de gênero no Brasil, mas a plena efetividade da legislação depende da superação dos desafios identificados e da contínua evolução legislativa e social.
4CEDAW, na sigla em inglês – Convention on the Elimination of all Forms of Discrimination Against Women.
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2Acadêmico de Direito. Artigo apresentado à (Faculdade de Direito de Porto Velho-Uniron) como requisito para obtenção do título de Bacharel em Direito, Porto Velho/RO, 2024.
3Professora Orientadora. Doutora em Ciência Jurídica DINTER entre FCR e UNIVALI. Mestre em Direito Ambiental pela UNIVEM/SP. Especialista em Direito Penal UNITOLEDO/SP. Especialista em Segurança Pública e Direitos Humanos pela UNIR. Especialista em Direito Militar pela Verbo Jurídico/RJ. E-mail: almeidatemis.adv@gmail.com.