JORNADA DE TRABALHO E DIREITO À DESCONEXÃO

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.12607794


Adriana da Silva Batista


RESUMO

A definição de uma jornada de trabalho permite assegurar ao trabalhador a preservação de sua saúde física, mental e emocional, na realização de suas atividades laborais. O mercado de trabalho atual, dominado pela tecnologia, exige cada vez mais profissionais diferenciados e conectados, com um fluxo de informação instantânea e rápidas soluções de problemas. Tal cenário, se não gerido adequadamente, pode ocasionar pressões nos trabalhadores para cumprimento de metas e alcance de resultados em tempo recorde, fazendo com que a jornada de trabalho e as pausas para descanso sejam desrespeitadas. Desta feita, faz-se necessário um estudo sobre a incidência do direito à desconexão sobre a jornada de trabalho, como retrato da incidência dos direitos fundamentais nas relações de trabalho, partindo-se da premissa de que todo empregado possui direitos que lhe são inerentes devendo, portanto, estar presentes em todas as suas relações sociais.

PALAVRAS-CHAVES: Jornada de Trabalho; Direitos Fundamentais; Direito à Desconexão.

ABSTRACT

The definition of a working day allows workers to be assured of preserving their physical, mental and emotional health when carrying out their work activities. The current job market, dominated by technology, increasingly demands differentiated and connected professionals, with an instant flow of information and quick problem solutions. Such a scenario, if not managed properly, can put pressure on workers to meet goals and achieve results in record time, causing the working day and rest breaks to be disrespected. Therefore, it is necessary to study the impact of the right to disconnection on the working day, as a portrait of the impact of fundamental rights in labor relations, based on the premise that every employee has inherent rights and must , therefore, be present in all your social relationships.

KEYWORDS: Working Hours; Fundamental Rights; Right to Disconnect.

INTRODUÇÃO

A definição de uma jornada de trabalho máxima, assegurada na Constituição Federal e demais legislações, busca preservar a saúde do trabalhador sob todos os seus aspectos, na medida em que este não se trata de uma mera ferramenta produtiva, mas sim de uma pessoa detentora de direitos. 

Com o avanço da tecnologia, os processos de trabalho foram facilitados, já que as informações são trocadas quase que instantaneamente, fazendo com que o cérebro humano, antes adaptado ao analógico, lide com o digital em quase todo o tempo. 

Para manter os parâmetros de qualidade e permanecer competitivas no mercado, muitas empresas exercem sobre seus trabalhadores intensa pressão para cumprimento de metas e prazos. E estes, sob o temor de não corresponder às expectativas patronais, muitas vezes, exercem sobre si mesmos uma demanda de eficiência e entrega de resultados. Isso pode implicar o descumprimento do limite de jornada de trabalho ou desrespeito às pausas e descansos.

Neste cenário, a incidência dos direitos fundamentais nas relações de trabalho ganha relevo e o direito à desconexão pode ser uma resposta ao problema.

O presente trabalho busca identificar a importância e as formas de se garantir o direito à desconexão para os trabalhadores, partindo da análise inicial da jornada de trabalho, buscando conceituá-la, bem como ressaltando a importância de sua limitação.

Tal discussão é embasada nos direitos fundamentais do trabalhador, a partir da demonstração da evolução que tais direitos sofreram ao longo dos anos e a forma como estes devem incidir nas relações trabalhistas. 

Partindo-se da premissa de que todo trabalhador possui direitos fundamentais, tanto em relação a sua condição de cidadão, como em relação a sua condição de empregado, busca-se conceituar o direito à desconexão e identificar a forma como este vem sendo reconhecido na doutrina e na jurisprudência. A análise de tal direito passa ainda pelo estudo das consequências da sua violação, demonstrando os males causados aos trabalhadores, dentre eles, o dano existencial.

Assim, a questão demanda análise cuidadosa por parte dos gestores, operadores e estudiosos do Direito, bem como da própria sociedade. 

MATERIAL E MÉTODOS 

Este estudo trata-se de uma pesquisa teórica, que tem por finalidade conhecer e aprofundar discussões. Quanto ao procedimento técnico, optou-se pela pesquisa bibliográfica e jurisprudencial, a partir do estudo da doutrina, artigos científicos e decisões dos tribunais em matéria trabalhista.

O critério de busca foi dividido nos principais temas, quais sejam: Jornada de Trabalho, Direitos Fundamentais, Direito à desconexão, dano existencial. Nesta pesquisa, a questão principal reside na importância do respeito à jornada de trabalho e suas pausas, como uma forma de garantir aos trabalhadores o direito à desconexão e, por consequência, lhes proporcionar condições dignas de trabalho, com saúde e qualidade.  Obtiveram-se os resultados a seguir.  

JORNADA DE TRABALHO – CONCEITO E ABRANGÊNCIA

Entende-se por jornada de trabalho o tempo diário em que o empregado encontra-se à disposição do empregador com o fito de lhe prestar serviços.

Para Mauricio Godinho:

Jornada de trabalho é o lapso temporal diário em que o empregado se coloca à disposição do empregador em virtude do respectivo contrato. É, desse modo, a medida principal do tempo diário de disponibilidade do obreiro em face de seu empregador como resultado do cumprimento do contrato de trabalho que os vincula.1

A doutrina traz critérios de estudo sobre esse tempo em que o trabalhador se encontra à disposição de seu empregador, na medida em que há períodos que podem não ser computados.

O critério do tempo efetivamente laborado diz respeito ao fato de que somente seria considerado tempo de trabalho aquele em que o empregado efetivamente produzisse, não sendo computado o tempo em que este estivesse ocioso ainda que nas dependências da empresa. Tal critério não é adotado pelo Brasil. Mauricio Godinho assevera que tal critério transfere para o empregado parcela do risco empresarial, posto que somente seria remunerado quando efetivamente estivesse produzindo para a empresa:

É evidente que tal critério opera uma necessária assunção pelo obreiro de parte significativa do risco empresarial, uma vez que o salário somente seria pago em direta proporção ao real trabalho prestado. Por essa razão é que semelhante critério tende a ser rejeitado pelas modernas ordens justrabalhistas.2

O critério do tempo à disposição do empregador em sentido estrito considera como tempo de trabalho aquele em que o empregado está sob a dependência jurídica do empregador, decorrente da própria subordinação contratual, considerando tempo de trabalho até mesmo aquele em que o obreiro esteja sem trabalhar/produzir, mas esteja à disposição do empregador, sendo, portanto, mais amplo que o anterior, posto que agrega ao tempo efetivamente laborado, o tempo em que o obreiro apenas esteja à disposição do empregador.

Já o critério do tempo à disposição do empregador no sentido amplo, inclui o período in itinere. Importante destacar aqui que, com a vigência da lei 13.467/2017, que produziu a reforma trabalhista, tal período deixou de ser considerado como tempo de disposição e remunerado.

O próprio artigo 4º da CLT informa que considera-se de efetivo serviço aquele em que o empregado esteja à disposição do empregador aguardando ou executando ordens, razão pela qual foi adotado no Brasil o critério do tempo à disposição do trabalhador e não o do efetivamente laborado.

Neste sentido, Amauri Mascaro:

Como o art. 4º da CLT considera de serviço efetivo “o período em que o empregado esteja à disposição do empregador, aguardando ou executando ordens”, não há dúvida de que a lei brasileira afasta o critério do tempo efetivamente trabalhado, para adotar o critério do tempo à disposição do empregador.3

Assim, podemos concluir que a jornada diz respeito somente ao lapso temporal em que o trabalhador esteve à disposição do empregador para prestação dos serviços, nela não sendo computados os intervalos não remunerados como, por exemplo, o intervalo intrajornada.

Nestes termos, pondera Sérgio Pinto Martins: “A jornada de trabalho compreende o número de horas diárias de trabalho que o trabalhador presta à empresa”.4

Importante frisar que é comum, no dia a dia, a confusão de conceito entre os termos duração do trabalho, jornada de trabalho e horário de trabalho, sendo relevante fazer uma distinção.

O termo duração do trabalho é a expressão mais ampla entre as três, posto que abrange o tempo de labor ou disponibilidade do obreiro tomando como parâmetros o dia, a semana, o mês e até mesmo o ano. 

Neste sentido, Bezerra Leite:

Duração do trabalho é expressão que tem sentido amplo, compreendendo, em geral, todo o período correspondente ao contrato, inclusive os períodos relativos a repouso semanal remunerado e férias anuais remuneradas, sem fazer distinção quanto ao tempo em que o empregado esteja efetivamente à disposição do empregador.5

Já o termo jornada de trabalho possui sentido mais restrito que o de duração do trabalho, compreendendo tanto o tempo diário em que o empregado se encontra efetivamente prestando serviços ao empregador, bem como o tempo em que se coloca a disposição, não computando neste tempo, os intervalos não remunerados, como por exemplo, o intervalo intrajornada.

Por fim, o termo horário de trabalho traz rigorosamente o tempo compreendido entre o início e o fim da jornada laboral, expressando a hora de início do labor e o seu término, computando, portanto, até mesmo os intervalos intrajornada.

Marcelo Moura exemplifica de maneira didática tal distinção entre o horário de trabalho e a jornada de trabalho:

O Horário de Trabalho, que deve ser exposto no estabelecimento empresarial, de forma visível, delimita o início e o fim de um dia de trabalho. Assim, o horário de trabalho de um empregado, por exemplo, se inicia às 9:00 h e termina às 18:00 h, mas sua jornada de trabalho, considerando-se uma hora de intervalo, é de 8 horas, já que o intervalo não é computado na jornada, salvo para fins de acidente do trabalho (art. 21, IV, § 1o, da Lei n. 8.213/1991). Horário, portanto, é representado pelo início e fim de um dia de trabalho, enquanto a jornada é o tempo efetivamente gasto pelo empregado em prol de seu empregador, aguardando ou executando ordens.6

Superada a definição do conceito de jornada de trabalho, bem como sua distinção em relação aos termos duração e horário de trabalho, importante se debruçar sobre o estudo de sua limitação, trazendo os fundamentos que justificam a sua necessidade.

A IMPORTÂNCIA DA LIMITAÇÃO DE JORNADA

No início do sistema de produção capitalista, as jornadas de trabalho eram exaustivas, chegando muitas vezes a dezesseis horas diárias. Com a organização da classe trabalhadora, e após muita luta, o Estado cedeu às pressões da sociedade na busca por melhores condições laborais, criando, assim, normas de limitação de jornada de trabalho.

A jornada de mulheres e menores foi inicialmente limitada em leis da Inglaterra, França, Itália e Alemanha. O controle da jornada diária de 8 horas ganhou repercussão universal com o Tratado de Versailles em 1919. Aqui no Brasil, o Decreto n. 21.186/32 fixou este limite de 8 horas diárias. A primeira constituição a trazer tal limitação foi a de 1934, sendo mantida tal disposição nas seguintes. Por fim, a Constituição de 1988 reduziu a jornada semanal para 44 horas.

Tal limitação anda alinhada com os princípios norteadores do Direito do Trabalho, especificamente os princípios da proteção e da dignidade da pessoa humana.

As grandes mudanças pelas quais o mercado de trabalho atual vem passando, em especial, com o avanço das tecnologias, causam impacto nas relações de trabalho e na forma como os trabalhadores são demandados e se percebem no contexto empresarial. 

Muitas empresas acabam por repassar a seus empregados as exigências desse mercado competitivo, extrapolando os limites de cumprimento de metas e prazos (cada vez mais exíguos) e entrega de soluções. Os próprios trabalhadores se esforçam para ser cada vez mais eficientes, com maiores entregas em menores prazos, e muitas vezes, alcançam tais objetivos preterindo os momentos de pausa e descanso tão necessários à recomposição de sua energia.

Neste sentido:

É irrefutável que o avanço tecnológico propicia profundas benesses para a sociedade em geral, contudo, possui um prisma não tão positivo, notadamente no que diz respeito aos operadores que materializam e efetivam essas tecnologias, isto é, ao elemento humano, a mão de obra em si, como verdadeiro fator de produção responsável por concretizar e dar vida a essas tecnologias.7

O indivíduo deve ser tido como um membro integrante da sociedade e que possui uma vida fora do ambiente laboral. Ora, o indivíduo possui uma família, é integrante de uma comunidade e precisa dispor de tempo para dedicar-se a esta sua dimensão social. O indivíduo precisa dispor de um tempo para dedicar-se às escolhas que fizer. Desta feita, fundamental se faz a limitação da jornada laboral, para que possa ser permitido ao indivíduo desfrutar de uma existência plena.

Da mesma forma, o respeito aos intervalos intra e interjornada para recuperação das energias são fundamentais. Ricardo Rezende os define como pequenos intervalos de tempo que objetivam recuperar as energias do trabalhador, para manter sua higidez física e mental e, por consequência, evitar que sofram com doenças ocupacionais e a ocorrência de acidentes de trabalho.8

Neste sentido, Amauri Mascaro, que eleva o direito ao descanso a condição de direito fundamental do trabalhador:

Outro direito fundamental do trabalhador é o direito ao descanso. O tempo livre permite ao homem o desenvolvimento integral da sua personalidade quando se dedica a outras atividades diferentes do trabalho profissional e que lhe facilitem o convívio familiar, com amigos, horas de entretenimento, estudos, convivência religiosa, prática desportiva, leitura de jornais e revistas, passeios, férias e tudo o que possa contribuir para a melhoria de sua condição social.9

Vólia Bomfim também traz à baila os fundamentos de tal limitação da jornada sob aspectos de ordem biológica, social e econômica:

As regras de medicina e segurança do trabalho envolvem os períodos de trabalho, os de descanso e as condições de trabalho. São normas imperativas que estabelecem direitos de ordem pública, impedindo as partes de renunciar, transacionar ou dispor de qualquer benesse que a lei tenha concedido ao empregado. A limitação do tempo de duração do trabalho tem como fundamento três aspectos importantes: biológicos, sociais e econômicos,

a)biológicos:

O excesso de trabalho traz fadiga, estresse, cansaço ao trabalhador, atingindo sua saúde física e mental. Portanto, os fatores biológicos são extremamente importantes para limitar a quantidade de trabalho diário. b)sociais:

O trabalhador que executa seus serviços em extensas jornadas tem pouco tempo para a família e amigos, o que segrega os laços íntimos com os mais próximos e exclui socialmente o trabalhador.

c)econômicos:

Um trabalhador cansado, estressado e sem diversões produz pouco e, portanto, não tem vantagens econômicas para o patrão.10

Na mesma linha, segue o ilustre mestre Marcelo Moura:

O direito do trabalho reconhece a necessidade de se estabelecerem limites à duração do trabalho, e a jornada de trabalho se insere neste contexto. São diversos os fundamentos para limitação do dia de trabalho: de ordem biológica, ao permitir a recuperação do organismo, evitando a fadiga e o estresse, sendo fator de prevenção contra doenças relacionadas ao dia a dia do trabalho; de ordem social, ao possibilitar o convívio mais intenso do empregado com sua família e demais pessoas do seu círculo social; de ordem econômica, por gerar empregos, mesmo que de caráter temporário, diante da necessidade de substituição daquele que goza férias, além do aumento de produtividade pelo empregado descansado.11

Assim, as jornadas excessivas, do ponto de vista biológico causam maiores chances de incidência de doenças ocupacionais. Além disso, em virtude da fadiga e cansaço aumentam as chances de acidentes de trabalho. Do ponto de vista social, afasta o trabalhador de seu convívio social, prejudicando sua relação com a família e amigos, trazendo segregação social. Por fim, do ponto de vista econômico, todo esse desgaste físico e emocional oriundo da jornada excessiva reduz a produtividade do empregado, trazendo, por conseguinte, minimização de lucros.

Por todo o exposto, é de fundamental importância a limitação de jornada não somente para o bem do trabalhador, como também para a própria subsistência da atividade empresarial produtiva.

OS DIREITOS FUNDAMENTAIS E AS RELAÇÕES DE TRABALHO – EVOLUÇÃO E CARACTERÍSTICAS

O tema dos Direitos e garantias fundamentais é tratado em nossa Carta Maior no Título II. Tais direitos surgiram como uma forma de proteger a sociedade do poder estatal. 

Neste sentido, Alexandre de Moraes, assim dispõe:

[…] surgiram como produto da fusão de várias fontes, desde tradições arraigadas nas diversas civilizações, até a conjugação dos pensamentos filosóficos-jurídicos, das ideias surgidas com o cristianismo e com o direito natural.12

Tal proteção se faz necessária em diversas dimensões, de forma que o indivíduo seja resguardado em todas as áreas de sua vida. Nestes termos, tomamos as palavras dos ilustres professores Luiz Alberto e Vidal Serrano em sua obra de Direito Constitucional:

Os direitos fundamentais podem ser conceituados como a categoria jurídica instituída com a finalidade de proteger a dignidade humana em todas as dimensões. Por isso, tal qual o ser humano, tem natureza polifacética, buscando resguardar o homem na sua liberdade (direitos individuais), nas suas necessidades (direitos sociais, econômicos e culturais) e na sua preservação (direitos relacionados à fraternidade e à solidariedade)13

Importante destacar que os direitos fundamentais não nasceram prontos e acabados e sim foram sofrendo uma evolução constante até atingirem o patamar dos dias atuais. São, portanto, direitos que estão constantemente se transformando em busca de se amoldar ao modelo de sociedade que lhes é contemporâneo.

Não é fácil definir precisamente o que vêm a ser direitos fundamentais. Trata-se de direitos que estão em constantes transformações, pois acompanham a evolução da sociedade e variam de acordo com o avanço das ideias políticas, democráticas, religiosas, econômicas e sociais de cada povo, ou, em outras palavras, variam no tempo e no espaço, segundo o ideário de cada povo e de cada época.14

A doutrina, diante desta evolução, costuma dividir os direitos fundamentais em gerações/dimensões. Partindo-se dos ideais da Revolução Francesa, quais sejam, liberdade, igualdade e fraternidade, estes direitos foram, num primeiro momento, classificados em direitos de 1ª, 2ª e 3ª geração, respectivamente. Com o tempo e a evolução da doutrina, outras dimensões foram consideradas (4ª e 5ª gerações).

Os direitos de 1ª geração retratam a passagem de um Estado autoritário para um Estado de Direito, dizendo respeito às liberdades públicas e aos direitos políticos, traduzindo o direito à liberdade, implicando em uma atitude negativa do Estado, de abstenção, em respeito à subjetividade do cidadão. 

Paulo Bonavides assim trata sobre o tema:

Os direitos da primeira geração são os direitos da liberdade, os primeiros a constarem do instrumento normativo constitucional, a saber, os direitos civis e políticos, que em grande parte correspondem, por um prisma histórico, àquela fase inaugural do constitucionalismo do Ocidente.

[…]

Os direitos de primeira geração ou os direitos de liberdade têm por titular o indivíduo, são oponíveis ao Estado, traduzem-se como faculdades ou atributos da pessoa que ostentam uma subjetividade que é seu traço mais característico; enfim, são direitos de resistência ou de oposição perante o Estado.15

Os direitos de 2ª geração trazem consigo a ideia de igualdade. Surgiram no momento histórico da Revolução Industrial Europeia, como uma resposta de combate às péssimas condições de trabalho. Estamos diante dos direitos sociais. Aqui, em contraposição aos direitos de 1ª geração, onde se tem uma dimensão negativa do Estado, se prima por uma dimensão positiva do Estado de forma que este tome medidas com foco no bem-estar social.

Alexandre de Morais os identifica como uma forma do Estado minimizar/neutralizar as disparidades sociais advindas das condições econômicas:

Sua consagração marca a superação de uma perspectiva estritamente liberal, em que passa a considera o homem para além de sua condição individual. Com eles surgem para o Estado certos deveres de prestações positivas, visando à melhoria das condições de vida e à promoção da igualdade material. A intervenção estatal destina-se a neutralizar as distorções econômicas geradas na sociedade, assegurando direitos afetos à segurança social, ao trabalho, ao salário digno, à liberdade sindical, à participação no lucro das empresas, à educação, ao acesso à cultura, dentre outros.16

Os direitos de 3ª geração traduzem o ideal de fraternidade, com o surgimento de preocupações mundiais tais como a preservação ambiental, bem como a proteção dada aos consumidores diante de sua hipossuficiência. O ser humano passa a ser considerado como membro de uma coletividade, sendo preponderante a questão da solidariedade.

Paulo Bonavides dispõe em sua obra os define como aqueles que têm como destinatários o próprio gênero humano:

Dotados de altíssimo teor de humanismo e universalidade, os direitos da terceira geração tendem a cristalizar-se neste fim de século enquanto direitos que não se destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo, ou de um determinado Estado. Têm primeiro por destinatário o gênero humano mesmo, num momento expressivo de sua afirmação como valor supremo em termos de existencialidade concreta. Os publicistas e juristas já o enumeram com familiaridade, assinalando-lhe o caráter fascinante de coroamento de uma evolução de trezentos anos na esteira da concretização dos direitos fundamentais. Emergiram eles da reflexão sobre temas referentes ao desenvolvimento, à paz, ao meio ambiente, à comunicação e ao patrimônio comum da humanidade.17

A doutrina ainda trata da 4ª geração, correspondente a uma globalização dos direitos fundamentais de forma a universalizá-los. Neste sentido, novamente o conceito trazido pelo Mestre Paulo Bonavides:

São direitos de quarta geração o direito à democracia, o direito à informação e o direito ao pluralismo. Deles depende a concretização da sociedade aberta para o futuro, em sua dimensão de máxima universalidade, para a qual parece o mundo inclinar-se no plano de todas as relações de convivência.18

Por fim, a 5ª geração traduz a ideia do direito à paz, sendo esta a classificação operada por Paulo Bonavides ao passo que Karel Vasak em sua teoria o identifica como um direito pertencente à 3ª geração.

Em que pese toda esta evolução e os diversos enfoques dados a cada dimensão de direitos humanos, o que se pode entender como sua função é que buscam resguardar o indivíduo desde uma concepção individual até uma concepção universal, de forma que toda a sociedade seja resguardada por estes direitos fundamentais, cuja supressão implicaria grave prejuízo.

Assim, os direitos fundamentais não atuam somente na questão da limitação dos poderes abusivos do Estado, mas também como uma forma de impor ao Estado a tomada de medidas que melhorem as condições sociais dos cidadãos.

A doutrina ainda costuma traçar características para os direitos fundamentais de forma a facilitar a compreensão de sua importância, eficácia e aplicabilidade. Assim, temos como características a historicidade, posto que nasceram com o Cristianismo, passando por diversas revoluções até chegar ao patamar dos dias atuais; a universalidade, posto que atendem à toda a sociedade, de modo indiscriminado; a limitabilidade, posto que não são absolutos, já que diante de confrontos há de se utilizar da ponderação de interesses; a concorrência, pois podem ser exercidos cumulativamente e, por fim, a irrenunciabilidade, posto que são irrenunciáveis, de forma que pode haver o seu não exercício, mas jamais a renúncia a um direito fundamental.

A EFICÁCIA HORIZONTAL DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NAS RELAÇÕES DE TRABALHO

Os direitos fundamentais são vistos como limites ao exercício do poder estatal, tendo aplicações, portanto, nas relações públicas, em que há, num dos pólos, a figura do Poder Público. 

Ocorre que a desigualdade não ocorre única e tão somente quando se está diante de uma relação entre particular e o Poder Público. Esta desigualdade também pode ser verificada em algumas relações entre particulares, nem sempre estando os contratantes em “pé de igualdade”.

No Direito do Trabalho, não poderia ser diferente. O empregado é parte hipossuficiente em uma relação laboral e, sendo o ordenamento jurídico brasileiro, voltado para esta questão de necessidade de proteção do obreiro, o tema não poderia deixar de ser tratado e apreciado no âmbito da justiça laboral. 

Diante destas disparidades, que podem ocorrer também em conflitos privados, surgiu a dúvida se os direitos fundamentais também teriam aplicação nas relações privadas. Assim, surgiram teorias que buscavam verificar a possibilidade ou não de sua incidência e a forma como esta se daria.

A teoria da negação da eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas assevera que estes impõem limitações apenas aos Poderes Públicos, não se aplicando de particular para particular, conforme depreende-se da leitura de trecho do artigo do professor Daniel Sarmento:

No cenário norte-americano tem prevalecido a visão de que, em regra geral, os direitos fundamentais positivados na Constituição não se estendem às relações privadas. É praticamente um axioma do Direito Constitucional norteamericano, quase universalmente aceito tanto pela doutrina como pela jurisprudência, previstos no Bill of Rights da Constituição daquele país, impõem limitações apenas para os Poderes Públicos e não atribuem aos particulares direitos frente a outros particulares com exceção apenas da 13ª Emenda, que proibiu a escravidão. Trata-se da chamada teoria da state action.19

A teoria da eficácia indireta e mediata é dominante no direito germânico e é intermediária entre a que nega a vinculação dos particulares e a que preza pela sua incidência direta:

A teoria da eficácia mediata nega a possibilidade de aplicação direta dos direitos fundamentais nas relações privadas porque, segundo seus adeptos, esta incidência acabaria exterminando a autonomia da vontade, e desfigurando o Direito Privado, ao convertê-lo numa mera concretização do Direito Constitucional.20

De outra banda, a teoria da eficácia direta e imediata, amplamente dominante no cenário brasileiro, prima pela incidência dos direitos fundamentais nas relações entre particulares independentemente da respectiva previsão legal. Novamente as palavras de Pedro Lenza nos esclarecem: “(…) alguns direitos fundamentais podem ser aplicados às relações privadas sem que haja a necessidade de “intermediação legislativa” para a sua concretização”.21

Importante neste ponto transcrever a ressalva feita por Daniel Sarmento em seu artigo sobre a situação do papel do legislador e do Judiciário diante desta teoria:

Tampouco se pode acusar a doutrina da eficácia imediata dos direitos fundamentais nas relações privadas de incompatível com o princípio democrático, por atribuir poder em demasia ao Judiciário, em detrimento do legislador. (…) Ademais, a maior parte dos adeptos desta teoria reconhece que, diante da existência de lei disciplinando a questão subjacente ao conflito privado, deve o Judiciário aplicar a norma vigente – e não dar ao caso a resposta que pareça mais justa a cada magistrado – , podendo afastar-se da solução preconizada pelo legislador tão somente quando concluir que esta se afigura incompatível com a Constituição.22

O supracitado autor ainda alerta para que, ao serem aplicados diretamente  direitos fundamentais às relações de trabalho, devem ser formulados parâmetros, evitando assim extremismos tanto ao negar sua incidência, com base na subordinação jurídica,  quanto primando pela total desconsideração das cláusulas contratuais, com base na autonomia privada. 

Neste ponto, devem ser evitadas duas posições extremas: a que ignora a participação da vontade do empregado na celebração do contrato de trabalho, assumindo posição excessivamente paternalista; e a que, em nome da sua autonomia contratual, se revela insensível diante da opressão privada, que pode ocorrer sob a fachada da autonomia contratual, sobretudo no contexto de relações assimétricas, como aquelas travadas entre patrão e empregado.23

Neste sentido, em uma relação laboral haverá incidência dos direitos fundamentais, sejam os de caráter geral, ou seja, aqueles dirigidos a todo cidadão (já que o trabalhador antes de ser parte numa relação de emprego é um cidadão, cuja dignidade também deve ser sempre respeitada), tais como o direito de não ser submetido a tratamento desumano ou degradante, direito à saúde, à educação, à alimentação, ao lazer, entre outros previstos constitucionalmente, bem como os específicos a sua condição de empregado, tais como salário digno e justo, férias remuneradas, jornadas limitadas, repouso semanal remunerado, higiene e segurança no trabalho.

Tal ocorre porque é impossível haver prestação de trabalho sem envolvimento e comprometimento da pessoa do trabalhador. Assim, ao ingressar numa relação de trabalho, além de trazer consigo todos os direitos fundamentais inerentes a sua condição de pessoa, agrega os que a lei lhe garante como trabalhador, o que vai repercutir não só na execução do próprio contrato, mas até mesmo na organização empresarial.24

Partindo-se da premissa de que os direitos fundamentais do trabalhador devem estar presentes na relação de emprego e considerando-se a situação peculiar dos empregados detentores de cargos de confiança, é necessário trazer à baila o direito à desconexão. 

Tal direito permite ao trabalhador o direito ao não trabalho, permitindo usufruir de sua vida de forma plena e não somente como uma mera “peça produtiva”. Sendo os empregados detentores de cargos de confiança excluídos do capítulo pertinente ao controle de jornada, não há como não se pensar sobre sua situação específica em relação a este direito, razão pela qual é crucial analisá-lo e buscar formas de associálo a tais empregados.

O DIREITO À DESCONEXÃO

A partir da consciência da eficácia horizontal dos direitos fundamentais nas relações laborais é que ganhou relevo a discussão sobre o direito à desconexão. Partindo-se da premissa de que o trabalhador precisa ter sua dignidade como pessoa humana respeitada e que seus direitos fundamentais não podem ser colocados à parte dentro de um contrato de trabalho, é que se levanta a bandeira de tal direito.

O direito à desconexão pode ser definido de forma bem sucinta como o direito ao não trabalho. Ressalte-se que esse direito ao “não trabalho” não se trata de uma ociosidade completa, mas sim de que os empregados tenham exatamente certos limites na “quantidade de tempo” que disponibilizam para o trabalho, de forma que este não interfira/adentre na vida privada do trabalhador.

Neste sentido, Marcia Vieira Mafra:

Assim, nesta ordem de ideias, a desconexão ao trabalho consiste no direito a labutar menos, a manter equilíbrio entre a vida profissional e, a pessoal, protegendo a saúde e a vida privada do trabalhador. Referido direito não está estimulando o ócio, a total ausência de trabalho, mas apenas, a redução da carga de labor a níveis aceitáveis sob o prisma social e individual. Também não se trata de levantar bandeira reacionária às alterações no mundo do trabalho levadas a efeito pelas conquistas tecnológicas.25

Souto Maior, ao tratar do tema, assim expõe:

Esclareça-se que o não-trabalho aqui referido não é visto no sentido de não trabalhar completamente e sim no sentido de trabalhar menos, até o nível necessário à preservação da vida privada e da saúde, considerando-se essencial esta preocupação (de se desligar, concretamente, do trabalho) exatamente por conta das características deste mundo do trabalho marcado pela evolução da tecnologia, pela deificação do Mercado e pelo atendimento, em primeiro plano, das exigências do consumo..26

Destarte, o direito à desconexão pode ser definido como o direito do trabalhador de, fora do seu horário de trabalho, poder utilizar o seu tempo livre da forma que lhe convier, com a garantia de que não sofrerá interrupções nestes períodos de descanso em virtude de demandas de trabalho, podendo, assim, dedicar-se as demais áreas de sua vida de forma plena. 

Tal direito está intimamente ligado ao princípio da proteção que, como é sabido, busca assegurar o equilíbrio na relação laboral, ou pelo menos, diminuir a distância que existe entre o trabalhador e o detentor do capital. Ora, sendo o empregado parte hipossuficiente numa relação laboral, este estaria sujeito a todo tipo de arbitrariedade por parte do empregador caso não estivesse amparado pelo princípio da proteção. 

O direito à desconexão busca justamente proteger o empregado destes possíveis abusos que podem ocorrer por parte do empregador no tocante à duração da jornada de trabalho, buscando evitar que os empregados sejam acionados durante seus períodos de descanso. 

Tal direito busca, por exemplo, evitar que o trabalhador seja acionado durante seu intervalo intrajornada, interjornada e até mesmo nas férias, posto que, a partir do momento em que um obreiro recebe algum tipo de ligação, mensagem ou e-mail de seu chefe durante suas férias, por exemplo, já teve violado seu direito de desconectarse de seu trabalho. 

É crucial reiterar que ao levantar-se a bandeira do direito à desconexão não se está primando por uma ociosidade plena, mas sim, pela imposição de limites à ligação/conexão do empregado ao seu trabalho, como forma de manter a sua dignidade, não permitindo que o mundo do trabalho passe a integrar até mesmo sua vida privada. 

Nestes termos, Vólia Bomfim Cassar:

O trabalhador tem direito à “desconexão”, isto é, a se afastar totalmente do ambiente de trabalho, preservando seus momentos de relaxamento, de lazer, seu ambiente domiciliar contra as novas técnicas invasivas que penetram na vida íntima do empregado.27

É sabido que os avanços tecnológicos propiciaram ao homem diversas facilidades nos meios de produção. Porém tais tecnologias, ao mesmo tempo em que facilitaram a forma de se trabalhar, também acabaram por estreitar o liame que separa o trabalho, da vida pessoal do trabalhador. O uso de smartphones, tablets, notebooks, bem como a utilização de aplicativos de conversas, tais como o WhatsApp, Messenger e hangouts permitem que o empregado acesse o seu trabalho a qualquer hora e em qualquer lugar. 

Ocorre que essa possibilidade acaba por escravizar o trabalhador, que permanece 24 horas conectado ao seu trabalho, atingindo o tempo em que teria livre para suas atividades pessoais, de lazer e com a família, por exemplo. É possível trabalhar à noite, fins de semana e até mesmo nas férias. Assim, o empregado que tem direito aos seus intervalos de descanso pode facilmente se ativar no trabalho, operando uma “quebra” na sua desconexão do trabalho.

Nesta esteira, pode-se dizer que a tecnologia, ao passo que facilitou a vida do homem em diversos aspectos também acabou por escravizá-lo, numa verdadeira escravidão moderna, a tecnológica, conforme destacado por Salomão Resedá:

O fantástico mundo da tecnologia passa a transformar-se no vilão do próprio homem. A tão perseguida ideia de desenvolver as atividades em seu próprio domicílio pode vir a imprimir ao trabalhador maior dedicação da sua capacidade intelectual ao âmbito profissional por muito mais tempo do que quando laborava no interior da própria empresa. A facilidade de comunicação e de localização poderá fazer ressurgir uma nova ideia de escravidão: a tecnológica.28

Todo esse avanço da tecnologia sobre os meios de produção e o mundo trabalho também acaba por trazer à baila uma gama de contradições que são muito bem destacadas por Souto Maior:

A primeira contradição está, exatamente, na preocupação com o não-trabalho em um mundo que tem como traço marcante a inquietação com o desemprego.

A segunda, diz respeito ao fato de que, como se tem dito por aí à boca pequena, é o avanço tecnológico que está roubando o trabalho do homem, mas, por outro lado, como se verá, é a tecnologia que tem escravizado o homem ao trabalho.

Em terceiro plano, em termos das contradições, releva notar que se a tecnologia proporciona ao homem uma possibilidade quase infinita de se informar e de estar atualizado com seu tempo, de outro lado, é esta mesma tecnologia que, também, escraviza o homem aos meios de informação, vez que o prazer da informação transforma-se em uma necessidade de se manter informado, para não perder espaço no mercado de trabalho.

E, por fim, ainda no que tange às contradições que o tema sugere, importante recordar que o trabalho, no prisma da filosofa moderna, e conforme reconhecem vários ordenamentos jurídicos, dignifica o homem, mas sob outro ângulo, é o trabalho que retira esta dignidade do homem, impondo-lhe limites enquanto pessoa na medida em que avança sobre a sua intimidade e a sua vida privada.29 

Assim, tem-se um quadro em que a sociedade possui preocupação elevada com a questão do desemprego, numa busca incessante por formas de geração de empregos, mas que simultaneamente busca pela efetividade de um direito ao não trabalho. Da mesma forma, ao passo que a tecnologia supre postos de trabalho, também escraviza os trabalhadores que dela se utilizam. Todo esse panorama força o empregado a se manter numa constante busca por informação e atualização para não ser preterido. E, por fim, ao “facilitar” a forma de se trabalhar, as tecnologias acabam por estreitar cada vez mais o liame entre a vida privada e a vida profissional do empregado.

De fato, um empregado diante deste quadro atual, ao receber demandas de seu chefe durante seus períodos de descanso, provavelmente terá receio em não atendê-las, sob a ameaça de que tal atitude possa vir a manchar a sua imagem perante seu empregador. Assim, este empregado acaba optando por atender as ligações, responder aos e-mails e mensagens e entregar prazos, sob o medo de uma possível retaliação. Ainda que não haja, por parte do empregador, ameaça concreta, o empregado a sente e sofre, diante da sua dependência perante aquele. Desta feita, pode-se verificar a relevância do tema nas relações de trabalho, já que sua violação fere de morte direitos fundamentais do empregado.

O Brasil ainda não possui uma lei específica para tratar do direito à desconexão, o que se verifica é um crescente debate na doutrina e nos tribunais acerca do tema. 

Na França, porém, já existe uma lei que entrou em vigor em janeiro de 2017 sobre o tema. Esta lei veio em resposta à pressão exercida pelos sindicatos franceses, baseada no fato de que as novas tecnologias criaram uma onda de “trabalho não declarado” fora dos horários de expediente30. Assim, os empregados estão legalmente amparados para não responderem mensagens eletrônicas fora dos seus horários de expediente.

Apesar de não se tratar de um direito expresso no ordenamento jurídico, ele surge, dentro da atual conjuntura, como corolário dos direitos trabalhistas positivados.

Nestes termos:

Na hipótese de violação persistente e reiterada do direito à desconexão pelo tomador de serviços, será viável a apresentação judicial de ação munida de pedidos de indenização por danos morais e de tutela inibitória para que o empregador se abstenha de praticar a conduta em detrimento do empregado.31

Diante dessa lacuna legislativa acerca do direito à desconexão propriamente dito tem chegado ao Judiciário brasileiro demandas que o forçam a se manifestar sobre o tema. Neste sentido, é importante trazer à baila alguns julgados.

No caso abaixo, submetido ao TRT da 1ª Região, o empregado laborava em excesso de jornada e entendeu-se pela ocorrência de dano existencial, sendo reconhecido o dever de indenizar. 

REPARAÇÃO POR DANO MORAL. DANO EXISTENCIAL. Excessiva jornada de trabalho. Configura-se o dano existencial quando o empregador impõe um volume excessivo de trabalho ao empregado, impossibilitando-o de estabelecer a prática de um conjunto de atividades culturais, sociais, recreativas, esportivas, afetivas, familiares, etc., ou desenvolver seus próprios projetos de vida nos âmbito profissional, social ou pessoal. É integrado por dois elementos: projeto de vida e vida de relações. Demonstrado a extensa e exaustiva jornada de trabalho do autor, sobretudo pela natureza do trabalho desempenhado como vigilante, restou evidente a conduta irregular do empregador e a lesão de ordem moral que deve ser reparada. Recurso não provido.

(TRT-1 – RO: 01007509320175010023 RJ, Relator: MARCELO ANTERO DE CARVALHO, Data de Julgamento: 28/08/2020, Décima Turma, Data de Publicação: 17/09/2020).32

Neste outro caso concreto, o Tribunal reconheceu a violação ao direito à desconexão de trabalhador que, mesmo nas férias, precisava manter contato com a empresa:

RECURSO ORDINÁRIO DA RÉ. FÉRIAS. DIREITO À DESCONEXÃO NÃO VERIFICADO. As férias são, tipicamente, a expressão do direito à desconexão do trabalho. Há de se ter em mente que descanso é pausa no trabalho e, portanto, somente será cumprido devidamente quando haja a desvinculação plena do trabalho. Tirar férias com uma linha direta com a empresa, ainda que o aparelho não seja acionado concretamente, estando, no entanto, sob ameaça de sê-lo a qualquer instante, representa negação plena ao descanso. […]. Recurso a que se nega provimento.

(TRT-1 – RO: 01007936020175010207 RJ, Relator: MARIO SERGIO MEDEIROS PINHEIRO, Data de Julgamento: 30/07/2019, Primeira Turma, Data de Publicação: 10/09/2019).33

Pela análise dos julgados acima, se verifica que, em que pese a ausência de legislação brasileira que especificamente trate do tema, a jurisprudência reconhece a aplicação do referido direito nas relações laborais, identificando os casos em que tal direito sofre violação e reconhecendo o direito de indenizar. Trata-se de um grande avanço na proteção do trabalhador, posto que, a violação a este direito acarreta inúmeros malefícios ao empregado, dentre os quais o dano existencial, que será abordado a seguir.

DANO EXISTENCIAL: CONSEQUÊNCIA DA CONEXÃO EXCESSIVA AO TRABALHO

A inobservância do direito à desconexão gera para o empregado diversos males. O trabalhador que permanece constantemente conectado ao seu trabalho, apesar de estar fora do seu ambiente de trabalho, não consegue descansar a sua mente, permanecendo todo o tempo alerta para responder qualquer demanda que venha a surgir relacionada ao seu trabalho. Assim, este empregado não consegue desfrutar de momentos de lazer com a sua família, dedicar-se a estudos ou atividades religiosas, ou somente descansar plenamente, posto que, a qualquer momento pode ser interrompido. Ainda que tal interrupção não venha a ocorrer, a simples consciência da possibilidade de que ela possa vir a ocorrer já gera, por si só, estresse no empregado. Assim, tal violação gera no empregado males de ordem física, psíquica e até mesmo social.

Dentre estes males merece relevo a questão do dano existencial. O dano existencial surge quando o empregado tem uma conexão tão constante com o trabalho que não consegue tempo para desfrutar a sua vida de forma plena, deixando de lado sua família, lazer, estudos, etc., tendo, assim, seu projeto de vida frustrado.

O empregador ao não respeitar o direito à desconexão de seus empregados acaba por gerar tal tipo de dano, já que o trabalhador não consegue se desvencilhar de seu trabalho nas horas em que deveria estar voltado para as demais áreas de sua vida, não atingindo, assim, seu pleno desenvolvimento pessoal.

Lorena de Mello em seu artigo sobre Sustentabilidade humana relata essa necessidade do indivíduo de ter tempo para desfrutar de outras áreas de sua vida além do trabalho, como uma forma de ter respeitada a sua dignidade humana:

Assim, para considerar-se completo ele deve ter ao menos em potencial tempo para o trabalho e tempo para a desconexão do trabalho, possibilitando o convívio social extramuros da “fábrica”. Se esse tempo não lhe é concedido, ou seja, se o empregador não respeita o tempo de desconexão concedido legalmente para esse fim, por exemplo, as onze horas interjornada (art. 66 da CLT), ele viola parcela da dignidade humana do trabalhador, afetando aspectos da sua existência, ou coexistência social, daí o chamado dano existencial.34

A doutrina italiana foi a primeira a tratar do tema dano existencial que, no início dos anos 60, passou a classificar uma nova espécie de dano injusto causado à pessoa, o denominado dano à vida de relação. Para caracterização deste dano era necessária uma repercussão no patrimônio da vítima. A análise e estudo do dano à vida de relação fomentou os estudos para dar origem ao mencionado dano existencial, que é mais amplo do que aquele, posto que independe de reflexos no patrimônio da vítima, de forma que seja garantida a dignidade humana do indivíduo.

Assim, o dano existencial é uma espécie de dano imaterial que acaba por causar na vítima uma frustração de suas expectativas de vida, posto que fica impedido de desenvolver os seus projetos.

O dano existencial no Direito do Trabalho, também chamado de dano à existência do trabalhador, decorre da conduta patronal que impossibilita o empregado de se relacionar e de conviver em sociedade por meio de atividades recreativas, afetivas, espirituais, culturais, esportivas, sociais e de descanso, que lhe trarão bem-estar físico e psíquico e, por consequência, felicidade; ou que o impede de executar, de prosseguir ou mesmo de recomeçar os seus projetos de vida, que serão, por sua vez, responsáveis pelo seu crescimento ou realização profissional, social e pessoal.35

É importante destacar que o dano existencial se diferencia do dano moral na medida em que a extensão de seu efeito é ainda mais ampla, já que extrapola o íntimo do indivíduo, pois atinge o seu aspecto social, público. Este é o entendimento de Lorena de Mello:

O dano existencial distingue-se do dano moral na medida em que atinge um aspecto público do indivíduo, ou seja, sua relação com outros seres, com o mundo social, enquanto o dano moral consiste na lesão ao patrimônio imaterial interno da pessoa.36

Flaviana Rampazzo ao tratar desta temática do dano existencial também faz distinção entre o este e o dano moral, destacando que sua incidência é ainda maior:

Destarte, o dano existencial difere do dano moral, propriamente dito, porque o primeiro está caracterizado em todas as alterações nocivas na vida cotidiana da vítima em todos os seus componentes relacionais (impossibilidade de agir, interagir, executar tarefas relacionadas às suas necessidades básicas, tais como cuidar da própria higiene, da casa, dos familiares, falar, caminhar, etc.), enquanto o segundo pertence à esfera interior da pessoa.37

Em que pese sua distinção do dano moral, o dano existencial também gera o dever de indenizar, posto que causa uma lesão grave ao obreiro. Além disso, tal indenização deve ter caráter pedagógico, assim como no dano moral, de forma a evitar que situações similares continuem ocorrendo. Nestes termos:

Esse dano ao aspecto do ser afetivo, em seus projetos de vida, merece ser combatido por meio de indenizações de caráter pedagógicos, que visem à reeducação do empregador para a eliminação da prática nociva de adoção de jornada exaustiva, mas também para incentivar o respeito ao direito do trabalhador à desconexão de toda e qualquer atividade laboral nos seus intervalos interjornada, semanais e também anuais, a fim de preservar a vida em sociedade (sustentabilidade humana) e evitar um retrocesso social como retorno da mercantilização do trabalho, em que o homem era tratado como uma peça das engrenagens da fábrica.38

Da mesma forma que no dano moral, com base no artigo 1º, inciso III, e artigo 5º, V e X, da Constituição Federal, bem como no Código Civil em seus artigos 12, caput, 186 e 927, o judiciário tem aplicado a ressarcibilidade dos danos extrapatrimoniais, conforme pode ser verificado no julgado abaixo:

AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA, INTERPOSTO PELA RECLAMADA. RECURSO REGIDO PELA LEI 13.467/2017. INDENIZAÇÃO POR DANO EXISTENCIAL. JORNADA DE TRABALHO EXAUSTIVA. DANO IN RE IPSA . O Tribunal Regional, na análise dos cartões de ponto, consignou que o autor laborava em regime exaustivo de jornada, ultrapassando habitualmente o limite legal em mais de duas horas, chegando a perfazer mais de seis horas extras por dia, de segunda a domingo, usufruindo de poucas folgas, e, inclusive, com supressão do intervalo para refeição e descanso. Em razão da constatação da prática de jornada de trabalho exaustiva, a Corte a quo reconheceu a ocorrência de dano existencial. O TST entende que a jornada excessiva e exaustiva configura abuso do poder diretivo do empregador, por restringir o direito ao descanso e ao lazer, gerando consequências negativas à higiene e à saúde do trabalhador. Assim, a submissão do obreiro à jornada excessiva ocasiona dano existencial, em que a conduta da empresa limita o desfrute da vida pessoal do empregado, inibindo-o do convívio social e familiar, além de impedir o investimento de seu tempo em reciclagem profissional e em estudos. Dessa forma, a reparação do dano não depende da comprovação dos transtornos sofridos pela parte, tratando-se, em verdade, de dano moral in re ipsa – em que o dano emerge automaticamente, desde que configurada a conduta ilícita, nos termos do art. 186 do Código Civil. Ilesos os arts. 818 da CLT e 373, II, do CPC/2015. Agravo de instrumento não provido. (TST – AIRR: 6966920175050036, Relator: Delaide Alves Miranda Arantes, Data de Julgamento: 27/06/2022, 8ª Turma, Data de Publicação: 09/08/2022).39

Assim, constata-se que tal dano é demasiado prejudicial ao trabalhador, posto que frustra o seu projeto de vida. O empregado ao desconectar-se do trabalho pode dedicar seu tempo livre a atividades de lazer, descanso, religião, etc. Trata-se de um respeito a sua condição humana, a sua condição de membro integrante de uma sociedade, que não pode ser tido apenas como um ser que produz, mas sim um ser que possui, além de deveres e obrigações, direitos. 

Tais direitos são fundamentais para uma existência digna do trabalhador. Ora, todo empregado antes de tudo é uma pessoa, que não pode ser considerada apenas uma “peça produtiva”. O indivíduo não é um fim em si mesmo. O trabalhador precisa usufruir de sua existência em todas as dimensões.

Ao desconectar-se do trabalho o indivíduo pode, por exemplo, usufruir de lazer, que é um meio eficaz de combater o cansaço e a fadiga decorrentes de uma jornada excessiva e que também serve para atender determinadas necessidades do ser humano, como a necessidade de libertação, de compensação, de recreação e de dedicação social, por exemplo.

Amauri Mascaro dispõe sobre tais necessidades do ser humano e de que forma elas se justificam:

O lazer atende, como mostra José Maria Guix, de modo geral, às seguintes necessidades: a) necessidade de libertação, opondo-se à angústia e ao peso que acompanham as atividades não escolhidas livremente; b) necessidade de compensação, pois a vida atual é cheia de tensões, ruídos, agitação, impondo-se a necessidade do silêncio, da clama, do isolamento como meios destinados à contraposição das nefastas consequências da vida diária do trabalho; c) necessidade de afirmação, pois a maioria dos homens vive em estado endêmico de inferioridade, numa verdadeira humilhação acarretada pelo trabalho de oficinas, impondo-se um momento de afirmação de si mesma, de auto-organização das atividade, possível quando se dispõe de tempo livre para utilizar segundo os próprios desejos; d) necessidade de recreação como meio de restauração biopsíquica; e) necessidade de dedicação social, pois o homem não é somente trabalhador, mas tem uma dimensão social maior, é membro de uma família, habitante de um município, membro de outras comunidades de natureza religiosa, esportiva, cultural, para as quais necessita de tempo livre; f) necessidade de desenvolvimento pessoal integral e equilibrado, como uma das facetas decorrentes de sua própria condição de ser humano.40

Assim, um empregado que permanece “24 horas” conectado ao trabalho, em virtude de suas responsabilidades empresariais e da relevância do cargo que ocupa dentro de determinada empresa é prejudicado em todas estas dimensões, ou seja, em sua vida social, familiar, religiosa, etc. 

Ora, o Direito do Trabalho tem como um de seus princípios norteadores o Princípio da Proteção, por meio do qual, busca-se evitar o empregado, parte hipossuficiente da relação, seja oprimido pela força do empresariado. A título de ilustração, cite-se os empregados detentores de cargo de confiança, em que pese, possuam alguns poderes de mando diferenciados em relação aos demais empregados, não deixam de ser economicamente dependentes do emprego, razão pela qual não parece ser plausível afastá-los da mesma proteção conferida aos demais tipos de empregados. 

Souto Maior chega a dizer que tal dependência chega a ser até mesmo moral, posto que tais empregados possuem uma posição, um status, e precisam manter seu padrão de vida, estando assim, de certa forma, sempre submetidos a pressão para cumprir metas, manter produtividade da equipe, dentre outras responsabilidades. 

Para atingir e cumprir todas estas metas, tais empregados trabalham horas e horas e em qualquer lugar, não podendo se desconectar do trabalho, sob o medo de causar algum prejuízo à atividade econômica e, consequentemente, ter seu emprego ameaçado. 

Parece-me que um primeiro e importante passo a ser dado na direção da humanização das relações de trabalho dos altos empregados é reconhecer que, mesmo tendo alto padrão de conhecimento técnico e sendo portadores de uma cultura mais elevada que o padrão médio dos demais empregados, não deixam de depender economicamente do emprego (aliás, há uma dependência até moral ao emprego, dada a necessidade natural de manutenção do seu status social) e que, por conta disso, submetem-se às regras do jogo capitalista para não perderem sua inserção no mercado. Sua sujeição às condições de trabalho que lhe são impostas pela lógica da produção é inevitável.41

Como faceta do capitalismo se busca um modelo de empregado que consiga realizar inúmeras tarefas ao mesmo tempo sem perder a qualidade. Sob a ameaça de ser preterido em relação a outro funcionário, o trabalhador acaba por se submeter a todas as situações que surgem em seu ambiente laboral.

A imagem do empregado polivalente foi intencionalmente construída para aumentar a lucratividade das empresas e sujeitar aqueles que trabalham por necessidade e que, por isso, se adaptam a quaisquer circunstâncias para se manterem no mercado de trabalho.42

Neste sentido, Alice Monteiro de Barros:

Ademais, a liberdade de regular o ritmo de trabalho, poderá levar o trabalhador a não distinguir tempo de trabalho e tempo livre, transformando-o em um workaholic. Todos esses fatores geram depressão, falta de concentração, irritabilidade, insônia, que, no somatório, são altamente estressantes.43

Raciocinando o Direito do Trabalho sob um prisma humanístico e de dignidade da pessoa humana, não seria mais plausível tolerar o desrespeito à jornada de trabalho e suas pausas., fazendo-se necessária a adoção de posturas por parte da classe patronal a fim de se evitar lesões aos momentos de descanso dos trabalhadores, tais como, organização da estrutura empresarial de forma que os empregados não sejam acionados a todo e qualquer tempo para solução de problemas.

Já que a tecnologia, como já abordado neste trabalho, permitiu relevantes mudanças na forma de trabalho, por que não usá-la como meio de se evitar excesso de trabalho? As empresas podem, por exemplo, implantar programas que impeçam o acesso aos sistemas da empresa em horários específicos. Tais sistemas também podem possuir um controle de tempo em que os empregados permanecem conectados, não permitindo um tempo de acesso maior do que o da jornada contratual.

Além disso, é perfeitamente cabível a realização de um estudo sobre a quantidade de trabalho, o prazo determinado para a sua finalização e o volume de metas e resultados exigidos de tais empregados. Não devem ser exigidas destes empregados metas inalcançáveis ou que, para serem atingidas, demandem do empregado uma dedicação fora dos padrões de normalidade.

O que se verifica é que a questão é mais de consciência e reflexão. É necessária uma reflexão sobre a condição humana destes trabalhadores, até mesmo para sobrevivência da própria atividade empresarial, posto que, descansados, tais empregados poderão trabalhar com tranquilidade e segurança, atingindo seus resultados, garantindo uma maior produtividade e, consequentemente, uma maior geração de empregos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Na sociedade contemporânea, tomada pelos grandes avanços tecnológicos, tornou-se possível trabalhar a qualquer hora e em qualquer lugar. Assim, o liame que separa a vida profissional de um trabalhador de sua vida privada tornou-se muito tênue.

A proteção do trabalhador no tocante a sua jornada de trabalho, traduz-se em normas atinentes tanto à sua condição física, psíquica, quanto social. O indivíduo necessita ter uma limitação em sua jornada de trabalho para que possa ter momentos de lazer e descanso. Trabalhadores submetidos a jornadas exaustivas estão mais sujeitos a doenças e acidentes de trabalho, além de serem privados do convívio social, em especial com sua família. Além disso, possuem uma menor produtividade em virtude do cansaço físico e mental decorrente desta extensa jornada. Desta feita, tem-se uma perda não somente para o trabalhador, mas também para a atividade empresarial, bem como para a própria sociedade.

Considerando a importância destes direitos dos trabalhadores e no intuito de que não ocorram supressões e lesões é crucial a incidência dos direitos fundamentais nas relações de trabalho, de forma que o patamar mínimo de direitos do trabalhador seja respeitado. 

O direito à desconexão, também chamado de direito ao não-trabalho, é um importante instrumento para a preservação da saúde e qualidade de vida do trabalho do trabalhador. Trata-se de um direito do trabalhador de desfrutar de momentos de descanso, lazer e convívio familiar, que deve ser respeitado por todos. 

O empregado não pode ser considerado como apenas uma peça produtiva que retrata um determinado valor de produção ou lucro para a atividade empresarial. Ele deve ser tomado como pessoa, detentora de direitos que lhe garanta o seu desenvolvimento profissional e pessoal.

Pelo exposto, é necessária uma reflexão sobre o tema de forma que os trabalhadores sejam analisados sob a sua condição humana e não somente sob o prisma do cargo que ocupam, tendo, portanto, direito ao controle de jornada, por se tratar de norma atinente à própria saúde e desenvolvimento do trabalhador. 

Partindo-se dessa premissa, devem ser buscadas soluções para que tal direito à desconexão seja concretizado. É necessária uma mudança de consciência dos sujeitos da relação de trabalho de forma que sejam evitadas essas lesões nos direitos dos empregados, para que consigam atingir seu pleno desenvolvimento enquanto trabalhadores e, principalmente, enquanto pessoa humana que são.

Além disso, as técnicas modernas que acabam por facilitar uma maior incidência de exploração do empregado devem ser aplicadas para impedir tal “escravidão”, de forma que seja garantido a estes trabalhadores o direito à desconexão.


1DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 15. ed. São Paulo: Ltr, 2016, p. 953.
2DELGADO, Mauricio Godinho, op. cit., p. 960.
3NASCIMENTO, Amauri Mascaro; NASCIMENTO, Sônia Mascaro. Curso de direito do trabalho: história e teoria geral do direito do trabalho: relações individuais e coletivas do trabalho. 29. ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 795.
4MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do Trabalho. 28. ed. São Paulo, Atlas: 2012, p .520.
5LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito do Trabalho – 14 edição 2022 (Portuguese Edition) (p. 1021). Saraiva Jur. Edição do Kindle.
6MOURA, Marcelo. Curso de direito do trabalho. 2. ed. São Paulo, Saraiva: 2016, p. 457.
7NEPOMUCENO, Thiago Luann Leão. Cibertrabalho: A Era Digital e as Relações de Trabalho. Desafios Para Uma Coexistência Constitucional Harmônica. Revista de Estudos Jurídicos do Superior Tribunal de Justiça , v. 01, p. 539-563, 2020.
8RESENDE, Ricardo Direito do trabalho / Ricardo Resende. – 9. ed. – [2. Reimp.] – Rio de Janeiro: Forense, 2023. Resende, Ricardo. Direito do Trabalho (p. 436). Edição do Kindle.
9NASCIMENTO, Amauri Mascaro; NASCIMENTO, Sônia Mascaro, op. cit., p. 792.
10CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. 9. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2014, p. 654.
11MOURA, Marcelo, op. cit., p. 456.
12MORAES, Alexandre. Os 10 anos da Constituição Federal. São Paulo: Atlas, 1999, p. 178.
13ARAUJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de Direito Constitucional. 9.ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 109-110.
14ARAUJO, Wallana Dantas Oliveira de. Direitos fundamentais do trabalhador e a declaração de 1998 da OIT.  © PRIMA FACIE, v. 7, 12, p. 25-49, jan./jun. 2008.
15BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 563564.
16BARROSO, Luís Roberto. O direito constitucional e a efetividade de suas normas. 7. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 101.
17BONAVIDES, Paulo. Curso de direito constitucional. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 563569.
18Ibidem, p. 571.
19SARMENTO, Daniel; GOMES, Fabio Rodrigues. A eficácia dos direitos fundamentais nas relações entre particulares: o caso das relações de Trabalho. Revista TST, Brasília, vol. 77, n. 4, p. 60-101, out./dez. 2011.
20Ibidem.
21Ibidem, p. 1065.
22SARMENTO, Daniel; GOMES, Fabio Rodrigues, op. cit., p. 60-101.
23Ibidem.
24GEMIGNANI, Tereza Aparecida Asta; GEMIGNANI, Daniel. A eficácia dos direitos fundamentais nas relações de trabalho. Rev. Trib. Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v.50, n.80, p.21-39,  jul./dez.2009. 
25MAFFRA, Márcia Vieira. Direito à desconexão no universo do trabalho. In: GUERRA, Giovanni Antônio Diniz; VASCONCELOS, Ricardo Guerra; CHADI, Ricardo (Org.). Direito do Trabalho. Belo Horizonte: FUMARC, 2015. v. 2, p. 508.
26MAIOR, Jorge Luiz Souto. Do Direito à desconexão do trabalho. Disponível em: <https://bdjur.stj.jus.br/jspui/handle/2011/18466> Acesso em: 27 jun. 2024.
27CASSAR, Volia Bomfim, op. cit., p. 662.
28RESEDÁ, Salomão. O direito à desconexão – uma realidade no teletrabalho. Revista LTr, vol. 71, n. 7, p. 820-829, jul. 2007.
29MAIOR, Jorge Luiz Souto. Do Direito à desconexão do trabalho. Disponível em: <https://bdjur.stj.jus.br/jspui/handle/2011/18466> Acesso em: 27 jun. 2024.
30________. O direito de se desconectar do trabalho deu certo na França? Valor Econômico, São Paulo, 27 mai. 2022. Disponível em:<https://valor.globo.com/carreira/noticia/2022/05/27/o-direito-dese-desconectar-do-trabalho-deu-certo-na-franca.ghtml>. Acesso em 27 jun. 2024.
31OLIVEIRA, Christiana D’Arc Damasceno. Direito à desconexão do trabalhador: repercussões no atual contexto trabalhista. Revista LTr, São Paulo, v. 74, n. 10, p. 1180-1188, out. 2010.
32RIO DE JANEIRO. Tribunal Regional do Trabalho. Recurso Ordinário nº  01007509320175010023 RJ, Relator: MARCELO ANTERO DE CARVALHO, Data de Julgamento: 28/08/2020, Décima Turma, Data de Publicação: 17/09/2020. Disponível em: <https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/trt1/928916224>. Acesso em 27 jun. 2024.
33RIO DE JANEIRO. Tribunal Regional do Trabalho. Recurso Ordinário nº 01007936020175010207RJ, Relator: MARIO SERGIO MEDEIROS PINHEIRO, Data de Julgamento: 30/07/2019, Primeira Turma, Data de Publicação: 10/09/2019. Disponível em: <https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/trt-1/783645887>. Acesso em 27 jun. 2024.
34COLNAGO, Lorena de Mello Rezende. Dano Existencial e a jornada de trabalho. Revista Eletrônica Tribunal Regional do Paraná, v.2., n.22, p. 56, set. 2013. Disponível em <chromeextension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://www.trt9.jus.br/portal/arquivos/7078849>.  Acesso em 27 jun.2024.
35BOUCINHAS FILHO, Jorge Cavalcanti; ALVARENGA, Rúbia Zanotelli de. O Dano Existencial e o Direito do Trabalho. Revista Eletrônica Tribunal Regional do Paraná, v.2., n.22, p. 26-51, set. 2013. Disponível em: <chromeextension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://www.trt9.jus.br/portal/arquivos/7078849>.  Acesso em 27 jun.2024.
36COLNAGO, Lorena de Mello Rezende. Dano Existencial e a jornada de trabalho. Revista Eletrônica Tribunal Regional do Paraná, v.2., n.22, p. 57, set. 2013. Disponível em <chromeextension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://www.trt9.jus.br/portal/arquivos/7078849>.  Acesso em 27 jun.2024.
37SOARES, Flaviana Rampazzo. Responsabilidade Civil por Dano Existencial. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora Ltda, 2009, p. 99
38COLNAGO, Lorena de Mello Rezende. Dano Existencial e a jornada de trabalho. Revista Eletrônica Tribunal Regional do Paraná, v.2., n.22, p. 59, set. 2013. Disponível em: <chromeextension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://www.trt9.jus.br/portal/arquivos/7078849>.  Acesso em 27 jun.2024.
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