JOGOS, BRINQUEDOS E BRINCADEIRAS LEVADOS A SÉRIO: A (IMPORTÂNCIA) DAS ATIVIDADES LÚDICAS NO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM.

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ar10202410220907


Shirlene de Alencar Ferreira;
Orientador: Costa, Murilo Jardelino da.


RESUMO

Este artigo tem como objetivo apresentar um resultado de uma pesquisa teórica e bibliográfica do lúdico como meio do processo ensino-aprendizagem. Jogos, brinquedos e brincadeiras foram compreendidos como  suporte para o desenvolvimento infantil, partindo da premissa que através de sua vivência a criança dialoga com o mundo adulto, com a sua realidade, reorganiza sentimentos e comportamentos interagindo enquanto sujeito no mundo, atuante em seu ambiente sócio-cultural  e, como tal, de seu processo de aprendizagem.   Através desse artigo, tivemos a oportunidade de contextualizar o lúdico na historiografia e na pedagocia, as diferenças entre jogos e brincadeiras e a função social que esses ocupam em outras culturas. Como conclusão ampliamos o conceito de ludicidade para além da compreensão do divertimento e recreação, mas como hífem no processo de ensino-aprendizagem.

PALAVRAS- CHAVES: ensinar, brincar, aprender.

INTRODUÇÃO

Segundo o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa[1] o substantivo brincar ganha contornos de coisa sem importancia, galhofar, gracejar, aparece como sinônimos, ou seja, algo leviano, sem importância.

Interessante pensar que essas mesmas palavras foram utilizadas para compreender e interpretar o brincar  no século IV a.C. Para o filosófo grego Aristoteles o brincar é de suma importância, pois é o “repouso” da mente. Seguindo o norte de Aristóteles, São Tomás de Aquino, utiliza da mesma interpretação: jogos e brincadeiras é o intervalo no processo do aprender. Jogamos, brincamos para melhor voltarmos às atividades sérias, as nobres, ou melhor dizendo, as intelectuais. Tão sério era a questão do brincar que no Concílio de Trento, os jogos e brincadeiras foram considerados pecaminosos pela Igreja Católica, sendo proibidos na cultura popular.

No século XVII a ludicidade foi constituída como a arte. Ainda dentro do contexto da filosofia Immanuel Kant, Friedrich Schiller concebem o brincar e a ação artística como oposição ao trabalho sério, ao trabalho que produz resultados empíricos. Pilares da filosofia ocidental, e como tal, inquestionável talvez sejam por isso que o ato de brincar ainda carrega interpretações de atividades supérfluas, sem sentido, e que o intervalo seja o espaço dedicado à hora do lazer, do descanso, confortavelmente instalado fora do tempo-espaço da hora do apreender e aprender.

Não questionada, essa visão se estende até o século XX e podemos localizá-la, também, na obra do filósofo inglês Herbert Spencer. Porém o século XVIII já aponta para novos horizontes, como diz Kishimoto: “Se em tempos passados, o jogo era visto como inútil como coisa não séria, depois do romantismo, a partir do século XVIII, o jogo aparece como algo sério e destinado a educar criança”. (KISHIMOTO, 1994. P. 108)

A importância das atividades lúdicas no processo de ensino-aprendizagem precisa ser melhor repensada no cotidiano escolar, pois estabelece uma grande relação entre o aprender, no lúdico aprendemos também para a vida. Não vemos o lúdico como prática educativa nas escolas, ocupando lugares de pouca ou nenhuma importância no processo de aprendizagem.

Questionar essa premissa é tocar em um ponto nevrálgico da concepção de educação em nossa sociedade. A escola voltada para o trabalho, como aponta a nossa LDB no Artigo 1º, inviabiliza e silencia a importância do brincar no processo de ensino aprendizagem, destituindo a ação de significantes e significados não permitindo estabelecer seu valor moral, ético, social, cultural, educativo.

É certo que novas vozes emergênciam a urgência de novas posturas pedagógicas, deslocando centro de gravidades e fecundando novas possibilidades de aprender, nos provocando a aprender a aprender e aprender a ensinar através do lúdico. Na educação vozes dissonantes de Kishimoto (1994), Bichara (1994), Oliveira (1995) ecoa em artigos como de Silva (2011), Santos e Jesus (2010), Almeida (2009) Pinto e Tavares (2010) entre tantos outros, na tentativa de questionar o inquestionável, não somente questionar, mas deslocar e ampliar concepções, brincar é sério e merece ser pensado como tal.

Através de observações realizadas intra-uterina, sabe-se que o bebe já brinca, seu corpo e o corpo da mãe eis seus primeiros brinquedos. Pés, mãos, líquidos, placentas fazem parte de seu repertório de brincadeiras diário. Ao nascer e à medida que cresce, amplia sua experiência e sua percepção de mundo. “Através das brincadeiras e jogos, constrói esquemas motores, exercita-se os repetindo, integra-os a novos tipos de comportamento, avança em novas descobertas”. (FIGUEIREDO, 2009, pg.27)

O ponto de partida para a realização dessa pesquisa e, posteriormente, a escrita desse artigo é a minha prática e experiências no espaço escolar e a premissa do lúdico como proposto e prática pedagógica, não nos intervalos, mas como ações contínuas no processo do aprender, direcionaram a busca do teórico para sustentar a minha prática.

Essa pesquisa foi realizada em etapas: no primeiro momento realizamos a catalogação dos teóricos sobre o tema a ser estudado, a seguir realizamos a leitura crítica e a análise e posteriormente selecionamos os textos relevantes a cerca do tema.

Com a base teórica constituída na pesquisa bibliográfica e empírica, partimos do pressuposto que toda criança é um sujeito em sua plenitude e sendo sujeito tem espaço e existência dentro do contexto social, cultural e histórico. Dialogando com Silva (2011) compreendemos o ato de brincar como prática social, principalmente no que diz respeito à construção do conhecimento.

(H) ORA (DE) ESTUDAR, (H) ORA (DE) BRINCAR!

Aprender ou Brincar; Aprender Brincando.

Aproveitando a oportunidade para brincar com os jogos das palavras, vimos que, no empírico e no teórico brincar é coisa séria e o educador e a escola são partes constitutivas para legitimar e transformar mudanças teóricas em práticas ou ações no e para brincar. A brincadeira possibilita-nos percorrer espaços poucos explorados na prática cotidiana e por isso muito escorregadio.

As palavras em si mesmas têm muito para nos dizer, na busca da morfologia da palavra lúdico, vimos que essa vem do latim, ludus e significa brincar. Interpretarmos jogos e brincadeiras como algo sem finalidade acarretou muitas violências no (dis) trato com povos de com outras cosmogonias.

A modernidade iluminista, a razão do cientificismo ocidental, o conhecimento letrado intitulado como único e legítimo, a formação do Estado Nação europeu determinou profundamente o Ocidente e a maneira como esse interpretou outros tempos, espaços, povos, racionalidades e culturas. Sob as lentes da modernidade, leituras de mundo foram condicionadas e condicionantes ao (não) compreendermos crenças, corpos, movimentos, progresso e civilização de povos extra-ocidentais.

O que está em questão não se refere à perspectiva de conhecimentos parciais ou provisórios, mas à crítica da produção de conhecimentos nos marcos do letramento em idiomas e filosofias ocidentais. Imaginários de progresso, civilização e letramento ganharam projeção, legitimando modos de ser, pensar e trabalhar eurocentrado desestabilizando e silenciando saberes e cosmovisão de povos e culturas alheias a suas lógicas históricas.

 Sendo a escola seletiva, ela não escapa do processo de manipulação e ideologia dos grupos que exercem o poder. Ela participa, em alguma escala, na construção da memória coletiva, através do esquecimento e silêncio dos rastros, marcas, vestígios de conhecimentos e vivencias extra-escolares.

Repensarmos a escola se faz emergencial nesse século, Freire (2001) já nos direciona para caminhos múltiplos para se conhecer, não há “epistemologia” sim “epistemologias”, pois não há uma epistemologia única; há formas de conhecer.

 Se caminhos variados já nos foram sugeridos e vivenciados, como no caso de Paulo Freire, por que a escola se torna inflexível para (re) pensar o modo de ensinar e a valorização de um único conhecimento, o conteúdo didático? Qual é o papel da escola? O que é a escola nas sociedades modernas ocidentais? O próprio Freire nos responde…

A escola é isso aí: por si mesma, cria uma barreira feita por nós em nós mesmos, exatamente por que a tarefa da escola – na forma errada… com uma percepção errada – é transferir conhecimento atual para o estudante. (Freire, 2001,37)

A escola contemporânea, apoiada nos alicerces do neoliberalismo e da modernidade capitalista silencia, ignora, amorfa conhecimentos. Ao entrar na escola o ritmo interno da criança muda, pois ela não tem mais o controle de seu tempo-espaço. Agora é a escola que dita à hora: hora da atividade, hora do lanche, hora de descansar, até mesmo suas funções fisiológicas são operacionadas assumindo aspectos (pasmem!) fabril e mesmo militar.

Presas a cadeiras, corpos entre em uma constante renuncia de seus movimentos. Como se a prática educativa se realizasse somente mentalmente, no intelecto, cabendo ao corpo o receptáculo e sustentáculo do conhecimento e das idéias.

Segundo Figueiredo (2009) a escola tem como objetivo disciplinar as crianças para tornar o seu trabalho cada vez mais produtivo e lucrativo, suas vozes ecoam também na visão do educador moçambicano Miguel Lopes, para esse, como para nós:

As reformas educacionais tendem a impor currículos cada vez mais rígidos, guiadas por uma concepção cada vez mais racionalista da educação escolar. O intelecto e o seu cultivo ou, melhor, o adestramento, impõem-se sobre as outras potências de espírito, memória e vontade. Uma corrente pedagógica (…) se infiltra em nome da centralidade do intelecto. (LOPES, 2004, p.335)

Regras, apitos, aplausos, recompensas e punições são artífices de controle corporal e educacional, são ferramentas utilizadas para que acondicione crianças, através da disciplina da ordem e da subordinação.

Ocorre o cumprimento da vontade alheia, mas especificamente do professor, não praticando a compreensão do respeito individual e dos valores éticos e morais, além de amputar qualquer forma de criação, sucumbindo toda a criatividade e a vivacidade das crianças.

O espaço escolar, muitas vezes, impossibilita o corpo de ser corpo, impossibilita o sujeito de ser sujeito, a humanidade de ser humana. Os que resistem são taxados de desordeiros, bagunceiros, maus alunos e como conseqüência notas baixas, pais na escola por motivos da seguridade da ordem, repetência, evasão ou expulsão.

Não tendo conhecimento, o ser sem luz, ou, simplesmente, aluno, necessita ser iluminado, ser direcionado para fora da caverna[2], obviamente, segurando as mãos sabias dos professores, no sentido íntimo da palavra, dos “professadores” do conhecimento, da luz, da sabedoria. Para se adotar o lúdico como prática pedagógica é preciso compreendê-lo como uma necessidade humana e ampliar a interpretação para além de possibilitar jogos e brincadeiras em sala de aula.

“No que diz respeito ao processo de ensino do professor, a responsabilidade do mesmo é diagnosticar o conhecimento que o aluno já carrega para si; organizar, selecionar e aplicar o material educativo; verificar se os conceitos assimilados durante o processo de conhecimento desenvolvido entre professores e alunos aos aceitos pela disciplina; readaptar a maneira de ensinar, de acordo com cada aluno, pois cada qual absorve de sua determinada maneira o conhecimento.” (PINTO, TAVARES, 2010, p. 228)

 A ludicidade mobiliza esquemas mentais, ativando as funções psico-neurológicas e as operatórias estimulando o pensamento e o ato de criar. “O que se vê é que aluno não problematiza, não questiona, só recebe e acomoda o conhecimento passado, desvinculado da realidade em que vive. O conhecimento se dá nas relações sujeito-objeto-realidade com a mediação”. (PINTO, TAVARES, 2010, p. 228)

O aprendizado com prazer permite a internalização, reelaboração e significações de conceitos e valores para se viver em sociedade. Brincar é antes de tudo, estar na em companhia de alguém ou de algo, mesmo que seja só na imaginação. É viver e “com-viver”, em grupo, ou pegando emprestadas as palavras de Santa Marli (In. SANTOS; JESUS, 2010): “brincar é viver”. Sabemos que o ser humano é, antes de tudo, um ser social, um ser coletivo. É através e no outro que tornamos humanos, é na inter-relação humana que nos humanizamos, sem o outro nos tornamos lobos².  

“Uma aula com características lúdicas não precisa ter jogos e brinquedos. O que traz ludicidade para a sala de aula é muito mais uma “atitude” lúdica do educador e dos educandos. Assumir essa postura implica sensibilidade, envolvimento, uma mudança interna, e não apenas externa, implica não somente uma mudança cognitiva, mas, principalmente, uma mudança afetiva. A ludicidade exige uma predisposição interna, o que não se adquire apenas com a aquisição de conceitos, de conhecimentos, embora estes sejam muito importantes. Uma fundamentação teórica consiste dá o suporte necessário ao professor para o entendimento dos porquês de seu trabalho. Trata-se de ir um pouco mais longe ou, talvez, melhor dizendo, um pouco mais fundo. Trata-se de formar (e assumir) novas atitudes, daí a necessidade de que professores estejam envolvidos com o processo de formação de seus educandos. Isso não é fácil, pois, implica romper com um modelo, com um padrão já instituído, já internalizado”. (ALMEIDA, 2009, p.1)

O educador que reconhece a ludicidade como imprescindível e constituinte da humanização do ser estimula o processo pedagógico por que desloca posições: sua hierarquia assume contornos verticais, sem, contudo, ser permissivo, o aluno assume posição de sujeito no ato de participar e há a alegria na conquista. (PINTO; TAVARES. 2010 p. 232). Ainda dentro dessa perspectiva, ser lúdico ou ter uma postura lúdica não significa passar os conteúdos através de brincadeiras, mas no modo de ensinar, na seleção do conteúdo e no papel do educando, alargando as discussões de Santos e Jesus (2010) que pensam o lúdico como uma estratégia de aprendizagem.

Jogando + Brincando= Brincadeiras?

Partindo do brincar como ação de construção de conhecimentos sendo realizados no percurso da vida, identificamos a incorporação do lúdico também no universo do adulto desde tempos remotos, como nos apontam a pesquisa da Professora Drª. Maria Ângela Barbato Carneiro, intitulada “A infância e as brincadeiras nas diferentes culturas”.

Nessa pesquisa, Carneiro faz um passeio na historiografia e nas culturas para nos apresentar a mudança da percepção da infância; as brincadeiras e os brinquedos com fins mágico-religioso em diferentes culturas e como o brincar tem mudado nas sociedades modernas ocidentais.

Os gregos tiveram grandes contribuições no universo lúdico infantil. Entre eles, as crianças comumente se divertiam com brinquedos de cerâmica e com o aro, um arco que rolava pelo chão. Em 400 a. C., Hipócrates, o “Pai da Medicina”, como era conhecido, já recomendava sua prática como um excelente exercício para as pessoas de fraca constituição física. Sua popularização, entretanto, acabou ocorrendo somente no século XIX. (CARNEIRO p.2)

Sendo uma necessidade humana o lúdico provoca a integração humana com o ambiente em que vive, com a sua cultura e lhe transmite valores. Através da brincadeira a criança desenvolve conhecimentos, questiona regras, socializam e se tornam criativas. O brincar proporciona limites e equilíbrio entre o mundo real e imaginário, através dessa prática a criança contorna e delimita o seu corpo e do mundo que a cerca.

Não há como crescer na dimensão cognitiva se não houver crescimento na relação como os outros e consigo mesmo. Os valores precisam ser abordados desde a Educação Infantil no sentindo de construir na relação com o outro um modo agradável de socializar experiências,valores e atitudes essenciais,para promover uma aprendizagem de qualidade”.  (SILVA, 2011, p.4)

A manutenção de sua cultura requer dos seus sujeitos, que esses tenham condições de interferirem em sua realidade social. O espaço da sociabilidade precisa ser estimulante e desafiador. Nossa identidade, enquanto indivíduo e histórico-cultural é construído e vivido num mundo onde as relações são dadas socialmente, daí a importância de (re) pensarmos o papel do brincar no espaço escolar e o espaço escolar como provocador de um aprendizado prazeroso, haja vista que,

Para que a aprendizagem seja significativa é necessário que o indivíduo perceba a relação entre o que está aprendendo e a sua vida. Isso envolvendo seu raciocínio, análise, imaginação, relacionamento entre idéias, coisas e acontecimentos. (PINTO; TAVARES, 2010, pg.229).

O processo de aprendizagem acontece de forma ativa em cada aluno, novos conhecimentos, habilidade, valores, capacidade de compreender a realidade de forma crítica, além dos conteúdos, é o que se espera do espaço escolar. Como formadora da sociedade que a cerca, a escola, tem grandes desafios e responsabilidade em provocar mudanças de comportamentos no dia-dia que desrespeite a diversidade e a dignidade humana. As educadoras Matta, Freitas, Santos vão mais além, apontando inclusive a psique:

A aprendizagem e o desenvolvimento cognitivo podem ser compreendidos como a transformação de processos básicos, biologicamente determinados, em processos psicológicos mais complexos. Essa transformação ocorre de acordo com a interação com o meio social e do uso de ferramentas e símbolos culturalmente determinados. (MATTA; FREITAS, SANTOS, 2010, p1)

É precioso ampliar o que chamamos “aprendizagem”, a escola prioriza somente dois determinados tipos de inteligência a Linguística e a Lógica, estaremos limitando os nossos alunos a outros tipos de saberes, como nos aponta o psicólogo Howard Gardner, onde trabalha a partir de sete tipos de inteligências diferentes. Partem do mesmo pressuposto as educadoras supra-citadas.

Essa aprendizagem esta dividida em sete estilos, sendo Físico, quando o individuo usa muito a expressão corporal para se expressar; Interpessoal, quando o individuo é introspectivo; Lingüístico, quando os sujeitos se expressam melhor com as palavras; Matemático, quando predomina o pensamento/raciocínio lógico; Musical, quando as pessoas se interessam mais por sons e musicas; Visual, sujeitos que exploram mais o aspecto visual das coisas. (MATTA; FREITAS, SANTOS, 2010, p. 4)

Essas multiplicidades de inteligências precisam ser constantemente provocadas, o que requer do professor criatividade e ousadia para a abertura de diferentes formas no processo de ensino-aprendizagem. Argila, guache, cirandas, histórias, fantoches, gincanas… Várias Inteligências, vários recursos. É importante que o professor não tome esses momentos como “descanso” somente. 

Como já dito, as interpretações acerca do brincar como algo sem finalidade, de pouca importância social acarretou em tratar jogos, brinquedos e brincadeiras como um instrumento musical tocando em uníssono, harmonicamente e com o mesmo significado.

Kishimoto (1994) nos alerta sobre as diferenças de entendimento sobre o jogo. Tantas são as ações consideradas jogos que se torna muito complexo sua definição. Seus limites se tornam mais complexo quando observamos a mesma conduta, dependendo da sociedade, ora é considerada como jogo, ora é considerada como não jogo, dependendo do valor e do sentido que a cultura, da qual faz parte, lhe atribuí. Dentro dessa prerrogativa a educadora ainda nos provoca: Qual a diferença entre jogo e brinquedo? (KISHIMOTO, 1994). 

O contexto social interfere no sentido que atribuímos aos jogos. Os jogos não objetivam compreender a realidade, mas a manipula através de símbolos nas vontades cotidianas. Através dos jogos abrimos mão do controle sobre a aprendizagem (o temos?). Aquele que brinca pode sempre escolher como fazer, como fazer e se vai ou não fazer.

Brinquedo, para Kishimoto (1994), não pode ser diminuído como jogo, pois tem dimensão material, cultural e técnica. O brinquedo é um suporte de brincadeira além de representar realidades, além de ter uma relação coam a criança e uma ampliação, não há na relação com o brinquedo um sistema de regras que organizam um sistema de regras. Já o jogo não é uma ação simplória, seu sentindo depende da linguagem de cada contexto social, além de ter regras pré-estabelecidas externamente do sujeito.

Já para Vilela,

O brinquedo, dotado de natureza livre, parece incompatibilizar com a busca de resultados, pois ao desempenhar uma tarefa como, por exemplo, sequência de cores ao formar um castelo de cartas, a criança pode desempenhar o que se encontra no seu imaginário e não o que o professor deseja ou planejou. É típico de o lúdico exteriorizar por conta de uma motivação interna, diferente do trabalho pedagógico, que oferece um estímulo externo. O brinquedo torna a ser o instrumento principal da atividade.  (VILELA, 2007 p.3)

Outras áreas do conhecimento também legitimam a importância do ato do brincar, dos jogos e brincadeiras. A psicologia reconhece o brinquedo e a brincadeira como meio de desenvolvimento e construção do conhecimento na infância, além de romper com a idéia do brinquedo como algo sempre lúdico e leve, como a psicanálise que soma o desprazer como parte integrante do brinquedo, do jogo e do brincar, quando a criança apresenta, através do lúdico, processos internos e vivências dolorosas.

Nas palavras de Santos e Jesus:

As brincadeiras são formas mais originais que as crianças tem de se relacionar e de se apropriar do mundo. É brincando que ela se relaciona com as pessoas e objetos ao seu redor, aprendendo o tempo todo com as experiências que pode ter. São essas vivências, na interação com as pessoas de seu grupo social, que possibilitam a apropriação da realidade, da vida e toda a sua plenitude. (SANTOS;JESUS, 2007, p.4)

Também para Arce (2007) as brincadeiras estimulam o sensorial e por isso mesmo estimula a criatividade, desenvolve a criatividade, ao desenvolver o faz de conta, tornando complexa a relação do imaginário com a realidade, as suas falas e ações.  

Devido essas diferenças entre jogos e brincadeiras é importante que o educador, além de oferecer jogos que tenham finalidades educativas, se faz necessário que a criança também assuma papel de atuante, onde ela possa ter a liberdade de escolher o tema da brincadeira para sugerir temas a serem desenvolvidos. Através do brincar a criança é agente da construção do seu conhecimento.

Daí a importância da atividade lúdica na educação infantil, ao facilita-lá, estamos contribuindo para o desenvolvimento das crianças. De acordo com o desenvolvimento através da zona proximal, justifica a importância da atividade lúdica na Educação Infantil, e ao fazê-lo vivenciar situações que estão além do seu nível atual de comportamento diário. (SILVA, 2007, P. 6)

É vasta as pesquisas e a literatura que abordam o tema do brincar como algo além do divertimento, mas como prática de ensino, de desenvolvimento intelectual e sócio cultural, também na área da saúde onde a prática é vista como ferramenta para a recuperação saudável.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O cotidiano, a relação do aluno com o professor e com o seu grupo, eis as situações de aprendizagem. É unânime os estudos apontarem que o educando precisa ser sujeito do seu processo de aprendizagem e que esse tenha significativo dialogando com o seu contexto diário e ampliando para outros mundos, não tomando a origem do aluno como o seu horizonte. Sempre há mais para saber, tanto para o pobre como para o rico.

O aluno tem conhecimento, ele vive em uma sociedade e minimamente sabe das regras morais e éticas de sua cultura, esse deve ser o ponto de partida do professor, a escola deve ser o lugar onde se descobre e redescobre saberes, de forma prazerosa e, por que não, feliz?

A mudança de paradigmas dentro do espaço-tempo da interpretação no ato de brincar não foi suficiente para reelaborar nossas práticas de ensino é preciso que tais mudanças ocorram também dentro do espaço educacional.

Através da minha experiência profissional e com base nas pesquisas realizadas estimular o brincar possibilita a construção de uma relação afetuosa, no terreno dos sentimentos e emoções transformamos a relação do educador – educando para além das prerrogativas dos conteúdos o ato de brincar.

Constatamos que a ludicidade provoca a aprendizagem, o desenvolvimento pessoal, grupal, social, cultural, pois é um terreno fecundo para novas descobertas e novas interlocuções com valores e com o mundo. Sala de aula é lugar de brincar para aprender e apreender aprendizados internos e externos, cabendo aos educadores a tarefa de melhor elaborar  significados e significantes no processo de ensino aprendizagem.


1http://www.priberam.pt/dlpo/default.aspx?pal=BRINCAR.11/03/2013. 11h14m
2O mito da caverna, escrito pelo filósofo grego Platão e encontra-se no  livro A República. Exemplifica a escuridão e de como podemos nos libertar pela luz da verdade e do conhecimento alem de discutir a educação na formação do Estado ideal.

BIBLIOGRAFIA

– ALMEIDA, Anne Esp. – Recreação: ludicidade como instrumento pedagógico. Março, 2009.

– FIGUEIREDO, Márcio Xavier Bonorino. – A Corporeidade na escola: Brinquedos, jogos e desenhos. Pelotas, Editora Universitária, 2009.

– KISHIMOTO, Tizuko Morchida. – A Modernidade e a Infância e o brincar. Revista Perspectiva, Florianópolis – Santa Cataria, 2004.

– MATTA, Eloana C. Cucolo da; FREITAS Maria de Socorro T. de; SANTOS Roseli Matos dos. – O lúdico como facilitador do processo de ensino aprendizagem cefaprocaceres, 2010. In http://cefaprocaceres.com.br.

– NOVOA Torres, Carlos Alberto. – Dialogo com Paulo Freire. Edições Loyola.

– OLIVEIRA, Ana Maria Faraco – O Brincar e o Desenvolvimento Infantil. Revista Perspectiva, Florianópolis

– PLATÃO. A República. Tradução de Enrico Corvisieri. Fundador. VICTOR CIVITA. (1907 – 1990). Editora Nova Cultural Ltda.

– SANTOS, Élia Amaral do Carmo; JESUS, Brasiliano do Carmo – O Lúdico no Processo Ensino-Aprendizagem. Dissertação de Mestrado, 2010.

– SILVA, Valdinéia Nogueira. – A Contribuição do Brincar como recurso pedagógico na sala de alfabetização da escola Milton da Costa Ferreira. – Revista Cientifica Eletrônica de Ciências Sociais Aplicadas da Eduvale. Ano IV, Número 06, novembro de 2011.

– VILELA, Maria Cristina da Silva. – Estudos Realizados Sobre o Brincar na Educação Infantil. Revista Cientifica Eletrônica de Ciências Sociais Aplicadas da Eduvale. Ano IV, Número 06, novembro de 2011.

Sítios Consultados.

www.portalfil.ufsc.br/republica.pdf

pt.wikipedia.org/wiki/Amala_e_Kamala

http://www.pucsp.br/educacao/brinquedoteca/downloads/OMEP%20-%20Campo%20Grande.pdf