REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7948281
Eduardo Augusto Araújo1
RESUMO
A intolerância religiosa é um fenômeno crescente no Brasil, que tem afetado muitas religiões no país, inclusive o cristianismo. Esse tipo de violência se manifesta de diversas formas, desde ações como rasgar livros sagrados até agressões físicas contra praticantes dessas religiões. A intolerância religiosa viola a liberdade de culto e a liberdade de expressão, que são direitos fundamentais garantidos pela Constituição brasileira. A liberdade de expressão também tem sido ameaçada nos dias atuais, especialmente no contexto das redes sociais. A disseminação de discursos de ódio e de fake news tem gerado debates sobre os limites da liberdade de expressão e a necessidade de regulamentação da internet. No entanto, é preciso ter cuidado para não restringir a liberdade de expressão de forma desproporcional, o que poderia prejudicar a democracia e o direito à informação. Diante desse cenário, é fundamental promover o diálogo e o respeito às diferenças religiosas e culturais, além de fomentar a educação em direitos humanos e a conscientização sobre a importância da liberdade de expressão em uma sociedade democrática. A atuação do Estado e da sociedade civil, por meio de políticas públicas e campanhas de conscientização, pode contribuir para o combate à intolerância religiosa e para a proteção da liberdade de expressão.
Palavras-chave: Intolerância. Religião. Democracia.
ABSTRACT
Religious intolerance is a growing phenomenon in Brazil, which has affected many religions in the country, including Christianity. This type of violence manifests itself in different ways, from actions such as tearing up sacred books to physical aggression against practitioners of these religions. Religious intolerance violates freedom of worship and freedom of expression, which are fundamental rights guaranteed by the Brazilian Constitution. Freedom of expression has also been threatened these days, especially in the context of social media. The spread of hate speech and fake news has generated debates about the limits of freedom of expression and the need to regulate the internet. However, care must be taken not to restrict freedom of expression disproportionately, which could undermine democracy and the right to information. Given this scenario, it is essential to promote dialogue and respect for religious and cultural differences, in addition to promoting human rights education and awareness of the importance of freedom of expression in a democratic society. The role of the State and civil society, through public policies and awareness campaigns, can contribute to the fight against religious intolerance and to the protection of freedom of expression.
KEYWORDS: Intolerance. Religion. Democracy.
1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho elaborado em moldes de uma monografia enquanto gênero texto, traz como tema principal a intolerância religiosa ao cristianismo, associando-a no contexto jurídico brasileiro, considerando a liberdade religiosa no Brasil, como um país democrático e laico. Para contextualizar a temática abordada, procurou-se promover reflexões a partir perspectivas legais disponíveis no Brasil de forma a correlacionar com teorizações, considerações e pontos de vistas disponibilizado na literatura, de áreas como Sociologia, Filosofia, Teologia, Psicologia, Antropologia e dentre outros que oferece um leque teórico para compreendermos algumas questões relacionadas a religiosidade e outros conceitos relacionados.
A liberdade religiosa é um conceito que começou a se popularizar no universo jurídico a partir do ano de 1948 com a Declaração Universal dos Direitos Humanos que coloca esta liberdade como um direito que não pode ser separado da dignidade humana. Sendo assim, muitos juristas e mestres em Direito Civis colocam a liberdade religiosa como um assunto importante para discernir o quanto de democracia uma nação representa ter.
Como vivemos em um país que é democrático e laico, a liberdade religiosa é um direito que temos. Porém com o decorrer desta década a intolerância e a liberdade religiosa tem sido afetadas no Brasil de uma forma mais exposta . Sendo assim buscou-se apresentar uma visão panorâmica de questões relativas ao fenômeno religioso, pontuando sua relação com a sociedade de modo que seja possível entender sua importância por vários ângulos e pontos de vistas.
Consequentemente para realização do estudo, delimitou-se como tema a intolerância religiosa e a liberdade de expressão, com isso o trabalho concentrou em tecer reflexões sobre o conceito, apresentando relações e correlações com aspectos históricos, sociológicos, antropológicos, teológicos que tratam sobre tal assunto. O objetivo central do estudo é demonstrar como a sociedade brasileira se encaminha para intolerância religiosa e a falta de liberdade de expressão. A problemática, ou seja, o problema ou questionamento que a pesquisa buscou responder por meio de sua realização pode ser contemplada através do seguinte questionamento: Como resolver socialmente os problemas atuais em relação a intolerância e a liberdade de expressão?
2. DESENVOLVIMENTO
2.1. RELIGIÃO E LIBERDADE
Com o presente capítulo, buscou-se apresentar uma visão panorâmica de questões relativas ao fenômeno religioso, pontuando sua relação com a sociedade de modo que seja possível entender sua importância por vários ângulos e pontos de vistas. Desta forma áreas como psicologia da religião, Filosofia da religião, Antropologia Religiosa e Sociologia da Religião, vão nos ajudar a compreender melhor tais assuntos que iremos abordar consequentemente, além da própria Teologia, que é a ciência que se estuda Deus, sua natureza e atributos e das relações com homem e universo, sendo um espécie de conjunto de princípios e doutrina de uma religião.
A liberdade a religião tem como principal fator o Direito, sendo assim, de início nas páginas que se seguem, tem-se a conceitos, históricos, perspectivas de pesquisadores, teóricos, envolvendo a fé, religião, religiosidade no meio social, ou seja, com a sociedade de forma ampla e pública. Consequentemente abordando todas as áreas proveitosas para explorar o tema deste capítulo, para ter conhecimento de como a sociedade pode evoluir neste quesito com tolerância e respeito. O Brasil como um país democrático e laico deve avançar e construir solidez nesse assunto.
2.2.1. Intolerância Religiosa No Brasil
A Intolerância religiosa é um crime que se potencializou muito neste século no Brasil, principalmente de 2010 até o ano em que estamos (2022). Esse crime pode gerar ofensas e agressões, sejam elas físicas ou verbais, e perseguições a grupos religiosos, tirando totalmente a liberdade de expressão em meio a sociedade quando o tema é religião. Porém, por mais que a intolerância religiosa tenha se intensificado mais nesta última década em nosso país, não é algo novo no decorrer da história, desde a antiguidade essas perseguições a grupos religiosos existem e se fazem presentes no meio da sociedade, seja no Brasil ou em outros países (SIMÕES;SALAROLI, 2017).
Entre as principais e mais antigas manifestações da civilização que se tem registro, a religião está como uma das mais relevantes, tendo passado pelos diferentes tempos e estando bem presente no dias atuais, sendo muito importante para sociedade. O mundo religioso relaciona-se com aspectos culturais e sociológicos. Posto isso, o Direito como um estudo, deve esclarecer bem e colocar uma visão bem ampla sobre tal assunto (SIMÕES; SALAROLI, 2017).
O Estado democrático de direito é uma realidade neste século XXI no Brasil, quer dizer que nós cidadãos temos o direito a professar uma fé, religião, religiosidade e a espiritualidade de modo geral, a legislação garante para todos nós tal direito. O Estado e a religião não são unidos, porém a prática da fé e da religiosidade é garantido, uma vez que seus alicerces estão na Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Com tudo isso, é necessário entendermos em diversos âmbitos o que tem acontecido no nosso país, que a intolerância e a liberdade de expressão têm se perdido cada vez mais com discursos violentos e não respeitosos. Como dito anteriormente é importante começarmos com conceitualizações, sociedade e histórico em relação a determinado tema.
A intolerância religiosa é um conjunto de ideologias com atos de discriminar e ofender pessoas ou grupos de diferentes religiões, crenças, e até mesmo aqueles que não seguem uma religião, sendo responsável por comportamentos ofensivos e intolerantes. Ou seja, esse fator passa a ocorrer quando pessoas agem com indiferença com outros por causa da sua religião de modo que venha ferir seu direito de se expressar e viver em sociedade. Esse crime fere diretamente a dignidade humana e liberdade do indivíduo. Agredir, perseguir, humilhar, discriminar pelo outro ter uma crença diferente são acontecimentos típicos de intolerância religiosa (GUIMARÃES, 2004)
No Brasil a intolerância religiosa é crime, sendo ele inafiançável e imprescritível, e a pena de reclusão vai entre 1 a 3 anos de prisão, mais o pagamento de multa. Como dito acima, o Brasil, de acordo com a Constituição Federal Brasileira, é estado laico. O que isso quer dizer? O país não tem uma religião oficial, todas devem ser respeitadas, sendo crime a intolerância conforme a lei nº 7.716, de 5 de janeiro de 1989. Um fato importante é que todos os cidadãos podem praticar sua determinada religião, no entanto a mesma não pode estar envolvida com o Estado, considerando isto é necessário que haja uma certa separação entre as atividades do indivíduo na vida privada e pública. (Lei nº7.716, 1989).
Uma curiosidade importante, é que no Brasil se tem o “Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa”, que é comemorado todo ano 21 de janeiro, conforme a lei nº11.635/07.
2.1.2. Laicismo
O Estado laico é muito importante para a liberdade religiosa, pois se dá pela separação entre estado e igreja, ou seja, os ideais, crenças e interesses religiosos não podem interferir no Estado. Isso não quer dizer que o Estado seja contra as religiões, pelo contrário, como já dito garante a liberdade a diversas religiões estarem inseridas na sociedade (SIMÕES;SALAROLI, 2017).
O País que tem o Estado como laico, não prioriza determinada religião e assim se desfazendo das outras, independente das escolhas por crenças e religiões. , as pessoas que estão naquela sociedade são tratadas de forma igual. Devendo garantir a liberdade de escolha para cada indivíduo. Grandes exemplos de países laicos no mundo hoje são, os Estados Unidos, Brasil, Japão, Canadá e Áustria, esses citados não sofrem intervenções religiosas nas suas decisões políticas. (ATAÍDE, 2017).
Na Constituição de 1824, a liberdade religiosa era garantida de forma mais restrita que na Constituição de 1988, pois a liberdade religiosa era apenas uma liberdade individual, sem qualquer proteção por parte do Estado. A Constituição de 1891 introduziu uma garantia mais ampla da liberdade religiosa, considerando-a um direito fundamental do cidadão, mas ainda assim não havia uma proteção efetiva do Estado. A Constituição de 1934, embora não tenha mencionado explicitamente a liberdade religiosa, considerava-a um direito fundamental do cidadão. A Constituição de 1946, por sua vez, estabeleceu a liberdade religiosa como um direito fundamental do cidadão, mas também garantiu a igualdade de todas as religiões perante a lei. (ATAÍDE, 2017).
A liberdade religiosa é um direito fundamental garantido pelo Estado Brasileiro, de acordo com a Constituição Federal de 1988. Nesse sentido, entende-se que a liberdade religiosa é o direito a exercer e professar a religião que se preferir, sem que haja interferência do Estado. É um direito fundamental do ser humano, sendo uma garantia assegurada pela Constituição Federal de 1988, no artigo 5º, caput. É importante salientar que a liberdade religiosa é um direito que deve ser usufruído com responsabilidade, sem que haja ofensa a direitos fundamentais de terceiros, bem como, ao bom funcionamento da sociedade, não podendo atentar contra a ordem pública ou a moral. (Brasil, 1988).
No Artigo 5º da Constituição está exposto que é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo isso um respaldo para a liberdade de cultos em igrejas ou em outros locais para tal, garantindo também a proteção a esses locais de cultos e liturgias. (Brasil, 1988).
No entanto a Constituição Federal de 1988, no artigo 19, inciso primeiro, deixa claro que é proibido ao poder público organizar cultos religiosos ou igrejas, prestar ajuda, impedir o funcionamento, ou ter com eles qualquer vínculo, pacto, tendo como excessão se for de forma regulamentada, com colaboração de ambos, ainda assim, com interesse público e sem vedar a ampla participação. (Brasil, 1988).
Historicamente o Brasil ainda lida com várias polêmicas na questão da proibição do Estado em interferir em assuntos que envolvem a religião, tendo como exemplo a algum tempo e ainda atualmente símbolos religiosos em espaços públicos, como escolas que é bem comum, fóruns e prédios públicos. (ATAÍDE, 2017).
A liberdade religiosa é uma liberdade civil. O Estado deve proteger o direito de todos os seus cidadãos de professar a religião de sua escolha, seja qual for, e de criar e manter instituições religiosas para fins religiosos, sem intervenção estatal. Isto significa que a religião deve ser separada do Estado. Com isso é vedada a preferência por uma face religiosa, para não ter uma oficial do Estado e assim rompendo com o laicismo, que inclui o respeito a todas as religiões, e além mais o direito e liberdade de escolha para seguir determinada religião e também o direito a orientação por alguma. Algo muito importante de se dizer também, e que na Constituição brasileira não diz a respeito ao monoteísmo, sendo o Estado totalmente neutro a qualquer posição teológica e a crenças de forma individual(ATAÍDE, 2017).
Pode-se afirmar que, em face da nossa Constituição, é válido o ensinamento de Soriano de que o Estado tem o de- ver de proteger o pluralismo religioso dentro de seu território, criar as condições materiais para um bom exercício sem problemas dos atos religiosos das distintas religiões, velar pela pureza do princípio de igualdade religiosa, mas deve manter-se à margem do fato religioso, sem incorpora-lo em sua ideologia (Scherkerkewitz, 1996).
Exposto tudo isso, conclui-se que no Brasil é proibido pelo Estado a opção de escolha por qualquer religião, também a qualquer adoção a perspectiva religiosa. Não podendo estimular qualquer disputa ou qualquer ato em favor de uma religião específica, sendo assim um país com respaldo a liberdade religiosa, e de expressão.
Essa imparcialidade, como um Estado Laico, deve estar presente em todas as esferas públicas como já dito anteriormente, como na educação, conscientizando das diferenças e diversidade, levando a uma sociedade pacífica e tolerante (ATAÍDE, 2017).
2.1.3. Religião como um fenômeno
Tanto as religiões como a mitologia são como um processo de explicação, sejam elas espontâneas ou não, para os acontecimentos que são estranhos para nossos olhos, dando para nós a possibilidade de explicar como tudo funciona, seja em termos de frutos, plantas, terra, ar ou espírito. Nosso olhar é de suma importância para compreendermos o mundo, seja ele físico ou espiritual, pois essa é a maneira que temos de interpretar o mundo, ou seja, o mundo é interpretado de acordo com o olhar que temos, com a maneira que olhamos para o mundo que nos cerca. A religião e a mitologia são interpretações que residem na mente individual de cada um, porém. (TORRES, 2012).
A experiência religiosa é feita de símbolos que variam de acordo com a cultura, a história e a tradição de cada povo. Quando esta experiência é assimilada e internalizada, ocorre a conversão que se manifesta em mudança de comportamento, atitudes, valores e visão de vida. A experiência religiosa é, portanto, o resultado de uma relação sociocultural que se manifesta ao longo da história de cada povo. A experiência religiosa é uma experiência de fé, que é vivenciada como verdade. A fé é a atitude interior que se expressa na vida cotidiana e que têm como objeto a verdade religiosa. A fé religiosa é aquela que uma pessoa tem em relação a um ser transcendente, a um mundo invisível. (SILVA, 2007).
Neste ponto é interessante apontar que o mitólogo estadunidense romeno Mircea Eliade (1998) considera que a mitologia assim como a religião é um objeto de estudo por excelência ao se ter em mente que ambas para quem as práticas e as vivências são tidas como verdades. Sendo assim o mito de criação como Adão e Eva proveniente da Cultura judaico-cristã para aquele que acredita tem o mesmo valor como verdade e explicação do real que a teoria evolucionista tem para um cientista do campo da biologia ou da arqueologia.
As narrativas religiosas, em especial as bíblicas, são fundamentais para a compreensão da religiosidade humana. Elas não apenas oferecem uma visão do sagrado, mas também apresentam um caminho a ser seguido para alcançar a experiência religiosa. A religião, portanto, não pode ser compreendida apenas como um conjunto de crenças, mas também como um modo de viver que envolve a prática de certos valores e normas. (ELIADE, 1998; SILVA, 2007).
Nesta seara Freud (1998), A religião apresenta-se como um conjunto de símbolos, rituais e crenças que tem como objetivo a representação de um ser ou de uma divindade. O ser religioso é aquele que reconhece e aceita estes símbolos, rituais e crenças, e os segue de forma prática. A religião é, portanto, uma forma de ver e interpretar o mundo, e de se relacionar com ele. A religião é, portanto, uma forma de ver e interpretar o mundo, e de se relacionar com ele.
Desde a antiguidade, o homem sempre demonstrou interesse e curiosidade pelo sobrenatural. A religião surge a partir desta necessidade do ser humano de buscar explicações para o que não consegue compreender por meio da razão. A religião, portanto, é uma forma de organização social que se caracteriza pela crença em um ou mais seres sobrenaturais e pelos valores e normas que regulam a vida social. (WELLHAUSEN, 2010).
A realidade concreta vivenciada pelos seres humanos demonstra que em todas as comunidades e culturas ao longo do planeta Terra sempre houve formas de transcender essa realidade como forma concreta é possível pensar na realidade captada pelos sentidos. O fogo queima a pele humana ao se ter contato. O frio pode levar à morte. A fome como uma resposta orgânica sugere a necessidade de se alimentar. Questões assim, estão baseadas na comprovação concreta da realidade. Entretanto, os seres humanos dotados de capacidades como imaginação, memória sentimentos e emoções transcendem ao passo dele ser necessário muito mais do que alimento e abrigo (PORTELA, 2013).
Neste sentido, o fenômeno religioso tem sido visto como uma das necessidades dos seres humanos que até mesmo serve como ponto de identificação de sua caracterização como ser que se diferencia dos animais. É através da experiência religiosa que as comunidades e as pessoas individualmente buscam respostas para uma gama de questões que são preconizadas desde os tempos mais remotos nos locais mais variados e distintos, bem como nas variadas classes sociais (SILVA, 2007).
Em suas pesquisas acerca do fenômeno religioso visto pela ótica da Psicologia Junguiana, Portela (2013), pontua que a vida intelectual de Jung, foi marcada desde muito cedo por um interesse, ou mesmo um fascínio relacionado a questões sobre Deus e a experiência humana a partir da espiritualidade. A temática, portanto, assinalado um ponto de grande importância no pensamento do psicólogo que fora discípulo de Freud.
Por isso, uma significativa parte da bibliografia por ele produzida foi dedicada a estudar o campo religioso por meio de uma abordagem psicológica, o que acabou por contribuir com uma fortificação dos estudos que interagiam religião e Psicologia e culminaria na estruturação da Psicologia da Religião como campo de pesquisa (SILVA, 2007).
Um aspecto que merece destaque é o fato de que a obra de Jung destinada aos fenômenos religiosos, desde sua publicação, chamou a atenção de pesquisadores e teóricos de variados campos como a Literatura, Antropologia, a Artes e a História, bem como de variadas vertentes e abordagens da Psicologia.
Não seria preciso uma citação especificamente de nenhuma dessas obras, para que o leitor percebesse que o tema sob estudo é relevante, pois ele está presente em todas elas. Cabe aqui, portanto, o seguinte questionamento: A religião ainda é relevante para a sociedade atual? Para responder a pergunta, é preciso analisar a religião sob diversos aspectos. Em primeiro lugar, é importante ressaltar que a religião é um fenômeno universal que existe em todas as sociedades, desde a pré-história, a religião sempre foi uma questão relevante. A religião é tão relevante que na maioria das sociedades ela é uma das suas bases, pois é através dela que se estabelece a relação do homem com o mundo, inclusive com a sociedade que o cerca.
A respeito da obra de Jung, Edinger (1996) postula que o conceito de atitude religiosa, o que por sua vez não é diretamente ligado a uma base institucional, visto que a religião é um fenômeno mais amplo e complexo do que a pura dogmatização e sacralização institucional. Assim, ele assegura: “uma atitude religiosa, em termos psicológicos, tem como base uma experiência do numinosum, isto é, do si-mesmo (1995, p. 84)”.
A religiosidade é o conjunto de todos os fatores sociais, culturais, históricos, psicológicos, biológicos, éticos, morais, antropológicos e existenciais que compõem o homem religioso, sua personalidade religiosa. Sua atitude religiosa é o ato de manifestação de sua religiosidade, ou seja, é a maneira como ele estabelece sua relação com o objeto de sua religiosidade, seja ele qual for. A religião, por sua vez, é a instituição organizada, a comunidade religiosa, que busca manter, preservar e difundir a religiosidade. A religiosidade, assim como a atitude religiosa, é vivenciada de forma pessoal, subjetiva e individual, pois é uma experiência de cada um.
A religião está presente no dia a dia das pessoas e como outras organizações, ela também se relaciona com o mundo do trabalho. A religião deve ser vista como um conjunto de práticas religiosas, doutrinas, dogmas e crenças de um grupo de indivíduos, unidos por uma ideologia, que buscam cumprir um objetivo comum. A religião em si é considerada como um grupo social, uma organização que se relaciona com outras organizações, sejam elas religiosas ou não, tendo como ponto central suas crenças. A religião é uma ferramenta de interação social, de interação com o mundo do trabalho.
Também, é muito comum entre as religiões a valoração de objetos, atos e ações como sagrados, ou seja, os valoram na medida que simbolizam ou representam simbolicamente a ligação entre a humanidade e a divindade. A cruz no cristianismo, à guisa de exemplos, pode-se ser mencionada com um símbolo que representa o sacrifício expiatório de Cristo. O batismo também, versa-se como um rito que representa simbolicamente um novo nascimento. Deste modo, fica observável que a religião se manifesta individual e coletivamente por suas instituições, símbolos, ritos e valores morais e éticos, dentro de uma seleção de aspectos e fatores culturais, teológicos e sociológicos (ELIADE, 1998).
A religião, em geral, é vista como um conjunto de crenças e práticas que são definidas por um grupo social, sendo que os seus membros estão ligados por uma união, por uma comunidade que compartilha de determinadas crenças, de um modo de viver e de uma cultura comuns. Em geral, cobra dos seus membros algum tipo de obrigação e, por isso, pode ser considerada uma instituição social. A religião, além de ser uma instituição social, é também uma instituição religiosa, visto que seus membros são ligados por um conjunto de crenças, de valores e de ideias que os remete ao Sagrado.
2.1.4. Intolerância religiosa ao cristão no decorrer da história
No entanto, os cristãos também têm uma história de intolerância religiosa que se estende desde a era apostólica até a era moderna. No início da era cristã, os cristãos eram perseguidos pelo Império Romano. Eles eram vistos como uma ameaça à estabilidade do império e foram alvo de perseguições, torturas e execuções. Durante a Idade Média, a intolerância religiosa foi usada como ferramenta política (GUIMARÃES, 2004, p. 28).
Os líderes cristãos usaram a violência para impor a sua visão da fé e garantir que os seus interesses políticos fossem atendidos. Na era moderna, a intolerância religiosa foi usada como meio de controlar as populações e impor a sua visão religiosa (GUIMARÃES, 2004, p. 28).
No que diz respeito ao cristianismo, o longo histórico de intolerância ao longo dos séculos tem sido bem documentado. Durante a Idade Média, os cristãos foram vítimas de perseguições por parte das autoridades, como a Inquisição espanhola e a perseguição religiosa da Idade Moderna (GUIMARÃES, 2004, p. 28).
Na Europa, os cristãos foram encarcerados, torturados e até mesmo mortos por suas crenças. Esta intolerância também foi sentida em outras partes do mundo, como na América do Sul, onde muitos cristãos foram reprimidos e perseguidos por seus ideais. Nos dias de hoje, a intolerância religiosa se manifesta de forma diferente, mas igualmente preocupante (GUIMARÃES, 2004, p. 28).
A intolerância religiosa tem se manifestado na história do Brasil desde a Colônia, quando o catolicismo foi imposto às populações indígenas e africanas que aportaram no território como escravos. Durante a República Velha, o Estado brasileiro adotou medidas para controlar o catolicismo e aumentar o controle sobre os cultos protestantes. No século XX, a intolerância religiosa ganhou novas formas e manifestações. O Estado passou a promover a laicização do Estado e, ao mesmo tempo, a restringir a manifestação de cultos protestantes. Além disso, o Estado passou a adotar medidas para restringir a prática do culto de religiões de matriz africana e, mais recentemente, a discriminar as populações LGBT.
O preconceito, a discriminação, a intolerância e, no caso das tradições culturais e religiosas de origem africana, o racismo se caracterizam pelas formas perversas de julgamentos que estigmatizam um grupo e exaltam outro, valorizam e conferem prestígio e hegemonia a um determinado “eu” em detrimento de “outrem”, sustentados pela ignorância, pelo moralismo, pelo conservadorismo e, atualmente, pelo poder político – os quais culminam em ações prejudiciais e até certo ponto criminosas contra um grupo de pessoas com uma crença considerada não hegemônica (NOGUEIRA, 2020, p.19).
A burguesia ocidental justifica sua posição de supremacia afirmando que as diferentes culturas não são igualmente evoluídas, com o ocidente a cristalizar a evolução da cultura em suas próprias formas. Esta ideologia é particularmente perniciosa, pois marginaliza e desvaloriza culturas que não se encaixam no modelo ocidental. Por outro lado, essa ideologia também incentiva a igualdade entre os povos, pois acredita que todos podem se beneficiar do conhecimento ocidental. Dessa forma, a burguesia ocidental tem conseguido preservar sua posição de supremacia, enquanto ao mesmo tempo se esforça para garantir um nível de igualdade entre as culturas (FANON, 1968, p. 135).
O racismo religioso não é direcionado apenas para grupos religiosos, mas também para aqueles que se identificam com algum elemento da cultura afrobrasileira, como na forma mais clara do racismo, que é o racismo institucionalizado. É difícil separar o racismo religioso do racismo institucionalizado, pois ambos são expressões de um mesmo sistema de opressão. O racismo religioso é expressado em múltiplas formas, desde o preconceito em relação a certas religiões, até o estigma e a discriminação contra aqueles que pertencem a elas. O racismo religioso também pode ser visto na forma como as religiões afro-brasileiras são representadas na mídia e na forma como elas são abordadas nas escolas (NOGUEIRA, 2020, p.47).
O proselitismo ocorre quando uma religião ou culto tenta converter ou atrair pessoas para seus quadros. Essa prática é muito comum e pode acontecer de diversas formas. Na maioria dos casos, o proselitismo é feito através da pregação e da distribuição de propaganda, utilizando-se de recursos como palestras, seminários, folhetos, livros e outros. Por outro lado, o proselitismo também pode ser feito mediante ações de caráter coercitivo, como a utilização de pressão e ameaças para obrigar alguém a se converter a determinado culto ou religião (GONÇALVES, 2013, p. 96).
No entanto, esse relacionamento também trouxe alguns benefícios, como a proteção pela Igreja aos interesses do Estado, a realização de diversos projetos e a criação de organizações religiosas. Além disso, a Igreja também se beneficiou, pois, com as relações com o Estado, ganhou maior reconhecimento e legitimidade, o que lhe permitiu a expansão de seus ideais por toda a sociedade. No entanto, devido a esse relacionamento, surgiu o problema da interferência da Igreja nos assuntos do Estado, como a criação de leis e a influência nos acordos internacionais. Essa interferência gerou uma crise com relação à laicidade do Estado (GONÇALVES, 2013, p. 96).
3. CONCLUSÃO
Em suma, a intolerância religiosa é um problema grave e crescente no Brasil, que viola a liberdade de culto e a liberdade de expressão. Ainda há muitos desafios a serem enfrentados nessa questão, tanto no âmbito individual quanto no coletivo. É preciso que sejam promovidos debates e ações concretas para combater a intolerância religiosa, por meio da educação, conscientização, políticas públicas e leis mais rígidas.
A conscientização sobre o tema é um ponto crucial para a erradicação da intolerância religiosa, seja por meio de campanhas educativas, como palestras, oficinas e seminários, ou pela inclusão do tema nos currículos escolares. O conhecimento sobre a diversidade religiosa é essencial para que as pessoas possam respeitar e conviver pacificamente com as diferenças.
Ações governamentais também podem ser eficazes para combater a intolerância religiosa. A criação de políticas públicas específicas, com a finalidade de garantir a proteção aos praticantes de religiões minoritárias, é um exemplo de iniciativa que pode ser adotada. Além disso, a criação de leis mais rígidas que punam a prática de intolerância religiosa é fundamental para que os agressores sejam responsabilizados por seus atos.
A sociedade civil também tem um papel importante na luta contra a intolerância religiosa. O diálogo entre os grupos religiosos, a promoção do respeito à diversidade e a denúncia de casos de intolerância são ações que podem ser realizadas por qualquer cidadão. O papel das mídias sociais também é relevante, já que é necessário que sejam conscientes sobre o impacto de suas postagens e que denunciem casos de intolerância.
Portanto, a intolerância religiosa é um problema complexo que afeta a sociedade como um todo. É preciso que haja um esforço coletivo para combater a intolerância religiosa e garantir a proteção aos praticantes de religiões minoritárias. A educação, conscientização, políticas públicas e leis mais rígidas são ferramentas essenciais nessa luta, assim como o diálogo e o respeito mútuo entre os grupos religiosos. A liberdade de expressão é um direito fundamental, mas não deve ser utilizada para propagar discursos de ódio e violência. A conscientização sobre a importância da liberdade de expressão, aliada à responsabilidade social, é fundamental para o exercício pleno da democracia e da cidadania.
REFERÊNCIAS
ATAÍDE, Marlene Almeida de. Diversidade cultural e intolerância religiosa: Uma afronta aos direitos humanos, uma questão de educação. Momento – diálogos em educação.v.26, n.2, 2017.
Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1996.
ELIADE, Mircea. Tratado de história das religiões. 2a ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
FANON, Frantz. Os condenados da terra. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1968.
FREUD, S. O Futuro de uma Ilusão. In: STRACHEY J. Edição Standard. 1996.
GONÇALVES, Antônio Batista. Da intolerância religiosa aos direitos humanos. Ultimo andar, n 21, 2013.
GUIMARÃES, Marcelo Rezende, Um novo mundo é possível. São Leopoldo: Ed. Sinodal, 2004.
NOGUEIRA, Sidnei. Intolerância Religiosa. 2020. Disponível em: <https://files.cercomp.ufg.br/weby/up/1154/o/Intolerancia_Religiosa_Feminismos_Plur ais_Sidnei_Nogueira.pdf?1599239392 >. Acesso em: 13 mar 2023.
PORTELA, Bruno de Oliveira Silva. O conceito religião no pensamento de Carl Gustav Jung. Sacrilegens, v. 10, n. 1, p. 46-61, 2013.
SCHERKERKEWITZ, Iso Chaitz. O direito de religião no Brasil. Revista da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo, São Paulo, V. 20, n. 146, p. 55-72, 1996.
SILVA, Reginaldo de Abreu Araujo. Reflexões sobre o proceso de individuação de Jó. Último Andar, n. 16, p. 64-72, 2007.
SIMÕES, Anélia dos Santos Marvila Dos Santos Marvila; SALAROLI, Tatiane Pereira
Pereira. O Retrato Da Intolerância Religiosa No Brasil E Os Meios De Combatê-La. 2017. Disponível em: <https://revista.fuv.edu.br/index.php/unitas/article/view/570.> Acesso em: 20 nov 2022.
TORRES, Carolina Gonzaga. A perspectiva freudiana sobre o fenômeno religioso. Revista de Psicologia, Fortaleza, v. 3 n. 1, p. 136-140, 2012.
WELLHAUSEN, Julius. A teocracia como ideia e como instituição. TRÁGICA: Estudos de Filosofia da Imanência, v. 3, n. 1, p. 12-24, 2010.
1 ARAÚJO, Eduardo Augusto. Graduando em Direito. Residente em Ceres/GO.