INCLUSION AND CITIZENSHIP: AN ANALYSIS OF PUBLIC POLICIES FOR THE LGBTQIAPN+ POPULATION IN FORTALEZA
INCLUSIÓN Y CIUDADANÍA: UN ANÁLISIS DE LAS POLÍTICAS PÚBLICAS DESTINADAS A LA POBLACIÓN LGBTQIAPN+ EN FORTALEZA
REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th102503022323
CORREIA, Fabíola Maria Rodrigues
RESUMO
O artigo busca analisar as políticas públicas destinadas à população LGBTQIAPN+ no contexto da cidade de Fortaleza, com foco em sua implementação, desafios e impacto na promoção de cidadania, inclusão e enfrentamento das desigualdades. A abordagem inclui uma revisão teórica sobre direitos humanos e inclusão social, bem como a análise de dados sobre um questionário aplicado com professores e gestores a fim de investigar a aplicação de programas e projetos destinados à população LGBTQIAPN+ nas escolas públicas de Fortaleza, bem como o conhecimento dos gestores e professores sobre políticas públicas voltadas para essa população. O estudo ressalta a importância de políticas estruturadas e integradas que considerem as especificidades dessa população, destacando a escola como espaço de transformação social e combate à discriminação.
Palavras chave: Políticas públicas. População LGBTQIAPN+. Inclusão social
SUMMARY
The article aims to analyze public policies directed at the LGBTQIAPN+ population in the context of the city of Fortaleza, focusing on their implementation, challenges, and impact on promoting citizenship, inclusion, and addressing inequalities. The approach includes a theoretical review of human rights and social inclusion, as well as an analysis of data from a questionnaire applied to teachers and managers to investigate the implementation of programs and projects aimed at the LGBTQIAPN+ population in public schools in Fortaleza, as well as the knowledge of managers and teachers regarding public policies directed at this population. The study emphasizes the importance of structured and integrated policies that consider the specificities of this population, highlighting the school as a space for social transformation and combating discrimination.
Keywords: Public policies. LGBTQIAPN+ population. Social inclusion.
RESUMEN
El artículo busca analizar las políticas públicas destinadas a la población LGBTQIAPN+ en el contexto de la ciudad de Fortaleza, centrándose en su implementación, desafíos e impacto en la promoción de la ciudadanía, inclusión y enfrentamiento de las desigualdades. La aproximación incluye una revisión teórica sobre derechos humanos e inclusión social, así como el análisis de datos de un cuestionario aplicado a profesores y gestores con el fin de investigar la aplicación de programas y proyectos destinados a la población LGBTQIAPN+ en las escuelas públicas de Fortaleza, así como el conocimiento de los gestores y profesores sobre políticas públicas dirigidas a esta población. El estudio resalta la importancia de políticas estructuradas e integradas que consideren las especificidades de esta población, destacando la escuela como espacio de transformación social y combate a la discriminación.
Palabras clave: Políticas públicas. Población LGBTQIAPN+. Inclusión social.
INTRODUÇÃO
As políticas públicas destinadas à população LGBTQIAPN+ têm se mostrado fundamentais na promoção da cidadania, na garantia de direitos e no enfrentamento das desigualdades sociais. No entanto, essa população ainda enfrenta desafios históricos que envolvem discriminação, exclusão social, violência e a negação de direitos básicos. No Brasil, os índices de violência contra pessoas LGBTQIAPN+ permanecem alarmantes, colocando o país entre os que mais registram homicídios motivados por LGBTQIAPN+fobia no mundo. Esses dados escancaram a necessidade de ações estruturadas e integradas que busquem combater as desigualdades e assegurar condições de vida dignas para essa comunidade.
No contexto da cidade de Fortaleza, capital do Ceará, a realidade da população LGBTQIAPN+ reflete tanto os avanços conquistados em âmbito nacional quanto os desafios específicos enfrentados em nível local. Apesar de iniciativas como o reconhecimento do nome social e a criação de programas de inclusão, ainda há barreiras significativas na implementação de políticas públicas nas áreas da educação, saúde, segurança e assistência social. A escola pública, por exemplo, enfrenta o desafio de ser um espaço de acolhimento e transformação social diante de um cenário em que o preconceito e a desinformação muitas vezes prevalecem.
Nesse sentido, compreender as políticas públicas voltadas para a população LGBTQIAPN+ em Fortaleza é essencial para avaliar seus impactos, identificar lacunas e propor estratégias de fortalecimento. O presente artigo busca contribuir para esse debate ao analisar as iniciativas existentes na cidade, bem como os desafios associados à sua aplicação. Além disso, este trabalho destaca a importância do papel da escola pública como um espaço privilegiado para a promoção da diversidade, o combate à discriminação e a construção de uma sociedade mais inclusiva.
Assim, o objetivo geral deste artigo é analisar as políticas públicas destinadas à população LGBTQIAPN+ em Fortaleza, identificando avanços, desafios e possibilidades de fortalecimento dessas iniciativas. Os objetivos específicos incluem mapear as políticas públicas locais, investigar as barreiras à sua implementação, refletir sobre o papel da escola pública nesse contexto e propor estratégias para aprimorar as ações existentes. Ao longo do texto, busca-se, assim, dialogar com os desafios enfrentados por essa população, a fim de contribuir para a construção de políticas públicas mais efetivas e inclusivas.
REFERENCIAL TEÓRICO
O referencial teórico deste estudo fundamenta-se em três eixos principais: os direitos humanos e a cidadania LGBTQIAPN+, as políticas públicas como instrumentos de inclusão social e o papel da escola pública na promoção dos direitos dessa população. Esses eixos dialogam entre si para construir uma base teórica que permita compreender os desafios enfrentados pela população LGBTQIAPN+ e a relevância de políticas públicas no contexto educacional e social.
1. DIREITOS HUMANOS E CIDADANIA LGBTQIAPN+
Os direitos humanos são um conjunto de garantias universais que asseguram a dignidade, a liberdade e a igualdade de todos os indivíduos, independentemente de suas características pessoais, como gênero, orientação sexual ou identidade de gênero. Contudo, a população LGBTQIAPN+ historicamente enfrenta violações sistemáticas de seus direitos, resultado de preconceitos estruturais que permeiam a sociedade. Judith Butler (2015), em sua obra Problemas de Gênero, destaca que as normas sociais e culturais frequentemente marginalizam aqueles que não se enquadram nos padrões heteronormativos, limitando o exercício pleno da cidadania.
No Brasil, embora avanços significativos tenham sido alcançados, como o reconhecimento da união estável entre pessoas do mesmo sexo (2011), a criminalização da LGBTQIAPN+fobia (2019) e políticas de inclusão como o uso do nome social em documentos (Decreto nº 8.727/2016), a realidade cotidiana ainda evidencia desigualdades profundas. Segundo Bento (2017), a cidadania LGBTQIAPN+ no Brasil, ainda é marcada pela precariedade, pois a existência formal de direitos não garante sua efetividade, especialmente em territórios mais vulneráveis, como periferias urbanas e regiões menos assistidas pelo Estado.
Mesmo com os avanços das políticas a luta ainda é muto grande pois conforme o “Dossiê dos ASSASSINATOS e da violência contra TRAVESTIS e TRANSEXUAIS brasileiras em 2019”, lançado pela ANTRA e IBTE, pode-se constatar que o Brasil segue como o país que mais assassina pessoas trans do mundo. O dossiê também traz um dado alarmante sobre uma pesquisa realizada por ocasião do mês de enfrentamento da LGBTIfobia no mundo, segundo a qual que 99% das pessoas LGBTI+ participantes afirmaram não se sentirem seguras no país.
E ainda e, 2019, foi julgado pelo Supremo Tribunal Federal a Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO 26).
Nesse julgamento, reconheceu-se a inconstitucionalidade na demora do Congresso Nacional em legislar sobre a proteção penal à população LGBTI+, interpretando conforme a Constituição Federal para enquadrar a homofobia e a transfobia, ou qualquer que seja a forma da sua manifestação, nos diversos tipos penais definidos em legislação já existente, como a Lei Federal 7.716/1989 (que define os crimes de racismo), até que o Congresso Nacional edite norma autônoma. A tese defendida no julgado entende que as práticas LGBTIfóbicas constituem uma forma de racismo social, considerando que tais condutas segregam e inferiorizam pessoas LGBTI. (Giowanna Cambrone – Publicado no Dossiê dos ASSASSINATOS e da violência contra TRAVESTIS e TRANSEXUAIS brasileiras em 2019)
No contexto de Fortaleza, a luta pela cidadania LGBTQIAPN+ envolve desafios significativos, incluindo altos índices de violência contra essa população. De acordo com o relatório “Violência da LGBTfobia no Brasil” da ANTRA (Associação Nacional de Travestis e Transexuais), o Brasil é considerado um dos países mais perigosos para pessoas LGBTQIAPN+, com uma média alarmante de assassinatos a cada ano.
O Dossiê de LGBTIfobia Letal denunciou que durante o ano de 2023 ocorreram 230 mortes LGBT de forma violenta no país. Dessas mortes 184 foram assassinatos, 18 suicídios e 28 outras causas.
Figura 1- Número de mortes de LGBTI+ no Brasil por seguimento em 2023.

Fonte: Observatório de Mortes e Violências contra LGBTI+, Brasil 2023.
Além da violência física, muitos membros da comunidade enfrentam a exclusão de serviços básicos, como saúde, educação e assistência social. Um estudo realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indica que a população LGBTQIAPN+ frequentemente busca serviços de saúde, mas enfrenta discriminação que impede o acesso a um atendimento de qualidade, contribuindo para desigualdades em saúde.
2. POLÍTICAS PÚBLICAS E INCLUSÃO SOCIAL: UMA PERSPECTIVA TEÓRICA
Em relação ao tema, é importante destacar que, com base na decisão do STF (MI 4733 e ADO 26), a LGBTIfobia foi reconhecida como crime de racismo. Isso significa que, por exemplo, os atos de praticar, induzir ou incitar o preconceito ou a discriminação com base na raça, conforme o artigo 20 da Lei 7.716/89 (Lei Antirracismo), assim como quaisquer outros crimes raciais, incluem a discriminação por orientação sexual e identidade de gênero da população LGBTI+, e não se aplicam apenas a pessoas heterossexuais e cisgêneras. É importante ressaltar que não existe “racismo reverso”, conforme reconheceu uma recente decisão judicial que fez menção explícita à referida decisão do STF.
As políticas públicas representam um conjunto de ações governamentais que buscam atender às demandas da sociedade, promovendo o bem-estar coletivo e combatendo desigualdades. Para a população LGBTQIAPN+, essas políticas devem considerar as especificidades de suas vivências, enfrentando as estruturas de exclusão e preconceito que historicamente marginalizam esses grupos (SILVA, 2020).
Segundo Bourdieu (1989), a exclusão social é resultado de desigualdades estruturais que reproduzem hierarquias de poder e acesso. No caso da população LGBTQIAPN+, essas desigualdades se manifestam na dificuldade de acesso a serviços de saúde, educação e emprego, bem como no alto índice de violência motivada por intolerância. Portanto, políticas públicas inclusivas precisam não apenas garantir direitos formais, mas também atuar na transformação das estruturas sociais que perpetuam a discriminação.
No Brasil, o Plano Nacional de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos da População LGBTQIAPN+ (2009) foi um marco importante na tentativa de integrar ações em diversas áreas, como saúde, segurança e educação. Apesar disso, a implementação dessas políticas enfrenta desafios, como falta de recursos, descontinuidade administrativa e resistências culturais. Em Fortaleza, embora existam iniciativas importantes, como o Centro de Referência Janaína Dutra, voltado ao atendimento da população LGBTQIAPN+, a efetividade dessas ações ainda é limitada, especialmente no que diz respeito à integração com outras políticas setoriais.
A inclusão social da população LGBTQIAPN+ passa, portanto, pela necessidade de políticas públicas que articulem ações concretas e educação como ferramenta fundamental para a transformação cultural e social. Desde 2004 se tem um olhar politico mais voltado as questões LGBTQIAPN+ a partir de um conjunto de iniciativas que consideramos:
2004: Criação do Brasil Sem Homofobia (BSH) – Programa de Combate à Violência e à Discriminação contra GLBT e de Promoção da Cidadania Homossexual.
2008: Realização da I Conferência Nacional de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais, com o tema “Direitos humanos e políticas públicas: o caminho para garantir a cidadania de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais”.
2009: Lançamento do Plano Nacional de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais – PNDCDH-LGBT.
Publicação do decreto que cria o Programa Nacional de Direitos Humanos 3 – PNDH 3.
2010: Criação da Coordenadoria Nacional de Promoção dos Direitos de LGBT, no âmbito da Secretaria de Direitos Humanos.
Implantação do Conselho Nacional LGBT, com representação paritária do governo federal e da sociedade civil.
2011: Criação da Política Nacional de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos de LGBT – Um marco importante que visa garantir os direitos da população LGBT em diversas áreas.
2013: Aprovação da união estável entre pessoas do mesmo sexo pelo Supremo Tribunal Federal (STF) – Uma decisão histórica que reconheceu a união de casais do mesmo sexo, garantindo direitos civis.
2014: Lançamento do Plano Nacional de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos de LGBT – Este plano incluiu ações voltadas para a educação, saúde e segurança da população LGBT.
2016: Criação do Comitê Nacional de Promoção da Igualdade Racial e de Gênero – Este comitê incluiu a questão LGBT em suas pautas, promovendo a interseccionalidade nas políticas públicas.
Dentre os movimentos destacamos ainda a ABGLT, fundada em 1995, é a maior rede LGBT da América Latina, reunindo mais de 200 grupos em todo o Brasil. Seu principal foco é defender os direitos LGBT através de ações junto ao Poder Legislativo, Executivo e Judiciário. Além da ABGLT, que representa a comunidade LGBT de forma ampla, existem outras organizações que se dedicam a causas específicas: Antra: uma associação nacional que representa os direitos de travestis e transexuais. ABL (Associação Brasileira de Lésbicas) e LBL (Liga Brasileira de Lésbicas): focadas nos direitos das mulheres lésbicas. CNT (Coletivo Nacional de Transexuais): defende os direitos da comunidade transexual. ABRAGAY (Associação Brasileira de Gays) e Artgay (Articulação Brasileira de Gays): lutam pelos direitos da comunidade gay.
Outras organizações, como a Rede Afro GLBT, o Coletivo Nacional de Lésbicas Negras Feministas Autônomas (Candaces – BR) e a Rede E-Jovem, trabalham com grupos específicos dentro da comunidade LGBT, levando em consideração questões como raça/cor e idade.
Vale destacar também o Plano Integrado de Enfrentamento da Feminização da Epidemia de Aids e outras DST (2007), que inclui ações específicas para mulheres lésbicas, bissexuais e transexuais.
Somente em 2021 completou-se 31 anos que a homossexualidade deixou de ser considerada patologia e foi retirada da Classificação Internacional de Doenças, a CID-10 (OMS, 1994).
Vale ressaltar, portanto, que os direitos ora conquistados não são garantidos de forma permanente, e, nesse sentido, é preciso uma constante vigilância para que não haja retrocesso e tais direitos não sejam retirados, uma vez que são objetos de disputa de diferentes projetos políticos e da complexa construção democrática, sobretudo na América Latina (Dagnino et al, 2006; Comparato, 2015).
Nesta mesma perspectiva, Fernandes (2020, p. 26) ressalta que ao falar sobre agências de controle governamental, é importante tratar “não apenas do controle, mas também do contra controle, este último entendido como ações adotadas pelos governados para modificar ou repelir um tipo de controle específico […]”, a exemplo dos movimentos sociais.
Aprovação de leis estaduais e municipais em diversas cidades e estados começaram a aprovar leis que garantem direitos e proteção à população LGBT, mesmo em um cenário nacional desafiador. Esses eventos mostram a evolução e os desafios enfrentados pela comunidade LGBT no Brasil ao longo dos anos.
Mesmo após 31 anos da retirada da homossexualidade da lista de doenças, a comunidade LGBT+ ainda precisa lutar para proteger seus direitos. Este artigo tem como objetivo analisar a trajetória das políticas públicas LGBT+ no Brasil, mostrando como elas impactam a vida das pessoas LGBT+ e quais avanços e desafios elas enfrentam. Além disso, vamos discutir as mudanças nas normas que orientam o trabalho de psicólogos com a comunidade LGBT+, refletindo sobre o papel da Psicologia e da Análise do Comportamento nesse contexto.
3. O PAPEL DA ESCOLA PÚBLICA NA PROMOÇÃO DOS DIREITOS LGBTQIAPN+
A escola pública ocupa uma posição estratégica na promoção dos direitos humanos e na construção de uma sociedade mais inclusiva. Segundo Freire (1996), a educação é um espaço de emancipação e transformação social, capaz de desconstruir preconceitos e promover a conscientização sobre as desigualdades que afetam diferentes grupos sociais. Nesse sentido, a escola pública tem o potencial de ser um ambiente acolhedor e seguro para estudantes LGBTQIAPN+, contribuindo para o reconhecimento de suas identidades e a valorização da diversidade.
No entanto, o ambiente escolar muitas vezes reflete os preconceitos e as exclusões presentes na sociedade. Estudos como os realizados por Brito (2020) apontam que estudantes LGBTQIAPN+ enfrentam altas taxas de bullying, abandono escolar e invisibilização de suas vivências no currículo escolar. A falta de formação de professores para lidar com questões de gênero e sexualidade também é um obstáculo, reforçando a necessidade de políticas educacionais que abordem essas temáticas de forma transversal e inclusiva.
Iniciativas como o “Projeto Escola Sem Homofobia”, lançado pelo governo federal em 2011, são exemplos de políticas voltadas para a inclusão de estudantes LGBTQIAPN+. Embora tenha sofrido resistência e cortes, ele trouxe à tona a importância de discutir gênero e sexualidade no ambiente escolar. Em Fortaleza, a rede pública tem adotado algumas iniciativas pontuais, mas ainda enfrenta desafios na formação de professores e na implementação de práticas pedagógicas inclusivas.
Portanto, é imprescindível que a escola pública seja reconhecida como um espaço de promoção dos direitos LGBTQIAPN+, capaz de combater a discriminação e contribuir para a construção de uma cultura de respeito e diversidade. Para isso, é necessário investir em formação continuada de professores, revisão de materiais didáticos e ações pedagógicas que fomentem o diálogo e a conscientização.
Assim, os direitos humanos, as políticas públicas e o papel da escola pública são elementos interdependentes na promoção de uma sociedade mais igualitária para a população LGBTQIAPN+. A análise desses três eixos oferece uma base teórica sólida para compreender os desafios enfrentados e propor estratégias que fortaleçam a inclusão e a cidadania.
Elaboramos um quadro com algumas das principais políticas públicas voltadas à população LGBTQIAPN+, tanto em nível nacional quanto no estado do Ceará. O quadro apresenta o ano, o nome da política e um resumo sobre cada uma delas.
Âmbito Nacional: Inclui políticas e decisões judiciais que têm abrangência em todo o território brasileiro, como a criminalização da LGBTQIAPN+fobia ou a Política Nacional de Saúde Integral LGBT.
Âmbito Ceará: Apresenta políticas específicas do estado do Ceará e da cidade de Fortaleza.
Quadro 1
Ano | Nome da Política | Resumo | Âmbito |
2004 | Programa “Brasil Sem Homofobia” | Lançado pelo Governo Federal, o programa visava combater a discriminação contra LGBTQIAPN+ e promover direitos. | Nacional |
2009 | Plano Nacional de Promoção da Cidadania e Direitos Humanos da População LGBTQIAPN+ | Documento que definiu diretrizes para a promoção da igualdade e o enfrentamento da violência contra LGBTQIAPN+. | Nacional |
2011 | Resolução nº 12 do Conselho Nacional de Combate à Discriminação | Garantiu o direito ao uso do nome social por pessoas trans em órgãos públicos federais. | Nacional |
2013 | Política Nacional de Saúde Integral LGBT | Criada pelo Ministério da Saúde, visa garantir o acesso da população LGBTQIAPN+ a serviços de saúde sem discriminação. | Nacional |
2018 | Decisão do STF (Adoção por Casais Homoafetivos) | O Supremo Tribunal Federal reconheceu o direito de casais homoafetivos à adoção, ampliando a cidadania LGBTQIAPN+. | Nacional |
2019 | Criminalização da LGBTQIAPN+fobia (STF) | Decisão do STF que equiparou a LGBTQIAPN+fobia ao crime de racismo, prevendo punição para atos discriminatórios. | Nacional |
2019 | Decreto nº 33.615/2019 (Ceará) | Criou o Comitê Estadual de Promoção dos Direitos Humanos da População LGBTQIAPN+, visando articular políticas no estado. | Ceará |
2020 | Implementação do Centro de Referência LGBTQIAPN+ Janaína Dutra | Espaço voltado à assistência, acolhimento e promoção de direitos para a população LGBTQIAPN+ em Fortaleza. | Ceará |
2021 | Lei Municipal nº 11.106/2021 (Fortaleza) | Criou o “Dia Municipal do Orgulho LGBTQIAPN+” e reforçou a importância de ações de conscientização e combate à discriminação. | Fortaleza |
2021 | Campanha Ceará Sem LGBTQIAPN+fobia | Iniciativa da Secretaria da Proteção Social, Justiça, Cidadania, Mulheres e Direitos Humanos (SPS) do Ceará para conscientização e combate à LGBTQIAPN+fobia. | Ceará |
2022 | Decreto nº 34.583/2022 (Ceará) | Regulamentou o uso do nome social em instituições públicas estaduais para pessoas trans e travestis. | Ceará |
Fonte: Autoria própria 2025.
Com esse quadro, é possível observar que o Brasil e o estado do Ceará têm buscado acompanhar as diretrizes para a política mundial no que se refere aos direitos LGBTQIAPN+, com realizações de várias ações e implementação de políticas públicas.
4. Resultados encontrados acerca da compreensão
Objetivo deste questionário foi investigar a aplicação de programas e projetos destinados à população LGBTQIAPN+ nas escolas públicas de Fortaleza, bem como o conhecimento dos gestores sobre políticas públicas voltadas para essa população. Elaboramos o questionário e aplicamos através do link de WhatsApp nos grupos de gestores e professores da rede municipal de fortaleza. Os respondentes foram Diretor(a), Professor(a) e Coordenador Pedagógico, com 61 respostas coletadas as quais eram livres para que o respondente ficasse à vontade para responder ou não a análise dos gráficos revela várias conclusões importantes. Na primeira sessão com três perguntas e acerca da Identificação e Contextualização tivemos 60 respostas.
Gráfico 1

Fonte: Autoria própria 2025.
A grande maioria (86,7%) dos respondentes são professores, com uma pequena porcentagem sendo diretores (8,3%) e coordenadores pedagógicos (5%). Este dado é importante porque indica que a maioria das opiniões refletem a perspectiva docente sobre a questão da inclusão.
Gráfico 2

Fonte: Autoria própria 2025.
A maior parte (41,7%) tem entre 0 a 10 anos de experiência na educação. Há uma distribuição relativamente uniforme entre os outros grupos de tempo de experiência. Este dado não indica uma preponderância de opiniões baseadas em anos de experiência.
Gráfico 3

Fonte: Autoria própria 2025.
A maioria dos respondentes (53,3%) trabalha no ensino fundamental I. Uma porcentagem substancial (28,3%) trabalha no ensino fundamental II, e menor porcentagem na educação infantil (18,3%). A ausência de informações sobre a amostra de Educação de Jovens e Adultos (EJA) (0%) pode limitar a capacidade de generalizar os resultados para todos os níveis de ensino.
Gráfico 4

Fonte: Autoria própria 2025.
Na Seção 2: Programas e Projetos na Escola, uma alta porcentagem (90%) das escolas participantes relata ter algum programa ou projeto voltado para inclusão LGBTQIAPN+. Este dado é positivo, sugerindo que a maioria das escolas está se esforçando para promover a inclusão.
Os programas citados incluem: distribuição de panfletos contra discriminação, vôlei inclusivo, feira de ciências, e um programa denominado “#semhomofobia”. A variedade de tipos de programas sugere um esforço diversificado para alcançar a inclusão. No entanto, a falta de detalhes sobre a implementação e o impacto desses programas limita uma análise mais profunda.
Na pergunta: Quais ações ou atividades relacionadas à diversidade sexual e de gênero são realizadas em sua escola? Responderam que a maioria das escolas relatam ter ações ou atividades relacionadas à diversidade sexual e de gênero. No entanto, muitas dessas ações são pontuais, informais, ou focadas no respeito geral, sem especificar ações voltadas para a comunidade LGBTQIAPN+. Este dado destaca uma lacuna na aplicação prática de políticas inclusivas, apesar da declaração de intenção. As ações incluem palestras, diálogos sobre respeito à diversidade, atividades esportivas e campanhas de conscientização. A variedade de abordagens indica esforços em múltiplas frentes, embora falte aprofundamento e avaliação de impacto.
Gráfico 5

Fonte: Autoria própria 2025.
A grande maioria (87,9%) das escolas afirma oferecer suporte específico para alunos LGBTQIAPN+ em situação de vulnerabilidade. Isso indica um compromisso institucional com o bem-estar desses alunos. Os tipos de suporte incluem escuta ativa, conversas informais, e algumas escolas mencionam o encaminhamento ao Conselho Tutelar se necessário. No entanto, seria benéfico conhecer maiores detalhes sobre a eficácia e o alcance destes suportes.
Gráfico 6

Fonte: Autoria própria 2025.
Uma porcentagem significativa (78,3%) dos respondentes demonstra conhecimento sobre políticas públicas municipais ou estaduais para a população LGBTQIAPN+. Este resultado sugere que há um nível razoável de informação sobre as políticas existentes. Os exemplos de políticas mencionadas incluem leis estaduais e municipais de combate à LGBTfobia, e a possibilidade de aplicação da lei Maria da Penha em casos de violência contra mulheres trans.
Gráfico 7
Fonte: Autoria própria 2025.
A grande maioria (100%) das escolas relata não oferecer treinamento ou formação continuada para questões de gênero e diversidade sexual. Esta é uma grande lacuna que precisa ser endereçada, pois a formação contínua é crucial para garantir a implementação eficaz das políticas de inclusão. Há opiniões divergentes sobre a eficácia das políticas públicas existentes. A maioria percebe a ineficácia, apontando a falta de implementação prática, formação de professores, e conscientização na comunidade. Os principais desafios incluem a formação de professores, a aceitação de pais e comunidade, a falta de projetos claros e sistemáticos, o preconceito, e a falta de conhecimento dos gestores. A complexidade e diversidade desses desafios destacam a necessidade de abordagens multifacetadas.
Na última pergunta que foi livre e sobre Sugestões para Fortalecer a Inclusão, as sugestões do questionário as respostas se dividem entre aqueles que consideram as políticas eficazes e aqueles que as veem como ineficazes, com uma proporção significativa indicando ineficácia. Esta divisão reflete a complexidade do problema e a dificuldade de implementar políticas inclusivas em um contexto marcado por preconceitos arraigados.
As justificativas para a ineficácia das políticas públicas apontam para diversos fatores: Falta de Implementação: Muitos consideram as políticas ineficazes porque elas não são implementadas de forma adequada na prática. As leis e os decretos existem, mas não se traduzem em ações concretas nas escolas. A falta de recursos, de formação dos professores e de acompanhamento são obstáculos para a implementação efetiva. Falta de Conhecimento e Sensibilização: A falta de conhecimento sobre as políticas públicas existentes, tanto entre os professores quanto entre as famílias, contribui para sua ineficácia. A sensibilização e a conscientização sobre a importância da inclusão LGBTQIAPN+ são também elementos fundamentais para o sucesso das políticas públicas.
Preconceito e Resistência: A resistência e o preconceito por parte de professores, funcionários, alunos e famílias são obstáculos poderosos que impedem a efetividade das políticas públicas de inclusão. As políticas precisam ser acompanhadas de ações que promovam a mudança de atitudes e comportamentos, combatendo os preconceitos e a discriminação.
Falta de Programas e Projetos Adequados: A ausência de programas e projetos estruturados, com objetivos claros, metas definidas e recursos adequados, também é apontada como um fator de ineficácia. Ações pontuais e desarticuladas não são suficientes para promover mudanças reais e sustentáveis no ambiente escolar.
Justificativas para a Eficácia (menos frequentes): As justificativas para a eficácia das políticas públicas são menos frequentes e geralmente condicionadas: Eficácia Condicional: Algumas respostas indicam a eficácia das políticas, mas apenas quando implementadas de forma adequada, acompanhadas de formação e sensibilização e com o apoio da comunidade escolar.
Com esses resultados as sugestões não são apenas um apêndice ao questionário, mas sim uma síntese das necessidades mais urgentes e das principais lacunas identificadas na busca por uma inclusão LGBTQIAPN+ verdadeira e efetiva nas escolas de Fortaleza. A falta de formação, o diálogo limitado com a comunidade e a fragilidade dos programas existentes são pontos críticos que precisam ser endereçados simultaneamente para que as políticas de inclusão se tornem realidade.
CONSIDERAÇÕES
O estudo indica um cenário complexo em relação à inclusão LGBTQIAPN+ nas escolas públicas de Fortaleza. Embora haja um esforço declarado por parte das escolas, a implementação prática das políticas de inclusão enfrenta grandes obstáculos, principalmente a falta de formação continuada e o preconceito.
A ascensão dos movimentos sociais desempenhou papel crucial na visibilidade de temas como gênero, sexualidade e orientação sexual, impulsionando o debate público e a conscientização social. A difusão da internet e das redes sociais, a partir da década de 2000, potencializou esse processo, democratizando o acesso à informação e ampliando as possibilidades de engajamento e participação social.
A internet, como plataforma de comunicação e difusão de conhecimento, facilitou a construção de redes de apoio, a troca de experiências e a produção de conteúdo sobre questões sociais, contribuindo para a desmistificação de preconceitos e a ampliação do debate público. No entanto, é importante reconhecer que o acesso à informação e a participação em debates online ainda se apresentam de forma desigual, com desafios relacionados à digitalização, à alfabetização digital e à própria estrutura social, que reproduzem desigualdades e dificultam o acesso a todos os indivíduos.
Apesar dos avanços, a resistência e o desconhecimento em relação a temas como gênero e sexualidade persistem em setores da sociedade, demandando esforços contínuos para promover a inclusão, o diálogo e a compreensão mutua.
Para avançar significativamente, são necessárias ações coordenadas e sustentáveis que abordem os desafios identificados de forma multidisciplinar e abrangente. A pesquisa destaca a necessidade de intervenções que promovam não só a conscientização, mas também a mudança de comportamentos e atitudes, incluindo os professores, famílias e toda a comunidade escolar.
REFERENCIAS
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DAGNINO, E.; Oliveira, A. J; Panfichi, A. Para uma outra leitura da disputa pela construção democrática na América Latina. São Paulo: Paz e Terra, 2006.
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