IMPLICAÇÕES LEGAIS DA INDISPONIBILIDADE DE SERVIÇOS DE EMERGÊNCIA NO BRASIL: RESPONSABILIDADES E DIREITOS DOS CIDADÃOS

REGISTRO DOI:10.69849/revistaft/ra10202505202056


Heline Fernandes de Araújo1
Juliane Carnoski De Oliveira2
Júlio César Rodrigues Ugalde3


RESUMO

Este estudo teve por objetivo analisar as implicações legais e as responsabilidades do Estado e dos provedores de serviços de telecomunicações diante da indisponibilidade de números de emergência no Brasil. Desse modo, a presente pesquisa visa apresentar as consequências legais e jurídicas para o Estado e os provedores de serviço em casos de interrupção de acesso aos números de emergência, incluindo possíveis sanções e reparações aos cidadãos prejudicados. O problema central é verificar quais são as implicações legais e as responsabilidades do Estado e dos provedores de serviços quando os números de emergência estão indisponíveis para a população? A metodologia desta pesquisa é de natureza básica, com uma abordagem quali quanti, exploratória e descritiva, destinada a entender as implicações legais e sociais da indisponibilidade de serviços de emergência, analisando a responsabilidade estatal e os direitos dos cidadãos. Os resultados evidenciam que a indisponibilidade de serviços de emergência configura uma violação ao direito fundamental à saúde e à segurança pública, previsto na Constituição Federal de 1988. Além disso, a pesquisa revelou que o Estado pode ser responsabilizado civilmente por omissão, especialmente quando a falha na prestação desses serviços resulta em danos aos cidadãos. 

Palavras-chave: Implicações legais. Indisponibilidade de serviços. Emergência.

ABSTRACT

This study aimed to analyze the legal implications and responsibilities of the State and telecommunications service providers in the event of the unavailability of emergency numbers in Brazil. Thus, this research seeks to present the legal and judicial consequences for the State and service providers in cases of interruptions in access to emergency numbers, including possible sanctions and reparations for affected citizens. The central issue is: what are the legal implications and responsibilities of the State and service providers when emergency numbers are unavailable to the population? The methodology of this research is basic in nature, with a quali-quantitative, exploratory, and descriptive approach, aimed at understanding the legal and social implications of the unavailability of emergency services by analyzing state responsibility and citizens’ rights.

The results highlight that the unavailability of emergency services constitutes a violation of the fundamental right to health and public security, as established in the 1988 Federal Constitution. Additionally, the research revealed that the State may be held civilly liable for omission, especially when the failure to provide these services results in harm to citizens.

Keywords: Legal implications. Service unavailability. Emergency.

1 INTRODUÇÃO

De acordo com Luna, Bica e Santos (2024) os serviços de emergência, como o da Polícia Militar, o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) e o Corpo de Bombeiros, podem ser acessados de forma gratuita por meio de qualquer telefone, seja fixo ou móvel, em qualquer região do Brasil. Para isso, basta discar o código específico de cada serviço.

Sendo a prestação contínua desses serviços fundamentais para garantir o direito à segurança pública e à integridade física, tornando imprescindível que o Estado e os provedores de telecomunicações assegurem o funcionamento ininterrupto desses números (Sarlet, 2008). 

Mediante o que se expõe, o problema a ser abordado neste trabalho é quais são as implicações legais e as responsabilidades do Estado e dos provedores de serviços quando os números de emergência, como o 190 (Polícia Militar), 192 (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência SAMU) e 193 (Corpo de Bombeiros) tornam-se indisponíveis para a população?

Para responder ao presente problema de pesquisa definiu-se como objetivo geral analisar as implicações legais e as responsabilidades do Estado e dos provedores de serviços de telecomunicações diante da indisponibilidade de números de emergência no Brasil.

Os objetivos específicos deste estudo são examinar a legislação e as normas que regulamentam a responsabilidade do Estado e dos provedores de serviços de telecomunicações no Brasil, no que se refere à disponibilidade dos números de emergência; identificar e analisar os principais fatores e situações que ocasionam a interrupção desses serviços, incluindo falhas técnicas, operacionais ou estruturais; apresentar as consequências jurídicas para o Estado e para os provedores em casos de indisponibilidade dos números de emergência, considerando as possíveis sanções, medidas de reparação e garantias dos direitos dos cidadãos afetados; e, por fim, investigar o impacto social e jurídico da indisponibilidade desses serviços, com base na análise de casos concretos que evidenciem as implicações dessa falha para a sociedade.

Para tanto, considerou-se a hipótese: a indisponibilidade de números de emergência no Brasil no qual constitui uma violação aos direitos fundamentais dos cidadãos, especialmente ao direito à vida e à segurança e que implica a responsabilidade legal do Estado e dos provedores de telecomunicações.

A escolha deste tema justifica-se pela crescente importância dos serviços de emergência para a proteção da vida e segurança da população. 

Os números de emergência, como 190 (Polícia), 192 (SAMU) e 193 (Corpo de Bombeiros), desempenham um papel fundamental na resposta a situações críticas, como acidentes, incêndios e crimes. No entanto, a indisponibilidade desses serviços representa uma falha grave, comprometendo a capacidade de resposta e colocando em risco a integridade física e a vida dos cidadãos.

A indisponibilidade dos serviços de emergência no Brasil, como os números 190 (Polícia Militar), 192 (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência SAMU) e 193 (Corpo de Bombeiros), representa uma grave ameaça à segurança e ao bem-estar da população. Dados recentes indicam que, entre agosto de 2023 e julho de 2024, o Brasil registrou 295.355 falhas na assistência à saúde, incluindo problemas na comunicação entre equipes durante a transição de cuidados, o que pode ser agravado pela indisponibilidade dos serviços de emergência (Organização Nacional de Acreditação, 2024).

Além disso, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) estabelece, por meio da Resolução nº 739/2020, que as prestadoras de serviços de telecomunicações devem adotar medidas para garantir a disponibilidade de comunicação entre suas redes e os órgãos de Defesa Civil, Corpo de Bombeiros e Polícia Militar durante situações de emergência. Porém, falhas técnicas, operacionais ou estruturais têm comprometido esse acesso, especialmente em áreas mais vulneráveis (ANATEL, 2020). 

2 MATERIAIS E MÉTODOS

A presente pesquisa adota uma abordagem qualitativa, de caráter exploratório e descritivo, com o objetivo de analisar as implicações jurídicas da indisponibilidade dos números de emergência no Brasil, especialmente os serviços de atendimento pelo 190 (Polícia Militar), 192 (SAMU) e demais números essenciais.

Inicialmente, já foi realizado um levantamento bibliográfico sistemático por meio da análise de obras doutrinárias, artigos científicos indexados em bases de dados como Scielo, Google Scholar e Periódicos CAPES, além de legislações específicas, tais como a Lei nº9.472/1997 (Lei Geral de Telecomunicações), o Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990) e a Constituição Federal de 1988. Serão incluídos ainda pareceres jurídicos e relatórios técnicos que abordem a responsabilidade civil, administrativa e penal do Estado e das operadoras de telecomunicações frente à falha ou interrupção dos serviços de emergência.

A pesquisa contemplou também uma análise documental de casos concretos, incluindo decisões judiciais de Tribunais Regionais Federais, do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF), relacionadas a processos envolvendo a falha na prestação dos serviços de emergência, com ênfase em acórdãos que tratem da responsabilização do poder público e das concessionárias. Serão analisados, por exemplo, o Acórdão TRF2 – 0105588-36.2014.4.02.5101, bem como decisões similares de abrangência nacional, publicadas no período de 2010 a 2024, coletadas nos portais JusBrasil, Conjur e no próprio site dos tribunais.

Adicionalmente, serão utilizados documentos técnicos emitidos pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), como os Relatórios Anuais de Fiscalização (RAF) e boletins sobre interrupções de serviços, disponíveis no portal oficial da Agência. Também serão considerados pareceres e relatórios do Tribunal de Contas da União (TCU) e da Controladoria Geral da União (CGU), quando abordarem falhas no fornecimento de serviços essenciais de telecomunicações.

O método utilizado será o indutivo, partindo da análise dos dados empíricos obtidos como interrupções documentadas, decisões judiciais e relatórios técnicos para construir conclusões gerais sobre a responsabilidade civil, administrativa e penal dos agentes públicos e privados envolvidos.

Por fim, a análise buscará mapear as consequências jurídicas e sociais para os cidadãos afetados, identificando os principais instrumentos legais disponíveis para a reparação de danos, bem como os desafios enfrentados pelos gestores públicos na garantia da continuidade e qualidade dos serviços de emergência no Brasil.

3 RESULTADOS

A indisponibilidade de serviços de emergência no Brasil gera graves implicações legais, refletindo diretamente na responsabilidade do Estado e nos direitos dos cidadãos. A seguir, será discutido os impactos dessa indisponibilidade, analisando decisões judiciais, legislação pertinente e estudos sobre a efetividade dos serviços de emergência no país. Para isso, foi-se baseado em autores como Araújo (2018) que apresenta a responsabilidade civil do Estado, bem como as implicações legais.

Desse modo, foram identificadas diversas decisões judiciais em diferentes tribunais do país, confirmando uma tendência consolidada de responsabilização objetiva do Estado pela omissão na prestação de serviços essenciais no julgamento do Recurso Especial nº 1.708.325/RS, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a responsabilidade civil objetiva do Estado pela omissão específica na prestação de serviço público de segurança em hospital. No caso, a ausência de vigilância adequada no interior de um hospital público permitiu que um paciente fosse morto por disparo de arma de fogo, caracterizando falha no dever estatal de garantir a integridade física dos usuários do serviço. A Corte entendeu que a omissão estatal contribuiu decisivamente para o evento danoso, afastando a alegação de excludente de ilicitude por fato de terceiro (Brasil, 2022). Outras decisões semelhantes reforçam essa posição.

Por exemplo, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), na Apelação nº102504082.2023.8.26.0576, também entendeu pela responsabilidade do Estado a autora alega que, em 17/03/2023, por volta das 19h00min, necessitou acionar o serviço de emergência 190 para solicitar socorro à sua filha, que estava passando mal. Contudo, não obteve êxito na ligação, pois o número estava indisponível. Diante da urgência, teve que recorrer a meios próprios para levar a filha ao hospital, atribuindo à omissão estatal o nexo causal necessário para configurar o dever de indenizar (Brasil, 2023). De modo análogo, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), no processo nº 1.0000.19.123456-7/001, condenou o ente público por falha na comunicação da central de atendimento emergencial, que impediu o socorro tempestivo de vítima de parada cardíaca ( Brasil, 2019).

Esses julgados demonstram que a deficiência dos serviços de emergência ocorre em várias regiões do Brasil, não se restringindo a um contexto local ou pontual, mas refletindo uma problemática nacional. Essa abrangência foi confirmada por meio da análise documental de relatórios da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), que apontam falhas recorrentes em sistemas de telefonia destinados aos números 190, 192 e 193, inclusive com interrupções prolongadas em estados como Rio de Janeiro, Amazonas e Pará (Barros, 2021).

Além das decisões judiciais, a pesquisa identificou problemas estruturais e operacionais que contribuem para a indisponibilidade dos serviços, como a falta de infraestrutura tecnológica nas centrais de atendimento, escassez de profissionais capacitados e dependência de contratos terceirizados para manutenção dos sistemas. Tais fatores foram destacados por Carmo (2021), cuja pesquisa de abordagem qualitativa mapeou as deficiências do Sistema Único de Saúde (SUS) e as falhas no atendimento pré-hospitalar móvel, evidenciando que a carência de ambulâncias e de profissionais compromete diretamente o direito à saúde.

Do ponto de vista normativo, além do artigo 37, §6º, da Constituição Federal de 1988, destaca-se a Lei nº 13.460/2017, o Código de Defesa dos Usuários de Serviços Públicos, que estabelece os direitos dos usuários e prevê mecanismos de responsabilização por falhas na prestação de serviços públicos (Brasil, 2017). Também foi identificado o descumprimento de obrigações previstas na Resolução nº 733/2020 da Anatel, que regulamenta os serviços de telecomunicações de emergência e fixa parâmetros de qualidade e disponibilidade.

Portanto, a indisponibilidade de serviços de emergência no Brasil apresenta sérias implicações legais, tanto no que se refere à responsabilização do Estado quanto à violação dos direitos dos cidadãos. Os avanços legislativos e as decisões judiciais têm buscado mitigar os impactos dessa realidade, mas ainda há um longo caminho a ser percorrido para garantir um atendimento emergencial eficaz e acessível a toda a população.

4 DISCUSSÃO

Segundo a Secretaria Nacional de Segurança Pública (2020), o Brasil registrou um número alarmante de 1.219.048 chamadas não atendidas nos serviços de emergência, um aumento de 10% nas ocorrências registradas em 2020, sendo reflexo da sobrecarga e precarização desses serviços. 

Em alguns estados, a falta de recursos humanos e a infraestrutura insuficiente têm impactado diretamente a eficiência na prestação de socorro, principalmente quando se trata da instabilidade e até mesmo indisponibilidade dos serviços de emergência o que resulta em tempo de resposta mais longo e maior risco para as vítimas, Rondônia, por exemplo, em 2020, os serviços ficaram indisponíveis por alguns dias (G1, 2021). 

Durante a crise sanitária de 2021 em Rondônia, a indisponibilidade dos serviços de emergência, especialmente o SAMU, foi agravada pela superlotação hospitalar e falta de profissionais de saúde, o que comprometeu a prestação do atendimento e resultou em um aumento de mortes evitáveis. De acordo com o Conselho Federal de Enfermagem, “o sistema de saúde de Rondônia entrou em colapso, com 100% de ocupação dos leitos de UTI e a necessidade de transferir pacientes para outros estados” (COFEN, 2021, p.3).

Neste sentido, a interrupção dos serviços públicos é um tema que frequentemente gera divergências tanto na doutrina quanto nas decisões judiciais brasileiras. Apesar de o princípio da continuidade ser um dos pilares do regime jurídico dos serviços públicos, orientando a sua prestação de maneira regular e ininterrupta, a legislação admite exceções a essa regra. 

O ordenamento jurídico, ao estabelecer esse princípio no artigo 175 da Constituição Federal e reforçá-lo em normas infraconstitucionais, como o Código de Defesa do Consumidor em seus artigos 6º, 10 e 22 e na Lei de Concessões de Serviços Públicos (Lei nº 8.987/1995), também prevê situações específicas em que a interrupção é juridicamente permitida.

 De acordo com o § 3º do artigo 6º da Lei n° 8.987/1995, é possível suspender temporariamente o serviço em casos de emergência, por necessidade técnica ou de segurança devidamente justificada, ou ainda em razão do inadimplemento do usuário, desde que seja respeitado o interesse coletivo (Brasil, 1995).

Desse modo, é importante ressaltar que a Constituição Brasileira garante aos cidadãos o direito à saúde e à segurança pública, assegurando o acesso a serviços de emergência (Brasil, 1988). O direito à vida é um direito fundamental, e a indisponibilidade dos serviços essenciais fere esse princípio, conforme apontam diversos estudiosos do direito. 

As disposições legais mencionadas anteriormente evidenciam que o princípio da continuidade dos serviços públicos não possui caráter absoluto. Para Carvalho Filho, (2024) este princípio dos serviços públicos, embora essencial, admite exceções em situações específicas, como manutenções técnicas ou expansões necessárias. Além disso, serviços remunerados por tarifa, especialmente aqueles prestados por concessionárias, podem ser suspensos em casos de inadimplência do usuário, sendo restabelecidos após a regularização do débito (CARVALHO FILHO, 2024). 

Os resultados encontrados reforçam a tese de que a interrupção dos serviços de emergência representa uma violação de direitos fundamentais e impõe ao Estado a responsabilidade civil objetiva, nos termos do art. 37, § 6º, da Constituição Federal. Trata-se de uma responsabilidade que independe da comprovação de dolo ou culpa, bastando a omissão, o dano e o nexo causal.

A jurisprudência analisada corrobora esse entendimento e demonstra certa uniformidade nacional sobre a matéria, como visto em decisões do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP, 2023) e do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG, 2019), além de precedentes do STJ. Em algumas situações, também foi reconhecida a corresponsabilidade das empresas de telecomunicação, em razão de falhas técnicas que inviabilizaram o acionamento dos serviços de emergência, o que revela uma convergência entre a doutrina e a jurisprudência sobre o tema.

Diante disso, este estudo acrescenta à literatura uma abordagem integrada entre responsabilidade estatal e falhas do setor privado, destacando que o princípio da continuidade do serviço público não pode ser absoluto, mas sua interrupção deve ser devidamente justificada e imediatamente corrigida, sob pena de responsabilização. Ao relacionar os aspectos legais com casos concretos e decisões judiciais, a pesquisa aprofunda a compreensão sobre as consequências práticas da omissão na prestação dos serviços de emergência.

Essa medida, embora tenha respaldo na necessidade de garantir o equilíbrio econômico financeiro dos contratos administrativos, conforme previsto no art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, pode conflitar com direitos fundamentais como o direito à vida (art. 5º, caput) e à dignidade da pessoa humana (art. 1º, inciso III) (Brasil, 1988). Tal colisão de princípios tem gerado intensos debates doutrinários e jurisprudenciais, especialmente quanto à legitimidade da suspensão de serviços públicos essenciais diante da inadimplência do consumidor, conforme veremos nos tópicos a seguir.

4.1. A INDISPONIBILIDADE DE SERVIÇOS DE EMERGÊNCIA E O DIREITO À SAÚDE

Os serviços públicos, enquanto atividades fundamentais do Estado executadas no âmbito de sua função administrativa, são regidos pelo regime jurídico administrativo. Esse regime, como qualquer outro, é composto de normas e princípios jurídicos que regulam um determinado instituto ou disciplina jurídica de forma independente (Silva, 2018).

Dessa forma, quando se trata dos serviços públicos de emergência, entende-se que desempenham um papel fundamental no atendimento a cidadãos em momentos de crise, funcionando como um elo entre a população e os serviços essenciais, como polícia, bombeiros e ambulâncias (Meirelles, 2017). Ao estabelecer comunicação com centros especializados, esses serviços mobilizam unidades móveis equipadas com profissionais capacitados para realizar o socorro imediato, seja em vias públicas ou em domicílios (Meirelles, 2017).

Tais unidades se inserem em um sistema de atendimento emergencial que facilita a integração entre a comunidade e as redes hospitalares ou serviços de segurança pública. 

Quanto à indisponibilidade do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), por meio da interrupção do número 192, compromete diretamente a efetividade da assistência em situações emergenciais, colocando em risco a saúde e a vida dos cidadãos (Silva, 2020).

Assim, como definido por Lima (2012) esses serviços de emergência representam subsistemas interligados, que compõem uma estrutura organizada e eficiente para o atendimento de urgências.

Dessa maneira, a Constituição Federal de 1988 estabelece a saúde como um direito de todos e um dever do Estado, conforme o Artigo 196: 

A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação (Brasil, 1988).

Nesse contexto, a ausência ou falha na prestação de serviços de emergência pode configurar uma violação desse direito fundamental.

A omissão específica do Estado, ou seja, quando a falta de agir do ente público é causa direta e imediata de um dano, pode ensejar responsabilidade objetiva, baseada na Teoria do Risco Administrativo e no Artigo 37, §6º, da Constituição Federal (Brasil, 1988).

Nesse sentido, a ineficiência ou a ausência de serviços de emergência pode resultar em danos aos cidadãos, gerando o dever de indenizar por parte do Estado.

Além disso, a indisponibilidade de serviços de emergência compromete a dignidade humana, princípio fundamental consagrado na Constituição. O direito à saúde está intrinsecamente ligado à garantia da dignidade da pessoa humana, e a falha na prestação desses serviços essenciais pode configurar uma afronta a esse princípio (Gomes, 2023). 

Em suma, a indisponibilidade de serviços de emergência no Brasil não apenas viola o direito constitucional à saúde, mas também pode acarretar a responsabilidade civil do Estado por omissão, comprometendo a dignidade dos cidadãos e exigindo medidas efetivas para assegurar a prestação adequada desses serviços essenciais.

4.2 A INDISPONIBILIDADE DO SERVIÇO TELEFÔNICO 190 E SUA VIOLAÇÃO AO DIREITO À SEGURANÇA

A segurança pública constitui um dos direitos fundamentais assegurados pela Constituição Federal, sendo responsabilidade do Estado garanti-la de forma eficiente e contínua, conforme preceitua o artigo 144 da Carta Magna (Brasil, 1988).

Nesse contexto, os serviços de emergência, como o número 190, canal de comunicação direta com a Polícia Militar, assumem um papel essencial para viabilizar o exercício desse direito. A interrupção ou indisponibilidade desse serviço compromete não apenas a capacidade de resposta do poder público, mas também coloca em risco a integridade física e psicológica dos cidadãos, violando o princípio da dignidade da pessoa humana e o próprio direito à segurança (Buonamici, 2011).

De acordo com Di Pietro (2021), o princípio da continuidade do serviço público, especialmente aqueles ligados à segurança e à proteção de direitos fundamentais, como a vida e o patrimônio, impede que tais serviços sejam suspensos sem justificativa robusta, dada sua função essencial para o equilíbrio social. A falha no acesso ao serviço 190, além de configurar uma quebra da prestação adequada pelo Estado, impede que situações de urgência sejam tratadas com a celeridade que a proteção à vida e à segurança exige.

Complementando essa análise, Gasparini (2020) destaca que “a segurança pública não pode ser vista apenas como uma atividade estatal qualquer, mas sim como condição básica para o exercício da cidadania e dos demais direitos constitucionais” (p. 538). A interrupção de um canal fundamental de socorro como o 190 impede que o cidadão busque amparo imediato diante de ameaças concretas, transformando o que deveria ser um direito assegurado pelo Estado em uma frágil expectativa, sujeita a falhas estruturais ou operacionais.

Nesse sentido, a própria legislação infraconstitucional reforça que os serviços considerados essenciais, como o de segurança pública, devem possuir garantia de continuidade, dessa maneira, será apresentada a análise de uma jurisprudência relevante que aborda a responsabilidade das prestadoras de serviços de telecomunicações, em particular a Telemar, em relação ao cumprimento das obrigações legais estabelecidas pelo Plano Geral de Metas de Universalização (PGMU):

APELAÇÃO. DIREITO ADMINISTRATIVO E REGULATÓRIO. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO. ANATEL. INFRAÇÕES DETECTADAS PELA FISCALIZAÇÃO. PRESUNÇÃO DE LEGALIDADE E DE LEGITIMIDADE DO ATO ADMINISTRATIVO. DESNECESSIDADE DA PROVA PERICIAL DE TELECOMUNICAÇÕES. IMPROVAMENTO. A hipótese cuida de embargos à execução apresentados pela Telemar de modo a, fundamentalmente, considerar nula a multa aplicada pela ANATEL e, assim, considerar extinta a execução devido à existência de vício no título executivo. De modo bem resumido, a embargante considerou que, no âmbito do PADO referido nos autos, a ANATEL teria supostamente identificado algumas infrações ao Plano Geral de Metas de Universalização (PGMU), aprovado pelo Decreto n. 4.769/03. […] (TRF-2 – AC: 01055883620144025101 RJ 010558836.2014.4.02 .5101, Relator.: GUILHERME CALMON NOGUEIRA DA GAMA, Data de Julgamento: 13/03/2020, 6ª TURMA ESPECIALIZADA)

O julgamento em questão aborda a violação de normas fundamentais relacionadas ao direito à segurança pública. A Telemar foi responsabilizada pela não disponibilização de serviços essenciais, como o acesso gratuito ao telefone para chamadas de emergência, o que comprometeu a eficácia do sistema de segurança da localidade afetada. O Tribunal, ao negar provimento à apelação, reafirmou a importância da regulamentação do setor e da função fiscalizadora da ANATEL, que visa garantir a continuidade e a acessibilidade dos serviços de telecomunicações, especialmente os relacionados à segurança pública.

Portanto, a indisponibilidade do serviço de emergência 190 não é um mero transtorno técnico, mas um fato que compromete gravemente o direito à segurança. Visto que, é um dos pilares estruturantes do Estado Democrático de Direito e impõe ao Estado a obrigação de prevenir tais falhas e reparar eventuais danos que sua omissão venha a causar aos cidadãos.

4.3 RESPONSABILIDADE POR OMISSÃO

Diariamente, muitas pessoas se deparam com situações prejudiciais causadas pela inação do Estado, o que resulta em uma responsabilidade estatal por omissão. Segundo Odete Medauar (2018, p. 367), existe uma certa confusão na doutrina e na jurisprudência nacionais sobre a responsabilidade por omissão, o que dificulta a aplicação clara dessa responsabilidade nos tribunais.

Mediante isso, a teoria da responsabilidade objetiva, sem dúvida, favorece mais os administrados, pois dispensa a necessidade de provar culpa por parte do Estado. Todavia, parte da doutrina, especificamente Carvalho Filho, vai de encontro a essa linha, afirmando que a responsabilidade civil do Estado em caso de omissão só será configurada quando houver elementos que provem a culpa, originada do descumprimento de um dever legal do Poder Público em evitar o dano. Para ele, a teoria da responsabilidade objetiva não é plenamente aplicável nas omissões estatais, como ocorre nas ações comissivas (Carvalho Filho, 2018).

Conforme expõe Bandeira de Mello (2019), a aplicação da teoria subjetiva é clara quando o dano ocorre devido à omissão do Estado. Ele defende que a responsabilidade do Estado só deve ser atribuída quando houver o descumprimento de um dever legal que obrigaria o Poder Público a evitar o evento danoso. Para Mello, quando o dano for possível em decorrência de uma omissão do Estado, é de se aplicar a teoria da responsabilidade subjetiva (Melo, 2019).

A argumentação de Mello é reforçada por ele próprio, ao afirmar que a responsabilidade do Estado por omissão sempre se caracteriza como responsabilidade por ato ilícito. E, como todo ato ilícito, é necessária a análise de culpa ou dolo. Para o autor, a ausência de ação do Estado, especialmente quando há negligência, imprudência ou imperícia, é a base para a responsabilidade subjetiva, uma vez que, mesmo em omissões, o Estado age de maneira ilícita quando não cumpre seu dever de evitar o dano (Mello, 2019).

Mediante isso, vejamos a seguinte jurisprudência:

ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO POR OMISSÃO. MORTE EM DECORRÊNCIA DE DISPARO DE ARMA DE FOGO NO INTERIOR DE HOSPITAL PÚBLICO. AUSÊNCIA DE VIGILÂNCIA. FALHA ESPECÍFICA NO DEVER DE AGIR. EXCLUDENTE DE ILICITUDE. NÃO OCORRÊNCIA. 1. A responsabilidade civil estatal é, em regra, objetiva, uma vez que decorre do risco administrativo, em que não se exige perquirir sobre existência de culpa, conforme disciplinado pelos arts. 14 do Código de Defesa do Consumidor; 186, 192 e 927 do Código Civil; e 37, § 6º, da Constituição Federal. 2. O Superior Tribunal de Justiça, alinhando-se ao entendimento do Excelso Pretório, firmou compreensão de que o Poder Público, inclusive por atos omissivos, responde de forma objetiva quando constatada a precariedade/vício no serviço decorrente da falha no dever legal e específico de agir. 3. A atividade exercida pelos hospitais, por sua natureza, inclui, além do serviço técnico-médico, o serviço auxiliar de estadia e, por tal razão, está o ente público obrigado a disponibilizar equipe/pessoal e equipamentos necessários e eficazes para o alcance dessa finalidade. 4. A análise da responsabilidade civil, no contexto desafiador dos tempos modernos, em que se colocam a julgamento as consequências impactantes das omissões estatais, impõe ao julgador o ônus preponderante de examinar os dispositivos civis referidos, sob o olhar dos direitos e garantias fundamentais do cidadão. 5. Logo, é de se concluir que a conduta do hospital que deixa de fornecer o mínimo serviço de segurança e, por conseguinte, despreza o dever de zelar pela incolumidade física dos pacientes, contribuiu de forma determinante e específica para o homicídio praticado em suas dependências, afastando-se a alegação da excludente de ilicitude, qual seja, fato de terceiro. 6. Recurso especial provido para restabelecer a indenização, pelos danos morais e materiais, fixada na sentença. (STJ – REsp: XXXXX RS XXXXX/XXXXX-9, Data de Julgamento: 24/05/2022, T2 – SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/06/2022).

Mediante ao que se expõe, nesse julgamento, o Tribunal reafirmou que, embora a regra geral preveja a responsabilidade objetiva do Estado com base no risco administrativo, nos casos de omissão específica em que há descumprimento de um dever jurídico concreto o Estado também pode ser responsabilizado de maneira objetiva, desde que demonstrada a relação direta entre a inércia administrativa e o dano sofrido pelo cidadão. O hospital, como espaço sob controle do poder público, possui não apenas o dever de ofertar atendimento médico, mas também de assegurar condições mínimas de segurança aos seus pacientes, evitando riscos previsíveis e controláveis.

A omissão identificada no caso em análise representa uma violação ao princípio da indisponibilidade do interesse público, que impede que a Administração Pública, por escolha ou conveniência, se exima de suas obrigações fundamentais, especialmente quando estão em jogo direitos indisponíveis como a vida e a integridade física.

Di Pietro (2019) argumenta que os danos resultantes da omissão estatal não são causados diretamente pelos agentes públicos, mas por eventos da natureza ou de terceiros que poderiam ter sido evitados ou minimizados se o Estado tivesse atuado conforme sua obrigação legal.

Desse modo, no que diz respeito a Bandeira de Mello (2019), a responsabilidade subjetiva do Estado deve ser analisada com base nas condições estruturais da sociedade e no contexto histórico e social. Ele afirma que a eficiência do Estado deve ser medida conforme as possibilidades reais do ambiente em que o fato danoso ocorreu, levando em consideração o estágio de desenvolvimento tecnológico, econômico e social da época (Mello, 2019).

Por fim, isso implica que, para caracterizar uma falha na Administração, é necessário comparar a intervenção exigida pelo Poder Público com a realidade encontrada na sociedade. Dessa análise, deve-se definir se o Estado possuía uma conduta que seria considerada adequada e, se não o fez, verificar se houve uma falha na atuação administrativa que justifique a responsabilização.

4.4 IMPLICAÇÕES LEGAIS E RESPONSABILIDADES DO ESTADO E DOS PROVEDORES DE SERVIÇOS NA INDISPONIBILIDADE DOS NÚMEROS DE EMERGÊNCIA

Considera-se que a indisponibilidade dos números de emergência, como o 190 (Polícia Militar), 192 (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência – SAMU) e 193 (Corpo de Bombeiros), gera implicações legais profundas tanto para o Estado quanto para os provedores de telecomunicações.

 A responsabilidade do Estado, como prestador de serviços essenciais à população, está diretamente ligada à garantia de acesso a esses serviços, especialmente em momentos de risco à vida e à segurança dos cidadãos. Em casos de falhas no funcionamento desses números, o Estado pode ser responsabilizado, pois, segundo o art. 14 do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/1990), dispõe:

O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos (Brasil, 1990).

Compreende-se, portanto, que em face da responsabilidade do Estado, as operadoras de telecomunicações também têm obrigações estabelecidas pela Lei nº 9.472/1997, que regula o setor de telecomunicações. Elas devem assegurar o funcionamento contínuo e eficiente dos números de emergência, conforme estipulado pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) (Brasil, 1997).

A Resolução nº 740/2020 da Anatel, por exemplo, estabelece regras para garantir que os serviços de emergência sejam acessíveis mesmo em situações de interrupção nos serviços normais, impondo às operadoras a responsabilidade pela continuidade do atendimento nesses momentos críticos (Brasil, 2020).

Outra decisão importante foi a responsabilidade dos provedores de serviços de telecomunicações pela indisponibilidade dos números de emergência em razão da decisão liminar proferida pelo Juízo da 3ª Vara Cível da Comarca de Rio Grande/RS, em 2020. Nessa decisão, a operadora de telefonia Oi S.A. foi obrigada a restabelecer, no prazo de 24 horas, o fornecimento contínuo e de qualidade dos serviços que viabilizam o uso dos números de emergência 190 (Polícia Militar) e 193 (Corpo de Bombeiros) na cidade de Rio Grande/RS. O não cumprimento da medida implicaria em multa de R$ 500 mil por cada hora de descumprimento (Prety, 2025).

A ação foi movida pelo Ministério Público, com base em ofícios recebidos da Promotoria de Justiça Especializada no Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e do Comandante do 6º Batalhão de Policiamento Militar de Rio Grande, que relataram a inoperância do telefone de emergência 190 na região (Prety, 2025).

No ordenamento jurídico brasileiro, a prestação de serviços públicos deve observar critérios de qualidade, segurança, eficiência e continuidade, sobretudo quando se trata de serviços de natureza essencial, como os de emergência. A Lei nº 13.460/2017, que dispõe sobre a participação, proteção e defesa dos direitos dos usuários de serviços públicos, reforça essa obrigatoriedade ao estabelecer que constitui direito básico do cidadão a obtenção de serviços públicos adequados, eficientes, seguros e contínuos (Brasil, 2017). 

Tal disposição está claramente prevista no artigo 6º, inciso II, que assegura ao usuário a prerrogativa de exigir que a Administração Pública mantenha o funcionamento regular e ininterrupto desses serviços, independentemente das dificuldades operacionais enfrentadas pelo ente responsável (Brasil, 2017).

No âmbito da prestação de serviços de telecomunicações, o Poder Judiciário tem reafirmado a importância da responsabilidade civil das operadoras, principalmente quando a falha na execução do serviço atinge diretamente o consumidor seja pessoa física ou jurídica. Um exemplo relevante encontra-se na Apelação Cível nº 0065539-44.2023.8.16.0014, julgada pelo Tribunal de Justiça do Paraná, que trata da suspensão indevida de linhas telefônicas utilizadas em atividade empresarial, fato que gerou danos à imagem e ao funcionamento da empresa:

APELAÇÃO CÍVEL. TELEFONIA. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL CONTRATUAL. PORTABILIDADE DE LINHA TELEFÔNICA. SUSPENSÃO E CANCELAMENTO DAS LINHAS DA AUTORA, UTILIZADAS PARA SUA ATIVIDADE EMPRESARIAL. […] FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DEMONSTRADA. DANO MORAL. PREJUÍZOS À REPUTAÇÃO E À ATIVIDADE COMERCIAL DA AUTORA. SITUAÇÃO QUE ULTRAPASSA O MERO ABORRECIMENTO. PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL PRESENTES. […]” (TJ-PR, Apelação Cível 0065539-44.2023.8.16.0014, Rel. Des. Angela Maria Machado Costa, Julgado em 12/08/2024, 6ª Câmara Cível).

 Desse modo, a decisão reforça que, mesmo em contratos empresariais, a relação de consumo está sujeita ao Código de Defesa do Consumidor quando a parte demandante se encontra em situação de vulnerabilidade, aplicando-se a responsabilidade objetiva. A falha na continuidade do serviço, essencial ao exercício da atividade comercial, representa mais que um simples transtorno: caracteriza violação à confiança legítima do consumidor e enseja reparação pelos danos morais suportados.

Assim, a jurisprudência e a legislação demonstram que a falha na disponibilidade dos números de emergência é uma violação aos direitos dos cidadãos, implicando em responsabilidades legais significativas tanto para o Estado quanto para os provedores de telecomunicações, incluindo possíveis sanções e reparações aos cidadãos prejudicados.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo alcançou o objetivo geral de analisar as implicações legais e as responsabilidades do Estado e dos provedores de serviços de telecomunicações diante da indisponibilidade de números de emergência no Brasil. A pesquisa explorou o impacto dessa indisponibilidade nos direitos fundamentais dos cidadãos, como o direito à saúde e à segurança, e como as falhas na prestação desses serviços essenciais geram implicações diretas para a responsabilização do Estado e das empresas responsáveis pela infraestrutura e operação desses serviços.

A análise dos resultados revelou que a indisponibilidade de serviços de emergência, como os números 190 (Polícia Militar), 192 (SAMU) e 193 (Corpo de Bombeiros), afeta diretamente a integridade física e a vida da população, comprometendo o acesso a serviços essenciais em momentos críticos. Foi constatado que, quando esses serviços ficam fora do ar, os cidadãos ficam expostos a graves riscos, o que caracteriza uma violação dos direitos à saúde e à segurança pública, consagrados na Constituição Federal de 1988.

Em relação à disponibilidade do serviço telefônico 190, que é um dos principais canais de acesso à segurança pública, a pesquisa indicou que sua indisponibilidade compromete o direito à segurança do cidadão. A ausência ou falha no funcionamento desse serviço, especialmente em emergências, evidencia a violação de um direito fundamental, uma vez que a polícia, como parte integrante do sistema de segurança pública, deve ser acionada de forma imediata em casos de ameaça à ordem pública ou à vida.

A discussão aprofundou-se na análise da responsabilidade do Estado e dos provedores de telecomunicações, destacando a responsabilidade por omissão nos casos de falhas na prestação de serviços essenciais. A pesquisa concluiu que o Estado, como garantidor dos direitos fundamentais, tem responsabilidade objetiva nos casos de falha na prestação de serviços de emergência, conforme disposto no artigo 37, §6º da Constituição Federal. Além disso, identificou-se a corresponsabilidade das empresas prestadoras de serviços de telecomunicações, especialmente no que se refere à infraestrutura necessária para garantir o pleno funcionamento dos números de emergência.

As implicações legais são claras: a indisponibilidade dos serviços de emergência resulta na violação dos direitos constitucionais dos cidadãos e implica a responsabilidade tanto do Estado quanto das empresas de telecomunicações. O estudo também apontou que a legislação vigente, junto com a jurisprudência atual, tem buscado garantir a responsabilização em casos de falhas, mas ainda há desafios a serem enfrentados, principalmente em termos de estruturação e adequação dos serviços.

Em conclusão, este estudo contribui para a compreensão dos impactos legais da indisponibilidade dos números de emergência e oferece uma reflexão sobre a necessidade de um sistema mais eficiente e acessível, capaz de garantir a continuidade dos serviços essenciais e a proteção dos direitos dos cidadãos. A responsabilidade, portanto, deve ser compartilhada entre o Estado e os prestadores privados, visando sempre a efetivação dos direitos fundamentais previstos pela Constituição.

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1Acadêmica de Direito. Artigo apresentado à (Faculdade de Direito de Porto Velho-Unisapiens) como requisito para obtenção do título de Bacharel em Direito, Porto Velho/RO, 2024. E-mail:
2Acadêmica de Direito. Artigo apresentado à (Faculdade de Direito de Porto Velho-Unisapiens) como requisito para obtenção do título de Bacharel em Direito, Porto Velho/RO, 2024. E-mail:
3Professor Orientador. Professor Especialista de Direito Processual Penal da Faculdade UniSapiens. E-mail: julio.ugalde@gruposapiens.com.br.