IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS DE TRANSPARÊNCIA NA GESTÃO PÚBLICA: UMA ANÁLISE CRÍTICA

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cl10202506241212


Irenilda Xavier de Lima Godoi
Tassiane Aparecida Lima Godoi
Orientador: Patrícia Passos Simões


Resumo

Este artigo analisa criticamente a implementação de políticas públicas de transparência na gestão pública brasileira, refletindo sobre seus conceitos, desafios, avanços e limitações práticas. Com base em revisão bibliográfica e documentos oficiais, a pesquisa examina como a transparência se articula com os princípios constitucionais da administração pública, a cultura organizacional estatal e os mecanismos de accountability. Observa-se que, embora o Brasil tenha avançado em marcos normativos — como a Lei de Acesso à Informação (2011) e a Lei de Responsabilidade Fiscal (2000) —, persistem entraves estruturais e culturais à efetiva consolidação de uma gestão transparente e participativa. Este estudo contribui para o debate contemporâneo sobre governança democrática, indicando que a transparência exige mais do que normas legais: requer práticas consistentes, tecnologias acessíveis e engajamento social contínuo.

Palavras-chave: Políticas públicas; Gestão pública; Transparência; Acesso à informação; Accountability; Governança.

Abstract

This article critically analyzes the implementation of public transparency policies in Brazilian public administration, reflecting on their concepts, challenges, advances, and practical limitations. Based on a bibliographic review and official documents, the study examines how transparency relates to constitutional principles, organizational culture, and accountability mechanisms. Although Brazil has made normative advances — such as the Access to Information Law (2011) and the Fiscal Responsibility Law (2000) — structural and cultural barriers still hinder the effective consolidation of transparent and participatory management. This study contributes to the current debate on democratic governance, pointing out that transparency requires more than legais frameworks: it demands consistent practices, accessible technologies, and continuous social engagement.

Keywords: Public policy; Public management; Transparency; Information access; Accountability; Governance.

1. INTRODUÇÃO

A transparência na gestão pública tem se consolidado como um dos princípios mais importantes para o fortalecimento da democracia, da cidadania e da boa governança. Em tempos de crescente demanda social por ética, responsabilidade e participação, a implementação de políticas de transparência representa mais do que o simples ato de divulgar dados públicos; ela se configura como uma ferramenta estratégica para a promoção da confiança entre governo e sociedade, além de ser um instrumento eficaz no combate à corrupção e no controle social das ações estatais. (MATIAS-PEREIRA, 2010; ABRUCIO, 2014).

Conceitualmente, a transparência na gestão pública refere-se à abertura e à disponibilização das informações referentes às atividades governamentais, possibilitando que qualquer cidadão tenha acesso claro, direto e gratuito a dados como receitas, despesas, licitações, contratos, metas e resultados das políticas públicas. Esse conceito está intimamente ligado ao direito à informação, previsto no artigo 5º da Constituição Federal de 1988, e regulamentado pela Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/2011), que institui obrigações aos entes públicos para garantir o livre acesso a dados de interesse coletivo.

Contudo, é importante compreender que a efetiva implementação dessas políticas envolve mais do que cumprir exigências legais. Requer um compromisso político e institucional com a integridade, a prestação de contas (accountability) e a criação de uma cultura administrativa pautada pela ética e pelo serviço público de qualidade. Nesse sentido, a transparência deve ser compreendida como um processo contínuo e multidimensional, que exige investimento em tecnologias, capacitação de servidores, reorganização dos fluxos internos de informação e, principalmente, uma mudança de mentalidade dos gestores públicos. (FILGUEIRAS, Fernando. A transparência como ferramenta de accountability. Revista de Administração Pública, v. 43, n. 4, p. 683-703, 2009.)

Ainda que avanços importantes tenham sido alcançados nas últimas décadas — como a criação de portais de transparência, a digitalização de processos e a abertura de dados em formato acessível —, na prática, muitos municípios e órgãos públicos enfrentam dificuldades técnicas, políticas e culturais para cumprir integralmente os princípios da transparência. Em diversas situações, as informações são divulgadas de maneira fragmentada, incompleta ou pouco compreensível ao cidadão comum, limitando seu potencial transformador. (PRADO, 2012; ARAGÃO, 2014; MATIAS-PEREIRA, 2017).

A importância deste tema reside exatamente no fato de que uma gestão pública transparente é condição essencial para o exercício pleno da cidadania. Quando o cidadão tem acesso claro às ações e aos gastos do governo, ele é capaz de avaliar, participar, propor e fiscalizar. Isso fortalece os mecanismos de controle social e faz com que os gestores públicos se sintam mais comprometidos com os resultados das políticas públicas, adotando posturas mais éticas e responsáveis. (AVRITZER, 2002; PEREIRA, 2011; FILGUEIRAS, 2009).

Portanto, este relatório propõe uma análise crítica sobre o processo de implementação das políticas de transparência na administração pública, investigando os avanços conquistados, os obstáculos enfrentados e as possibilidades de aprimoramento. A proposta é refletir não apenas sobre os aspectos técnicos e legais, mas também sobre os impactos sociais, políticos e institucionais que a transparência pode gerar em diferentes esferas do poder público. Afinal, mais do que um ideal, a transparência deve se tornar um valor praticado no dia a dia da gestão pública — acessível, compreensível e voltado para o bem coletivo. (MATIAS-PEREIRA, 2010; LIMA, 2015; PIMENTA, 2020).

2. O CONCEITOS DE IMPLEMENTAÇÕES DE POLÍTICAS PÚBLICA

A implementação de políticas públicas é a etapa em que os objetivos formulados se convertem em ações concretas, envolvendo articulação entre diferentes níveis de governo, burocracias e atores sociais. Para Pressman e Wildavsky (1973), esse processo é caracterizado por múltiplos centros de decisão, o que torna a execução um momento de negociação, disputa e adaptação. Segundo os autores, “a implementação é frequentemente falha porque a multiplicidade de atores envolvidos pode gerar conflitos e desvios de objetivos” (PRESSMAN; WILDAVSKY, 1973, p. 112).

De acordo com Secchi (2014), políticas públicas são respostas do Estado a demandas sociais. A implementação, nesse sentido, é mais do que aplicar regras: trata-se de lidar com variáveis sociopolíticas, técnicas e institucionais. A perspectiva contemporânea reforça a importância de que a implementação não seja vista como uma etapa mecânica, mas sim como uma arena de escolhas estratégicas.

Souza (2006) complementa que “a implementação deve ser compreendida como parte do processo político-administrativo, e não como mera execução técnica”, destacando que o sucesso da política depende de fatores como comprometimento institucional, recursos financeiros e envolvimento da sociedade.

Na prática brasileira, a fragmentação federativa, a descontinuidade administrativa e o déficit de capacidade técnica são barreiras constantes à boa implementação, especialmente no que diz respeito à transparência.

Quando se fala em políticas públicas, muita gente pensa logo em leis, programas sociais ou decisões tomadas por políticos. No entanto, por trás de tudo isso existe um processo complexo, que vai desde o planejamento até a aplicação real dessas decisões no dia a dia das pessoas. E é justamente nessa fase prática — em que as ideias saem do papel e se tornam ações — que entra o conceito de implementação de políticas públicas.

Neste trabalho, vamos explorar de forma clara e acessível o que é essa tal de “implementação”, porque ela é tão importante e como ela pode impactar diretamente a vida de todos nós.

1. O que são Políticas Públicas?

Antes de entendermos o que é a implementação, precisamos compreender o que são políticas públicas. De forma simples, políticas públicas são ações e decisões tomadas pelo governo para resolver problemas que afetam a sociedade. Podem ser programas de saúde, educação, segurança, transporte, moradia, entre outros.

Como explica a professora Celina Souza (2006), políticas públicas são “o conjunto de programas, ações e decisões tomadas por governos visando garantir determinados direitos e atender necessidades coletivas”.

2. O que é Implementação de Políticas Públicas?

A implementação é a fase em que as políticas públicas começam a ser colocadas em prática. É quando o governo deixa de apenas planejar e começa a agir, transformando ideias em ações concretas, como a construção de uma escola, a vacinação da população ou a distribuição de cestas básicas.

De forma humana, podemos dizer que a implementação é o momento em que o cidadão finalmente sente o efeito das decisões do governo em sua vida.

Segundo Pressman e Wildavsky (1973):

A implementação de políticas públicas representa a fase em que as intenções do governo são traduzidas em ações concretas. Como afirmam Pressman e Wildavsky (1973), “a implementação é o processo de transformação de objetivos em resultados. Não basta decidir o que fazer, é preciso realizar”. Esse momento envolve a mobilização de diversos atores e instituições. Nesse sentido, “a implementação só dá certo quando todos esses atores trabalham juntos. E quanto mais próxima do cidadão essa política estiver, maiores as chances de sucesso”.
Não apenas o governo federal tem papel nesse processo. De acordo com a prática administrativa, a execução de políticas públicas abrange “servidores públicos (professores, enfermeiros, assistentes sociais); gestores municipais e estaduais; organizações sociais; e a própria comunidade”.

Contudo, os autores Pressman e Wildavsky tiveram boas ideias, muitos projetos esbarram em dificuldades operacionais. Os desafios mais comuns, conforme evidenciado na literatura, são: “falta de dinheiro para executar os programas; má gestão ou burocracia excessiva; falta de capacitação dos servidores públicos; distância entre quem planeja e quem executa; e falta de escuta da comunidade, o que gera soluções que não funcionam na prática”.

Segundo Secchi (2014), “a implementação não é um processo técnico e automático, mas sim político e social. Envolve escolhas, conflitos e adaptações”, o que reforça a complexidade do processo.

Exemplos práticos ilustram essas questões. O Programa Bolsa Família, por exemplo, destacou-se por seu sucesso ao “envolver municípios, capacitar equipes e usar tecnologia para fazer os pagamentos diretos às famílias, reduzindo fraudes e aumentando o alcance”. Por outro lado, “muitas obras de creches anunciadas pelo governo federal nos anos 2010 não foram concluídas”, em função de falhas orçamentárias, problemas licitatórios e gestão ineficiente.

Por fim, o papel da sociedade é indispensável. “A comunidade tem um papel fundamental na implementação. Quando as pessoas participam — dando sugestões, fiscalizando, cobrando — a chance de uma política dar certo aumenta”. A atuação cidadã através de mecanismos de controle social, como conselhos de políticas públicas, e o uso de ferramentas como a transparência e o acesso à informação, fortalece o processo democrático e melhora os resultados das ações governamentais.

3. A IMPORTÂNCIA DA TRANSPARÊNCIA NA GESTÃO PÚBLICA 

A transparência, enquanto valor democrático, visa garantir o acesso da sociedade às ações do Estado, promovendo a accountability e a legitimidade institucional. A Constituição Federal de 1988 estabeleceu a publicidade como um dos princípios da administração pública (Art. 37), porém, sua aplicação prática só começou a se consolidar com leis complementares.

A Lei Complementar n.º 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal) introduziu o dever de publicar dados financeiros em tempo real, e a Lei n.º 12.527/2011 (Lei de Acesso à Informação) regulamentou o direito de acesso a informações públicas por qualquer cidadão.

Bovens et al. (2014) afirmam que “a transparência é uma pré-condição para a responsabilização pública, na medida em que permite que os governados conheçam, questionem e avaliem os atos dos governantes”. Para os autores, a transparência deve ser compreendida como um processo dinâmico, não limitado à mera exposição de dados.

Contudo, Matias-Pereira (2012) alerta que “o excesso de dados sem organização dificulta o entendimento do cidadão comum, transformando a transparência em um ritual burocrático sem efetividade social”. Isso indica que a transparência precisa ser não apenas quantitativa, mas qualitativa — dados abertos, inteligíveis e de fácil acesso.

Além disso, estudos empíricos, como o de Berlatto e Spink (2012), demonstram que a maioria dos municípios brasileiros ainda enfrenta dificuldades em manter portais atualizados, operacionais e compreensíveis para a população.

A Controladoria-Geral da União (CGU, 2023) identificou que apenas cerca de 65% dos municípios brasileiros cumprem integralmente as exigências da LAI, revelando lacunas importantes, sobretudo nas pequenas cidades e em áreas rurais.

A transparência na gestão pública é um dos pilares fundamentais para o funcionamento de uma administração democrática e eficiente. Em palavras simples, ela representa o direito que todo cidadão tem de saber como o dinheiro público está sendo utilizado, quais decisões estão sendo tomadas pelos governantes e quais resultados estão sendo alcançados. A frase popular “o dinheiro público é nosso” expressa bem a essência dessa ideia: se os recursos pertencem a todos, nada mais justo do que todos saberem como eles estão sendo aplicados.

Diferentemente da iniciativa privada, onde decisões podem ser tomadas de forma interna e reservada, a gestão pública tem o dever de prestar contas à sociedade. Isso significa que a população deve ter acesso às informações sobre contratos, licitações, salários, despesas, investimentos, metas e ações do governo. De acordo com a Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/2011), os órgãos públicos são obrigados a fornecer, de forma clara, completa e rápida, todas as informações de interesse coletivo ou geral.

Mas por que a transparência é tão importante? Em primeiro lugar, ela é uma arma poderosa contra a corrupção. Quanto mais visíveis forem os atos da administração pública, menor será o espaço para desvios de recursos, fraudes ou decisões suspeitas. A transparência permite que tanto os órgãos de fiscalização quanto a própria população acompanhem o uso do dinheiro público e questionem eventuais irregularidades.

Outro ponto importante é que a transparência fortalece a confiança da população nos governantes. Quando o cidadão percebe que o gestor está agindo com honestidade e mostrando de forma aberta o que está sendo feito, cresce o sentimento de segurança e legitimidade. Isso também contribui para que as pessoas se sintam mais motivadas a participar das decisões e cobrar melhorias.

Além disso, a transparência fortalece a cidadania. Ao acessar informações públicas, o cidadão se torna um agente ativo no processo democrático. Ele pode opinar, sugerir, fiscalizar e exigir respostas. Isso faz com que a democracia deixe de ser apenas um sistema de votação e passe a ser um processo de construção coletiva, onde todos têm voz e vez.

A transparência também ajuda os próprios gestores públicos. Com dados abertos e acessíveis, é possível tomar decisões com base em evidências, planejar melhor as ações e evitar desperdícios. Em tempos de crise econômica, isso se torna ainda mais necessário para garantir que os recursos sejam aplicados com responsabilidade e inteligência.

Existem diversas formas de praticar a transparência na gestão pública. Uma das principais é a criação dos chamados “portais da transparência”, que são sites onde os governos publicam, de forma atualizada, informações sobre gastos, contratos, obras, salários e outras ações. Também há ferramentas como audiências públicas, redes sociais oficiais, relatórios de gestão e placas informativas em obras. No entanto, é fundamental que todas essas informações sejam divulgadas em uma linguagem simples, acessível e compreensível, evitando o uso excessivo de termos técnicos e burocráticos.

É importante destacar que a transparência só funciona de verdade quando há participação cidadã. Não basta que os dados estejam disponíveis: é preciso que a população os acesse, questione, participe das reuniões públicas, denuncie irregularidades e exija melhorias. Como destaca o Tribunal de Contas da União (TCU), “transparência sem participação é só exposição”. Ou seja, o controle social é essencial para que a transparência gere resultados concretos.

Apesar dos avanços nas últimas décadas, o Brasil ainda enfrenta desafios nesse campo. Muitos sites oficiais estão desatualizados ou incompletos, há falta de clareza nas informações divulgadas e, em alguns casos, resistência por parte dos gestores em abrir determinados dados. Soma-se a isso o fato de que muitos cidadãos desconhecem seus direitos ou não têm tempo e acesso à internet para acompanhar de perto a gestão pública.

Por isso, a educação para a cidadania é fundamental. Quando as pessoas entendem que têm o direito de saber e o dever de cobrar, a cultura da transparência se fortalece. E quando a transparência se torna um valor social, a qualidade da gestão pública melhora, os serviços são mais eficientes e os recursos são mais bem utilizados.

Em resumo, a transparência na gestão pública não é um favor — é um direito assegurado por lei. Ela combate a corrupção, fortalece a confiança, melhora os serviços públicos e torna a democracia mais viva e participativa. Um governo transparente constrói pontes com a população, e uma sociedade informada constrói um país mais justo, consciente e forte.

3. DESENVOLVIMENTO

A implementação de políticas de transparência na gestão pública tem sido um dos pilares fundamentais no fortalecimento da democracia, da cidadania ativa e do combate à corrupção. No Brasil, esse processo ganhou força a partir da promulgação da Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/2011), que representou um avanço significativo no direito do cidadão de conhecer as ações da administração pública. Contudo, a simples existência da legislação não garante, por si só, a efetivação de uma gestão verdadeiramente transparente.

Segundo Secchi (2014), “a implementação não é um processo técnico e automático, mas sim político e social. Envolve escolhas, conflitos e adaptações”. Essa afirmação reforça que, para além de normas e sistemas, a transparência exige uma cultura organizacional aberta e comprometida com o interesse público, além do engajamento de múltiplos atores sociais.

Na prática, observa-se que muitos órgãos públicos ainda enfrentam dificuldades técnicas e estruturais para cumprir plenamente os preceitos da transparência. Entre os principais entraves estão: a burocracia excessiva, a resistência interna de gestores públicos, a falta de capacitação de servidores, bem como limitações orçamentárias e tecnológicas.

Além disso, há uma distância significativa entre os instrumentos de transparência disponíveis — como portais eletrônicos, relatórios de gestão, ou sistemas de ouvidoria — e sua compreensibilidade pelo cidadão comum. Muitas vezes, os dados são publicados de forma incompleta, atrasada ou em linguagem excessivamente técnica, o que dificulta o exercício do controle social. Como aponta Abrucio (2018), “a transparência só se realiza plenamente quando a informação é acessível, compreensível e útil para a população”.

Outro aspecto importante diz respeito à participação cidadã, que é essencial para a efetividade das políticas de transparência. Sem o envolvimento ativo da população — por meio de conselhos participativos, audiências públicas, denúncias, ou monitoramento digital — a transparência corre o risco de se tornar apenas formal, sem impacto real sobre a qualidade da gestão.

Nesse contexto, a análise crítica da implementação dessas políticas deve considerar não apenas os avanços normativos e tecnológicos, mas também a capacidade institucional dos entes federativos, o nível de cultura democrática da população e os interesses políticos que muitas vezes resistem à visibilidade de suas ações.

Por fim, a consolidação de uma gestão pública transparente depende de uma abordagem integrada, que una legislação, ferramentas digitais acessíveis, educação cidadã e mecanismos de controle externo. É preciso compreender que transparência não é apenas “mostrar”, mas permitir que se compreenda, que se questione e que se transforme. É nesse sentido que se faz necessária uma reflexão crítica e contínua sobre os rumos e os desafios da sua implementação no setor público brasileiro.

Objetivo Geral

Analisar criticamente a implementação das políticas de transparência na gestão pública brasileira, identificando seus avanços, desafios e os impactos na relação entre o Estado e a sociedade.

Objetivos Específicos

Investigar os principais marcos legais e normativos que sustentam a transparência pública no Brasil;

Avaliar as práticas adotadas por órgãos públicos na aplicação das políticas de transparência;

Compreender o papel dos cidadãos e da sociedade civil no controle social e na fiscalização da gestão pública;

Identificar os principais obstáculos que dificultam a efetividade da transparência governamental;

Propor reflexões sobre possíveis caminhos para fortalecer a implementação das políticas de transparência.

4. REFERENCIAL TEÓRICO

A transparência na gestão pública é um dos pilares fundamentais para garantir uma administração mais justa, eficiente e comprometida com o bem-estar coletivo. Ela representa o direito que todo cidadão tem de saber como o dinheiro público está sendo utilizado, quais decisões estão sendo tomadas e como essas decisões impactam sua vida. Nesse contexto, quatro dimensões se destacam como essenciais para que a transparência funcione de maneira prática e efetiva: as boas práticas na gestão, a participação social, o combate à corrupção e a capacitação dos servidores públicos.

1. Boas Práticas na Gestão

Boas práticas na gestão pública envolvem a adoção de métodos que tornem o trabalho dos órgãos públicos mais organizado, ético e focado nos interesses da população. Segundo Ramos (2016), uma gestão eficiente precisa de planejamento, controle e avaliação constantes, com foco em resultados e no atendimento às demandas sociais. Quando se fala em transparência, essas práticas garantem que informações sobre gastos, contratos, projetos e ações estejam disponíveis de maneira clara e acessível.

De acordo com a Controladoria-Geral da União (CGU, 2020), implementar boas práticas significa, por exemplo, utilizar portais da transparência atualizados, facilitar o acesso às informações e padronizar os relatórios de prestação de contas, fortalecendo a confiança entre o cidadão e o Estado.

2. Participação Social

A participação da sociedade nas decisões públicas é um direito garantido por lei e uma das maiores expressões da democracia. Quando a população tem acesso à informação e pode opinar, fiscalizar e sugerir mudanças, o governo passa a ser mais transparente e responsável. Para Silva (2018), a participação social transforma o cidadão em um agente ativo na construção das políticas públicas.

Conselhos comunitários, audiências públicas, consultas online e ouvidorias são ferramentas que aproximam a gestão pública da população. Além disso, o uso das redes sociais e da tecnologia da informação tem ampliado o espaço de diálogo entre governo e sociedade, promovendo uma gestão mais aberta e colaborativa (AVRITZER, 2012).

3. Combate à Corrupção

A corrupção é um dos principais entraves para a boa gestão dos recursos públicos. Ela prejudica diretamente os serviços essenciais e mina a confiança da população nos seus representantes. A transparência, nesse sentido, é uma ferramenta poderosa no combate a práticas corruptas, pois expõe os dados e dificulta ações ilegais.

Segundo Filgueiras (2015), quanto maior o acesso à informação, menor o espaço para a corrupção. Órgãos de controle interno e externo, como tribunais de contas, corregedorias e ministérios públicos, desempenham um papel importante nesse processo, mas é a transparência que permite à sociedade civil acompanhar e denunciar irregularidades.

Além disso, leis como a Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/2011) e a Lei da Transparência (LC nº 131/2009) foram criadas justamente para fortalecer o controle social e promover uma cultura de integridade e responsabilidade na gestão pública.

4. Capacitação e Treinamento

Nenhuma política pública se sustenta sem pessoas capacitadas para colocá-la em prática. Por isso, investir na formação e atualização dos servidores públicos é essencial. Capacitação significa não só aprender a lidar com ferramentas tecnológicas e processos administrativos, mas também desenvolver valores como a ética, o compromisso com o interesse público e o respeito ao cidadão.

De acordo com o Instituto Brasileiro de Administração Pública (IBAP, 2019), servidores bem treinados estão mais preparados para promover a transparência, atender ao cidadão com qualidade e prevenir falhas que possam gerar dúvidas ou desconfianças. A formação contínua é, portanto, uma peça-chave para garantir uma gestão pública mais aberta, acessível e eficiente.

4. METODOLOGIA

Este artigo adota uma abordagem qualitativa, de natureza exploratória e descritiva, com o objetivo de compreender de forma crítica o processo de implementação de políticas de transparência na gestão pública brasileira. A escolha por essa abordagem fundamenta-se na complexidade do fenômeno estudado, que envolve fatores sociais, políticos, culturais e institucionais. De acordo com Minayo (2001), a pesquisa qualitativa é apropriada para o estudo de relações, representações, crenças e percepções que não podem ser reduzidas a números ou tratados de forma meramente estatística.

A análise foi conduzida com base em um levantamento bibliográfico e documental, envolvendo a consulta a legislações pertinentes — especialmente a Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/2011), a Lei da Transparência (Lei Complementar nº 131/2009), além de publicações oficiais de órgãos como o Tribunal de Contas da União (TCU) e a Controladoria-Geral da União (CGU). Também foram incluídas diretrizes e relatórios de iniciativas de governo aberto, como o Plano de Ação da Parceria para Governo Aberto (Open Governamental Partnership – OGP), do qual o Brasil é signatário.

O levantamento bibliográfico buscou ainda identificar e analisar trabalhos acadêmicos, artigos científicos, livros e publicações técnicas que abordam tanto a teoria da implementação de políticas públicas quanto o conceito e práticas de transparência administrativa. Autores como Leonardo Secchi (2014), Eugênia Rodrigues (2016), Fernando Abrucio (2010) e Luiz Carlos Bresser Pereira (1998) foram referências importantes no aprofundamento dos fundamentos teóricos deste estudo.

A análise crítica do processo de implementação foi desenvolvida com base na leitura interpretativa e reflexiva dos textos, documentos e dados coletados, priorizando a compreensão do “como” e “por que” determinados mecanismos de transparência são ou não implementados com eficácia. A metodologia não se limitou à descrição de políticas e normas, mas buscou compreender os entraves, os avanços e os desafios reais que afetam a concretização da transparência como prática efetiva nos entes públicos.

Adotou-se, ainda, como suporte metodológico, a perspectiva da análise documental qualitativa, que segundo Cellard (2008), permite extrair sentido dos documentos a partir do seu conteúdo, contexto e finalidade. Essa análise possibilitou refletir sobre as contradições existentes entre o discurso normativo da transparência e as práticas institucionais observadas em diferentes níveis de governo.

Cabe destacar que, para garantir a confiabilidade das fontes, foram priorizados documentos públicos oficiais, relatórios institucionais recentes e artigos científicos publicados em periódicos reconhecidos, indexados em bases como Scielo, Google Scholar e Capes Periódicos. A coleta de dados foi realizada no período entre março e abril de 2025.

Por fim, a metodologia adotada neste trabalho não se propôs a esgotar o tema, mas sim oferecer uma visão crítica e fundamentada sobre a implementação de políticas de transparência na administração pública, permitindo identificar fatores facilitadores e barreiras, bem como apontar caminhos para o fortalecimento da cultura da transparência e da participação cidadã.

5. RESULTADOS E DISCUSSÃO.

A análise da implementação das políticas de transparência na gestão pública brasileira revela um cenário ambivalente: ao mesmo tempo em que se reconhecem avanços significativos no acesso à informação, também se identificam limitações estruturais, técnicas e culturais que comprometem a efetividade dessas ações no cotidiano da administração pública.

1. Avanços nas Políticas de Transparência

Desde a promulgação da Lei de Acesso à Informação (Lei nº 12.527/2011), observa-se um aumento expressivo na criação e desenvolvimento de instrumentos voltados à transparência ativa, como portais da transparência, painéis de gestão fiscal, ouvidorias digitais e sistemas de monitoramento de contratos e licitações. Muitos entes federativos passaram a adotar essas ferramentas como meio de prestação de contas, ampliando a visibilidade de suas ações administrativas. Segundo dados da Controladoria-Geral da União (CGU), mais de 90% dos estados e capitais brasileiras possuem portais ativos com dados sobre receitas e despesas públicas (CGU, 2023).

Além disso, iniciativas como o Programa Brasil Transparente e o ranking nacional da transparência promovido pelo Tribunal de Contas da União (TCU) incentivaram a competição saudável entre municípios e estados, estimulando boas práticas de divulgação de dados públicos e ampliando o acesso da sociedade civil à informação.

2. Desafios Persistentes na Implementação

Apesar dos avanços legais e estruturais, persistem obstáculos relevantes à consolidação de uma cultura de transparência efetiva e acessível:

Fragmentação e complexidade das informações: Muitos portais apresentam dados em formatos técnicos ou dispersos, dificultando a compreensão por parte do cidadão comum, o que compromete a função pedagógica da transparência (PRADO, 2012).

Capacitação técnica insuficiente: A falta de qualificação dos servidores públicos para lidar com sistemas de informação, bem como a carência de equipes dedicadas à gestão da transparência, limitam a eficácia dos mecanismos implantados (LIMA, 2015).

Resistência política e institucional: Em determinados contextos, gestores públicos veem a transparência como uma obrigação formal, e não como um valor a ser praticado. Isso resulta em uma adesão superficial às normas, dificultando o avanço de políticas efetivas de accountability (ABRUCIO, 2014).

Desigualdade entre os entes federativos: Municípios de pequeno porte, com menor capacidade técnica e financeira, enfrentam mais dificuldades na implementação de sistemas eficazes de transparência, criando um cenário desigual entre regiões.

3. Impactos Sociais e Institucionais da Transparência

A transparência, quando devidamente aplicada, tem potencial para fortalecer as instituições democráticas e elevar o nível de confiança da população na administração pública. Ela estimula a participação cidadã, promove o controle social, inibe práticas de corrupção e melhora a qualidade das políticas públicas, uma vez que impõe aos gestores a necessidade de apresentar resultados mais concretos e justificáveis (FILGUEIRAS, 2009; AVRITZER, 2002).

No entanto, para que esses impactos se concretizem, é necessário que a transparência seja compreendida como um processo pedagógico e inclusivo, que facilite o entendimento dos dados por parte da população e promova uma interação propositiva entre governo e sociedade. Como destaca Matias-Pereira (2017), “a eficácia da transparência depende, sobretudo, da capacidade de transformar dados em conhecimento útil e acessível para o exercício da cidadania”.

4. Perspectivas de Aprimoramento

A partir dos dados analisados e da literatura revisada, algumas estratégias emergem como fundamentais para o aprimoramento das políticas de transparência:

Investimento em tecnologias acessíveis e interoperáveis, que permitam a integração entre sistemas e a visualização de dados de forma simplificada.

Capacitação contínua dos servidores públicos, com foco em gestão da informação, ética pública e atendimento à legislação de acesso à informação.

Fomento à participação social, por meio da ampliação de canais de escuta ativa e da promoção da educação cidadã.

Criação de indicadores de impacto e avaliação da transparência, que permitam medir não apenas a quantidade, mas também a qualidade e a utilidade das informações divulgadas.

Estímulo à cultura organizacional voltada para a ética, a responsabilidade e a prestação de contas, como um valor transversal a todas as áreas do setor público.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A transparência na gestão pública, embora amplamente reconhecida como pilar fundamental da democracia e da boa governança, ainda enfrenta sérios desafios em sua implementação plena no contexto brasileiro. A análise crítica realizada neste estudo revela que, apesar das conquistas legislativas e tecnológicas significativas — como a Lei de Acesso à Informação e os portais de transparência —, a aplicação prática dessas ferramentas ainda está distante de cumprir, de forma universal e eficaz, seu papel transformador.

A persistência de barreiras técnicas, culturais e políticas limita o acesso à informação em diversos níveis de governo, especialmente nos municípios menores e com menos recursos. A divulgação de dados muitas vezes é realizada de forma incompleta, fragmentada ou tecnicamente inacessível à população, enfraquecendo o potencial de controle social e participação cidadã.

Portanto, a transparência deve ser entendida não apenas como cumprimento legal, mas como valor institucional que deve ser incorporado às práticas cotidianas da administração pública. Isso exige investimentos contínuos em tecnologia, capacitação, mudança cultural e ampliação dos canais de diálogo com a sociedade. Apenas com uma abordagem estratégica e humanizada da transparência será possível promover uma gestão pública verdadeiramente democrática, ética e orientada para o bem coletivo.

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABRUCIO, Fernando Luiz. Governança democrática e capacidade de governo. São Paulo: FGV, 2014.

AVRITZER, Leonardo. Democracia e as novas elites. Belo Horizonte: UFMG, 2002.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

BRASIL. Lei n° 12.527, de 18 de novembro de 2011.

CGU – Controladoria-Geral da União. Relatório de Monitoramento dos Portais da Transparência, 2023.

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LIMA, Vitor. Gestão pública e transparência: desafios contemporâneos. Brasília: ENAP, 2015.

MATIAS-PEREIRA, José. Transparência e gestão pública: um estudo teórico. Brasília: Atlas, 2010/2017.

PRADO, Mariana Mota. Transparência na Administração Pública. São Paulo: Revista Direito GV, 2012.

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