GUARDA COMPARTILHADA DE ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7436456


Amábia Nicolly Silva Vinhal
Professora Orientadora: Me. Aline Muniz


RESUMO

O presente trabalho tratou-se sobre a guarda compartilhada de animais de estimação, dando ênfase na grande evolução histórica que se obteve através do tempo, em relação ao lugar do animal nas famílias englobando também as questões afetivas, observando que houve um aumento relevante no número de animais de estimação presente nos lares das famílias brasileiras. Ao que se refere às questões jurídicas concernentes de como ficaria a situação dos animais de estimação, logo após uma dissolução dos cônjuges, ainda há uma grande discussão, tendo em vista a ausência de uma regulamentação através do ordenamento jurídico, sendo assim, existem algumas diferentes visões de quais requisitos serão identificados para haver uma determinação judicial, exaltando sempre o melhor para o bem estar do animal. A presente pesquisa terá apresentação de dados, acerca da problemática presente nesse trabalho, a metodologia usada será de caráter explicativa, pois visa demonstrar situações decorrentes, evidenciando casos, conflitos, e necessidades acerca de um determinado assunto, apresentando também soluções. A utilizar-se de dados vindos de fontes secundárias como livros, artigos científicos e pesquisas bibliográficas.

Palavras chave: Evolução histórica dos animais, tutela dos animais, família multiespécie.

ABSTRACT

The present work was about the shared custody of pets, emphasizing the great historical evolution that is obtained through time, in relation to the place of the animal in families, also encompassing as affective issues, noting that there was a relevant increase in the number of pets present in the homes of Brazilian families. Regarding the legal issues concerning how the situation of pets would be, right after the dissolution of the spouses, there is still a great discussion, in view of the existence of a regular through the legal system, therefore, there are some different ones visions of requirements will be determined to have a judicial determination, always extolling the best for the welfare of the animal. The present research will have data presentation, about the problematic present in this work, the methodology used will be of an explanatory character, since it aims to demonstrate arising situations, highlighting cases, conflicts, and needs about a certain subject, also presenting solutions. Using data from secondary sources such as books, scientific articles and bibliographic research.

KEYWORDS: Historical evolution of animals, guardianship of animals, well-being.

INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas, o comportamento do ser humano para com os animais, evoluiu bastante, principalmente na questão de tratamento e afetividade, já que muitos consideram esses bichos de estimação, como integrante da família, inclusive há de se falar, em uma nova configuração familiar, que é chamada de família multiespécie, se tratando de quando o animal é considerado e reconhecido como parte do grupo familiar (FARACO, 2008).

Esse avanço social teve grande influência no cotidiano das pessoas, havendo então grandes discussões concernentes à relação entre o ser humano e os animais de estimação, e devido a isso, cada vez mais tem sido freqüente, a busca das pessoas no ordenamento jurídico, com o intuito de solucionar questões concernentes à guarda dos animais de estimação.

A intenção principal desse trabalho é fazer com que o leitor entenda as possíveis soluções judiciais, e também acerca das discussões englobadas pelo ordenamento jurídico, envolvendo conflitos dos animais domésticos, tendo em vista a nova posição que os animais de estimação tem tomado nas famílias da sociedade contemporânea, frente à essas mudanças e discussões, o tema é recente, e deve ser discutido e analisado.

A presente pesquisa terá apresentação de dados, acerca da problemática presente nesse trabalho, a metodologia usada será de caráter explicativa, pois visa demonstrar situações decorrentes, evidenciando casos, conflitos, e necessidades acerca de um determinado assunto, apresentando também soluções. A utilizar-se de dados vindos de fontes secundárias como livros, artigos científicos e pesquisas bibliográficas.

Deste modo, levantadas as considerações finais ao que se refere à metodologia, o intuito é demonstrar fatos decorrentes acerca da guarda compartilhada de animais de estimação, e a necessidade de uma regulamentação no ordenamento jurídico.

No capítulo um foi, foi tratado acerca do Instituto de guarda no Brasil, atentando-se aos avanços e mudanças que houve, fazendo uma análise histórica da legislação brasileira concernentes à guarda, além de enfatizar sua inovação.

No capítulo dois, foi tratado acerca da histórica relação social do ser humano e os animais, enfatizando a forma que evoluiu no aspecto de cuidado e afeto de um

para com o outro, além de demonstrar a trajetória da evolução humana, e também a situação dos animais perante a legislação brasileira, tendo em vista que o direito e proteção dos animais, foi um assunto que repercutiu bastante nos últimos anos, pois há projetos em pautas, relacionado aos maus tratos de cães e gatos, e também questões concernentes à guarda.

No capítulo três, foi abordado questões concernentes à regulamentação da guarda dos animais de estimação, analisando os fatos comuns, e também pelo aspecto jurídico, além de situações que ocorreram, levando em consideração os conflitos gerados, acerca da ausência do ordenamento jurídico se tratando dessas questões, e a forma como as quais têm sido solucionada, e as considerações levadas em conta, por parte do poder judiciário.

1. O INSTITUTO DA GUARDA NO BRASIL

A grande mudança social e histórica no Brasil ecoou juntamente nos institutos jurídicos, bem como ao que se refere à guarda. Uma vez que o casamento era fortemente considerado um instituto sagrado, o qual enfatizava as distintas obrigações de homens e mulheres concernentes ao âmbito familiar. Naquele período de meados do século XX, o homem tinha a obrigação de buscar o sustento da família e a mulher incubia a responsabilidade de cuidar da casa e de todos os afazeres domésticos, além da educação dos filhos, recaindo sobre ela também, a submissão a todas as vontades do homem.

O divórcio foi instituído no Brasil dia 28 de junho de 1977, que foi a partir daí que o matrimônio passou a ter mudanças com base na dissolução de muitos vínculos conjugais e então surgiu uma necessidade de uma nova regulamentação sobre guarda.

Tendo em vista que a mãe sempre ficava incumbida dos cuidados de casa e dos filhos, a sociedade já enxergava que após uma separação conjugal, o filho continuaria com a mãe, porém ao poucos o pai foi tendo uma participação mais ativa na vida dos filhos e isso passou a ser visto de outra forma.

Sendo assim, o Direito de Família atravessou por diversas variantes de sentidos, onde houve uma grande evolução histórica, juntamente com alterações na Constituição Federal de 1988, que trouxe mudanças significativas (BRASIL, 1988).

Quando se refere à guarda, ela está diretamente ligada com a definição de vigilância, cuidados e proteção, pois trata-se do direito e dever dos genitores em exercício sobre seus filhos. Antigamente a guarda era constituída e fundamentada na responsabilidade de quem fora culpado com relação a separação, com o passar do tempo, houve várias mudanças e esse quesito tornou-se obsoleto, além de arcaico, não fazendo parte do atual ordenamento jurídico. 

Destarte, os novos ditames buscam priorizar a guarda compartilhada, salvo expresso em lei ou por determinação de ambas as vontades. Quando se refere a guarda compartilhada, entende-se como uma responsabilidade conjunta de ambos os pais que não residem mais na mesma residência, acerca dos direitos e deveres sobre seus filhos.

1.1 Uma reflexão histórico-normativa da legislação brasileira concernente à guarda

A sociedade brasileira sofreu notórias mudanças, sendo ela política ou psicossocial. Antigamente a guarda era vista de uma forma bem diferente e mais ríspida que a atual, os quesitos analisados eram ultrapassados e diante tantas evoluções houve uma necessidade de um novo modelo de criação de guarda visando sempre o bom relacionamento e o convívio dos pais para com seus filhos.

Na relação familiar, o que mais se enfatiza são os filhos, levando em consideração a vulnerabilidade e a pouca idade dos mesmos, por esse motivo é que a guarda refere-se a um direito consistente na posse do menor, dirigida a um terceiro que vai se responsabilizar de modo com que proteja, vigie e cuide. No entanto, há vários tipos de guardas, sendo elas: Guarda Unilateral, Guarda Alternada e Guarda Compartilhada.

Normalmente, a guarda é definida no momento do divórcio, onde fica acordado entre os pais as obrigações de cada um e a regulamentação de visitas. Em 1890 foi criado o Decreto 181 surgindo nele uma regulamentação voltada para os filhos, se tratando de uma previsão para a situação que ocorre após a separação dos pais. Tal decreto concebia a guarda dos filhos para aquele que não fora culpado da dissolução conjugal, mas incumbia outra parte, participar da criação e educação dos filhos.

Logo após, o Código Civil de 1916 visou que naquelas situações de uma dissolução amigável haveria de respeitar o que fora acordado pelos cônjuges (BRASIL, 1916).

Com o Decreto Lei n° 3.200 que foi criado em 1941, houve alteração na regulamentação de guardas, porém em 1971, o Decreto foi alterado pela Lei n° 5.582/70, que definiu que a guarda seria da mãe, havendo a possibilidade de ficar incumbido a um terceiro, se houvesse uma justificativa. Entretanto, em 1977 surgiu a regulamentação de uma dissolução, partindo desse pressuposto, houve uma necessidade de mudança no ordenamento jurídico.

E com a última alteração no ordenamento jurídico, não há de se falar em guarda incumbida a que não fora culpado da dissolução da união, e sim uma priorização de guarda compartilhada entre os pais ou unilateral, se expressa vontade de ambas as partes, sempre visando o bem estar do menor. Com a edição da Lei n° 11.698/08, o Código Civil (BRASIL, 2002) explanou a guarda compartilhada.

1.2 O conselho de guarda segundo a legislação e a doutrina

A guarda compõe a estrutura do poder familiar, ajustando-se também para decidir com quem ficará a responsabilidade de cuidado com a criança, lembrando que isso não tirará a responsabilidade do outro. De certo modo, podemos ver a guarda como uma divisão de companhia direta de moradia e responsabilidade com o menor, embora não exista algum laço afetivo ou conjugal entre os pais, há sempre de haver um interesse em comum que é o bem estar do filho, portanto, a autoridade parental permanecerá íntegra.

Dissolução de um relacionamento é algo muito comum, deste modo muitas vezes não se encerra toda relação já que normalmente, partindo disso, as pessoas podem haver um interesse em comum, sendo esse os filhos, tornando um laço eterno entre os pais em prol do bem estar da prole.

Há de se falar, em uma grande dificuldade que os filhos passam após a dissolução da união dos pais, já que hão de passar por todo um processo de mudança e adaptação, e a guarda surge para regulamentar todo esse processo.

A guarda é uma atribuição no âmbito familiar que enfatiza todos os cuidados e proteção que um menor necessita, assim como os direitos e deveres destinados aos pais.

Vale lembrar que, pode ocorrer da guarda ser atribuída unicamente para um dos genitores ou a ambos, sendo de forma alternada, havendo uma atribuição sucessiva para ambos.

1.3 A guarda compartilhada: Uma inovação

A guarda compartilhada foi introduzida no nosso ordenamento jurídico de forma expressa com o início do vigor da Lei n° 11.698/2008, que alterou os artigos 1.583 e 1.584, do Código Civil de 2002. Entende-se como a responsabilização conjunta em razão dos direitos e deveres dos pais que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns.

A Constituição Federal traz no preâmbulo a supremacia do exercício dos direitos sociais/individuais, a liberdade, igualdade, segurança, o bem-estar, o desenvolvimento e a justiça como valores soberanos. Sendo assim, os genitores sem distinção alguma, são responsáveis pelo menor, o representando de forma legal, possuindo o dever de acordar sobre as decisões que envolvam o filho menor, zelando por seus interesses e direitos. (FONTES, 2009).

No que concerne a guarda compartilhada os pais devem exercer simultaneamente a guarda de sua prole, dividindo todas as obrigações e todos os direitos, não havendo então uma obrigatoriedade e sim um acordo ao que se refere à moradia ou o tempo em que os menores estarão em companhia de um ou de outro.

Contudo, o filho poderá residir em uma só residência, independente se for a mãe ou o pai, incumbido ao genitor não guardião avaliar e entrar em um consenso, decidindo como ocorrerá as visitas.

Vale ressaltar que, não havendo um acordo entre as partes ao que concerne a guarda, será fixada a guarda compartilhada. Na audiência de conciliação, o juiz explicará como funciona essa guarda, e como ficará incumbido para cada responsável, tudo aquilo que será seu dever, e a importância de cumprir tudo aquilo que fora acordado, enfatizando também as sanções se houver descumprimento das cláusulas.

2 A RELAÇÃO SOCIAL-AFETIVA DOS SERES HUMANOS E OS ANIMAIS

Ao que se referem os animais, no decorrer do tempo, houve uma mudança significativa em relação ao seu tratamento, pois os animais de estimação viviam apenas nos quintais e tinham um tratamento bem diferente do que atualmente, cada vez mais os animais de estimação têm ocupado um espaço afetivo na vida das pessoas.

Nos dias atuais, muitos animais têm sido tratados como membros familiares, além de todo tratamento que têm recebido de seus respectivos donos, levando em conta que os animais oferecem companhia e carinho, fazendo assim uma criação de um vínculo muito forte com o seu dono, motivando ainda mais as pessoas terem esse tipo de comportamento.

Provando que os animais são criaturas sensíveis tendo emoção entre eles e quem os cria, é perceptível as benfeitorias que ele pode causar ao ser humano, justa causa há de se falar numa inovação do direito dos animais.

Com o advento da domesticação, a sobrevivência dos animais domésticos se torna dependente de seu dono humano. O humano vira seu soberano e mestre, e os animais seus servos e escravos. Por definição, animais domesticados são subservientes dos desejos da humanidade e, para a maioria das espécies envolvidas, essa perda de independência teve algumas consequências em longo prazo, bastante devastadoras (SERPELL, 1996).

2.1 A histórica relação sócia dos animais e os seres humanos

A relação do ser humano com o animal passou a ter uma dependência de valor, que é instituída pela sociedade ou cultura relacionada com o aspecto de cuidado e afeto de um para com o outro.

Ao observarmos a trajetória da evolução da espécie humana, a partir dos relatos históricos, é possível analisar o quanto esta relação é estreita e o quanto ela é influenciada por necessidades específicas da época vivida (DELARISSA, 2003).

Os animais com os quais os seres humanos interagem com o passar da história possuíram um significado profundo, o qual a natureza do relacionamento com eles e a forma em que eles foram considerados dependeu de como os humanos enxergavam a nós mesmos e o nosso lugar no fluxo da existência, logo esse relacionamento toma formas extraordinárias no curso do tempo e em culturas diversas (MANNING; SERPELL, 1994).

É perceptível a sensibilidade de grande parte da população em relação aos animais, embora dessa relação tem criado laços de que alguns acreditam que os animais tem que servir aos intuitos dos seres humanos, no entanto o papel desempenhado pelos animais se modificam, passando a ter então uma importância mais fixa e sensitiva na vida das pessoas.

Observa-se que nenhuma outra categoria de animais se criou tão junto aos seres humanos como os animais que compartilham o espaço doméstico. O final do século XX foi o marco do início de uma incrível humanização desses animais, o que remeteu a manutenção de se ter um animal de estimação que se tornou uma fonte cultural cada vez mais complexa (FRANKLIN, 1999).

A convivência dos humanos com os animais sofreu modificações, haja vista que os papéis desempenhados pelos animais se modificaram consequentemente. Nos dias atuais há uma preocupação, além de interesse cada vez mais significativo pelos animais estimação, em razão das novas configurações familiares, tendo em vista que cada vez mais, os animais estão sendo incluídos nesse grupo familiar, assim como aduz Knebel (2012):

Assim como as crianças conquistaram seu espaço junto à família no decorrer da Idade Média; nos dias de hoje os animais de estimação também vêm adquirindo seu espaço; espaço este que não é conquistado, mas sim dado a eles pelos seres humanos. Então, estes novos protótipos de formação familiar que mesclam a relação e o convívio entre humanos e animais tem se tornado cada vez mais presente em nossa sociedade (KNEBEL, 2012, p.37).

Portanto, a relação social do ser humano com os animais é algo que tem avançado cada vez mais perante situações na qual o animal está tendo extrema importância no ciclo familiar.

2.2 A mudança social e os animais de estimação: Uma questão de afetividade

A afetividade entre os animais domésticos e os seus donos teve uma grande crescente na atualidade, haja vista que o vínculo afetivo de um com o outro foi crescendo cada vez mais e o animal de estimação está ocupando mais espaços na vida afetiva de cada pessoa.

Vale ressaltar a importância dos animais nos lares, já que eles têm uma grande influência na vida das pessoas, pois além de serem carinhosos eles demonstram um cuidado diferente. Sobre essa questão, há uma forma de entendimento de como esse laço afetivo foi construído no decorrer do tempo. Entretanto, o poeta La Fontaine (2011), identificava nos animais as características humanas, ele ainda escreveu:

Nós devemos dizer a elas (crianças) o que são um leão, uma raposa e assim por diante; e por que às vezes comparamos um homem a essa raposa ou a esse leão. Isso é o que as fábulas pretendem fazer; as primeiras noções sobre esses assuntos provêm das fábulas (LA FONTAINE apud DESBLACHE in MACIEL, 2011, p.301).

Ao que se refere a esta forma de escrita, onde é projetado na outra espécie características antropomórficas, há de pensar na identificação enquanto mecanismo que possibilita “assimilar um aspecto, uma propriedade, um atributo do outro e se transforma, total ou parcialmente, segundo o modelo desse outro” (LAPLANCHE; PONTALIS, 2001, p.226).

Então, de forma didática, as pessoas vão se adequando ao fato de terem uma consideração afetiva muito grande aos seus bichos, chegando a ser considerados como filhos ou membros da família.

2.3 Os animais perante a legislação brasileira

Os direitos dos animais vêm se desenvolvendo na sociedade após a segunda metade do século XX, período que se seguiu à II Guerra Mundial, sempre aliada ao meio ambiente e ao direito ambiental. A Declaração Universal dos Direitos dos Animais se trata diretamente das prerrogativas dos animais de forma nacional, em matéria de ética e respeito. Ao que se refere a tutela e direito dos animais, há alguns dispositivos que versam sobre tal matéria, versando na Constituição Federal (BRASIL, 1988):

Art. 225 Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

£1 Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:

Vll- Proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade (BRASIL, 1988).

O ordenamento jurídico brasileiro também traz no art. 32 da Lei n° 9.605/98 um dispositivo que proíbe os maus tratos ao “praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos” (BRASIL, 1998, s/p).

Vale enfatizar que é declarado também, cruel e degradante o fato de abandonar um animal, se incluindo também os atos de maus tratos, tortura e ações afins. A Constituição Federal (BRASIL, 1988) ainda considera os animais como mero objeto e bens ambientais, entretanto a Declaração reconhece os animais de forma que são sujeitos de direito.

O direito e proteção dos animais, foi um assunto que repercutiu bastante nos dois últimos anos, haja vista que foi um tema que mobilizou o Senado, já que estava presente dois projetos de defesa dos animais, sendo a PLC 17/2017 que faz proibição a eliminação de gatos, aves e cães saudáveis pelos órgãos de controle zoonoses, além de incentivar a adoção desses bichos e a PLC 27/2018 que faz uma determinação de que os animais não poderão ser considerados como meros objetos.

A discussão continua acerca desse assunto, haja vista que há projetos em pauta, relacionados aos maus tratos de cães e gatos, e também questões concernentes à guarda. Houve ainda mais discussão, quando um deputado fez diversas declarações acerca do direito do animal, ainda enfatizando sobre a crueldade, abandono e maus tratos, correlacionadas com a vida do animal, haja vista que ele não possui meios de se defender, e nem são capazes de procurar seu próprio direito, ficando então a cargo da sociedade exercer tal função.

Em uma sessão realizada no dia 09/09/2020, foi aprovado no Senado Federal o Projeto de Lei n° 1095/2019, que faz uma alteração no art. 32 da Lei de Crimes Ambientais, Lei n° 9.605/1998 intitulando o aumento de pena concernente às práticas de abuso, maus-tratos, mutilação e ferimentos contra cães e gatos. Atualmente a pena é de detenção de 3 meses a 1 ano, com essa mudança passa a ser de reclusão de 2 a 5 anos, além de multa e também a proibição da guarda do respectivo animal.

É perceptível que temos diversos dispositivos que versam sobre os animais, ainda sobre questões de direito, proteção, porém ainda muito que se falar, haja vista a complexidade dos quesitos referente à vida dos bichos, guarda e à situação decorrente no Brasil.

3. A GUARDA COMPARTILHADA DE ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO

Neste capítulo será abordado questões concernentes à regulamentação da guarda dos animais de estimação, analisando os fatos comuns, e também pelo aspecto jurídico, além de situações que ocorreram, levando em consideração os conflitos gerados, acerca da ausência do ordenamento jurídico se tratando dessas questões, e a forma como as quais têm sido solucionada, e as considerações levadas em conta, por parte do poder judiciário.

3.1 A guarda compartilhada na perspectiva do direito comparado

Com o passar do tempo, o animal de estimação garantiu um espaço maior nas famílias brasileiras, a igualdade entre homens e animais nas garantias de necessidade básicas, tem ocorrido com frequência, como também a necessidade de uma regulamentação do Direito, nas questões de guarda e cuidados, levando em consideração que os animais também tem a capacidade de sentir, além de manifestar seus sentimentos, como: carinho, raiva e medo.

Muitos casais que não possuem filhos, adotam animais de estimação, e como consequência, criam um forte laço afetivo, podendo até ser comparado com o tratamento em relação às crianças, tendo, por exemplo, até comemoração de aniversário.

Com esse avanço, a sociedade contemporânea, por diversas vezes tem levado ao judiciário, questões acerca das ligações sentimentais, juntamente com a guarda para com seus animais de estimação, e levando em consideração a importância do homem em prezar o papel na manutenção da vida terrestre, de uma forma mais genérica.

A Constituição Federal brasileira, não determinou que os animais possuem direitos fundamentais, porém no seu artigo 225, ela enfatiza que os mesmos precisam ser protegidos (BRASIL, 1988):

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo- se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

VII – proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais à crueldade (BRASIL, 1988, s/p).

Ainda, há uma grande divergência acerca dos animais serem tratados como sujeito de direito, o Gordilho (2004), define essa divergência, in verbis, e afirma que problema não consiste em saber se os animais podem ou não ser sujeitos de  direito ou ter capacidade de exercício, mas de conceder ou não direitos fundamentais básicos, como a vida, a igualdade, a liberdade a até mesmo de propriedade.

A nova visão concebida às pessoas em relação aos seus animais, fez com que geraram muitos conflitos, após uma dissolução do casal, observa-se que a idéia de se desvincular do animal, é algo nada aceitável para essas pessoas, tendo em vista o laço de carinho e afeto gerado entre ambos.

No que tange à custódia dos animais de estimação, a aplicação da guarda compartilhada, pode ser a solução dos conflitos, é uma solução mais adequada de lides, que os donos dos animais, buscam judicialmente uma situação de regulamentação dos animais de estimação.

Deve haver, portanto, um equilíbrio na ponderação dos interesses, sendo ideal que se procure garantir o bem-estar e melhor interesse de todas as partes envolvidas na lide, não sendo possível, por incompatibilidade de interesses, o bem- estar do animal de estimação deve prevalecer na decisão da guarda (MILLS; KREITH, 2011).

Vale ressaltar que, o bom senso e boa-fé de ambos os cônjuges, facilita a solução dos conflitos, visando sempre a necessidade e o bem-estar do animal, analisando também o vínculo afetivo entre o tutor e o animal.

3.2 A guarda compartilhada de animais de estimação e a legislação civil brasileira

Houve uma grande evolução histórica acerca da guarda, todavia, foram levadas questões ao judiciário relacionadas não somente com os filhos menores, mas também acerca dos animais de estimação. Vale ressaltar um comentário feito por Santos apud Vieira (2016) acerca da importância de um animal de estimação:

O animal como membro familiar sugere a existência de uma relação interespécies e de uma família multiespécie composta por humanos e seus animais de estimação. Os mesmos acabam tendo diferentes funções, que vão desde serem vistos como objetos para o dono mostrar para outras pessoas, dando certo status social, cuidadores para algumas pessoas e até integrantes da família, tendo a mesma importância dos demais membros. Nesse sentido, destaca-se que “em estudo conduzido por Berryman e outros pesquisadores se concluiu que os animais de estimação são vistos como tão próximos quanto o próprio filho pelos humanos (SANTOS, 2008 apud VIEIRA, 2016).

É notório, o aumento do status de animais de estimação nas famílias brasileiras e, ainda, existem opiniões divergentes acerca desse tema, além de críticas sobre o fato de tratar o animal como se fosse gente.

Evidentemente, Dias (2018) diz que esse dispositivo inclui implicitamente a ideia de que os animais têm direito: à dignidade humana, quando compete ao poder público e à comunidade zelar pela vida, o respeito à integridade corporal, o equilíbrio ecológico e a preservação dos ecossistemas, e a não subordinação à crueldade; no sentido de que a vida sobrevive em um ecossistema de leis que proíbem práticas que ameacem seu equilíbrio ecológico, ou seja, que ameaçam de extinção e os exponham à crueldade humana.

Além disso, mais importante que serem coisas e possuírem as características apontadas, o que se destaca é serem eles equiparados a um objeto, o qual é desprovido de quaisquer direitos próprios e identificado apenas enquanto é tutelado por alguém. Logo, os animais integram a categoria das “coisas móveis semoventes”, uma vez que são coisas que se movem em virtude de força própria.

Entretanto, existe proteção jurídica dos animais no sistema judiciário brasileiro e,  com o passar do tempo, também houve necessidade de regulamentação no quesito da guarda dos animais, já que após a dissolução da união dos casais, frequentemente tem havido conflitos ao ficar acordado com quem ficará o animal.

Consequentemente, os casos relacionados a animais de estimação foram para o tribunal cível porque, como mencionado anteriormente, os animais eram tratados como bens móveis, portanto, pertencem à propriedade, ora submetidos ao regime de bens que estava previsto no Código Civil (BRASIL, 2002).

Diante todo o exposto, e partindo de uma análise de dados, pressupõe-se que muitos casais, criam um animal de estimação como parte do núcleo familiar, nesse diapasão a Dra. Regina Beatriz, advogada e presidente da ADFAS enfatiza:

Se o animal efetivamente é de ambos os cônjuges e se estes nutrem a mesma estima pelo pet, o ideal é optar pela guarda compartilhada. Nesta alternativa, o animal terá a atenção de ambos, até mesmo no que diz respeito às necessidades e tratamentos, incluindo os cuidados veterinários e afetivos.

É imperioso destacar que além dos fatos mencionados, o bem estar do animal de estimação deve ser priorizado, tornando imprescindível uma análise dos fatos e circunstâncias, tais como observam-se vários aspectos da diferença entre bens e pessoas, uma vez que as mercadorias têm diferentes subdivisões e categorias, como os bens são fungíveis ou insubstituíveis, consumíveis ou não consumíveis, divisíveis ou indivisíveis, unitários ou coletivos, hereditários e não hereditários, etc., ou seja, os bens são de valor material ou imaterial que possa ser objeto de uma relação jurídica, por outro lado, consistem em personalidades determinadas de acordo com quem é pessoa física (pessoa) ou pessoa jurídica (empresa).

3.3 Os casos de guarda compartilhada de animais de estimação e a nova realidade social do Brasil

O Direito brasileiro define os animais não humanos como coisas, bens móveis, semoventes. Nos dizeres do artigo 82, do Código Civil (BRASIL, 2002, s/p) são “móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social” (BRASIL, 2002, s/p). Com a intenção de reafirmar a situação jurídica de objetos de direito, as crias dos animais, na linguagem da Lei Civil brasileira, pertencem ao seu proprietário, podendo ser vendidos ou doados, conforme estabelece o artigo 1.232 (BRASIL, 2002).

Através das novas considerações familiares, que foram surgidas através do afeto e consideração, surgiu a família multiespécie, formada, por seres não humanos e humanos, tendo a vista a forte conexão formada entre ambos, e compreendida através de sentimentos.

No Brasil, ainda não há uma legislação específica para tratar das questões da guarda dos animais, porém há tempos o animal de estimação passou a ser visto e considerado como parte da família e não como um objeto que possa ser partilhado.

Analisando dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) foi enfatizado que a quantidade de cães e gatos nos lares das famílias brasileiras ultrapassou o número de crianças. Hoje, os animais são considerados como parte da família, sendo tratados com afeto e responsabilidade.

Atualmente, existe um Projeto de Lei n° 542/2018, que trata da guarda dos animais de estimação após a dissolução dos casais, tal projeto está aguardando a designação do relator desde 2019.

Diante a ausência da regulamentação, poderá haver um acordo extrajudicial entre as partes, definindo então a situação de ambos perante o animal, incluindo a definição de como serão as visitas, a moradia, e até mesmo às custas, podendo acionar o judiciário para o pedido de homologação do juiz.

Vale lembrar que, a situação que ocorreu no dia 22 de julho de 2015, na cidade de Rio de Janeiro, onde uma tutora entregou seu animal temporariamente a uma amiga, que se apegou além do esperado, e então proibiu a dona do animal de visitá-lo, ou ter qualquer contato, porém, O juízo decidiu pela guarda da verdadeira dona, e concedeu direito de visitação da mulher que cuidou do animal, gerando um carinho afetivo entre ambos. O feito tramitou na 48ª Vara Cível da comarca do Rio de Janeiro, sob o nº 0257790-28.2015.8.19.0001 (G1, 2015).

Todavia, pode haver um conflito entre as partes, ficando então ao encargo do juiz a responsabilidade de definir, de acordo com as condições expostas e aos demais encargos necessários. Portanto, o magistrado deve buscar a melhor solução para cada caso concreto, socorrendo-se à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito.

Então, pode-se dizer que a legislação brasileira, contudo, está omissa em alguns pontos, pois mesmo com alguma regulamentação em relação à proteção dos animais, ainda está vago no quesito de guarda e regulamentação dos animais, acarretando então, diversas interpretações do judiciário.

Há diferentes vertentes a serem consideradas e analisadas, porém o ponto principal a ser visualizado é a priorização da garantia do bem-estar do animal.

Diante das muitas demandas concernentes à guarda de animais de estimação, tornou-se necessária uma definição concreta acerca da regulamentação, haja vista que muitos casais após a dissolução, almejam continuar o convívio com o animal, inclusive alguns casais têm elaborado acordo pré-nupcial incluindo as questões relativas à guarda, como o direito de visitas e outros interesses relativos aos animais de estimação, portanto, é grande valia a alteração do status jurídico dos animais, com o intuito de reconhecer estes como seres conscientes e titulares de Direitos.

Destarte, segundo a Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro em seu art. 4° (BRASIL, 1942, s/p) “quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito” (BRASIL, 1942, s/p), sendo assim, na existência de conflitos entre os ex-cônjuges o Poder Judiciário poderá auxiliar na lide ao determinar diante aos fatos qual o melhor regime, podendo ser unilateral ou compartilhada, propiciando o melhor convívio para o animal de estimação.

 Deve-se observar que, como as pessoas envolvidas têm sentimentos de proteção, a custódia e a visitação devem ser estabelecidas primeiro em seu interesse e não no do animal (SOUSA, 2020).

Sob o aspecto do Código Civil (BRASIL, 2002) os direitos sobre o animal doméstico vale da mesma perspectiva da guarda infantil, ora sem lei específica sobre o assunto, mantendo-se os deveres e obrigações dos pais e o exercício do poder familiar, mesmo depois do divórcio ou da dissolução da união estável. 

Portanto, o instituto deve seguir os mesmos princípios: os direitos e deveres dos tutores que têm o direito de manter os animais com eles e que têm o dever de vigiá-los, além de manter sua proteção, bem-estar e segurança. 

Por conseguinte, uma vez definida a guarda para um dos ex-cônjuges ou compartilhada entre eles, os deveres inerentes ao dever de cuidar e zelar pelo animal de estimação, bem como a necessidade de vacinar e o controle de doenças contaminosas torna-se prioridade.

No entanto, o grau de afeto e proximidade entre eles e o animal e as condições materiais, mentais e físicas do animal devem ser levados em consideração na hora de escolher a tutela que melhor se adapta às necessidades do animal e à convivência dos tutores e supervisores. Essas condições dizem respeito à sua capacidade de proporcionar o melhor estilo de vida para o animal, bem como alude Ximenes e Teixeira (2017):

O melhor interesse do animal deve ser observado pelo juiz no caso concreto, analisando as condições de vida, a disponibilidade da pessoa para cuidar do animal, afeição, entre outros fatores. A aplicação desse princípio deve ser baseada em considerar que os animais são seres sensíveis, que possuem sentimentos e retribuem o afeto aos seus donos (XIMENES; TEIXEIRA, 2017, p. 82-83).

A disponibilidade de tempo que o sujeito tem para conviver e interagir com o animal, a suficiência da rotina para aproveitar as necessidades e hábitos de exercício e o espaço de vida disponível para o animal dependendo do tamanho e personalidade do animal, cada espécie e raça, além de outros elementos para identificar a realidade ideal do adotante, neste sentido Sanches (2015) complementa:

Cuidar de um animal de estimação exige não somente oferecer um lar, abrigo, comida, carinho e proteção, mas também o cuidado do acompanhamento veterinário, o convívio familiar, os gastos diários e a atenção, o tempo que poderá e deverá ser dedicado ao animal, pois, os animais que foram levados para o âmbito doméstico, assim como as crianças, dependem exclusivamente do ser humano e essa relação deve ser pensada a longo prazo, como é a vida do animal, de menor duração que a vida humana, mas que deve ser protegida até o fim, não devendo ser tratada como mero objeto (SANCHES, 2015, p.89).

Para manter o bem-estar do animal, os proprietários contribuem proporcionalmente com seus recursos, mesmo que separados por divórcio ou rompimento de união estável, conforme discute o art. 1.703, do Código Civil (BRASIL, 2002, s/p) que “para a manutenção dos filhos, os cônjuges separados judicialmente contribuirão na proporção de seus recursos” (BRASIL, 2002, s/p), ou seja, facilitando o convívio e o auxílio de ambos os ex-cônjuges ao manter o pleno desenvolvimento do animal com seus criadores.

A vista disso, assemelha-se à pensão alimentícia, pois os animais, assim como as crianças, demandam cuidados com a saúde, a alimentação e o lazer, o que gera despesas que devem ser suportadas por seus donos.

No caso dos animais, Gonçalves (2017) aduz que como no caso da guarda conjunta dos filhos, é estabelecida uma residência fixa, ou seja, o animal mora na casa de apenas um tutor, mas como este caso exige boas relações entre os ex-companheiros, o detentor desprotegido tem livre acesso ao seu animal,  o direito de visitá-lo e a oportunidade de participar ativamente de sua vida diária.

Ainda, Gonçalves (2016) salienta que o objetivo do cuidado conjunto é, assim, a guarda responsável de ambos os tutores, a manutenção de vínculos afetivos entre animais de estimação e donos, manejo e cuidado conjunto desses animais, portanto, os custos relacionados ao animal devem ser divididos igualmente, 50% para cada um.

Nesse sentido, mostrou-se que já existem ações no sistema judicial para casais que buscam benefícios aos animais após a dissolução de um casamento ou união estável, cabendo aos tribunais decidir, por intermédio de analogias ou mesmo avaliar esses motivos, considerando que os animais de estimação não podem mais ser tratados como objetos, o que reforça ainda mais a importância da aprovação de uma legislação específica.

3.4 Análises jurisprudenciais acerca da guarda compartilhada de animais de estimação

A jurisprudência atual tende a defender com maior cuidado e proteção os animais de estimação por meio de analogias que são frequentemente usadas para fazer valer os direitos dos animais de estimação. Alguns tribunais usam essas analogias para avaliar as causas de animais, sendo assim, o litígio brasileiro incluiu os animais de estimação no tribunal de família, desde então os ex-casais entram com ações para reivindicar visitas, pensão alimentícia e até a custódia de seus animais.

Os conflitos relativos às leis de proteção animal e a questão da divisão de bens após o divórcio em exigem a criação de uma lei especial sobre o assunto evitando possíveis casuísticas que possam surgir de decisões judiciais conflitantes. Portanto, é particularmente relevante a decisão emanada pelo Superior Tribunal de Justiça, sendo o Recurso Especial de nº 1713167/SP (BRASIL, 2018):

RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. DISSOLUÇÃO DE UNIÃO ESTÁVEL. ANIMAL DE ESTIMAÇÃO. AQUISIÇÃO NA CONSTÂNCIA DO RELACIONAMENTO. INTENSO AFETO DOS COMPANHEIROS PELO ANIMAL. DIREITO DE VISITAS. POSSIBILIDADE, A DEPENDER DO CASO CONCRETO. 1. Inicialmente, deve ser afastada qualquer alegação de que a discussão envolvendo a entidade familiar e o seu animal de estimação é menor, ou se trata de mera futilidade a ocupar o tempo desta Corte. Ao contrário, é cada vez mais recorrente no mundo da pós-modernidade e envolve questão bastante delicada, examinada tanto pelo ângulo da afetividade em relação ao animal, como também pela necessidade de sua preservação como mandamento constitucional (art. 225, § 1, inciso VII -“proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade”). 2. O Código Civil, ao definir a natureza jurídica dos animais, tipificou-os como coisas e, por conseguinte, objetos de propriedade, não lhes atribuindo a qualidade de pessoas, não sendo dotados de personalidade jurídica nem podendo ser considerados sujeitos de direitos. Na forma da lei civil, o só fato de o animal ser tido como de estimação, recebendo o afeto da entidade familiar, não pode vir a alterar sua substância, a ponto de converter a sua natureza jurídica. 3. No entanto, os animais de companhia possuem valor subjetivo único e peculiar, aflorando sentimentos bastante íntimos em seus donos, totalmente diversos de qualquer outro tipo de propriedade privada. Dessarte, o regramento jurídico dos bens não se vem mostrando suficiente para resolver, de forma satisfatória, a disputa familiar envolvendo os pets, visto que não se trata de simples discussão atinente à posse e à propriedade. 4. Por sua vez, a guarda propriamente dita – inerente ao poder familiar – instituto, por essência, de direito de família, não pode ser simples e fielmente subvertida para definir o direito dos consortes, por meio do enquadramento de seus animais de estimação, notadamente porque é um múnus exercido no interesse tanto dos pais quanto do filho. Não se trata de uma faculdade, e sim de um direito, em que se impõe aos pais a observância dos deveres inerentes ao poder familiar. 5. A ordem jurídica não pode, simplesmente, desprezar o relevo da relação do homem com seu animal de estimação, sobretudo nos tempos atuais. Deve-se ter como norte o fato, cultural e da pós-modernidade, de que há uma disputa dentro da entidade familiar em que prepondera o afeto de ambos os cônjuges pelo animal. Portanto, a solução deve perpassar pela preservação e garantia dos direitos à pessoa humana, mais precisamente, o âmago de sua dignidade. 6. Os animais de companhia são seres que, inevitavelmente, possuem natureza especial e, como ser senciente – dotados de sensibilidade, sentindo as mesmas dores e necessidades biopsicológicas dos animais racionais -, também devem ter o seu bem-estar considerado. 7. Assim, na dissolução da entidade familiar em que haja algum conflito em relação ao animal de estimação, independentemente da qualificação jurídica a ser adotada, a resolução deverá buscar atender, sempre a depender do caso em concreto, aos fins sociais, atentando para a própria evolução da sociedade, com a proteção do ser humano e do seu vínculo afetivo com o animal. 8. Na hipótese, o Tribunal de origem reconheceu que a cadela fora adquirida na constância da união estável e que estaria demonstrada a relação de afeto entre o recorrente e o animal de estimação, reconhecendo o seu direito de visitas ao animal, o que deve ser mantido. 9. Recurso especial não provido. (STJ – REsp: 1713167 SP 14 2017/0239804-9, Relator: Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 19/06/2018, T4 – QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 09/10/2018, (BRASIL, 2018, s/p).

Isto posto, o relator rejeitou as alegações de que o assunto seria trivial, ao contrário, considerou sua repetição no mundo e enfatizou a importância da proteção da fauna e da flora, conforme estipulado no artigo 225, §1º, inciso VII, da lei Constituição Federal. Ressaltou-se ainda que, não trata-se de humanização do animal, mas sim da identificação do terceiro gênero pertinente, devendo a situação ser analisada nos documentos que visam proteger a pessoa e sua vinculação afetiva com o animal (BRASIL 2018).

O supracitado recurso especial, ainda expôs a importância do vínculo criado entre tutor e animal, classificação de animal perante a legislação pátria e o direito de visita concedido ao tutor que permaneceu afastado posteriormente à dissolução da união estável, após serem analisadas todas as vertentes. 

Além disso, é indiscutível a obrigatoriedade da responsabilidade civil dos tutores  para com os seus animais de estimação, pois estes não alcançam a independência por estarem para sempre dependentes dos seus donos. E, vale ressaltar, que os animais se tornaram membros da família que têm sentimentos mútuos por seus donos, fato que trouxe à tona a discussão sobre os seres sencientes e as famílias multiespécies, conforme o entendimento jurisprudencial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), no Acórdão proferido em sede de Agravo de Instrumento nº 2207443-23.2019.8.26.0000 (BRASIL, 2020):

GUARDA DE ANIMAIS DE ESTIMAÇÃO. DECISÃO QUE REVOGOU A COMPARTILHADA LIMINARMENTE DEFERIDA. RECURSO PROVIDO.

Guarda de animais de estimação. Insurgência contra decisão que revogou a guarda compartilhada dos cães, com alternância das visitas. Efeito suspensivo deferido. Afastada a preliminar de não conhecimento suscitada pelo agravado. Possibilidade de regulamentação da guarda de animais de estimação, seres sencientes, conforme jurisprudência desta C. Câmara e deste E. Tribunal. Probabilidade do direito da agravante, em vista da prova da estreita proximidade com os cães, adquiridos durante o relacionamento das partes. Fatos controvertidos que demandam dilação probatória, justificada, por ora, a divisão da guarda dos cães para que ambos litigantes desfrutem da companhia dos animais. Risco de dano à recorrente em aguardar o julgamento final da demanda. Requisitos do art. 300 do CPC configurados. Decisão reformada. Recurso provido (BRASIL, 2020).

Ao apreciar o agravo de instrumento do agravante, o relator identificou os animais como seres sencientes e que pertencem ao núcleo familiar, além de evidenciar que os animais de estimação podem ser objeto de tutela. Contudo, ao anexar aos autos uma foto das tatuagens do cachorro em seu corpo e outros documentos relacionados à sua criação, o agravante demonstrou o carinho e cuidado demonstrado aos animais de estimação, com isso, o Egrégio Tribunal chegou ao entendimento da probabilidade do direito do agravante (BRASIL, 2020).

Isto posto, observa-se que as disputas pelos animais de estimação estão gradualmente sendo levadas à atenção dos juízes em processos de divórcio ou  dissolução do vínculo conjugal devido ao apego entre os animais e seus donos. Dessa forma, os animais foram colocados como tema central de interesse das partes, o que impossibilitou de tratá-los como objetos na partilha de bens. 

A legislação brasileira atualmente os trata e os vê como semoventes, o que causa um conflito entre o direito civil positivo e os interesses dos tutores, uma vez que lutam para não perder o contato com seu amado animal e também se preocupam com o bem-estar do animal.

Portanto, a falta de legislação gera insegurança jurídica, pois os juízes devem decidir de acordo com seu próprio entendimento ao aplicar a base do atual status legal do animal para ampará-lo de acordo com a propriedade ao invés do novo conceito de família multiespécies que busca manter o vínculo afetivo e amoroso de seus membros.

In fine, é necessário que o juiz aja de acordo com os interesses das partes e do animal de acordo com seu bem-estar, até que essa realidade seja alcançada, adequando-se à composição da nova família e aplicando o instituto da guarda, visitas e alimentos em conformidade, além de realizar as adaptações necessárias a depender de cada caso e tipo de animal de estimação.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pode-se observar ao longo deste trabalho, que a guarda compartilhada, é considerada um avanço na legislação, e por consequência a sociedade brasileira sofreu diversas mudanças, pois antigamente a guarda era vista de uma forma bem diferente e mais ríspida que a atual, os quesitos analisados eram ultrapassados e diante tantas mudanças, houve uma necessidade de um novo modelo de criação de guarda visando sempre o bom relacionamento e o convívio dos pais para com seus filhos.

Contudo, ao passar do tempo, houve grandes avanços acerca das relações entre os seres humanos e os animais de estimação, fazendo com que houvesse várias discussões concernentes à guarda dos animais, haja vista que nos dias atuais, muitos animais têm sido tratados como membro familiar, além de todo tratamento que tem recebido de seus respectivos donos, levando em conta que os animais oferecem companhia e carinho, fazendo assim uma criação de um vínculo muito forte com o seu dono, motivando ainda mais as pessoas terem esse tipo de comportamento.

Diversas situações foram levadas ao judiciário, por um conflito gerado, logo após a dissolução de um casal, perante a falta de um consenso em definir com quem ficará a guarda do animal doméstico, porém no nosso ordenamento jurídico é tratado

questões de proteção dos animais, porém acerca da guarda, não há definição concreta, apesar de haver projeto de lei, a fim de decretar essa regulamentação, para uma melhor solução da lide.

A falta de uma regulamentação jurídica trouxe de certa forma, uma insegurança, levando em consideração o viés afetivo criado. Como demonstrado, o animal, foi objeto em diversos processos, através da busca de uma solução de conflitos acerca da guarda do animal.

A discussão continua acerca desse assunto, haja vista que há projetos em pauta, relacionados aos maus tratos de cães e gatos, e também questões concernentes à guarda. Houve ainda mais ênfase, quando um deputado fez diversas declarações acerca do direito do animal, ainda enfatizando sobre a crueldade, abandono e maus tratos, correlacionadas com a vida do animal, haja vista que ele não possui meios de se defender, e nem são capazes de procurar seu próprio direito, ficando então a cargo da sociedade exercer tal função.

Contudo, para prezar o bem-estar do animal, e não somente o interesse do ser humano, é necessário que haja uma regulamentação do ordenamento jurídico, para que não haja instabilidade nas decisões tomadas por parte do poder judiciário, com relação a guarda dos animais de estimação, portanto, pode ser analisado uma possível alteração do status jurídico dos animais, para maior eficácia na solução dos conflitos.

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