FILOSOFIA E CIÊNCIA: FUNDAMENTOS PARA ENTENDER O PARADIGMA HOLÍSTICO

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/cs10202506221134


Everton Nogueira Silva1
Harine Matos Maciel2
Renata Firmino do Amaral3


RESUMO

A relação entre ciência e filosofia era mais íntima na Grécia antiga. A partir do renascimento houve a separação entre os conceitos de ciência e filosofia e a filosofia passou a ser mais abrangente. Estreitar a relação entre ciência, filosofia e senso comum torna-se necessário para que se possa alcançar plenamente o paradigma holístico que é tão necessário para a produção de conhecimentos que levam à solução dos problemas existentes atualmente. A visão holística torna-se cada vez mais fundamental para os debates acadêmicos acerca da interdisciplinaridade, e a sua demonstração prática possibilitará a vivência dos novos conceitos e metodologias a serem estudados.

Palavras – chave: Racionalismo. Científico. Interdisciplinar.

1. RELAÇÃO ENTRE FILOSOFIA E CIÊNCIA 

A filosofia pode ser vista, segundo Serra (2008), como a “mãe das ciências” pelo fato de que esta foi a primeira forma de conhecimento racional que surgiu na Grécia antiga. Este novo formato de pensar desvencilhado das explicações míticas para as questões essenciais da vida ganhou força com a escola de Mileto onde nasceu a filosofia ocidental. Os filósofos desta escola buscavam na natureza as respostas sobre a origem e composição do universo, passando assim a produzirem conhecimentos, sem negar a existência dos deuses, mas também sem atribuir a eles a explicação de tudo. A partir desses estudos os filósofos gregos desenvolveram-se conhecimentos em diversas áreas como astronomia, matemática e geometria, havendo assim o surgimento da ciência a partir da filosofia.

Já para Collingwood (1986), a ciência natural, ou simplificadamente ciência, vem antes da filosofia para que esta tenha algo para meditar. Este mesmo autor verifica que a ciência é o estudo pormenorizado do fato natural e a filosofia é a meditação sobre os princípios da ciência ou de outro domínio de pensamento.  Porém, há um consenso entre os dois autores mencionados a partir da afirmação de que os dois fenômenos estão intimamente ligados e que um não pode avançar satisfatoriamente sem o outro. 

 A relação entre ciência e filosofia era mais íntima na Grécia antiga. A partir do renascimento houve a separação entre os conceitos de ciência e filosofia e a filosofia passou a ser mais abrangente, enquanto que a ciência tornou-se cada vez mais específica e autossuficiente. As duas passaram a ficar de lados opostos. 

Porém, segundo Francelin (2004), no final do século XIX houve um movimento contrário que buscava relacionar a ciência e a filosofia em que a ciência não poderia ficar fechada em si mesma. A nova revolução científica parte da percepção e entendimento do paradigma holístico como alternativa para estreitar as relações entre ciência e filosofia.  Nesse sentido, o presente trabalho busca lançar mão das bases filosóficas e da ciência para a compreensão do paradigma holístico. 

2. A VISÃO FILOSÓFICA DA CIÊNCIA

A filosofia tem o desafio de responder aos princípios humanos da curiosidade e da admiração. No método filosófico, questionar torna-se o fundamento da atividade de investigação teórica. Segundo Zuben (1992, p. 15) “A filosofia tem sua origem e sua raiz no espanto que provém de uma dificuldade inicial que é provocada pelo fato de existirem argumentos em conflitos […]”. 

Segundo Aristóteles (A 982a) o apresentar e o elaborar de uma questão (reflexão), cerne do método filosófico, conduzindo a solução, é uma tarefa difícil e árdua. Os filósofos gregos buscavam atingir a “Sophia” denominada de primeira sabedoria (visão crítica). Para Aristóteles (A 982a):

É, pois evidente que a sabedoria (Sophia) é uma ciência sobre certos princípios e causas. […] Ademais, aquele que conhece com mais exatidão e é mais capaz de ensinar as causas, consideramo-lo mais sábio em qualquer ciência. E, entre as ciências, pensamos que é mais sabedoria a que é desejável por si mesmo e por amor ao saber, do que aquela que se procura por causa dos resultados, e (pensamos) aquela destinada a mandar é mais sabedoria que a subordinada. Pois não deve o sábio receber ordens, porém dá-las, e não é ele que há de obedecer a outro, porém deve obedecer a ele o mesmo sábio. Tais são, por sua qualidade e seu número, as ideias que temos acerca da sabedoria e dos sábios.

Aristóteles percebe que a filosofia se fundamenta sob três princípios: primeiro que a filosofia é um saber de “todas as coisas”; segundo que a filosofia é um “saber livre” e em terceiro que a filosofia é um saber que envolve a percepção crítica da razão denominado por saber crítico que se expressa a partir da curiosidade do ser humano que é insaciável em querer explorar o desconhecido. Sob o conceito de filosofia, Chaui (2000) observa que:

[…] O conhecimento filosófico é um trabalho intelectual. É sistemático porque não se contenta em obter respostas para as questões colocadas, mas exige que as próprias questões sejam válidas e, em segundo lugar, que as respostas sejam verdadeiras, estejam relacionadas entre si, esclareçam umas às outras, formem conjuntos coerentes de ideias e significações, sejam provadas e demonstradas racionalmente.

Para Jaspers (1971, p.138) “a filosofia aspira à verdade total, que o mundo não quer”. De acordo com Murcho (1998) o conhecimento humano tem duas fontes: a experiência e a razão. Na linguagem filosófica é costume dizer-se que uma proposição é a priori se a sua verdade pode ser conhecida sem apelar para a experiência; e a posteriori se pelo contrário só podemos conhecer a sua verdade através da experiência ou sistematização. 

A sistematização para entendimento dos fenômenos naturais nos remete ao conceito de ciência como método para respostas aos fenômenos naturais. Suas relações com o cotidiano humano estão interligadas às questões filosóficas, mesmo que essa ferramenta do pensar humano não represente a plena realidade e nem tampouco expresse a total capacidade de absorção do conhecimento, os cientistas, na busca por respostas, reconhecem na filosofia os mesmos questionamentos expressos no o que? por que? e como? A natureza humana aspira pela reflexão filosófica como método indutivo ao conhecimento.

A filosofia da ciência traz essa discussão, pois este ramo da filosofia estuda a natureza da própria ciência, como conceitos pressuposições, demonstra que o pensamento científico não se forma nem se transforma após a experimentação, pois antes disso vem a ideia (FRANCELIN, 2004). Para Silva (2010), a “filosofia da ciência é um conjunto de reflexões acerca do conhecimento científico e está presente desde a filosofia grega”.    

Desenvolvida no século XX, a filosofia da ciência teve como um dos seus mais influentes filósofos Karl Popper, que defendia a proposição de que as ideias precedem a experimentação. Para ele a ciência se inicia a partir das construções teóricas, mas somente será aceita quando for testada através de experimentos, além disso, a proposição para ser científica deve ser falseável. Isso proporciona uma movimentação e uma ruptura de paradigmas a partir de revoluções constantes. A partir da busca de falsear uma teoria é que o conhecimento científico se desenvolve.

Já Thomas Kuhn, outro importante filósofo da ciência, afirma que o desenvolvimento desta ocorre a partir de revoluções científicas que acontecem em intervalos específicos de tempo. Para este filósofo a ciência somente se desenvolve satisfatoriamente se for conduzida em parceria com a filosofia da ciência e história da ciência.   A filosofia de Kuhn influenciou bastante o ensino das ciências, pois introduziu as concepções filosóficas nestes estudos.

Assim, pode-se afirmar que a filosofia da ciência tem como objetivo auxiliar e esclarecer a natureza da ciência unificando o seu complexo de pensamentos, dando-lhe condição de ciência, afinal, esta não pode se desenvolver plenamente sozinha, pois é a filosofia que harmoniza e completa a ciência. 

3. A CIÊNCIA E SUA COMPREENSÃO

Há muitos anos existe o debate sobre o que é e o que não é ciência, contudo ainda não houve um consenso entre os estudiosos. A ciência procura explicações para os efeitos naturais e o comportamento humano, buscando compreender as transformações que ocorrem no mundo. Chassot (2003, p. 37) considera-a como “uma linguagem para facilitar a leitura do mundo”. Porém, a ciência nada mais é do que o desenvolvimento do senso comum, apesar de que este conhecimento não é científico, entretanto o senso comum de hoje, já foi ciência no passado. Sem o senso comum, a ciência não pode existir.  

A ciência passou por algumas fases. A fase de se preocupar em compreender a natureza das coisas e do homem, depois passou a introduzir a experimentação científica, e no início do século XX iniciou-se a contestação, a crítica aos fatos antes incontestáveis. Neste período a ciência passou por um processo de perda de autonomia, ela era tida como produtora da única verdade existente. Segundo Santos (1987) é importante repensar os limites do rigor científico e como é feita a contribuição para o conhecimento, já que a ciência não é mais a dona da verdade absoluta, é necessária a união de pesquisadores e da população em geral na busca de qualquer tipo de conhecimento, seja ele considerado científico ou não, pois todo conhecimento é válido.

A ciência tem o poder de articular a população, pois esta descobre sua função e sua importância para a construção de um ambiente mais participativo, investigativo e de pesquisa. Ela depende da visão de mundo do observador e é marcada, constantemente, por dilemas devido às diferenças de culturas, classes, formações, religiões, entre outros. Com tantas diferenças, será que é possível fazer ciência sem objetividade e métodos pré-estabelecidos?  

Fazer ciência é aplicar um método que consiste num conjunto de regras para fazer algo. A ciência é feita com o auxílio da investigação científica, que se desenvolve devido à necessidade de construir uma possível resposta ou solução para um problema, decorrente de algum fato ou conjunto de conhecimentos teóricos. A metodologia científica envolve os métodos que têm como objetivo definir como fazer ciência, como captar e interpretar as informações disponíveis. 

De acordo com Matos e Vieira (2002) há muitos recursos para se conduzir um trabalho científico, sendo necessário escolher o que mais se adéqua a realidade que se pretende investigar. As pesquisas podem ser do tipo bibliográfica, documental, estudo de caso, participante, ação, experimental, entre outros. As técnicas utilizadas podem ser observação, questionário ou entrevista, pensando no que se pretende coletar e verificar. Já a análise dos dados obtidos pode ser feita através da estatística ou análise de conteúdo e de discurso, sendo importante lembrar que há determinados resultados que podem ser quantificados e outros não. O essencial é que o pesquisador escolha com cautela os métodos e técnicas, já que uma má escolha compromete o resultado da pesquisa, prejudicando assim o surgimento de novos conhecimentos.  

Com base no que foi discutido até então, Granger (1994, p.113) afirma que: 

A ciência é uma das mais extraordinárias criações do homem, que lhe confere, ao mesmo tempo, poderes e satisfação intelectual, até pela estética que suas explicações lhe proporcionam. No entanto, ela não é lugar de certezas absolutas e […] nossos conhecimentos científicos são necessariamente parciais e relativos.

Há um lado obscuro da ciência, para muitos estudiosos, que consiste na análise das consequências de alguns resultados de pesquisas ou experimentos, como por exemplo, a criação de bombas e armamentos. Sem o avanço da ciência não seria possível a criação destes, utilizados muitas vezes para prejudicar outros seres humanos. O que poderia ser feito para que a ciência não fosse utilizada para fins malévolos? Para que pesquisadores não se apropriarem de técnicas ou produtos que possam vir a ser utilizados para fins obscuros? A resposta é que não se pode controlar por completo esse tipo de pesquisa, pois cada país possui suas regras e normas, e afirmam que todas as pesquisas feitas para esses fins são com o objetivo de proteger suas nações. Enfim, a ciência produz bons e maus frutos, dependendo de como e por quem seus resultados serão utilizados.

Alves (1999) afirma que aceitar a diversidade para a ciência não foi uma tarefa fácil, pois o ser humano tem dificuldade em aceitar o desconhecido ou diferentes pontos de vista, já rotula como errado algo que nem conhece. Durante muito tempo a ciência era feita só de uma maneira, e se fizessem algo diferente, não era considerado científico. O cientista busca a verdade, porém as conclusões das pesquisas e dos experimentos são sempre provisórias, pois haverá o aparecimento de coisas novas que precisarão ser testadas ou acrescentadas, surgindo sempre novos resultados e que também não serão definitivos. Não há limites para a ciência, não há limites para a disseminação do conhecimento, seja de qual for a área de conhecimento.

 “A ciência é uma pretensão de conhecimento, dentro de um processo infindável de busca e pesquisa” (DEMO, 1997, p.22). As respostas que a ciência procura nunca chegará de forma definitiva, pois o conhecimento estará sempre em constante transformação e os pesquisadores poderão percorrer diferentes caminhos na busca por respostas ou resoluções. A ciência questiona a realidade e busca torná-la mais agradável para a população, uma vez que um mundo melhor de se viver é o objetivo de todos, independente de cor, raça, nacionalidade, escolaridade, renda, entre outros.  

4. O PARADIGMA HOLÍSTICO 

Thomas Khun (1962) em seu livro “A Estrutura das Revoluções Científicas” nos apresenta o conceito de que o progresso científico não se limita apenas ao acúmulo gradativo de novos dados gnosiológicos e sim como um processo contraditório marcado pelo que ele denominou de “revoluções” do pensamento científico. Khun propõe a ideia de evolução da ciência a partir de dois estágios fundamentais, sendo um momentaneamente estável e o outro instável, desconhecido, sem respostas que incomodam a comunidade científica pelo fato do conhecimento ainda ser limitado, não respondendo ao incompreensível. O primeiro estágio, denominado de ciência normal é onde se apresenta e resolvem às questões que surgem no paradigma vigente, já no segundo, o paradigma original não funciona adequadamente e começa a surgir um novo, este período é denominado ciência extraordinária (DAYRELL, 2009). Kuhn discutiu categoricamente o paradigma, pois foi ele quem o estabeleceu definindo-o como, “[…] a expressão de uma estrutura geral capaz de reunir os membros de uma comunidade científica, ele nos auxiliaria a compreender de que modo, por exemplo, certos conceitos científicos são aceitos em uma época, mas rejeitados em outra.” (SILVA, 2010, p. 2).     

O conhecimento momentâneo está sob a luz do paradigma que na sua acepção grega original, seria o mesmo que modelo ou padrão a ser seguido. Chibeni e Almeida (2007, p.9) atestam que: “um paradigma fornece os fundamentos sobre os quais a comunidade científica desenvolve suas atividades representando um “mapa” a ser usado pelos cientistas na exploração da natureza”.

A ciência segue regras e modelos de paradigmas existentes estando o trabalho do cientista limitado a esclarecer e elucidar conceitos fundamentais de maneira acrítica e doutrinária condicionadas a fatores sociológicos e culturais para a solução dos problemas e enquanto esse paradigma responder às inquietudes momentâneas ele funcionará plenamente. 

A não resposta às inquietudes momentâneas fará com que o paradigma original começa a declinar, levando a ciência à fase denominada por Khun de ciência extraordinária, que se encontra na fronteira entre o “velho” paradigma e o “novo” paradigma que está em fase de construção, sendo aceito, ainda nesta fase, os métodos e conceitos anteriores pela comunidade científica havendo de fato a “revolução” quando se encerrarem as discussões sob a nova concepção paradigmática que a partir daí irá responder às inquietudes humanas. 

Na transição de um paradigma em crise para um novo paradigma surge uma nova tradição de ciência normal, sendo um processo de reconstrução a partir de novos princípios que alteram algumas generalizações teóricas mais elementares e que na transição do “velho” para o “novo” algumas coincidências podem ser respondidas por ambos. Na concepção de um novo paradigma os cientistas utilizam novos métodos e orientam seu olhar em novas direções percebendo novas concepções sob um mesmo ponto anteriormente avaliado, é neste momento que entra o paradigma holístico.

As palavras holístico e holismo são originárias do termo grego holos, que significa todo, inteiro. O termo holismo foi utilizado pela primeira vez pelo filósofo sul-africano Ian Christian Smuts em seu livro Holism and Evolution, editado em Londres, no ano de 1926. (WEIL, 1990). Conforme Araújo (1999), a palavra holismo foi utilizada por Smuts para designar uma visão de universo onde seres e coisas são partes integrantes e interligadas desse todo, em um processo evolutivo. 

O paradigma holístico surge da necessidade de se superar o paradigma reducionista da ciência para a criação de um novo olhar perceptivo das relações humanas com a natureza que são complexas e apresentam múltiplas dimensões (física, psicológica, social, espiritual, dentre outras). Sob a perspectiva daquele, Déoux e Déoux (1996), observa que: 

[…] o meio no qual o ser humano está inserido, sobre o qual age, e do qual depende, insere-se a necessidade de se transpor o paradigma que propagou uma visão reducionista de ser humano, de mundo e da realidade. Surge, nesse contexto, o emergente paradigma transdisciplinar holístico, que defende a construção de novos horizontes para o ser humano, em que se perceba integrado enquanto ser complexo[…]  

Nessa perspectiva, ser humano e ambiente são entidades complexas, transdisciplinares, cuja compreensão não pode ocorrer apenas dentro dos limites disciplinares, bem como as intervenções em prol de uma harmonia entre ambos implica em articulação entre ciência e política.  o emergente paradigma transdisciplinar holístico introduz um novo olhar sobre o mundo e sobre o ser humano coligando a visão holística da sabedoria de tradições milenares, a visão sistêmica originária da teoria geral dos sistemas, a transdisciplinaridade, a física quântica e a ecologia profunda.

A evolução para o pensamento holístico passa pelas correntes de pensamento analítica, defendida por René Descartes (visão redutiva-causal) e Isaac Newton (metodologia determinista, função explicativa) e sintética defendida por Carl Gustav Jung (construtiva). Para Crema (1991), o método analítico surge a partir do paradigma mecanicista-reducionista marcado pela busca de respostas às inquietudes humanas através da experimentação quantitativa. Já sob a perspectiva sintética, este mesmo autor observa que a busca por respostas atua sob uma visão qualitativa fundamentada nas visões psíquicas do sentimento e intuição humana. Karl Jaspers (1883-1969) em suas análises sobre a necessidade de se empreender reflexões metodológicas observa que para a prática do conhecimento o ser humano necessita de vários métodos simultâneos, subdivididos em três grupos: primeiro – apreensão dos fatos particulares; segundo – investigação das relações e terceira – percepção das realidades.   

A abordagem holística busca integrar os métodos analítico e sintético não havendo antagonismo e sim complementaridade, ou seja, o holístico representa um salto qualitativo da apreensão da realidade e que, segundo Crema (1991), vivifica e articula a dinâmica “todo-e-as-partes” facultando o exercício da transdisciplinaridade.   

5. A INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA NO PRODEMA UFC

A disciplina Lógica e Crítica da Investigação Científica é essencial para o Programa de Desenvolvimento e Meio Ambiente (Prodema), pois proporciona um melhor esclarecimento sobre a importância de uma pesquisa de caráter multidisciplinar e como esta deve ser conduzida, para que possa dar resultados tanto no âmbito pessoal, como para a academia e principalmente para a população, o principal alvo das pesquisas científicas.  Baseado nisso os subitens que se seguem apresentarão os projetos de pesquisa dos autores e como a referida disciplina contribuiu ou contribui no desenvolvimento das futuras teses de doutorado.

5.1 Projeto: Análise Socioambiental dos Assentamentos Rurais Contemplados pela Transposição do Rio São Francisco

A sociedade em seus assentamentos encontra-se organizada com as suas culturas e seus métodos de produção agrícola em que o conhecimento acaba passando entre gerações. Buscando averiguar o conhecimento dos costumes tradicionais aplicados nas técnicas de manejo agropecuários em assentados rurais (beneficiários futuros da transposição do Rio São Francisco) este objeto de pesquisa buscará a partir da visão de envolvimento entre pesquisador e comunidade (educando – educador, educador – educando, Paulo Freire) entender o conhecimento empírico camponês (análise sintética) que foram repassados entre gerações e que são técnicas ainda hoje aplicadas dentro da perspectiva moderna da agricultura familiar.

Para isso, a pesquisa deverá sair da visão tecnicista (análise analítica) devendo haver um entendimento histórico-social dos costumes e hábitos das gerações camponesas que foram repassados como alternativa de sobrevivência em ambientes escassos de recursos naturais no semiárido nordestino. O entendimento da gestão ambiental nos assentamentos rurais deverá envolver várias áreas do conhecimento sob a perspectiva holística e sua transdisciplinaridade sendo o holístico a proposta para se responder aos questionamentos relacionados aos impactos sociais, econômicos, culturais e ambientais que serão evidenciados com a transposição do rio São Francisco. 

5.2 Projeto: O Impacto do Programa Bolsa Verde na Sustentabilidade Ambiental no Estado do Ceará: Um Estudo de Caso nos Municípios de Aquiraz e Beberibe

A problemática do projeto de pesquisa é: o programa Bolsa Verde vai contribuir para a sustentabilidade ambiental no Estado do Ceará? É importante estudar este assunto, pois políticas públicas voltadas à sustentabilidade e a conservação ambiental são cada vez mais necessárias, já que o ser humano tem degradado constantemente o meio em que vive e com isso prejudicando a existência destes para as novas gerações. 

Muitos autores estudados na disciplina Lógica e Crítica da Investigação Científica trouxeram novos conhecimentos, contribuindo assim para o projeto de pesquisa e posterior desenvolvimento da tese, em especial, Rubem Alves, pois ele afirma que os cientistas, ao fazer ciência, não são movidos por razões quantitativas, científicas, e sim por curiosidade, prazer, ambição profissional, dinheiro, fama, entre outros. O importante é ter sempre em mente que o conhecimento que importa não é somente o científico, aquele que pode ser comprovado ou testado, qualquer tipo de conhecimento engrandece o homem, enriquece a sociedade e nenhum estudioso é detentor da verdade, pois não existe verdade absoluta, depende do ponto de vista. Ao aplicar os questionários da pesquisa em questão será necessário ter a sensibilidade de não só anotar o que os entrevistados responderem, também será preciso sentir a forma que eles vivem, agem e pensam, pois tudo que estiver ao redor do objeto de estudo auxiliará na escrita do  trabalho, já que o principal objetivo é desenvolver um trabalho que ajude a sociedade a melhorar, contribuindo com um mundo mais consciente tanto no âmbito ambiental, econômico e social, para que possamos ter, em um futuro não muito distante, um mundo melhor para se viver.

5.3 Projeto: Relação entre degradação ambiental e pobreza rural: o caso do semiárido cearense

Este projeto relaciona problemas econômicos, ambientais e sociais, que no caso deste último é a pobreza, um infortúnio de difícil erradicação, assim como a degradação ambiental, de um modo geral. Quando se observam esses dois problemas no meio rural, principalmente no semiárido brasileiro, vê-se que há um agravamento devido à vulnerabilidade desta área. Baseado nisso, a pesquisa pretende responder a seguinte questão: existe uma relação entre a pobreza rural e degradação ambiental na região semiárida do Estado do Ceará? Observar essa relação é relevante para que se estabeleçam estratégias que atuem na origem do problema que se quer dissipar, neste caso pode ser um auxílio para a formulação de políticas públicas voltadas para o desenvolvimento rural no semiárido. 

Como se pode observar essa pesquisa possui um caráter interdisciplinar e porque não dizer que se adéqua ao paradigma holístico, pois trata a pobreza e a degradação como temas multidimensionais e vai tentar demonstrar as várias dimensões destes fenômenos e como eles os afetam. 

A metodologia deste projeto aliará o estudo quantitativo como qualitativo. Para contemplar o primeiro será criado um índice composto de pobreza rural e degradação ambiental para demonstrar numericamente como estão ranqueados os municípios do semiárido com relação a estes dois fenômenos e para avaliar quais dimensões mais afetam estes fenômenos. A parte qualitativa terá a aplicação de entrevistas no município que apresentar o pior índice, para que se possa observar in loco como ocorre esta interação entre o homem do meio rural e a natureza.  E tem como modalidade de pesquisa, a pesquisa-ação, graças a disciplina de Lógica e crítica da investigação que demonstrou a necessidade de não apenas verificar, mas transformar o grupo escolhido. Assim, a pesquisa busca fugir do tipo de ciência fechada a que se está sujeito atualmente, como bem descreveu Rubem Alves, mas pretende filosofar sobre a ciência que se quer produzir, passeando por tipos diferentes de metodologias para não cair nas redes do senso comum.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Estreitar a relação entre ciência, filosofia e senso comum torna-se necessário para que se possa alcançar plenamente o paradigma holístico que é tão necessário para a produção de conhecimentos que levam à solução dos problemas existentes atualmente, que são complexos e dinâmicos, e que não podem ser resolvidos simplesmente por meio de uma ciência fechada e autossuficiente. É necessário que os cientistas possam filosofar sobre suas experiências, romper com o racionalismo científico para alcançar de fato o objetivo de transformar as várias realidades, fazendo a ciência sair dos laboratórios e incidir positivamente na vida da população, assim como foi demonstrado no documentário Lixo Extraordinário, em que a partir de um simples trabalho artístico de fotografias pode-se transformar um pouco a vida das pessoas envolvidas. A abordagem holística permite o exercício da interdisciplinaridade, forma esta de fazer ciência abordada pelo PRODEMA conforme apresentado na disciplina de Lógica e Crítica da Investigação Científica, influenciando de forma positiva a visão dos alunos no que concerne a este tema. A visão holística torna-se cada vez mais fundamental para os debates acadêmicos acerca da interdisciplinaridade, e a sua demonstração prática possibilitará a vivência dos novos conceitos e metodologias a serem estudados.

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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1Doutor em Desenvolvimento e Meio Ambiente. Professor da Universidade Estadual do Ceará (UECE). Email: enogueirasilva@hotmail.com
2Doutora em Desenvolvimento e Meio Ambiente. Professora do Instituto Federal do Ceará (IFCE – campus Baturité). Email: harine@ifce.edu.br
3Doutora em Desenvolvimento e Meio Ambiente. Graduada em Zootecnia. Email: amaralrenataf@gmail.com