EXTENSÃO DA LEI MARIA DA PENHA ÀS MULHERES TRANS

EXTENSION OF THE MARIA DA PENHA LAW TO TRANS WOMEN

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10051135


Angela Bentes de Abreu1
Adriano Michael Videira dos Santos2


RESUMO

O presente artigo tem como objetivo analisar quais as implicações da aplicação da Lei Maria da Penha para a proteção das mulheres trans. A violência contra a mulher tem sido uma constante na humanidade, com atos de violência, em especial, violência doméstica e familiar, situação estas que tem sido sofrida por mulheres trans. Os procedimentos metodológicos utilizados para esta pesquisa foi através de um levantamento bibliográfico, o método de abordagem dedutivo, sendo pesquisa qualitativa caracterizada por um estudo descritivo, de cunho exploratório. Com os resultados da pesquisa é possível inferir que a Lei Maria da Penha foi um marco histórico no Brasil, pois o seu advento trouxe uma maior proteção para as vítimas de violência, não apenas em razão do sexo, mas sim abarcando o gênero feminino. As mulheres transexuais não se identificam com seus corpos, pois se sentem constrangidos, já que o físico e o psicológico se divergem. Não bastasse esta situação ainda passam por violência relacionada ao seu gênero. Fato este que tem levado o ordenamento jurídico a buscarem mecanismos que alcancem as mulheres trans, por intermédio da Lei Maria da Penha que estas mulheres possam ser tuteladas e protegidas por esta Lei, não apenas por seus direitos regidos pelo Código Penal, mas também que tenham direitos a se enquadrarem nas especificações da Lei Maria da Penha.

Palavras chaves: Mulheres trans. Violência doméstica. Lei Maria da Penha. Aplicabilidade.

ABSTRACT

This article aims to analyze the implications of applying the Maria da Penha Law for the protection of trans women. Violence against women has been a constant in humanity, with acts of violence, especially domestic and family violence, a situation that has been suffered by trans women. The methodological procedures used for this research were through a bibliographical survey, the method of deductive approach, being qualitative research characterized by a descriptive study, of an exploratory nature. With the research results, it is possible to infer that the Maria da Penha Law was a historic milestone in Brazil, as its advent brought greater protection for victims of violence, not only due to sex, but also covering the female gender. Transsexual women do not identify with their bodies, as they feel embarrassed, as the physical and psychological aspects diverge. As if this situation were not enough, they still experience violence related to their gender. This fact has led the legal system to seek mechanisms that reach trans women, through the Maria da Penha Law, so that these women can be protected and protected by this Law, not only for their rights governed by the Penal Code, but also for them to have rights to comply with the specifications of the Maria da Penha Law.

Keywords: Trans women. Domestic violence. Maria da Penha Law. Applicability.

1 INTRODUÇÃO

A temática proposta para este artigo aborda uma preocupação com a extensão da Lei Maria da Penha às mulheres trans. A transexual é uma pessoa que possui um descontentamento com o seu corpo, possui um desejo compulsivo pela identidade do sexo oposto ao seu. Possui um distúrbio entre o seu sexo físico e o psicológico. Neste artigo foi abordado sobre os entendimentos de que a Lei Maria da Penha também se aplica às Mulheres Trans, e que estas podem ser tuteladas e protegidas por esta Lei.

De acordo com Szaniawski (1999) a identidade sexual tem sido considerada como uma das mais importantes características da identidade da pessoa, permitindo que haja o desenvolvimento da personalidade, assim como a proteção e a integridade psicofísica, abordando também que tal pessoa tem o poder da disposição do seu próprio corpo e a tutela à saúde.

O enfrentamento à violência contra a mulher, é um problema social, público e político, e com a finalidade de minimizar os casos de violência contra a mulher a Lei Maria da Penha a (Lei n° 11.340/06), traz em seu bojo as expressões que qualificam a violência doméstica e familiar. E com o decorrer do tempo algumas mudanças foram sendo incorporadas à Lei Maria da Penha. Deste modo, a problemática apresentada neste artigo questiona: quais as implicações da aplicação da Lei Maria da Penha para a proteção das mulheres trans?

O transexualismo trava uma luta entre o sexo físico com o sexo psicológico da pessoa, trazendo sentimentos que divergem do campo onde existem as características, tanto psicológicas quanto físicas (SCHMIDT, 2014). Ou seja, psicologicamente a transexual sente-se com aspectos femininos enquanto seu corpo tem características masculinas. 

Compartilhando da mesma ideia, Maranhão (1995, p. 134), reforça que as transexuais “fenotipicamente pertencem a sexo definido, mas psicologicamente ao outro e se comportam segundo este, rejeitando aquele”. Deste modo, a transexual acredita que o sexo psicológico é o que lhe pertence, apesar de seu físico transmitir e definir outra mensagem.

A expressão Mulher tem uma extensão considerada e utilizada no mundo jurídico que possui dois viés controversos, de acordo com Santos, Krawczak e Foguesatto (2017) um deles apresenta uma defesa à mulher que é considerada apenas aquelas que nasceram com o sexo biológico feminino ou que tiveram seus registros como do gênero feminino, por outro lado alguns sustentam a defesa de que mulher é toda pessoa que se identifica como sendo do sexo feminino, apesar de possuir outro sexo biológico ou que tenha sido registrado como uma pessoa do sexo masculino.

A presente pesquisa apresenta grande relevância social, visto que hoje, no Brasil, há um grande índice de mulheres e mulheres trans vítimas de violência, de todas as classes, idades e raças. Algumas sofrem abusos por muitos anos antes de procurar ajuda. E a escalada da violência é frequente onde as vítimas acabam se tornando pessoas vulneráveis. Outro aspecto relevante neste estudo é a afronta a princípios constitucionais que tal situação enseja, a exemplo dos princípios da dignidade da pessoa humana, a dignidade sexual e a liberdade sexual. Justifica-se ainda, haja vista que a violência contra as mulheres é um dos fenômenos mais denunciados atualmente e que mais têm repercussões no meio social. Nesse aspecto, demonstra-se necessária a elaboração de políticas públicas de repressão contra essa conduta, com o objetivo de firmar o que está descrito na Carta Magna, quando esta estabelece a igualdade de todos perante a lei.

Sendo assim, este artigo traz como objetivo geral: analisar quais as implicações da aplicação da Lei Maria da Penha para a proteção das mulheres trans. E como objetivos específicos: apresentar as razões históricas que norteiam a violência contra a mulher na atualidade e a origem da Lei Maria da Penha; explanar os aspectos sobre sexo, gênero e transexuais que permeiam a Lei 11.340/2006; apontar os conceitos e características da transexual, diferenciando das demais orientações sexuais; e, entender como a Lei Maria da Penha compreende as mulheres trans que são vítimas de violência, apontando as garantias jurídicas.

A Lei 11.340/2006 teve sua origem e foi promulgada em homenagem à Maria da Penha Maia Fernandes, que se tornou vítima de violência por parte de seu marido, que tentou matá-la duas vezes, disparando um tiro em suas costas, deixando-a paraplégica e, posteriormente, tentando eletrocutá-la no banho. (LIMA, 2013). Sendo um verdadeiro marco legal para atuação do estado a fim de proporcionar mais proteção às mulheres.

Para uma melhor compreensão da manifestação da violência contra a mulher, é necessário entender toda a questão sociocultural vivenciada pela sociedade ao longo do tempo. Fato este também vivenciado pelas mulheres transexuais, pois têm enfrentado grande luta diante de preconceito e buscando uma inclusão social para que haja um fim dos constrangimentos e violência que sofrem.

Este estudo está subdividido em seções. A seção 2 traz os procedimentos metodológicos utilizados nesta pesquisa. Na seção 3 apresenta os resultados obtidos. Já na seção 4 foi apresentada a discussão da temática objeto de estudo desta pesquisa, analisando quais as implicações da aplicação da Lei Maria da Penha para a proteção das mulheres trans, as razões históricas que norteiam a violência contra a mulher na atualidade e a origem da Lei Maria da Penha, os aspectos sobre sexo, gênero e transexuais que permeiam a Lei 11.340/2006, os conceitos e características da transexual, diferenciando das demais orientações sexuais e abordando como a Lei Maria da Penha compreende as mulheres trans que são vítimas de violência, apontando as garantias jurídicas. Na seção 5 traz as considerações finais.

2 MATERIAL E MÉTODOS

A presente pesquisa teve como base uma revisão bibliográfica em bancos de dados, dentre eles: Scielo, google acadêmico, assim como de livros dos renomados autores da área. A coleta dos dados foi realizada mediante levantamento bibliográfico, que de acordo com Marconi e Lakatos (2010, p. 142) a pesquisa bibliográfica “é um apanhado geral sobre os principais trabalhos já realizados, revestidos de importância, por serem capazes de fornecer dados atuais e relevantes relacionados com o tema”. Podendo ser realizada através de livros, artigos, periódicos, teses, jornais, internet, dentre outros recursos.

A abordagem da pesquisa foi de natureza qualitativa, de cunho exploratório, que conforme Gil (2002), este método propicia uma maior familiaridade com a problemática proposta para a pesquisa, possibilitando um melhor atendimento das ideias ou hipóteses levantadas. 

A abordagem do problema deste estudo é elaborada de forma qualitativa com objetivo elaborado de forma descritiva. Na pesquisa qualitativa, a característica mais marcante é o caráter interpretativo, sendo utilizada a subjetividade no estudo. A validade da qualitativa é baseada na capacidade que métodos proporcionam para a realização dos objetivos de forma fidedigna (PAIVA JR.; LEÃO; MELLO, 2011). 

Na análise de dados será feita a leitura e interpretação dos dados coletados, que de acordo com Minayo (2002, p. 69) pode-se: “apontar três finalidades para essa etapa: estabelecer uma compreensão dos dados coletados, confirmar ou não os pressupostos da pesquisa e/ou responder as questões formuladas e ampliar o conhecimento sobre o assunto pesquisado”. Buscando responder a problemática aventada e desenvolver o pensamento acerca do assunto proposto, que é sobre a possibilidade da aplicação da Lei Maria da Penha para a proteção das mulheres trans.

3 RESULTADOS

Existem diferentes conceitos e características do transexual, com distinções para com as demais orientações sexuais. O sexo está relacionado aos aspectos biológicos, enquanto o gênero refere-se a uma construção social, considerando a identificação do indivíduos e como ele se encaixa nos papeis sociais. 

A transexual, nas considerações de Schmidt (2014, p. 11) “é uma pessoa que não aceita o seu sexo físico, pois ela diverge do seu sexo psicológico. Os transexuais não são considerados pessoas com distúrbios psicológicos, mas apresentam uma falta de organização de sua personalidade”.

O transexualismo, é compartilhado por Szaniawshi (1999, p. 117) como sendo uma pseudo-síndrome psiquiátrica, onde a pessoa tem identificação com o sexo oposto, o que causa desconforto e constrangimentos. Sendo uma temática muito debatida no que tange a realização da cirurgia de transgenitalização.

E por ser uma situação de desconforto com seu próprio corpo com o qual não se identifica, o que torna difícil a aceitação por parte de alguns profissionais de adentrarem nesta seara. 

Através da Resolução nº 1482/97, o Conselho Federal de Medicina – CFM, ressalta que “o transexual se caracteriza por apresentar um desvio psicológico permanente de identidade sexual, com rejeição do fenótipo e tendência à automutilação e/ou auto-extermínio”. (CFM, 1997, p. 1).

Em determinadas situações a sociedade tem como costume confundir a nomenclatura dos indivíduos e acreditam que homossexuais, bissexuais, travestis e transexuais tem o mesmo significado, entretanto, existem diferenças que serão abordadas. 

De acordo com Cartilha de Comunicação e Linguagem LGBT (2014, p. 11) “o termo homossexual foi criado por um médico húngaro, Karoly Maria Kertbeny, em 1869. A partir de então, passou-se a designar como homossexuais as pessoas do mesmo sexo/gênero (homens e mulheres) que sentiam atração entre si”. 

Já a bissexualidade, de acordo com Peres (2001, p. 119) “implica o reconhecimento de uma identidade sexual independente das demais, oscila entre heterossexual e o homossexual, sem que isso leve a renúncia de uma das duas identidades”. Desta forma, o indivíduo se relaciona tanto com pessoas do mesmo sexo quanto do sexo oposto, sem que, contudo, haja renúncia de uma das preferências sexuais.

O travesti, conforme as ideias de Schmidt (2014, p. 15) está relacionado ao modo de se vestir com roupas do sexo oposto, afirmando que “pessoas que nascem com sexo masculino e tem identidade de gênero feminina, assumindo papéis de gênero diferentes daqueles impostos pela sociedade”. Ressaltando ainda que “muitas travestis modificam seus corpos, colocando próteses de silicone ou fazendo tratamentos com hormônios, mas não desejam fazer a cirurgia de transgenitalização”. Deste modo, assume também o papel do sexo oposto, embora tenha um sexo biológico diferente do qual se traveste, e não sinta a necessidade ou desejo de passar pela transgenitalização.

Heterossexual é a pessoa que se sente atraída afetiva e/ou sexualmente por pessoa do sexo oposto. O que é exposto na Cartilha de Comunicação e Linguagem LGBT (2014, p. 13), “indivíduo amorosamente, fisicamente e afetivamente atraído por pessoas do sexo/gênero oposto. Heterossexuais não precisam, necessariamente, terem tido experiências sexuais com pessoas do outro sexo/gênero para se identificarem como tal”. Isto engloba não somente a área sexual, mas também a afetiva com pessoas do sexo oposto.

De acordo com a Cartilha de Comunicação e Linguagem LGBT (2014, p. 16) a identidade de gênero é:

É uma experiência interna e individual do gênero de cada pessoa, que pode ou não corresponder ao sexo atribuído no nascimento, incluindo o senso pessoal do corpo (que pode envolver, por livre escolha, modificação da aparência ou função corporal por intervenções médicas, cirúrgicas e outras) e outras expressões de gênero, inclusive vestimenta, modo de falar e maneirismos.

Identidade de gênero é a percepção íntima que uma pessoa tem de si como sendo do gênero masculino, feminino ou de alguma combinação com os dois, independente do sexo biológico. A identidade traduz o entendimento que a pessoa tem sobre ela mesma, como ela se descreve e deseja ser reconhecida. 

No que diz respeito a violência, a origem etimológica do termo violência, vem do latim violentia, tendo o significado de caráter violento, força, sendo a violência uma ação entre indivíduos que causam danos a outrem. Nesse diapasão, Modena (2016, p. 8) leciona a seguinte definição da palavra violência.

[…] do latim, violentia, expressa o ato de violar outrem ou de se violar. Além disso, o termo parece indicar algo fora do estado natural, algo ligado à força, ao ímpeto, ao comportamento deliberado que produz danos físicos tais como: ferimentos, tortura, morte ou danos psíquicos, que produz humilhações, ameaças, ofensas. (MODENA, 2016, p. 8).

Percebe-se que a violência tem um histórico desde os primórdios, visto que tem sido inerente às relações cotidianas. Para tanto, Modena (2016) acrescenta que Freud, nos seus estudos entende que a violência é inerente aos seres humanos, havendo um equilíbrio de vida (eros) e o instinto de agressividade, a violência é necessária para que haja a preservação do indivíduo.

E diante de todo o histórico de opressão por parte dos homens para com as mulheres, estas ainda são considerados como seres inferiores. Baldo (2015) aponta que “na ideologia machista, aquela mulher que sofria abusos do marido deveria aguentar tudo sem tomar atitude, pois é seu dever como esposa suportar as exigências do marido’. Sendo esta ideologia machista que vem se perdurando por muitos séculos, uma ideologia pautada no patriarcado quando consideram que a mulher agredida, violentada pelo marido ou companheiro são consideradas culpadas por tal agressão.

Nas palavras de Belmonte et al. (2018) reiteram que a mulher tem sido discriminada durante toda a história, ocupando uma posição submissão diante do marido, e esta discriminação tem reflexo até os dias de hoje sendo marcada pela lógica machista construída ao longo do tempo. 

O marco legal de enfrentamento à violência contra a mulher se deu por intermédio da Lei nº 11.340, de 07 de agosto de 2006, conhecida como Lei Maria da Penha, foi instituída no Brasil como forma de proteção e enfrentamento à violência doméstica e familiar contra as mulheres. Tal lei foi promulgada em homenagem à Maria da Penha Maia Fernandes, que se tornou vítima de violência por parte de seu marido, que tentou matá-la duas vezes, disparando um tiro em suas costas, deixando-a paraplégica e, posteriormente, tentando eletrocutá-la no banho. (LIMA, 2013).

Com objetivos claros de lutar contra a violência à mulher, que há muito tempo tem encontrado lugar na sociedade, alcançando até mesmo sentimento de que é uma prática natural, entre alguns desavisados.

Krawczak, Foguesatto e Strücker (2017) apontam que apesar de não existir uma regulamentação legal mais assertiva na doutrina, em casos de violência doméstica e familiar contra as mulheres trans, a aplicabilidade da Lei Maria da Penha poderá ser utilizada considerandos os princípios Constitucionais e os constantes em Tratados e Convenções Internacionais sobre Direiros Humanos.

A Lei nº 11.340/2006, no artigo 5ª, preceitua que:

Artigo 5º. Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial: I – no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas; II – no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa; III – em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação. Parágrafo único. As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual. (BRASIL, 2006).

No entendimento de Gonçalves (2015), não obstante, a redesignação de sexo realizado por algumas trans, isto não altera a condição biológica, a saber: não possuem, ovários, trompas, útero, dentre outras características pertencentes ao sexo feminino, não podendo ser tuteladas pela Lei Maria da Penha.

Entretanto, a supracitada Lei apresenta em seu bojo, que:

Art. 2º Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social. (BRASIL, 2006).

Compartilhando do mesmo entendimento Dias (2006), ressalta que ao estabelecer mecanismos de proteção à mulher, independente de orientação sexual, a Lei garante essa proteção às lésbicas, às travestis e às mulheres trans. Considerando que estas coabitam em um ambiente familiar em uma relação de afeto, e sofrem condições de violência relativa ao gênero feminino, há justificativas plausíveis para uma aplicabilidade da Lei Maria da Penha e exige uma proteção especial.

4 DISCUSSÃO

4.1 Raízes históricas da violência de gênero contra a mulher

Ao longo da história a mulher tem lutado para conquistar seu espaço na sociedade, não somente como auxiliadora do homem, cuidando da casa e dos filhos, mas, sobretudo, tem galgado sua inserção na política, na economia e no social. Segundo Cunha (2004), a divisão de tarefas era relacionada com a sexualidade desde a Antiguidade, quando os homens tinham como atividade a caça e a pesca, já a mulheres eram responsáveis pelo cultivo da terra e a colheita dos frutos.

De acordo com Alexandre (1990), os gregos, de Alexandria, comungavam dos mesmos costumes e preceitos judaicos, em que as fêmeas cuidavam dos afazeres domésticos, aos homens era dado a viver em liberdade, tanto na paz quanto na guerra, já às chamadas raparigas o abrigo da clausura.

Na Idade Média, entre os séculos V e XV, nos anos de 476 d.C. a 1500, a Inquisição se instaurou no século XIII, as mulheres eram caçadas como bruxas. É lecionado por Mendes (2014) que havia a crença de que existia uma ligação da feitiçaria com a mulher, sendo relatado em trechos de livros que havia perversidade, malícia, fraqueza física e mental, além da mulher ser considerada de pouca fé, e alguns homens eram protegidos contra os seus feitiços.

Com isto, houve uma injustiça muito grande para com as mulheres, pois estas foram brutalmente perseguidas. De acordo com Galiza (2008, p. 2) a mulher foi alvo de grandes perseguições. O movimento denominado a “Caça às Bruxas” foi encabeçado pela Igreja, através do Santo Ofício (inquisição). Estas perseguições matavam mulheres que, segundo os religiosos, cometiam rituais pagãos, estima-se que morreram entre 40 mil a 100 mil mulheres acusadas de promover bruxarias.

Neste diapasão, Mendes (2014, p. 29) ressalta que “a caça às bruxas é elemento histórico marcante enquanto prática misógina de perseguição. Entretanto, a perfeita aliança entre os discursos jurídico, médico e teológico, em favor do encarceramento da mulher no recinto doméstico ou no convento é algo ainda mais significativo[…]”.

Ainda no período medieval a maternidade era algo extremamente relevante, assim como o casamento, sendo condição de grande valor para o status da mulher na sociedade. Deste modo quando praticavam o infanticídio, estas sofriam penas de afogamento, enterrada viva ou queimada em fogueira. (MENDES, 2014).

Alguns países se prevalecem das tradições culturais para perpetrarem a opressão e a violência contra a mulher. Nas palavras de Dahlberg e Krug (2006, p. 1175), tais tradições são utilizadas “[…] como justificativas para práticas sociais particulares perpetuadoras da violência. A opressão das mulheres é um dos exemplos mais amplamente citados, mas há ainda muitos outros”.

A fragilidade da mulher era constantemente confundida e divulgada como incapacidade para tomar decisões, sendo considerada e tratada como um ser inferior. Nesse diapasão, o tempo que a mulher se dedicava ao trabalho não obtinha remuneração igualmente aos homens, vindo somente, posteriormente, após as lutas e conquistas por intermédio do direito. De acordo com as considerações de Fontoura e Araújo (2016, p. 17):

A desigualdade de gênero observada no tempo dedicado ao trabalho remunerado e ao trabalho não-remunerado é uma realidade na imensa maioria dos países. Suas causas – relacionadas à própria reprodução das desigualdades de gênero nas sociedades – e consequências – a possibilidade de inserção de mulheres e homens em outros campos da vida social e a qualidade dessa inserção, bem como a menor valorização dos trabalhos profissionais relacionados aos cuidados, além de muitas outras – vêm sendo estudadas.

Em todo o contexto social e político a desigualdade era latente, o que impulsionou as mulheres a reivindicarem os seus direitos, e com isto algumas transformações foram ocorrendo ao longo dos tempos. Mesmo com algumas restrições, a mulher já iniciou uma jornada de luta pelos direitos igualitários, sendo que esse já era um passo para as muitas conquistas que viriam posteriormente.

E desde os primórdios percebe-se que há uma luta velada entre homens e mulheres “as empresas, os ambientes políticos e, incrivelmente, até algumas instituições religiosas, têm estimulado uma competição nada saudável, e até mesmo destrutiva, entre as pessoas (ALMEIDA, 2015, p. 31)”. 

E diante de todo o histórico de opressão por parte dos homens para com as mulheres, estas ainda são considerados como seres inferiores. Baldo (2015) aponta que “na ideologia machista, aquela mulher que sofria abusos do marido deveria aguentar tudo sem tomar atitude, pois é seu dever como esposa suportar as exigências do marido’. Sendo esta ideologia machista que vem se perdurando por muitos séculos, uma ideologia pautada no patriarcado quando consideram que a mulher agredida, violentada pelo marido ou companheiro são consideradas culpadas por tal agressão.

Nas palavras de Belmonte et al. (2018) reiteram que a mulher tem sido discriminada durante toda a história, ocupando uma posição submissão diante do marido, e esta discriminação tem reflexo até os dias de hoje sendo marcada pela lógica machista construída ao longo do tempo. 

As lutas contra essa ideologia têm sido confrontadas pelas feministas que lideram essas reivindicações, e segundo Teles (1999, p. 165) “são as feministas que cobram a grande dívida social e econômica que tem o patriarcado perante a humanidade, em vista das injustiças milenares cometidas sob sua autoridade”. Na concepção machista os homens ocupam um lugar de superioridade em detrimento das mulheres, se sobressaindo na sua visão de dominação expondo a mulher em uma postura de inferioridade, sendo o principal motivo para que ocorra o Feminicídio, um crime de discriminação cometido contra a mulher pelo fato dela ser mulher.

É visível que as pessoas são incitadas a lutarem por seu espaço na sociedade, no trabalho e muitas vezes sem levar em consideração outros aspectos que são mais determinantes para uma visão mais humanitária, e, consequentemente, as violências fazem parte destes conflitos. O ordenamento jurídico tem se posicionado com vistas a minimizar a violência contra a mulher.

4.2 Conceitos e características da mulher transexual

A conceituação de transexual elaborada pelo Movimento Social de Pessoas Transexuais e também Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais – LGBT (2007, p. 52), é como sendo uma:

[…] pessoa com identidade de gênero que se caracteriza por uma afirmativa de identificação, solidamente constituída e confortável nos parâmetros de gênero estabelecidos (masculino ou feminino), independente e soberano aos atributos biológicos sexualmente diferenciados. 

Já na concepção de Diniz (2002, p. 48), sobre a conceituação de transexual, expõe que, de acordo com a:

Medicina legal e psicológica forense. 1. Aquele que não aceita o sexo, identificando-se psicologicamente com o sexo oposto, sendo, portanto, um hermafrodita psíquico. 2. Aquele que apesar de aparentar ter um sexo, apresenta constituição cromossômica do sexo oposto e mediante cirurgia passa para outro sexo. Tal intervenção cirúrgica para a mulher consiste na retirada dos seios, fechamento da vagina e confecção de pênis artificial, e para o homem, na emasculação e posterior implantação de uma vagina. 3. Para a Associação Paulista de Medicina, é o indivíduo com identificação psicossexual oposta a seus órgãos genitais externos, com o desejo compulsivo de mudá-los.

Através da Resolução nº 1482/97, o Conselho Federal de Medicina – CFM, ressalta que “o transexual se caracteriza por apresentar um desvio psicológico permanente de identidade sexual, com rejeição do fenótipo e tendência à automutilação e/ou auto-extermínio”.

Na Resolução nº 1.955/2010, em seu artigo 3º, traz a seguinte definição de transexualismo e que apresentam 4 critérios básicos, a saber:

1) Desconforto com o sexo anatômico natural; 

2) Desejo expresso de eliminar os genitais, perder as características primárias e secundárias do próprio sexo e ganhar as do sexo oposto; 

3) Permanência desses distúrbios de forma contínua e consistente por, no mínimo, dois anos; 

4) Ausência de transtornos mentais.

Nesse sentido, o transexualismo tem sua origem na tenra idade, onde ainda a criança está impossibilitada de discernir, não tendo a capacidade de compreender o que ocorre no seu psicológico, isto na faixa de dois anos. Mesmo com a incapacidade de discernimento já se inicia um processo de questionamentos a respeito do que se passa no psicológico e com o seu corpo (SZANIAWSKI,1999).

Na definição de Vieira (2004, p. 47), partindo do mesmo princípio, transexual “é o indivíduo que possui a convicção inalterável de pertencer ao sexo oposto ao constante em seu Registro de Nascimento, reprovando veementemente seus órgãos sexuais externos, dos quais deseja se livrar por meio de cirurgia”. A estudiosa, aponta ainda que:

Segundo uma concepção moderna o transexual masculino é uma mulher com corpo de homem. Um transexual feminino é, evidentemente, o contrário. São, portanto, portadores de neurodis-cordância de gênero. Suas reações são, em geral, aquelas próprias do sexo com o qual se identifica psíquica e socialmente. Culpar este indivíduo é o mesmo que culpar a bússola por apontar para o norte. (VIEIRA, 2004, p. 47).

O Manual de Diagnóstico e Estatística de Transtornos Mentais – DSM-V, tratava a transexualidade como transtorno/desordem de identidade de gênero, entretanto, em 2014 foi retirado dessa classificação e sendo reclassificada como disforia de gênero. 

Conforme a visão de Athayde (2001) disforia de gênero refere- se à divergência entre o sexo de nascimento com o qual o indivíduo se identifica e manifesta seu comportamento. O que causa angústia, depressão, e algumas pessoas julgam necessária a cirurgia ou outros procedimentos para intervir no físico. 

Desta forma, e com a mesma visão da transexualidade, é asseverado por Schmidt (2014, p. 11) que o processo “é caracterizado por sua rejeição ao seu sexo físico, trazendo consigo consequente rejeição ao seu corpo, o que os leva a querer realizar a mutilação, ou possível cirurgia para que adequem seu corpo ao seu verdadeiro sexo (o psíquico)”. A disforia tem uma interpretação de sofrimento emocional e não uma doença mental, o que já era considerado um constrangimento com esta classificação tornava-se muito mais insuportável para as transexuais. 

4.3 Violência contra mulheres trans e as garantias jurídicas na Lei Maria da Penha 

Existem duas correntes que debatem sobre a temática, sendo uma corrente conservadora que discorda que as mulheres trans não podem receber a proteção legal e especial da Lei Maria da Penha, embora tenham realizado a cirurgia para troca do órgão genital. A outra corrente mais moderada reconhece que essa proteção deve alcançar as mulheres trans, reconhecendo que há uma nova realidade física e morfológica. (BASTOS, 2013).

O alcance do termo ‘Mulher’ é aquela pessoa que se identifica como sexo feminino, mesmo que não seja o biológico. E por intermédio desse entendimento podem sim considerar a possibilidade da mulher trans receber as garantias, ser tutelada e protegida pela Lei Maria da Penha. (KRAWCZAK; FOGUESATTO; STRÜCKER, 2017).

Em 2022, no primeiro semestre, por uma decisão da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou-se a aplicação da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) em casos de violência doméstica ou familiar contra mulheres transgênero. (STJ, 2023).

De acordo com a decisão o STJ fixou medidas protetivas a mulher transexual que foi vítima de violência doméstica praticada por seu pai. Sendo este um precedente inédito na corte. O pai, usuário de drogas e álcool chegou em casa alterado e agrediu a filha, sendo perseguida pela rua até o momento em que encontrou uma viatura da Polícia Militar. (STORARI, 2022; STJ, 2023).

O relator Ministro Rogerio Schietti Cruz, apontou em sua decisão sobre o caso supramencionado, o seguinte texto:

RECURSO ESPECIAL. MULHER TRANS. VÍTIMA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. APLICAÇÃO DA LEI N. 11.340/2006, LEI MARIA DA PENHA. CRITÉRIO EXCLUSIVAMENTE BIOLÓGICO. AFASTAMENTO. DISTINÇÃO ENTRE SEXO E GÊNERO. IDENTIDADE. VIOLÊNCIA NO AMBIENTE DOMÉSTICO. RELAÇÃO DE PODER E MODUS OPERANDI. ALCANCE TELEOLÓGICO DA LEI. MEDIDAS PROTETIVAS. NECESSIDADE. RECURSO PROVIDO. 1. A aplicação da Lei Maria da Penha não reclama considerações sobre a motivação da conduta do agressor, mas tão somente que a vítima seja mulher e que a violência seja cometida em ambiente doméstico, familiar ou em relação de intimidade ou afeto entre agressor e agredida. 2. É descabida a preponderância, tal qual se deu no acórdão impugnado, de um fator meramente biológico sobre o que realmente importa para a incidência da Lei Maria da Penha, cujo arcabouço protetivo se volta a julgar autores de crimes perpetrados em situação de violência doméstica, familiar ou afetiva contra mulheres. Efetivamente, conquanto o acórdão recorrido reconheça diversos direitos relativos à própria existência de pessoas trans, limita à condição de mulher biológica o direito à proteção conferida pela Lei Maria da Penha.

Deste modo, na decisão do relator, ministro Rogério Schietti, ficou evidenciado que a violência doméstica, familiar ou nas relações de afeto está baseada no gênero e não no sexo biológico.

Nesse emblemático, a decisão da Sexta Turma é extremamente relevante para o Brasil, pois este lidera o ranking mundial de violência contra travestis e transexuais. A Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) divulgou um dossiê onde relata que no ano de 2022 foram 131 vítimas fatais (STJ, 2023).

Concernente a criação de novos mecanismos de proteção à mulher, a doutrinadora Maria Berenice Dias, leciona que: 

Ao conceder a lei mecanismos de proteção à mulher, sem distinguir sua orientação sexual, encontra-se assegurada proteção tanto às lésbicas como às travestis e às transexuais que mantêm relação íntima de afeto em ambiente familiar ou de convívio. Em todos esses relacionamentos as situações de violência contra o gênero feminino justificam a especial proteção. (DIAS, 2006, p. 442).

Em 2018, houve um caso que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sua maioria, reafirmou jurisprudência da corte com a permissão para uma pessoa trans mudasse o nome e gênero no registro civil, mesmo sem a redesignação de sexo. (COELHO, 2018).

Para esse caso, em especial, do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Dias Toffoli ressaltou que:

[…] a solução proposta no acórdão do TJ-RS, da anotação do designativo ‘transexual’ nos assentamentos pessoais, não garante a dignidade do indivíduo e causa efeitos deletérios, como sua discriminação, sua exclusão e sua estigmatização. Além do transexual não desejar ser reconhecido socialmente dessa forma, não existe, sob o ponto de vista científico, essa categoria de sexo. Necessita essa pessoa que sua autodeterminação de gênero que está no campo psicológico seja também reconhecida no âmbito social e jurídico. (COELHO, 2018, p. 1).

O Supremo Tribunal Federal (STF), entendeu:

[…] ser possível a alteração de nome e gênero no assento de registro civil mesmo sem a realização de procedimento cirúrgico de redesignação de sexo. A decisão ocorreu no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4275, encerrado na sessão plenária realizada na tarde desta quinta-feira (1º). A ação foi ajuizada pela Procuradoria-Geral da República (PGR) a fim de que fosse dada interpretação conforme a Constituição Federal ao artigo 58 da Lei 6.015/1973, que dispõe sobre os registros públicos, no sentido de ser possível a alteração de prenome e gênero no registro civil mediante averbação no registro original, independentemente de cirurgia de transgenitalização. (STF, 2018, p. 1).

Diante dessa decisão as pessoas transexuais poderão alterar o nome e o sexo no registro civil, sem que haja a necessidade de redesignação sexual, pois estas se consideram mulheres. Não obstante, os direitos adquiridos e constantes no Código Penal, isto traz mais segurança pois irão se enquadrar nas especificidades regidas pela Lei 11.340/2006, no Art. 5º. (BENTO, 2014; MASIERO, 2018).

Considerando que a Lei Maria da Penha, está em evolução e assegura a proteção contra assédio e violência de gênero contra as mulheres, a doutrinadora Maria Berenice Dias (2014) reitera que para as mulheres trans torna-se difícil quando não possuem o nome e gênero designado no registro civil e buscam as delegacias para prestarem queixas, essas são dispensadas pelos atendentes alegando que o nome ainda é masculino e a denúncia tem que ser realizada em outro local.

Para Gomes (2009, p. 1):

Parece-nos acertado afirmar que, na verdade, as medidas protetivas da Lei Maria da Penha podem (e devem) ser aplicados em favor de qualquer pessoa (desde que comprovado que a violência teve ocorrência dentro de um contexto doméstico, familiar ou de relacionamento íntimo). Não importa se a vítima é transexual, homem, avô ou avó etc. Tais medidas foram primeiramente pensadas para favorecer a mulher (dentro de uma situação de subordinação, de submetimento. Ora, todas as vezes que essas circunstâncias acontecerem (âmbito doméstico, familiar ou de relacionamento íntimo, submissão, violência para impor um ato de vontade etc.) nada impede que o Judiciário, fazendo bom uso da Lei Maria da Penha e do seu poder cautelar geral, venha em socorro de quem está ameaçado ou foi lesado em seus direitos. Onde existem as mesmas circunstâncias fáticas deve incidir o mesmo direito.

Deste modo, torna-se precípuo e premente que haja mais mecanismos, alterações na Lei Maria da Penha que alcance todas as mulheres que sofrem violência doméstica, sem distinção do sexo biológico.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante de situações tão contundentes no que diz respeito às pessoas transexuais, com histórico de violências sofridas de todas as espécies, discriminação, constrangimentos, o que tem levado muitas à depressão e por vias de fato, ao suicídio. E um dos pontos fulcrais de discussão e luta das transexuais terem mecanismo de amparo legal.

Partindo do objetivo geral que foi analisar quais as implicações da aplicação da Lei Maria da Penha para a proteção das mulheres trans, tem-se vislumbrado a questão das possibilidades das mulheres transexuais conseguirem obter o direito à extensão da Lei Maria da Penha. E através do estudo realizado com os mais renomados autores da temática, os resultados foram analisados e interpretados, e com isto possibilitando uma maior gama de conhecimentos para a realização e conclusão do artigo.

Ao analisar os dados obtidos, chegou-se aos seguintes resultados, que a violência contra a mulher, mesmo com todo o arcabouço no ordenamento jurídico e a aplicação penal tem vitimizado muitas mulheres. Com um histórico cultural patriarcal que durante muitos séculos a mulher foi oprimida e sempre considerada inferior. E esta violência tem se perpetuado com práticas abusivas e violentas que culminam com o crime de feminicídio baseado no gênero da vítima.

Há que se dizer que os objetivos fixados para o trabalho, foram alcançados, bem como foi possível responder à questão aventada sobre as implicações da aplicação da Lei Maria da Penha para a proteção das mulheres trans.

Podendo ser observado nesta pesquisa que o ordenamento jurídico tem passado por algumas evoluções, e considerando que a Lei Maria da Penha é extensiva ao gênero, a mulher trans tem recebido garantias por lei no que diz respeito ao direito de ter seu nome social e gênero no registro civil, a fim de garantir um atendimento sem a discriminação do sexo. E em decisão recente, o STJ determinou a aplicação da Lei supracitada em casos de violência doméstica ou familiar contra mulheres trans.

Neste trabalho, portanto, de forma breve, pode-se comprovar e registrar a grande e imprescindível relevância da temática proposta nesse estudo, em conceder mecanismo de proteção à mulher independente de sua orientação sexual ou seu sexo biológico. 

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1Acadêmica de Direito. Artigo apresentado às Faculdades Integradas Aparício Carvalho – FIMCA, como requisito para obtenção do título de Bacharel em Direito, Porto Velho/RO, 2023

2Professor Orientador. Professor do curso de Direito