EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA RELAÇÃO ENTRE O HOMEM E SOLO, RESGATANDO LIAMES PRETÉRITOS APRESENTADOS PELA SOCIEDADE BRASILEIRA CONTEMPORÂNEA

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10390911


Katia Gomes de Oliveira;
Uelton Carlos da Silva;
Professor orientador: Lenício Dutra Marinho Júnior.


RESUMO:

Vários ramos da ciência compreendem o solo de acordo com seus ramos de estudo. A geologia, pedologia entres outras ciências vislumbram aspectos distintos do que é o solo. No entanto, para os povos indígenas não há essa especificidade sendo o solo, a terra, a mãe natureza, organismo vivo que o conectam como todo os seres vivos. Atualmente tem se discutido a respeito da gestão sustentável dos recursos naturais. A criação de uma nova cultura ecológica baseada na introdução de práticas econômicas inspiradas nas tradições indígenas se faz necessária, uma vez que em razão das perdas dos recursos naturais em virtude de ações antrópicas no decurso do tempo representa um caminho promissor para promover a sustentabilidade e a harmonia entre a humanidade e o meio ambiente. O resgaste das práticas indígenas, enraizadas em uma profunda conexão espiritual com a terra, oferecem lições valiosas sobre como equilibrar as atividades humanas com os ciclos naturais, exemplo disso esta o manejo sustentável e a rotação de cultivos. Ao unir a sabedoria ancestral das comunidades indígenas com as inovações contemporâneas, podemos construir uma nova cultura econômica que respeite a integridade ambiental, promova a equidade social e garanta um futuro sustentável para todos. A reversão da crise ambiental requer uma mudança profunda na mentalidade e no comportamento humano. A educação ambiental desempenha um papel crucial nesse processo, onde a cultura ecológica precisa ser implementada na sociedade atual.

Palavras chaves: Solo. Crise Ambiental. Práticas sustentáveis. Povos indígenas. Recursos naturais.

ABSTRACT

Various branches of science understand the soil according to their branches of study. Geology, pedology and other sciences envisage different aspects of what the soil is. However, for indigenous peoples there is no such specificity as the soil, the land, the mother nature, living organism that connects it with all living beings.  Currently there has been discussion about the sustainable management of natural resources. The creation of a new ecological culture based on the introduction of economic practices inspired by indigenous traditions is necessary, since due to the loss of natural resources due to anthropic actions in the The course of time represents a promising path to promote sustainability and harmony between humanity and the environment. The recovery of indigenous practices, rooted in a deep spiritual connection with the land, offers valuable lessons on how to balance human activities with natural cycles, an example of which is sustainable management and crop rotation. By uniting the ancestral wisdom of indigenous communities with contemporary innovations, we can build a new economic culture that respects environmental integrity, promotes social equity and ensures a sustainable future for all. Reversing the environmental crisis requires a profound change in human mentality and behavior. Environmental education plays a crucial role in this process, where ecological culture needs to be implemented in today’s society.

Keyword: Soil. Environmental Crisis. Sustainable practices. Indian people. Natural resources.

INTRODUÇÃO:

Os povos indígenas que ocupavam o Brasil há milhares de anos sempre mantiveram uma conexão intrínseca com a terra, considerando-a sagrada e essencial para sua sobrevivência física, bem-estar espiritual, individual e coletivo. Para os povos originários o meio ambiente é responsável por todo o sustento da teia da vida, por isso, a “mãe natureza”, é um organismo vivo e interconectado que alimenta o homem no planeta. Ratificando a compreensão da forma como os povos originários se relacionam com a natureza, Eliane Potiguara, (1989, p. 22,), assim pontua:

Não há sociedade de classes entre os índios, porque a terra e os bens de produção são coletivos, não existindo assim nem ricos e nem pobres. 3 – A sociedade indígena é comunitária. O trabalho é comunitário. Não havendo relação de poder, as relações humanas são harmoniosas (pais e filhos, marido e mulher etc.) e a ajuda, bem como solidariedade mútuas são altamente presentes.4-O índio não acumula bens materiais; produz o necessário para viver.

distintamente da visão dos povos indígenas, a compreensão das sociedades complexas e capitalistas no cenário contemporâneo é utilitarista e pragmática, como expressa na lei 13.577/2009, no seu artigo 3° XX, que define  solo como sendo a:

Camada superior da crosta terrestre, formada por minerais, matéria orgânica, água, ar e organismos vivos enquantoo uso atual da terminologia “terra” se refere a território, espaço, definindo o nome do nosso planeta, portanto, a palavra solo compreende o que está disposto no diploma legal acima citado, agregando ainda seu valor econômico, sendo nesta o desenvolvimento da camada vegetal.

Em virtude da racionalidade econômica notou-se as modificações em relação ao solo, analisando desde a forma com a qual os primórdios utilizavam, até chegar a sociedade atual, diferentes técnicas de uso e manejo, utilização de agrotóxicos na agricultura cooperaram para o cenário de crise ambiental presente.

A problemática instaurada na relação entre o homem e o solo veio desde do período da revolução industrial (1760)  acentuando-se  nos anos da primeira e segunda Guerra Mundial (1914 a 1945), até os dias atuais. Fatores como o crescimento populacional, os processos de urbanização, o crescente processo de industrialização estão totalmente ligados as modificações que o solo sofreu no decorrer do tempo. O homem após adotar a postura de dominador/ explorador no meio ambiente e como consequência a necessidade de produção em grande escala e a descoberta de técnicas cada dia mais sofisticada  provocaram uma extensa crise ambiental. Assim segundo: Ivo Raposo Gonçalves CIDREIRA-NETO1 Gilberto Gonçalves RODRIGUES:

a organização do espaço geográfico, a interação entre o ser humano e a natureza revela marcos históricos distintos, moldados pelamaneiras como a natureza é utilizada e apropriada. Essa dinâmica evolui desde relações harmoniosas na pré-história até os dias atuais, caracterizados por uma abordagem predatória e utilitária em relação ao ambiente.

Por isso segundo Enrique Leff (2018, p. 33), “o modo de exploração trouxera transformações culturais e enterraram uma vasta quantidade de conhecimento práticos advindos de comunidades autóctones”.

Desta feita,  em razão das práticas capitalistas que não dimensionam as consequencias do uso indiscriminado dos recursos naturais, o autor acima assimm afirma:

A racionalidade econômica que se instaura no mundo como núcleo duro da racionalidade da modernidade, expressa em um modo de produção fundado no consumo destrutivo da natureza que vai degradando o ordenamento ecológico do planeta terra e minando suas próprias condições de sustentabilidade.” (LEFF, 2018, p. 27)

Atualmente o termo “antropoceno”  tem sido largamente discutido,  ele aponta essa relação do homem com natureza, caracterizando o ser humano como uma força geológica que compete com as forças naturais, no impacto e modificação do planeta), o antropoceno conceitua os reflexos na natureza em virtude das ações do ser humano no decorrer do tempo no meio ambiente. Para Paulo Artaxo, (p. 03, 2014) desde os anos 80, alguns pesquisadores começaram a definir o termo Antropoceno como uma época em que os efeitos da humanidade estariam afetando globalmente nosso planeta.

Percebe-se que a compreensão do antropoceno faz ligação com a ideia de racionalidade econômica sob a ótica de Enrique Leff que vê instalada a crise ambiental a partir de um processo de acumulação do capital que foi gerando processos produtivos cada vez mais técnicos para revalorizar e a capacidade produtiva do meio ambiente e especial.

Nesse sentido, Enrique Leff, apresenta como o meio de superar a crise ambiental atual, priorizar a diversidade étnica e cultural da espécie humana e promover o desenvolvimento das diferentes formas de manejo produtivo da biodiversidade,  vejamos:

o saber ambiental não se conforma uma doutrina homogênea, fechada e acabada; emerge e se desdobra em um campo de formações ideológicas heterogêneas e dispersas, constituídas por uma multiplicidade de interesses e práticas sociais; nas estratégias de poder inscritas no discurso teórico das ciências (economia, ecologia, antropologia, direito); no saber camponês e das comunidades indígenas integrado a seus sistemas gnosiológicos, seus valores culturais e suas práticas tradicionais de uso da natureza; no saber ambiental inscrito nas políticas de desenvolvimento sustentável, em suas estratégias e em suas práticas discursivas, e em seus instrumentos normativos e jurídicos (LEFF, 2006, p. 280-281).

Observa-se que de acordo o autor a participação da comunidade indígena para o resgate dos liames do homem e o solo é de suma importância, visto que,  as práticas exercidas pelos povos originários fazem parte do saber ambiental que permite nortear condutas possíveis de minimizar as ações humanas negativas no meio ambiente. Compreendendo essa necessidade de resgate das formas de viver no planeta terra, (TOZONI-REIS, 2004), faz a seguinte observação:

“A relação do homem com a natureza é uma construção histórica e social que foi se moldando ao longo dos tempos. Compreender a concepção da natureza nos permite também a compreensão das questões que envolvem a relação homem-natureza e a ruptura que colocou ambos em posições contraditórias determinando, a crise ambiental agravada em decorrência do modelo econômico que vem se reconfigurando. Porém, embora se tenha tido um intenso desenvolvimento e maior conhecimento técnico científico que proporcionou o maior aprofundamento dos conhecimentos sobre os processos ecológicos, ainda não se conseguiu reverter essa relação dicotomizada (TOZONI-REIS, 2004, p. 11).”

Contudo, o objetivo central desse trabalho analisar como as práticas indígenas no cuidado e manejo do solo podem cooperar para a recuperação de áreas degradadas pelas ações humanas. Para tanto, a partir da pesquisa bibliográfica será apontado o quanto é possível e efetivamente válido  colocarmos as ideias dos povos indígenas em prática, como forma de melhoramento da nossa qualidade de vida e redução da crise ambiental existente.

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Para o estudo, foi realizado uma extensa pesquisa básica exploratória de levantamentos bibliográficos (artigos, livros, dissertação e teses) relacionados ao tema. Destacam-se referenciais que envolvem questões amplas sobre o tema: evolução histórica da relação entre o homem e solo, resgatando liames pretéritos apresentados pela sociedade brasileira contemporânea. Conforme as abordagens das temáticas, podemos considerá-la como uma pesquisa qualitativa. “A pesquisa qualitativa se preocupa com o nível de realidade que não pode ser quantificado, ou seja, ela trabalha com o universo de significados, de motivações, aspirações, crenças, valores e atitudes (MINAYO, 2014).”

OBJETIVOS

Geral: Analisar como as práticas indígenas no cuidado e manejo do solo podem cooperar para a recuperação de áreas degradadas pelas ações humanas.

Específicos: Descrever a forma como os povos originários se relacionam com o meio ambiente. Explicar de forma clara como as práticas de cuidado e manejo do solo dos povos indígenas podem auxiliar para mitigar os impactos ambientais negativos das ações humanas no meio ambiente, em especial no solo.Evidenciar que é possível por meio do resgate das relações pretéritas que o homem tinha com a natureza, superar a crise ambiental instalada nos dias atuais.

DEFINIÇÃO DE SOLO

Inicialmente, é preciso entender que o conceito de solo está conectado aos vários ramos da ciência que estuda o tema, por isso, para cada linha de pesquisa há uma compreensão distinta, e quando analisado em profundidade revela-se uma definição complexa com significados diferentes.

O estudo do solo apresenta várias especificações, na engenharia civil o solo é estudado do ponto de vista preventivo, no intuito de observar os maciços terrosos quando submissos a forças provenientes das obras de engenharia. Segundo Lepsch 2010,pag.18) o solo é todo material de construção ou mineração da crosta terrestre escavável por meio de pá, picareta, escavadeira, etc… sem necessidade de explosivos.

Portanto, para engenharia civil, o solo é o material de construção mais remoto e fundamental. Suas propriedades, como capacidade de suporte, permeabilidade e compressibilidade, são críticas na construção de edifícios, estradas e outras infraestruturas. A engenharia de solos lida com o projeto de fundações e escavações com base nas características do solo.

Distintamente da análise feita pela engenharia civil, a agricultura estuda o solo com ênfase na sua composição nutricional, sua capacidade de fornecer nutrientes para plantas. Por isso, a composição química do solo é ponto central para os agricultores no intuito de obter informações que direcionam o tipo de cultivo e a correção necessária de nutrientes que devem ser feitas.Constantemente enfatisa a analise quimica do solo para fins de fertilidade muito requisita pelo agricultores. (Lepsch (2010,pag.18).

Desta feita, no contexto agrícola, o solo é a base de sustentação para o desenvolvimento das plantas. Ele é o meio que fornece água e esculentos essenciais para o aumento das culturas. Por isso, o que o solo fornece como valor nutricional são fatores cruciais para o sucesso das práticas agrícolas.

Já para a pedologia interessa-se pela totalidade da compreensão do que podemos definir como solo, para essa ciência tanto a parte superficial (arável) quanto as demais do solo são relevantes, esse ramo de estudo importa mais com a composição, materiais, origem e que fatores influenciaram nessa formação, ou seja, a descrição e a classificação do solo. Assim vejamos:

A Pedologia, cujas noções básicas e conceitos fundamentais foram definidos em 1877, pelo cientista russo Dokouchaev. A partir dessa data, o solo deixou de ser considerado simplesmenteum corpo inerte, que reflete unicamente a composição da rocha que lhe deu origem (rocha parental), para ser identificado como um material que evolui no tempo, sob ação dos fatores ativos do ciclo supérgeno (clima, vegetação, topografia e biosfera)  (Maria Cristina M. Toledo, Sonia Maria B. de Oliveira, Adolpho J. Melfi., 2000)

A pedologia explora a complexidade do solo, estuda a formação, a classificação e a caracterização dos solos, bem como suas propriedades físicas, químicas e biológicas. Isso é essencial para a compreensão das funções ecológicas dos solos e seu papel na produção de alimentos.

Para Lepsch (2010, p. 19,)   o pedólogo examina o solo com atenções diferentes porque o vê como um objeto completo de estudos básicos, aplicados, e usa métodos científicos de induções e deduções sucessivamente.

Ainda para a geologia o solo compõe uma sequência chamada de ciclo geológico, é fruto do intemperismo químico e físico das rochas. Na geologia, o solo é formado por rochas desgastadas ao longo de milênios, e sua análise é fundamental para entender a história da Terra, processos de intemperismo, erosão e sedimentação, portanto, para essa ciência os fatores genéticos são mais relevantes. Geólogos podem entender como parte da ciência que estuda a sequencia de eventos geoógicos do chamado “ciclo geologico” Lepsch (2010, p. 19,) .

Podemos então entender que o conceito técnico cientifico do solo é que este é a camada superior da crosta terrestre, uma entidade dinâmica e complexa composta por minerais intemperizados, matéria orgânica em diferentes estados de decomposição, água, ar e organismos vivos. Essa matriz de elementos interage constantemente, desempenhando funções vitais na ecologia, agronomia e geologia. Para a ciência, o solo é estudado por meio da pedologia, que busca entender sua formação, classificação, características físicas e químicas, bem como sua influência em ecossistemas e cultivos. O pedologo examina o solo com atenções diferentes porque o vê como objeto completo de estudos básicos e aplicados e usa metodos cientificos de induçoes e deduções sucessivamente (Lepsch (2010, p. 20,)

Desta feita, segundo  Toledot (e.tal., 2000) o solo como o produto do intemperismo, do remanejamento e da organização das camadas superiores da crosta terrestre, sob ação da atmosfera, da hidrosfera, da biosfera e das trocas de energia envolvidas”.

Assim, para cada ramo de estudo há um entendimento a respeito do que é solo, porém, para a compreensão clara do tema proposto, é fundamental a análise não de acordo com o conceito de cada ciência, mas a exploração da totalidade conforme apresentado pela pedologia.

Todavia, se para a engenharia civil o solo é um maciço terroso, para a agricultura é a base de sustentação e fornecimento de nutrientes para as plantas, para os povos originários o solo é a terra, a natureza, “a mãe natureza”. Os indígenas e a floresta são ligados como irmãos. A floresta é uma vida” (Davi  Kopenawa, 2022).

Para os indígenas o solo tem uma dimensão muito mais profunda do que sua definição científica, é uma entidade viva, sagrada e espiritualmente conectada à identidade e ao bem-estar, é a mãe que nutre e sustenta a vida, não apenas para os seres humanos, mas para todas as criaturas.

A visão indígena do solo destaca sua importância cultural, espiritual e econômica, observando a necessidade de proteção e respeito intenso por esses recursos naturais, pois a vida depende desses elementos, observemos o que transcreve o autor abaixo:

Anastacio Peralta ainda compara a natureza a um corpo humano, cujas florestas compõem a pele, e os rios são como “o sangue em nossas veias”. E, para Flor Brilhante, “Os brancos estão judiando da ÑandeSy” Ou seja, para esses povos, a natureza é um organismo vivo, que deve ser tratado com respeito e igualdade pelos seres humanos, que são dependentes dela, pois a terra constitui o elemento central de suas vidas, e de seu ñandereko(Um olhar peculiar para a natureza: os guarani e suas crenças1 (SILVA, Renata Cavazzana,2016)

Portanto, para o índio o solo é muito mais do que uma entidade física ou um substrato para o cultivo; é uma parte integral de sua cultura, identidade e modus vivendi.

Os povos originários tem uma visão cosmológica em relação ao meio ambiente, ou seja, não é o solo apenas aquele que fornece a alimentação para a sobrevivência, mas é alargada, vinculando seu modo de viver (espiritual, praticas culturais, cultivo) a  esse sentido global, toda a natureza faz parte  da sua relação com o meio ambiente.

Em sua obra ecologia, capital e cultura Henrique Leff ( 2009,p.57) descreve que as práticas indígenas eram voltadas para ao mesmo tempo renovar e conservar a capacidade de produção do solo.

Eles compreendem que o solo está interligado com a água, as plantas, os animais e os seres humanos, e essa compreensão influencia suas práticas de manejo e seu respeito pela terra. E nós somos povos guardiões da terra, o povo indígena (Davi Kopenawa, 2019).

Desta feita, percebe-se que em nada se assemelha a relação dos povos originários com o solo e a concepção advinda de outros povos. Enquanto que para os índios trata-se de um todo, a natureza, a terra, o meio ambiente é interligado e seu valor vai além do econômico, para a sociedade moderna, trata-se de exploração, apenas para fornecimento de recurso natural para movimentar a economia e contribuir para a sobrevivência humana. Ratificando a concepção indígena de terra preceitua Eliana Potiguara., (1989, p. 07):

Não há sociedade de classes entre os índios, porque a terra e os bens de produção são coletivos, não existindo assim nem ricos e nem pobres. 3 – A sociedade indígena é comunitária. O trabalho é comunitário. Não havendo relação de poder, as relações humanas são harmoniosas (pais e filhos, marido e mulher etc.) e a ajuda, bem como solidariedade mútuas são altamente presentes. 4-O índio não acumula bens materiais; produz o necessário para viver.

Assim, para as comunidades indígenas, o solo não é apenas um recurso natural, é a base de sua espiritualidade, cultura, subsistência e identidade e serve como um elo vital nessa rede. O cuidado com o solo é para essas comunidades um dever sagrado, uma responsabilidade de preservar a harmonia entre os seres humanos e a natureza, que até os dias atuais tentam manter seu modo de viver preservando suas tradições, conforme foi ensinado pelos seus ancestrais.

Toda a ação humana altera o estado natural dos materiais para melhor aproveitá-los e, assim, imprime à natureza as marcas características de uma determinada cultura:

O que podemos dizer, isto sim, é que as sociedades indígenas convivem com o ambiente sem depredá-lo irreversivelmente (TASSINARI, 1995, P. 453). Um olhar peculiar para a natureza: os guarani e suas crenças1SILVA, Renata Cavazzana da2

Por isso, ao reconhecer e respeitar os conhecimentos tradicionais, podemos abrir espaço para soluções inovadoras e sustentáveis, promovendo uma abordagem mais holística e igualitaria na busca por respostas aos desafios presentes.

Desta feita, o estudo multidisciplinar do solo, sua complexidade e importância em diversas áreas científicas apresenta o quanto é relevante a preservação e cuidado com o meio ambiente, por isso, a concepção dos índios enriquece essa compreensão, dando uma perspectiva holística e espiritual sobre o solo.  Unir esses conhecimentos é fundamental para promover práticas sustentáveis e respeitosas com a natureza, honrando não apenas a ciência, mas também as tradições e sabedorias ancestrais das comunidades indígenas.

CRISE AMBIENTAL- QUANDO COMEÇOU?

A crise ambiental começa a sua jornada a partir do processo de colonização europeia no século XV, quando as potências coloniais buscaram explorar os recursos naturais de terras recém-descobertas. A busca por riquezas levou à exploração desenfreada de florestas, minerais e vida selvagem, modificando ecossistemas inteiros e causando estragos ambientais significativos.

A busca por riquezas levaram as potências coloniais, como Espanha, Portugal, Inglaterra, França e Holanda a uma caça desenfreada pelos recursos naturais, por isso, florestas foram derrubadas para madeira e agricultura, minerais foram extraídos desregulamente, e a vida selvagem foi perseguida para peles e carne. Essa exploração indisciplinada visava o lucro imediato e não considerava as implicações ambientais a longo prazo.

Ainda, com a expansão das potências europeias por meio das grandes navegações, a relação com o solo mudou drasticamente, a cultura de extração e exportação da floresta foi implementada, o que acarretou em uma exploração intensiva do solo. Como podemos observar em Marchant (1943, p. 25) sobre a exploração do pau-brasil:

Sancionando esse período Fernão de Noronha, ilustre mercador português do  século XVI, com articulação política já existente a época conseguiu autorização de comercio com a Índia e preparou inúmeras frotas de  navios que saíram com as armadas para o Leste; e assim também conquistou o monopólio do pau-brasil, mandando vários embarcações a explorar esse artigo

Além da extração permanente de pau-brasil e monocultura de cana-de-açúcar, a atividade mineradora (especialmente de ouro e diamantes) no século XVIII , nos vales do rio Doce e no rio das Mortes (rio das Velhas), também resultou em gandre impacto ambiental: áreas degradadas, erosão e poluição dos rios e mudanças no ecossistema presente até os dias atuais. Essas práticas econômicas coloniais visavam a extração dos recursos de forma célere até o esgotamento, no intuito acumular capital nas metrópoles e abastecer o mercado externo de matérias primas. (PRADO JUNIOR, 1998)

A exploração colonial no século XVIII, marcada pela degradação de recursos naturais, como o pau-brasil, e o estabelecimento de monoculturas de açúcar e café, teve profundos impactos socioambientais.

A exploração desenvolvida do pau-brasil levou à devastação significativa de extensas áreas florestais. O corte incluído para a obtenção de riquezas da madeira causou desequilíbrios nos ecossistemas locais, resultando na perda de biodiversidade e na manipulação do solo.

O desmatamento intensivo e exploração do Pau-Brasil influenciaram severamente sobre os componentes do Ecossistema. (A IMPORTÂNCIA DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL NA PRESERVAÇÃO DO PAU-BRASIL -Paubrasilia echinataEliane Oliveira Marquesa,Daniela Cristina Silva Borges,2020, pag.06)

A introdução da monocultura de cana-de-açúcar teve efeitos devastadores nos ecossistemas. Grandes extensões de terras foram convertidas em plantações, levando ao desmatamento e perda de habitats naturais. com o esgotamento do solo devido às práticas agrícolas. A monocultura acentuou a erosão dos solos, dirimindo destarte, sua fertilidade. Notas sobre a migração campo-cidade e amonocultura no Brasil,(Lucas Guedes Vilas Boas, pag.09, 2015)

A expansão da monocultura de café no século XVIII também levou à transformação massiva de paisagens naturais. A derrubada de florestas para dar lugar às plantações comprovadas em desequilíbrios ecológicos, erosão do solo e diminuição da biodiversidade. A ocupação dos imensos espaços territoriais disponíveis para a expansão cafeeira representou uma das maiores intervenções humanas na história da paisagem natural. (Técnica, Trabalho e Natureza na Sociedade Escravista, 1998

As atividades cafeicultoras no Brasil, ao longo dos séculos XIX e XX, tiveram consequências graves no meio ambiente, com o auge do ciclo do café, quando grandes extensões de terras foram convertidas em plantações e práticas agrícolas intensivas foram empregadas, a expansão das plantações de café levou ao desmatamento em larga escala, principalmente na região Sudeste do Brasil, vejamos:

durante  os  séculos  XIX  e  XX,  a  criação  de  um  mercado  global  de café,   transformou   ecossistemas,   especialmente   com   a   circulação   de   pessoas (plantadores  de  café,  agrônomos,  trabalhadores),  de  plantas  (novas  variedades  e espécies   de   café   em   circulação),   novas   ideias   e   técnicas   (monoculturas, sombreamento, insumos químicos) (EXPANSÃO DA FRONTEIRA NO CAFÉ NO BRASIL E A CHEGADA NO CAFÉ NAS ÁREAS FLORESTADAS DO BRASIL CENTRALMaria Eduarda Fernandes Santos1Lucas Figueiredo Ribeiro 2Rodrigo Fernandes de Souza 3Sandro Dutra e Silva

No século XX durante a crise cafeeira  o governo promoveu a queima de estoques de café para tentar controlar a oferta e estabilizar os preços. Essa prática teve impactos ambientais negativos, pois resultou em emissões atmosféricas provenientes da queima de grãos, houve uma tendência à intensificação do uso de insumos químicos, como fertilizantes e pesticidas, além da contaminação de recursos hídricos. Na tentativa de conter a queda, o governo federal comprou grande parte dos estoques dos produtores e queimou 80 milhões de sacas do produto. (A Crise de 1929 atingiu a economia e mudou a ordem política no Brasil   GIULIANA VALLONE)

Introduzida a monocultura agroexportadora  no século XIX, XX e  prosseguindo até os dias atuais, caracterizada por latifúndios monocultores de agricultura extensiva,  essa prática agrícola, focada na produção em larga escala de um único produto destinado à exportação, atrai impactos negativos no meio ambiente, na sociedade e na economia. Nesse sentido, a monocultura foi, e é até hoje, responsável por grande parte dos desmatamentos de florestas no Brasil. Primeiro a mata atlântica na região sudeste e mais recentemente o Pantanal e a Amazônia tem sofrido por conta do avanço da soja.   

Nas áreas a montante do Pantanal, expandiu-se a monocultura da soja destinada à exportação, bem como a da cana-de-açúcar para a produção de biocombustível, provocando na região, de forma indireta, os efeitos socioeconômicos negativos próprios desse tipo de exploração agrícola. (Cenários para a Gestão Ambiental no Brasil Claudio Antonio G. Egler∗ Gisela Aquino Pires do Rio, 20 novembro de 2014)

Já entre os anos de 1914 e 1918 , quando ocorreu a primeira Guerra Mundial houve um grande avanço tecnológico, isso porque para o uso generalizado de novas armas, como tanques, aviões e armas químicas, foi necessário  a busca  por matérias-primas, como minerais metálicos (ferro, alumínio, cobre) e combustíveis fósseis (carvão, petróleo), para a produção de armamentos e máquinas de guerra.  

Com a expansão do uso do motor a combustão em direção a praticamente toda a esfera da guerra, o petróleo se tornou um artigo de primeira necessidade,passando sua posse a significar condição para a vitória ou mesmo derrota, no caso de não se garantirem as fontes de suprimento. O petróleo e a Primeira Guerra Mundial: consequências operativas e planejamento estratégico Bruno Luiz de Souza Ronchi* Bruno Palombini Gastal** Stefano Arroque*** Yuri Pinheiro da Rosa, p. 62****

Por isso, com a busca em grande quantidade dos recursos naturais para a fabricação dos armamentos, também estimulou a destruição de ecossistemas, especialmente nos países fornecedores de matérias primas como o Brasil. Novamente o resultado é o aumento da pressão sobre as áreas de floresta e espaços geográficos ricos em recursos minerais e vegetais, com o Brasil. Importante registrar que toda a histórica estrutura econômica do Brasil (da colonização a República), foi pautada naquilo que Enrique Leff (1998) denominou de racionalidade econômica.

Após a primeira guerra mundial, entre 1918 e 1939, surgiu uma breve preocupação com a recuperação ambiental, porém, a grande depressão econômica da década de 1930, combinada com o crescimento das indústrias de armamentos e o aumento da produção industrial, levou um uso mais intensivo dos recursos naturais. Em outras palavras, não havia, até então, uma demanda social, nem mesmo uma consciência ecológica, que justificasse a adoção sistemática de medidas de mitigação ou controle ambiental.

Estas ganhariam o primeiro contorno com a intensificação da industrialização nos anos 1930.  (POLÍTICA AMBIENTAL BRASILEIRA: ANÁLISE HISTÓRICOINSTITUCIONALISTA DAS PRINCIPAIS ABORDAGENS ESTRATÉGICAS Marcus Bruno Malaquias Ferreira∗ Alexandre Ottoni Teatini Salles*,pag. 14, 2017)

O período entre guerras assistiu o aumento do consumo de bens de consumo, incentivado pelo sistema capitalista, e com isso, mais uma vez, a demanda crescente por matérias-primas, como metais, petróleo e produtos químicos foi notório, levando a um maior impacto ambiental.

a etapa de “administração dos recursos naturais”, iniciada nos anos 1930, refletia uma visão de sistema econômico pouco integrado com as questões ambientais. As ações eram voltadas a disciplinar o acesso aos insumos necessários para a promoção de uma industrialização intensiva em recursos naturais (POLÍTICA AMBIENTAL BRASILEIRA: ANÁLISE HISTÓRICO INSTITUCIONALISTA DAS PRINCIPAIS ABORDAGENS ESTRATÉGICAS Marcus Bruno Malaquias Ferreira∗ Alexandre Ottoni Teatini Salles*, pag. 14, 2017)

A Segunda Guerra Mundial (1939- 1945) também alavancou como na primeira guerra mundial uma produção em larga escalada seja industrial e militar, houve uma exploração ainda maior em razão dos avanços tecnológicos de recursos naturais, com intuito de produzir mais armamentos, navios, aeronaves e munições. Em verdade, a disputa dos recursos brasileiros por Estados Unidos e Alemanha no limiar do conflito constitui chamativo precedente da movimentação do País no tabuleiro do jogo das potências mundiais, interessadas – como sempre estiveram – nos recursos naturais dos países periféricos.pag.04

No pós-guerra (1945 em diante) o sistema capitalista, impulsionado pela grande onde consumista e a disseminação de uma mentalidade de produção e consumo incessantes, intensifica-se a crise ambiental a partir do que os historiadores denominam a Grande Aceleração: período histórico em que o uso dos recursos naturais e minerais, bem como a emissão de gás carbono, cresceram de forma exponencial, como nunca antes. (ARTAXO, 2014)

O crescimento econômico tornou-se sinônimo de progresso, levando a uma exploração insustentável dos recursos naturais e à produção em massa de bens descartáveis, gerando resíduos que sobrecarregam ecossistemas delicados, conforme descrição do autor abaixo:

grande aceleração” iniciada no final da Segunda Guerra Mundial. É evidente que, se os indicadores da “grande aceleração”, especialmente os que se referem ao crescimento da população global e do crescimento do consumo dos recursos naturais renováveis e não-renováveis, se mantiverem, o risco de futuras situações de crise e colapso torna-se-á muito significativo.(pag. 10, Os Desafios Ambientais Criados pela Grande Aceleraçã Pós-Guerra Filipe Duarte Santos*, 2010

Portanto, criou-se a ideia de que as descobertas de novos recursos naturais e o avanço tecnológico levariam o homem a uma sociedade melhor, pois  os recursos naturais pareciam inesgotáveis, como se fossem infinitos e a exploração dessas fontes naturais foram elevando as alterações em todo ecossistema, acarretando mudanças em todo meio ambiente, observe o que a autora abaixo apresenta sobre essa discussão:

A busca ilimitada pelo abastecimento constante dos recursos naturais e a amplitude cada vez maior das relações de produção capitalistas por todo o globo impõem um ritmo frenético de produção e consumo, incompatível com o ritmo da natureza. (Ana Carolina Quintana e Vanessa Hacon, 2011 pag.444)

Como vimos a demanda incessante por recursos naturais para o crescimento econômico resulta na exploração excessiva de recursos E, além disso, contribui para o aumento da desigualdade socioeconômica, tornando cada vez mais complexa para certas sociedades lidar com os impactos adversos das alterações climáticas, da poluição e da influência ambiental.

O rápido crescimento populacional pode aumentar os problemas econômicos, sociais e ambientais, tais como a inacessibilidade aos recursos, a generalização da pobreza, o desemprego e a degradação ambiental. Sustentabilidade:diferentes perspectivas, um objectivo comum JOÃO VICTOR INÁCIO PEREIRA, pag. 07,2014.

Segundo Henrique Leff (2009,p.) a degradação ambiental não é um resultado direto da pressão demográfica sobre a capacidade de carga dos ecossistemas, mas das formas de apropriação e usufruto da natureza. E o exploração econômica capitalista, pautada pela racionalidade ambiental, produziu uma grave situação de crise ambiental.  

Para o enfrentamento dessa crise, Leff (2009, pag. 99) sugere que as questões ambientais não podem ser tratadas de forma singular, mas multidisciplinar e pluralista que ele denomina racionalidade ambiental, onde os conceitos modernos atuais interagem com o conhecimento tradicional e locais sobre o meio ambiente.Esclarece ele que “os princípios de racionalidade ambiental reorientam as políticas científicas e tecnológicas para o aproveitamento sustentável dos recursos, visando a construção de um novo paradigma produtivo e de estilos alternativos de desenvolvimento” (2009, p. 30).

Leff defende a importância da transdisciplinaridade, que envolve a colaboração entre diversas disciplinas, como economia, ecologia, sociologia e antropologia. Essa abordagem ampla permite uma compreensão mais completa dos desafios socioambientais e a busca por soluções mais integradas., vejamos:

Os principais objetivos da racionalidade ambiental introduzem uma série de critérios qualitativos como proposito desta nova estratégia de desenvolvimento (uma distribuição mais equitativa da riqueza, uma maior participação social na tomada de decisões e no controle das atividades produtivas, assim como uma melhora da qualidade ambiental e de vida. (Leff. H, 2009, pag.308)

Por outro lado, o autor acima citado afirma que a racionalidade econômica conduziu um processo tecnológico orientado para as necessidades de acumulação do capital, para ele a visão convencional da economia que busca maximizar o crescimento econômico e o lucro a qualquer custo, muitas vezes ignora os impactos ambientais negativos e o esgotamento de recursos naturais. Ele argumenta que essa visão unidimensional da racionalidade econômica leva a uma exploração insustentável do ambiente e à degradação ambiental:

A racionalidade econômica ao maximizar os excedentes e beneficios economicos a curto prazo deixa a questão da equidade social e da sustentabilidade ecologica para as politicas distributivas de uma riqueza criada sobre a base da acumulação do capital que é intrisecamente destruidora da natueza. (Leff, 2009, p. 42).

Por fim, para Leff (2009) a sociedade contemporânea tem como base a racionalidade econômica que é responsável pela degradação ambiental que teve como consequência a perda da qualidade de vida dos seres humanos e destruição do ecossistema gerados pela universalização do capital. Por isso é preciso uma nova racionalidade capaz de trazer a tona novas práticas econômicas mais sustentáveis e justas, e para tanta as comunidades tradicionais, especialmente os povos originários tem muito a contribuir para o desenvolvimento da racionalidade ambiental.

RETORNO DAS PRÁTICAS SUSTENTAVEIS PARA SUPERAR A CRISE AMBIENTAL

Como vimos, a exploração desenfreada dos recursos naturais no decorrer do tempo deixou como herança um ecossistema em desequilíbrio, limitado na produção, desajustado e restrito na diversidade biótica.

 Atualmente a disponibilidade dos recursos naturais estão se tornando cada vez mais escassos em razão do desenvolvimento socioeconômico, a crescente demanda por alimentos, o avanço do desmatamento, entre outros fatores que colaboram para o comprometimento do ecossistema.

No entanto, para Leff (2009) a crise ambiental é uma crise da razão e não uma crise de fundo ecológico, assim descreve: “a necessidade de criar uma cultura ecológica para transformar as relações do homem com a natureza.” (Leff, 2009, p.281).

Então para a superação da crise ambiental instalada, a educação pode ser a fonte de resgate dos ensinos pretéritos das práticas advindas das comunidades indígenas. Por meio desses ensinamentos haverá um processo estratégico de que se utilizará para a formação cultural e a retomada de valores abolidos, que contribuirá para o alcance e construção de um planeta sustentável. É nesse sentido que os princípios de participação dos povos indígenas nas agendas do desenvolvimento sostenible dos mesmos como fundamentos de nova racionalidade social e produtiva. H, Leff, 2009, pag. 272.

Por isso, em nosso entendimento, e considerando a perspectiva de Leff (2009), as práticas dos povos originários e seu conhecimento se tornam relevantes para esse momento da história porque seus saberes podem ajudar a recuperar o ecossistema devastado. Portanto, o diálogo é primordial mesmo com percepções distintas, porque é cabível negociar interesses que são contrapostos e iniciar a base de um futuro sustentável.

Atualmente, é sabido que alguns conceitos e práticas estão sendo resgatados, exemplo disso é a rotação de culturas que consiste na prática agrícola que envolve a alternância de diferentes culturas em uma mesma área ao longo do tempo, é uma opção que ajuda a melhorar a fertilidade, reduzir o acúmulo de pragas e doenças e diminui a degradação do solo com finalidade de atenuar os problemas advindos da pratica da monocultura. Um exemplo do modelo de agricultura indígena que deveria ser seguido é o de reproduzir a diversificação, tanto de espécies como de variabilidade genética. .(Características da Agricultura Indígena e sua Influência na Produção Familiar da Amazônia,Raimundo Nonato Brabo Alves, 2001, pag 20).

O monocultivo juntamente com algumas práticas culturais impróprias têm causado a degradação do solo e a perda dos recursos naturais. Nas áreas de lavouras temporárias, bem como em áreas de pastagens não há utilização de boas práticas.

Com a rotação de culturas há clara evidência de recuperação do solo e continuidade da produção do ecossistema, permitindo que a natureza se recomponha da intervenção antrópica negativa.

Os povos indígenas mantiveram essa prática e mesmo com a influência tecnológica em algumas de suas terras e do conhecimento do homem branco, foram fieis a sua cultura de manejo da terra, por isso, até os dias atuais os indígenas fazem o cultivo em tempos distintos para cada espécie. Há respeito à natureza e todo o ecossistema, uma vez que para esses povos existem o que se denomina calendário agrícola, baseado na astrologia, a diversificação de culturas, seu roçado é caracterizado com esse conhecimento e por isso apresenta-se em  diferentes espécies para cada período do ano.  

Muitas tribos indígenas dõminavam sistemas sofisticados de produção que incluíam desde conhecimentos de calendários agrícolas baseados na astrologia, até sistemas de seleção e manejo de solos e diversificação de culturas.(Características da Agricultura Indígena e sua Influência na Produção Familiar da Amazônia,Raimundo Nonato Brabo Alves, 2001, pag 05)

Outra prática que está sendo resgatada na agricultura é o uso de adubos orgânicos, como compostagem e esterco, substituindo os fertilizantes químicos, que auxiliam na fertilidade do solo e não prejudica o meio ambiente e aumentam a capacidade de retenção de água do solo. Em relação aos custos para se incluir essa prática veja análise:

Pode-se considerar também que no manejo sustentável do solo, é uma prática relativamente simples, aproveita os restos de culturas e de animais local, e quando comparada com adubações químicas, em se tratando de custos de produção, reduz em até três ou quatro vezes os custos, sendo, portanto, muito rentável além de sustentável, pois melhora as propriedades físicas, químicas e biológicas do solo. (A PRÁTICA DA COMPOSTAGEM NO MANEJO SUSTENTÁVEL DESOLOS, Edimar Teixeira Diniz Filho, UFERSA, 2007

Quando se fala de práticas sustentáveis para superar a crise ambiental já instalada é importante ressaltar a respeito do Manejo Sustentável do Solo que inicia com o monitoramento e avaliação da qualidade do solo. A análise de parâmetros como pH, teor de matéria orgânica e nutrientes é feita para entender as necessidades do solo, minimizar o uso de pesticidas e fertilizantes químicos fazem parte da ideia do manejo sustentável, que com essas práticas evita a poluição da água e a degradação do solo.

O uso e manejo sustentável do solo são essenciais para garantir a produção contínua de alimentos saudáveis para uma população em crescimento.

Os indígenas da Amazônia desenvolveram sistemas de manejo de agroecossistemas que podem e devem servir de referência para novos sistemas de uso da terra, dentro do conceito de sustentabilidade que a sociedade atualmente exige. Características da Agricultura Indígena e sua Influência na Produção Familiar da Amazônia,Raimundo Nonato Brabo Alves, 2001, pag 19)

A reintrodução de prática agrícolas tradicionais, baseados na diversidade de cultivos e no uso sustentável da terra, pode reduzir a pressão sobre o solo e promover a regeneração ambiental. Conforme  exemplo do manejo sustentavel, há esperança para  um caminho promissor de aliar a harmonia entre a humanidade e o meio ambiente.

É possível fazer a junção da sabedoria ancestral das comunidades indígenas com as inovações contemporâneas permitindo desta forma a construção de uma nova cultura econômica que respeite a integridade ambiental, promova a igualdade  social e garanta um futuro sustentável para todos. Melhor ajuste do atual processo de reprodução do capital as condições de regeneração dos recursos naturais e de equilíbrio ecológico (Leff, 2009 , pag. 233/234).

Nesse sentido, podemos afirmar que os índios detêm na sua cultura a realização do manejo sustentável, realizando praticas que permitem o solo se recompor após sofrer algum tipo de impacto. Abaixo segue observação:

O manejo indígena, ao contrário, estimula a diversidade, permite a recaptura de nutrientes e estimula a regeneração. O fogo indígena é combinado por atividades que compensam o seu potencial destrutivo, para fazer frente ao processo de lixiviação, à exposição ao calor e à chuva, que tendem a empobrecer os nutrientes do solo, carente de fósforo, nitrogênio, potássio, cálcio e magnésio. No início, ateiam fogo controlado para a abertura dos terrenos de plantio e posteriormente a prática é repetida em menor escala, como uma técnica integrada ao conjunto de sua orientação no manejo dos recursos, com objetivos de fertilização e abertura de espaços reservados aos cultivos selecionados.O fogo faz parte, nestas culturas, de um conjunto de técnicas de manejo pelas quais os índios relacionam o trato da vegetação com o cuidado a ser dedicado aos animais, ou seja, a atração da caça e a garantia de alimentos A parcela a ser queimada é cercada com grama seca e arbustos . . .(236 ESTUDOS AVANÇADOS 14 (40), 2000 e de outras plantas úteis.)

Assim, o manejo sustentável do solo, permite a preservação da fertilidade do solo conforme exemplo de prática realizada pelas comunidades indígenas acima citadas, garantindo o sucesso contínuo da agricultura, redução da erosão do solo e evitando a perda de solo fértil e a poluição de recursos hídricos.

Por isso, revisitar e valorizar as práticas indígenas é essencial e possui um papel crucial na busca por soluções para superar a crise ambiental. As comunidades indígenas desenvolveram ao longo de gerações um profundo conhecimento sobre os ecossistemas locais e suas práticas de manejo sustentável. Esse conhecimento é valioso para a gestão ambiental e a preservação da biodiversidade. (Leff, 2009)

A respeito dos povos originários Leff (2009, p. 131) afirma que são fontes de motivação das populações rurais e base de sua atividade criativa, inovadora e produtiva, de sua capacidade de mudança e adaptação, de seu potencial de incorporar de maneira seletiva, elementos da ciência e da tecnologia moderna às suas práticas produtivas tradicionais.

Deste modo, a visão cosmológica dos povos originários vai de encontro a um profundo respeito pela natureza e uma compreensão da interconexão entre todas as formas de vida, o que é visto nas suas ações são uma aliança entre cultura, espiritualidade, vida, tudo entrelaçado em perfeita harmonia, o que promove uma ética de conservação, assim descrito abaixo:

Precisamos, portanto, avançar na consolidação dessa parceria com os povos indígenas no cotidiano das ações de Educação Ambiental, reconhecendo inclusive que os mesmos são nossos parceiros preferenciais na preservação ambiental. (OUTRAS EPISTEMOLOGIAS EM EDUCAÇÃO AMBIENTAL: o que aprender com os saberes tradicionais dos povos indígenas Mauro Guimarães1Heitor Queiroz de Medeiros2).

Por fim, é necessário desenvolvermos o exercício do diálogo para a superação da crise ambiental visando contemplar valores pretéritos para o tempo atual como  as práticas indígenas  que permitem aprendermos lições valiosas e assim encontrarmos soluções práticas para amenizar ou abortar a destruição do nosso ecossistema e desenvolvermos um novo modo de vida com valores que respeitem os recursos naturais e sua finitude.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante de todo exposto, é possível superar a crise ambiental presente nos dias atuais com soluções práticas sustentáveis inspiradas nas tradições indígenas e ao mesmo tempo atender as demandas do mercado capitalista. Porém, essas medidas necessitam da colaboração e transformações significativas nos sistemas econômicos e culturais contemporâneos.

Por isso, os aprendizados sustentáveis influenciados pelas culturas indígenas podem ser benéficos para a gestão dos recursos naturais e a conservação ambiental, isso inclui a implementação de técnicas agrícolas e florestais sustentáveis, o respeito pela biodiversidade e a promoção de uma ética de conservação devem ser levados em consideração para se tornar realidade o retorno de um ecossistema equilibrado.

 A adaptação do mercado capitalista é essencial para se alertar a respeito da finitude dos recursos naturais e assim trabalhar sobre a perspectiva do consumo consciente.,  incorporar modelos de negócios, por meio de ações como ,a produção orgânica, manejo sustentável,  diversidade na agricultura através da rotação de cultivo e a educação ambiental precisam ser acrescentados para mudar o cenário de degradação ambiental visível nos dias atuais.

Desta feita, podemos adquirir uma convivência equilibrada entre a humanidade e a natureza, garantindo que as próximas gerações leguem um planeta saudável, com uma postura  voltada à preservação do nosso ecossistema com uso consciente dos recursos naturais disponíveis, visando a diminuição do consumismo para preservar e resgatar as práticas sustentáveis e  recuperar o meio ambiente da degradação que vem sofrendo nos últimos anos.

Por meio de medidas que envolvam todos, é racional pensarmos que o quadro presente, requer um trabalho lento e gradual, que trará resultados e estancará a destruição do ambiente e melhorará a qualidade de vida. Assim, é necessário cultivar um novo modo de vida, com outros valores em termos de sustentabilidade e meio ambiente.

Por fim, a cultura ecológica e as práticas indígenas principalmente são decisivas, pois desempenham um papel importante na preservação dos ecossistemas, pois ao longo de gerações e com um profundo respeito pela natureza e uma compreensão intrínseca do meio ambiente, as comunidades indígenas em todo o mundo oferecem saberes valiosos sobre como viver em harmonia com todo ecossistema. Os índios detêm uma gestão cuidadosa dos recursos naturais e conexão espiritual com a terra que oferecem um modelo inspirador de práticas sustentáveis mitigatórias e compensatórias para restaurar e regenerar a natureza que foi destruída por diversas atividades antrópicas e neste tempo precisam ser substituídas por atividades que tragam resultados positivos para destruição que fora causado em todo meio ambiente existente.

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