ESPONDILOSE ANQUILOSANTE EM CÃO JOVEM: RELATO DE CASO

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7992495


¹Míriam Cristina Alves de Oliveira Campos;
¹Lorhaynne Amandha de Aguiar Rabello Soares;
¹Mariane Diniz Lelis;
²Débora de Almeida Caborges;
³Fabrício Alves de Oliveira Campos.


RESUMO

A espondilose anquilosante é uma doença que acomete a coluna vertebral, comumente nas porções torácicas, lombares ou lombossacrais. Ela geralmente acomete cães idosos e é caracterizada por neoformações ósseas proliferativas. Seus sinais clínicos comuns são dor, dificuldades motoras, claudicação, paresia parcial/total, entre outros. O diagnóstico é realizado por meio de radiografia, mas outros exames de imagem mais avançados também podem ser utilizados. O tratamento é baseado nos sintomas do paciente, podendo-se utilizar fármacos para alívio de dor e também métodos não farmacológicos, como fisioterapia e acupuntura.

Palavras chave: acupuntura, espondilose anquilosante canina, fisioterapia veterinária, moxabustão

ABSTRACT

Ankylosing spondylosis is a disease that affects the spine, commonly in the thoracic, lumbar or lumbosacral portions. It usually affects elderly dogs and is characterized by proliferative bone neoformations. Its common clinical signs are pain, motor difficulties, claudication, partial/total paresis, among others. Diagnosis is made by means of radiography, but other more advanced imaging tests may also be used. The treatment is based on the patient’s symptoms, and drugs can be used for pain relief and also non-pharmacological methods, such as physiotherapy and acupuncture.

Keywords: acupuncture, canine ankylosing spondylosis, veterinary physiotherapy, moxibustion

INTRODUÇÃO

Os cães têm a coluna vertebral composta por 7 vértebras cervicais, 13 torácicas, 7 lombares, 3 sacrais e cerca de 20 caudais. Ela é responsável pela sustentação do eixo corporal e pela manutenção da postura. E também é por meio dela que acontece a movimentação do animal (DYCE, 2010). Distúrbios da coluna vertebral são observados com bastante frequência no atendimento veterinário de cães (SANTOS et al., 2006).

A espondilose anquilosante é uma enfermidade de origem idiopática, que geralmente acomete cães idosos e é caracterizada por neoformações ósseas proliferativas nas vértebras (MELO, 2022). A espondilose ocorre com mais frequência nas vértebras torácicas, lombares e lombo-sacrais, especialmente em cães da raça Boxer e de raças grandes (SANTOS et al., 2006).

Os sinais clínicos manifestados pelo animal dependerão da localização da lesão e também de sua gravidade, mas os mais comuns incluem dor focal ou generalizada, paresia, ataxia, paralisia e distúrbios de micção. Por meio da avaliação no atendimento clínico do paciente, assim como análise do histórico, do início dos sinais e da progressão da doença, é possível obter as informações necessárias para o estabelecimento do tratamento indicado (NELSON; COUTO, 2015).

Exercícios terapêuticos, fisioterapia, medicação analgésica e anti-inflamatória e suplementos alimentares (colágeno tipo II, sulfato de condroitina, etc), acupuntura simples e eletroacupuntura, e quiropraxia são algumas das opções utilizadas (HALLE; GRANHUS, 2021).

A fisioterapia é a opção apropriada para o tratamento de alterações da coluna vertebral em cães porque propicia redução da dor e do tempo da recuperação no pós-cirúrgico, e também é capaz de melhorar a função e a qualidade dos movimentos, o que favorece muito a reabilitação dos animais. Por meio do uso de exercícios terapêuticos, agentes físicos e terapias manuais, a fisioterapia veterinária tem importante contribuição na prevenção e no tratamento das doenças nos animais (RIOS, 2016).

OBJETIVO

O objetivo desse artigo é relatar o caso de uma cadela jovem com espondilose anquilosante e demonstrar as relações entre bem estar animal, qualidade de vida e tratamentos como fisioterapia e acupuntura.

DESCRIÇÃO DO CASO

Uma cadela SRD de quase 4 anos, 20 kg, castrada foi levada para consulta em uma clínica da cidade de Contagem, em Minas Gerais, apresentando claudicação do membro posterior esquerdo. A paciente fazia uso contínuo de Condroplex LB® e tinha histórico de espondilose na região lombar e espondilite em vértebra L2, que foi descoberta há cerca de três anos quando ela realizou radiografia dessa região. Nesse mesmo exame de imagem também foi visualizada outra alteração, discoespondilite, que foi tratada com Doxiciclina na mesma época.

A paciente estava ativa, tinha o calendário vacinal atualizado, segundo a tutora estava com alimentação, urina e fezes normais. Os parâmetros clínicos estavam fisiologicamente dentro do esperado, mas durante a palpação da coluna vertebral o animal apresentou reação de dor na região lombossacral.

Diante do histórico pregresso e do exame físico foi solicitada radiografia da coluna lombar na projeção laterolateral e também da pelve na projeção ventrodorsal. Também foi prescrito para a paciente Dipirona Sódica (500mg VO/BID) por 6 dias e Dexametasona (SC/SID) por 5 dias.

O exame de imagem foi realizado e foi possível ver espondiloses nas vértebras L1, L2, L3, L7 e S1, sendo anquilosante entre L2-L3 e L7-S1 (Figura 1). Além disso, também foram evidenciados remodelamentos ósseos de cabeças femorais e um discreto deslocamento lateral da patela direita com relação ao sulco (Figura 2). A posição radiográfica da pelve foi feita com muita dificuldade devido à agitação e à movimentação constante do animal, por isso, pode haver interferência no diagnóstico.

Figura 1: Radiografia da região lombar da coluna vertebral em projeção laterolateral. Fonte: Arquivo pessoal

Figura 2: Radiografia da pelve em projeção ventrodorsal. Fonte: Arquivo pessoal

Diante do laudo dos estudos radiográficos foi prescrito para a paciente Gabapentina (100mg VO/BID) por 15 dias e Ograx Artro 10® (VO/SID) para uso contínuo. A tutora também foi orientada a conciliar a essa prescrição sessões de fisioterapia e de acupuntura.

A paciente fez uso das medicações e iniciou fisioterapia e acupuntura. Os exercícios do protocolo fisioterápico eram compostos por 20 repetições de pista de obstáculos (Figura 3) e de circuito; e 10 repetições de alongamentos de paravertebrais e de comando “senta e levanta”. Também eram feitos os alongamentos de membros pélvicos (Figura 4), torácicos e coluna (Figura 5) em 3 séries de 30 segundos cada e 30 repetições de cada mobilização articular (Figura 6).

Figura 3: Pista de obstáculos nível médio. Fonte: Arquivo pessoal

Figura 4: Alongamento de membro pélvico. Fonte: Arquivo pessoal

Figura 5: Alongamento de coluna. Fonte: Arquivo pessoal

Figura 6: Mobilização de articulação. Fonte: Arquivo pessoal

Alguns equipamentos foram usados como adjuvantes dos exercícios, como a laserterapia com a caneta de 830nm feita de forma pontual nas vértebras, quadril, joelhos e cotovelos; a magnetoterapia feita no quadril e a moxabustão realizada nos pontos de acupuntura e no aplicador rolo (Figura 7).

Após pouco mais de um mês de acompanhamento conjunto da equipe veterinária da clínica médica e da fisioterapia o animal já havia cessado a claudicação e foi liberado das sessões fisioterápicas para manter somente os exercícios do protocolo em casa diariamente.

Figura 7: Moxabustão no aplicador rolo. Fonte: Arquivo pessoal

DISCUSSÃO

Distúrbios da coluna vertebral são frequentemente observados no atendimento veterinário de cães. (SANTOS et al., 2006). A anamnese é utilizada para classificar o distúrbio por meio da coleta de dados, como o início e a duração dos sinais clínicos, histórico de traumas, evidência de dor, os membros afetados, se há existência de incontinência fecal ou urinária, entre outros (DENNY; BUTTERWORTH, 2006; FOSSUM, 2008).

O exame ortopédico da coluna vertebral é feito por meio de uma cuidadosa palpação das vértebras, atentando-se para sinais incomuns, como áreas de contorno anormal e hiperestesia (DEWEY, 2015). Os exames complementares de imagem, como radiografia, tomografia computadorizada e ressonância magnética, são muito importantes para estabelecer o diagnóstico de alterações na coluna vertebral, já que, de acordo com Denny e Butterwoeth (2006), esses exames proporcionam visualização de fraturas, reduções de espaço intervertebral, processos de anquilose, protusões do disco intervertebral, entre outros. A anamnese aliada ao exame físico mostra-se essencial para o direcionamento de cada atendimento clínico.

Segundo Ortega et al (2012) a espondilose afeta mais comumente as vértebras torácicas, lombares e lombossacrais, mas também pode ocorrer nas vértebras cervicais. Levine et al (2006) e Ortega et al (2012) afirmam que essa doença é mais comum em cães idosos, entretanto o caso clínico deste artigo apresenta a ocorrência em paciente jovem.

O estudo de Santos et al (2006) resalta a frequência do desenvolvimento dessa afecção em cães da raça Boxer e também nos de porte grande, não sendo o caso do animal em questão, que é SRD e de porte médio. Essa situação resalta a força da hereditariedade e faz-se confirmar que, apesar de mestiço, o cão pode aflorar doenças e distúrbios típicos de raças e portes específicos.

As opções que existem para tratamento das afecções de coluna vertebral variam consideravelmente e a decisão sobre o melhor tratamento a ser realizado está relacionada a alguns fatores: estágio da doença, grau de urgência e as limitações financeiras do tutor (MIKAIL; PEDRO, 2009). As cirurgias são indicadas nos casos de dor persistente ou déficit neurológico de moderado a grave, Já nos casos em que os sintomas são leves ou os pacientes são idosos e/ou tem outras doenças concomitantes a escolha é o tratamento conservativo. Ele consiste em repouso com restrição na movimentação do paciente por tempo determinado, além do uso de medicação (corticoides ou anti-inflamatórios não-esteroides e analgésicos) para redução de dor (MIKAIL; PEDRO, 2009; ROBERTSON; MEAD, 2013) e suplementos alimentares (sulfato de condroitina, colágeno tipo II, etc) para proteção das articulações (HALLE; GRANHUS, 2021).

O tratamento fisioterápico pode ser utilizado para reabilitação pós-cirúrgica, lesões musculoesqueléticas, pré-operatório, casos neurológicos, (SANTOS et al., 2006; ALVES; STURION; GOBETTI, 2019), assim como para manutenção da qualidade de vida e preservação da mobilidade do animal em tratamentos conservativos (ROBERTSON; MEAD, 2013). A fisioterapia pode reduzir a inflamação, melhorar a irrigação sanguínea e a cicatrização dos tecidos, estimular o sistema nervoso, auxiliar no controle de peso, melhorar a função cardiorrespiratória e diminuir distúrbios nas articulações, ligamentos e nos tendões (ALVES; STURION; GOBETTI, 2019).

O protocolo fisioterápico deve ser personalizado para cada paciente e nele deve ser considerados alguns fatores, como disposição do animal, idade, expectativas para desempenho no futuro, urgência de recuperação, equipamentos disponíveis e custo.

(LEVINE; MILLIS; MARCELIN-LITTLE, 2008). As técnicas de alongamento geralmente são realizadas em conjunto com a amplitude passiva de movimentos para aumentar a flexibilidade das articulações e a capacidade de extensão dos tecidos periarticulares, músculos e tendões (PEDUCIA, 2010).

Os exercícios ativos são utilizados para reduzir a dor e melhorar a amplitude de movimentos e a propriocepção, por isso, são recomendados para o protocolo de reabilitação de vários diagnósticos, incluindo as afecções de coluna vertebral e os danos neurológicos. Eles devem ser prescritos pelo fisioterapeuta veterinário como parte do programa de tratamento, assim como devem também compor o programa de exercícios para realização em casa. (SAUNDERS, 2007).

Algumas terapias vêm ganhando espaço como adjuvantes dos alongamentos e dos exercícios praticados na fisioterapia. A laserterapia é um método não farmacológico e não invasivo que usa radiação eletromagnética para produzir reações químicas (MIKAIL; PEDRO, 2009). Ela é indicada para tratar distúrbios ortopédicos, neurológicos e também musculoesqueléticos (KLOS; COLDEBELLA; JANDREY, 2020). Já a magnetoterapia caracteriza-se pela aplicação de campos magnéticos que agem nos tecidos e também no sangue, aumentando a solubilidade das substâncias, tecido ósseo e no colágeno, ativando o metabolismo celular e a proliferação mitótica nos tecidos lesionados (MIKAIL; PEDRO, 2009).

A acupuntura é uma técnica milenar em que ocorre estimulação de pontos corporais específicos, os chamados acupontos (FARIA; SCOGNAMILLO-SZABÓ, 2008). Eles ficam localizados em grandes terminações nervosas como em tendões, vasos e cápsulas articulares (ALVES; STURION; GOBETTI, 2019). A escolha dos pontos deve ser baseada no diagnóstico do animal, mas sempre levando em consideração os efeitos locais, sistêmicos e a distância (SCOGNAMILLO-SZABÓ; BECHARA, 2010).

Devido ao seu potente efeito analgésico a acupuntura é indicada para o tratamento de doenças neurológicas e processos agudos ou crônicos de dor. Nessa técnica além das agulhas convencionais, pode-se utilizar também, moxabustão, implantes de agulha de ouro, eletroacupuntura ou injeção de vitamina B12. (FOGANHOLLI; FILADELPHO; 2007)

CONCLUSÃO

Espondilose é uma doença que acomete a coluna vertebral, geralmente nas porções torácicas, lombares ou lombossacrais. Os sintomas dependem da região acometida, mas dor local ou generalizada é o mais comum.

Embora não haja cura para a doença, há diversas abordagens terapêuticas que podem ser utilizadas para minimizar os sintomas, como uso de anti-inflamatórios e de suplementos de sulfato de condroitina e colágeno tipo II, assim como os protocolos de fisioterapia e de acupuntura. Os tratamentos devem sempre focar no alívio da dor e no aumento da longevidade dos pacientes.

Dessa forma o diagnóstico precoce e o tratamento adequado são fatores essenciais para garantir bem estar e melhora da qualidade de vida dos cães com espondilose.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALVES, M., V., D., L., D.; STURION, M., A., T.; GOBETTI, S., T., D., C. Aspectos gerais da fisioterapia e reabilitação na medicina veterinária. Ciência Veterinária UniFil, v. 1, n. 3, 2019.

DENNY, H.; BUTTERWORTH, S. Cirurgia ortopédica em cães e gatos. Exame neurológico, 2006.

DEWEY, C. W. Cirurgia de pequenos animais. Cirurgia da coluna toracolombar, 4 ed , 2015.

DYCE, K. Tratado de Anatomia Veterinária. Elsevier Brasil. ISBN 9788535246421, 2010.

FARIA, A., B., D.; SCOGNAMILLO-SZABÓ, M. V. R. Acupuntura veterinária: conceitos e técnicas-revisão. Ars Veterinaria, v. 24, n. 2, 2008.

FOGANHOLLI, J., N.; FILADELPHO, A., L. Tratamento de distúrbios neuromusculares em cães com o uso da acupuntura. Revista Científica Eletrônica de Medicina Veterinária. Editora FAEF, Ano V, Número 09, Julho de 2007.

FOSSUM, T. Cirurgia de pequenos animais. Princípios fundamentais da neurocirurgia, Elsevier, 2008.

HALLE, K.S.; GRANHUS, A. Veterinary chiropractic treatment as a measure to prevent the occurrence of spondylosis in boxers. Vet. Sci. https://doi.org/10.3390/vetsci8090199, 2021

KLOS, T., B.; COLDEBELLA, F.; JANDREY, F., C. Fisioterapia e reabilitação animal na medicina veterinária. Pubvet, v. 14, 2020.

LEVINE, D.; MILLIS, D. L.; MARCELIN-LITTLE, D. J. Introdução à reabilitação física em veterinária. Reabilitação e fisioterapia na prática de pequenos animais. ROCA, 2008.

LEVINE, G., J.; LEVINE, J., M.; WALKER, M., A.; POOL, R., R.; FOSGATE, G.,T. Evaluation of the association between spondylosis deformans and clinical signs of intervertebral disk disease in dogs: 172 cases (1999–2000). JAVMA, 228(1), 2006.

MELO, L. A. S. B. Uso de ozonioterapia como tratamento para o alívio da dor crônica e miofascial causada por espondilose: revisão de literatura e descrição de sete casos clínicos . Lisboa, 2022.

MIKAIL, S.; PEDRO, C. Fisioterapia veterinária. 2 ed. Manole, ISBN 9788520424407, 2009.

NELSON, R.; COUTO, C. Medicina interna de pequenos animais. Localização da lesão e exame neurológico. Elsevier Brasil, 2015.

ORTEGA, M.; GONÇALVES, R.; HALEY, A., WESSMANN, A., PENDERIS, J. Spondylosis deformans and diffuse idiopathic skeletal hyperostosis (DISH) resulting in adjacent segment disease. Vet Radiol Ultrasound, 53(2), 2012.

PEDUCIA, D. D. Fisioterapia: amplitude de movimento e alongamento. 2010.

RIOS, M. S. Fisioterapia veterinária: as diversas modalidades terapêuticas. 2016.

ROBERTSON, J.; MEAD, A. Physical therapy and massage for the dog. CRC Press. ISBN 9781840766097, 2013.

SANTOS, T. C. C. D. et al. Principais afecções da coluna vertebral de cães: estudo retrospectivo (1995-2005). Veterinária e Zootecnia, v. 13, n. 2, 2006.

SAUNDERS, D. G. Therapeutic exercise. Clinical techniques in small animal practice, Elsevier, v. 22, n. 4, 2007.

SCOGNAMILLO-SZABÓ, M., V., R.; BECHARA, G., H. Acupuntura: histórico, bases teóricas e sua aplicação em Medicina Veterinária. Ciência Rural, v. 40, n. 2, 2010.

THRALL, D. Diagnóstico de Radiologia Veterinária. Elsevier Brasil. ISBN 9788535279610, 2014.


¹ Centro Universitário UNA
² Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
³ Universidade José do Rosário Vellano – UNIFENAS