ESCATOLOGIA DO MOSQUITO ANÓFELES E AEDES: SUA TRAJETÓRIA HISTÓRICA

ESCHATOLOGY OF THE ANOPHELES AND AEDES MOSQUITO: THEIR HISTORICAL TRAJECTORY

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ra10202510091445


Dirson Dresle Alves Soares1
Náfria Chianca da Silva Soares2
Marizete Silva Prates3


Resumo. Os relatos sobre a presença do mosquito anófeles e aedes aegypti remontam a milhares de séculos, tendo sua influência no meio ambiente nas mais variadas áreas do planeta Terra. Os mosquitos anófeles e aedes são conhecidos por serem vetor de doenças graves, como a malária, dengue, febre amarela e outras. Estas doenças são transmitidas através da picada dos mosquitos, que transmitem o parasita responsável pela doença. Além das doenças, os mosquitos anófeles também representam riscos para os humanos devido à sua capacidade de transmitir alérgenos, substâncias responsáveis por causar alergias. 

Palavras-chave: mosquitos anófeles; Aedes aegypti; trajetória histórica; saúde; mazelas.

Abstract. This article reports about the presence of the anopheles mosquito and Ae. aegypti date back thousands of centuries, having their influence on the environment in the most varied areas of Earth Planet. Anopheles and aedes mosquitoes are known to be vectors of serious diseases, such as malaria, dengue fever, yellow fever and others. These diseases are transmitted through the bites of mosquitoes, which transmit the parasite responsible for the disease. In addition to diseases, anopheles mosquitoes also pose risks to humans due to their ability to transmit allergens, substances responsible for causing allergies. 

Keywords: anopheles mosquitoes; Aedes aegypti; historical trajectory; health; ills.

Introdução

Este artigo tem como escopo abordar o tema da influência das mazelas causadas pela ação dos mosquitos em diferentes épocas da história apresentando de forma mais resumida as fases em que é possível observar a presença do mosquito no contexto histórico da humanidade. Para isso foi usado como base o livro “O Mosquito: a incrível história do maior predador da humanidade, autor Dr. Timothy C. Winegard”, no qual é feito um levantamento histórico do tema proposto.

A transmissão de algumas doenças ocorre quando os seres humanos entram em contato com animais infectados ou quando os alimentos ou água contaminados são ingeridos. Algumas doenças zoonóticas incluem doenças transmitidas por insetos, como a malária, febre amarela e o vírus Zika, doenças transmitidas por alimentos, como a salmonelose, e doenças transmitidas através de animais, como a raiva. 

Para Winegard (2022, p. 30), 

A transmissão natural de doenças entre animais e humanos é chamada de zoonose (doença animal, em grego). […] aumento mais acentuado ao longo dos últimos cinquenta anos é o do arbovírus, que são vírus transmitidos por vetores artrópodes como carrapatos, pernilongos e mosquitos”. (WINEGARD, 2022, p. 30).

Assim, os relatos sobre a presença do mosquito remontam há milhares de séculos, tendo sua influência no meio ambiente nas mais variadas áreas do planeta Terra. Segundo Winegard há “um exército de 110 trilhões de mosquitos patrulhando o globo terrestre […] Em 2018, ele sacrificou apenas 830 mil pessoas” p. 12.

A análise de fósseis ajudou os pesquisadores a entender como o parasita malárico evoluiu, e quando ele passou a afetar os humanos. Além disso, também nos ajudam a entender como o parasita malárico se espalhou por todo o mundo e como ele se adaptou a diferentes hospedeiros. “Através da análise de alguns fósseis podemos deduzir que uma forma de parasita da malária, que surgiu pela primeira vez em aves há 130 milhões de anos, assolou ancestrais humanos primordiais há apenas seis a oito milhões de anos” (WINEGARD, 2022, p. 31).

Outras doenças transmitidas por mosquitos incluem o vírus Zika, o vírus da dengue, a febre chikungunya, a leishmaniose, a filariose, as arboviroses, etc. Algumas destas doenças podem ser transmitidas diretamente de uma pessoa infectada para outra, enquanto outras são transmitidas por mosquitos. Por exemplo, a malária é transmitida por mosquitos do gênero Anófeles, enquanto a dengue é transmitida por mosquitos do gênero Aedes. 

De acordo com o Relatório Oficial da Associação Americana de Saúde Pública:

As quatro formas de malária humana podem apresentar tais semelhanças […]. A mais grave, por falciparum (terçã maligna) pode ter um quadro clínico variável que inclui febre, calafrios, coagulação, choque, insuficiência renal e hepática […]. p. 232

Documentos históricos sugerem que os primeiros navios carregados com escravos que partiram da África para a América, também estavam carregados de insetos, incluindo os mosquitos, em que vasilhas de água ou outros recipientes serviam para a preservação das provisões, e que podiam permitir que os mosquitos viajassem a grandes distâncias.

A malária faz parte dos protozoários e os sintomas da malária são febre, calafrios e dores musculares, o que ocorre em cerca de 7 a 30 dias após a picada do mosquito. Se a doença não for tratada, podem ocorrer complicações mais graves, como anemia, insuficiência renal e até mesmo a morte. Winegard (2022, p. 38) comenta em seu livro: “Hoje em dia, todo ano são quase trezentos milhões de desafortunados que contraem malária […].

Malária causada por Plasmodium vivax tem sintomas mais leves do que a malária causada por Plasmodium falciparum. Os sintomas de Plasmodium vivax incluem febre, cansaço, dor de cabeça, calafrios e suores. Já os sintomas de Plasmodium falciparum incluem febre alta, calafrios, dores abdominais, náuseas, vômitos, dor de cabeça, escurecimento da pele e anemia. A malária causada por Plasmodium falciparum também pode causar complicações graves, como convulsões, falência de órgãos e até mesmo a morte “o parasita da malária aninhado em seu fígado passará por um ciclo impressionante de sete etapas. Ele precisa de vários hospedeiros para sobreviver e procriar – o mosquito e um batalhão de vetores secundários: humanos, macacos, […]” (WINEGARD, 2022, p. 39).

Quando um mosquito infectado suga o sangue de uma pessoa, ele transfere os parasitas para dentro do organismo da vítima. Uma vez dentro do organismo, o parasita se multiplica e invade as células vermelhas do sangue, causando sintomas como febre, dores de cabeça, dores musculares, fraqueza e náuseas. Winegard (2022, p. 39) assinala: “as hemácias inchadas acabam se arrebentando, espalhando tanto uma forma duplicada, que segue para atacar hemácias novas”.

Os sumérios são considerados como o povo mais antigo que se estabeleceu na Mesopotâmia, a região que é considerada o berço da civilização. Eles desenvolveram a escrita cuneiforme, e estabeleceram as primeiras cidades da região, que serviram como um modelo para as cidades modernas. Além disso, os sumérios também desenvolveram sistemas de irrigação, e leis de propriedade. Esta civilização também deixou um grande legado cultural, incluindo poesia, epopeias, e obras de arte em tela, bronze e cerâmica. Essa região fora palco da presença de doenças transmitida por mosquitos em seus primórdios:

A referência mais antiga a uma doença transmitida por mosquito remonta a 3.200 a.C. Tabuletas sumérias, descobertas no “berço da civilização” entre os rios Tigres e Eufrates, na antiga Mesopotâmia, descrevem claramente febres maláricas atribuídas a Nergal, o deus babilônico do mundo inferior, representado como um inseto que lembra um mosquito. (WINEGARD, 2022, p. 67).

Tutancâmon foi um faraó famoso por ter sua múmia bem preservada, descoberta em 1922 no túmulo da Vala dos Reis. No entanto, foi durante seu reinado que o Egito declinou, perdendo territórios para os hititas. O faraó também foi responsável por fazer as reformas religiosas introduzidas por Aquenatón reversíveis, fazendo com que o culto a Amon-Ra se tornasse novamente o culto oficial no Egito. A descoberta dos cientistas foi muito significativa, pois forneceu um forte indício de que a malária foi uma doença endêmica no Egito antigo. Isso sugere que a morte de Tutancâmon não foi causada pelo envenenamento, como muitos acreditavam anteriormente, mas sim pela malária. Além disso, esses achados também forneceram informações importantes sobre o comportamento das doenças no Egito antigo e nos permitiu entender melhor o ambiente de saúde em que Tutancâmon viveu. Winegard (2022, p. 70-71) Afirma que: “A morte por malária falciparum do faraó, aos dezoito anos, em 1323 a.C., marcou o começo do declínio do Egito […], é mencionada no papiro egípcio mais antigo com texto sobre medicina, datado de 2.200 a.C.”

Os egípcios usavam a urina como tratamento para a malária. Isso era feito de duas maneiras principais. Primeiro, a urina podia ser usada como compressa, que era aplicada à área afetada. Além disso, a urina também era consumida como parte do tratamento. Os egípcios acreditavam que a bebida poderia curar a malária por seus nutrientes e propriedades terapêuticas. Também se acreditava que a bebida criaria uma barreira interna para proteger o corpo da malária. 

Na China antiga, a malária era conhecida como uma doença comum e temível. Os antigos também acreditavam que era causada por um “espírito maligno” que precisava ser exorcizado para curar a doença. Quesada em:  “La Enfermedad y el Hombre” na página 37 assim nos diz: En China, se señala la presencia de epidemias desde el año 243 a. de C.

Durante séculos a malária foi uma doença comum na Índia, com epidemias se espalhando por todo o país. As primeiras referências à malária na Índia datam de aproximadamente 1500 a.C., quando as acharam mencionadas nos Vedas, os principais textos sagrados do hinduísmo. Conforme Richard Gordon em: “A Assustadora História da Medicina”, p. 27: O médico hindu Susruta (c. 500 d.C.) suspeitava que a malária era disseminada não pelo ar, mas pelos mosquitos que zumbiam ao fim do dia […].

I – Trajetória Ocidental – época antiga e primeiros relatos da presença do mosquito e suas influências

A Grécia Antiga foi um dos principais berços do conhecimento humano. Esta cultura foi responsável por desenvolver grandes avanços na filosofia, matemática, astronomia, medicina, poesia, teatro, história e muito mais. A influência da cultura grega foi sentida ao longo dos séculos e ainda é evidente na arte, arquitetura e literatura moderna. 

Os gregos antigos acreditavam que o conhecimento era uma ferramenta para melhorar a condição humana. Os gregos antigos também foram pioneiros na criação de sistemas de governo, leis e educação. Estes sistemas foram influenciados por sua crença de que o conhecimento era a chave para o progresso. 

A crença grega de que o conhecimento era a chave para o progresso ajudou a moldar a história e a cultura ocidental. Esta crença ainda está presente na sociedade ocidental de hoje.

A tocha do progresso foi passada de Sócrates para Platão e Aristóteles até ir parar nas mãos ambiciosas de um jovem príncipe, nas terras remotas da macedônia, norte de Atenas. Com o tempo impulsionaria e disseminaria a cultura, os livros e as ideias gregas […], em bibliotecas magnificas e enriquecidas pela mente, pela literatura, […]. (WINEGARD, 2022, p. 79).

As guerras médicas são caracterizadas por inúmeros conflitos entre persas e gregos, porém, a batalha de Plateias foi uma importante guerra travada entre as forças gregas e persas, na província de Plateias, na região de Beócia, na Grécia, em agosto de 479 a.C. Esta batalha ocorreu como parte da Segunda Guerra Médica e teve como resultado uma grande vitória para os gregos.

O exército grego, liderado pelo Rei Leônidas I, resistiu ao exército persa, comandado pelo Rei Xerxes I, durante três dias, até que os gregos foram forçados a se retirar devido à superioridade numérica do inimigo. No entanto, Leônidas e seus 300 espartanos, juntamente com os seus aliados, conseguiram causar danos significativos ao exército persa antes de serem derrotados. Assim descreve o autor: “As forças terrestres dos persas foram obrigadas a atravessar um terreno pantanoso […]. “As fileiras dos persas foram imediatamente tomadas por malária e pela disenteria, a tal ponto que as baixas superaram a faixa dos 40%”. (WINEGARD, 2022, p. 86).

Hipócrates (médico grego) notou que a estrela Canícula aparecia na mesma época em que as epidemias de malária eram mais frequentes e mais mortais. Ele acreditava que o aumento na temperatura e a umidade que acompanhavam a estrela poderia ter algo a ver com as epidemias de malária. Ele também acreditava que as mudanças climáticas e sazonais que acompanhavam a estrela poderiam influenciar a saúde das pessoas (WINEGARD, 2022, p. 87): “o inchaço do baço e os ciclos febris, as faixas de tempo e a severidade das diferentes infecções maláricas “terçã, quartã”, […]. 

A Teoria dos Miasmas de Hipócrates dizia que as doenças eram causadas por vapores ou substâncias maléficas em suspensão no ar. Segundo esta teoria, os miasmas eram liberados por corpos em decomposição, esgotos, lixo e outras fontes, e eram transportados pelo vento para causar doenças. Para Winegard (2022, p. 89), “Hipócrates e seus predecessores chegaram extremamente perto da origem, pois associaram a malária à água parada, mas não aos mosquitos que se reproduziam nela”.

O Rei Filipe II, da Macedônia, organizou o exército macedônio de forma inovadora. Ele usou a falange, uma formação militar com soldados equipados com sarissas, que eram lanças longas. Ele também criou um sistema de oficiais e soldados profissionais, com base na meritocracia, que significa que aqueles que eram mais qualificados eram promovidos de acordo com o seu desempenho. Essas reformas foram essenciais para o sucesso militar da Macedônia.

Alexandre, o Grande, foi um dos mais famosos e bem-sucedidos governantes da antiguidade clássica. Nascido em Pella, na Macedônia, em 356 a.C., passou a maior parte de sua infância como príncipe da Macedônia. Aos 20 anos, assumiu o trono após a morte de seu pai, Filipe II. Durante os próximos dez anos, Alexandre conquistou a Grécia, a Ásia Menor, a Síria e a Pérsia, formando um vasto império. Ao longo de suas conquistas, ele implementou um sistema de governança, que incluía novas leis, tributação e reformas militares.

Além disso, ele promoveu o intercâmbio cultural entre seu império e a Grécia, permitindo a difusão de ideias gregas na Ásia. Esta interação enriqueceu ambos os lados, pois trouxe inovações tecnológicas, religiosas e artísticas para o mundo antigo. Alexandre também se destacou como visionário militar. O uso de táticas e estratégias inovadoras e o foco na disciplina e no treinamento de seus soldados foram essenciais para sua conquista. Após anos de campanha, Alexandre morreu em 323 a.C., deixando um legado duradouro e uma história lendária. Ele continua sendo considerado um dos maiores líderes militares da antiguidade e influenciou gerações de líderes no mundo moderno. De acordo com WINEGARD:

A sequência da enfermidade de Alexandre foi bem documentada por seus seguidores mais próximos e se encontra nos “Diários Reais”. Todas as descrições deixam claro que, desde o aparecimento dos primeiros sintomas até a morte, a doença de Alexandre durou doze dias. Considerando o período registrado, a partir da entrada de Alexandre pelo miasma pantanoso na Babilônia, incluindo os sintomas e o ciclo febril, até o momento da morte, tudo indica que foi malária falciparum. O poderoso Alexandre, o Grande, morreu em 11 de junho de 323 a.C., aos 32 anos, ceifado por um discreto e minúsculo mosquito. (WINEGARD, 2022, p. 100).

A Primeira Guerra Púnica iniciou-se em 264 a.C. com o conflito entre o Império Romano e o Império Cartaginês que durou até 241 a.C. O conflito começou como uma disputa por influência comercial na Sicília, mas logo se expandiu para outras regiões do Mediterrâneo, incluindo a península italiana. Em meio às batalhas havia um elemento surpresa.

No solstício de inverno de 18 de dezembro, o exército de Aníbal, já exaurido e esgotado, […] enfrentou na Trébia um bloqueio romano de 42 mil homens.

O sucesso dessa campanha dependia da garantia do elemento surpresa, preservado e protegido […] nos montes Apeninos, seguido de uma marcha lenta de quatro dias através de brejos infestados de mosquitos transmissores da malária. Os cartagineses conseguiram sair dos pântanos doentios, mas pagaram um preço enorme por isso. O mosquito sugou a saúde e a moral das tropas cartaginesas e do líder incrivelmente talentoso. Aníbal contraiu malária, e as febres intensas o privaram da visão no olho direito. (WINEGARD, 2022, p.p 110-111).

A malária foi provavelmente a causa da morte dos soldados cartagineses e dos seus generais. Os mosquitos são atraídos pelo calor e pela umidade, o que torna as áreas pantanosas e alagadas, como o delta do rio Anapo, um local propício para a transmissão da doença. O fato de os soldados terem entrado em território alagado e não habitado, os expôs ao contato com o agente infeccioso, que provavelmente foi a malária.

Quando as legiões e os mercadores de Roma se espalharam pela Europa, a malária foi junto. O vasto império que ia da África ao norte da Europa produziu um nível inédito de intercâmbio de ideias, inovações, pensamentos, mas também de pestilências. (WINEGARD, 2022, p. 117).

Legionários e administradores romanos também sofreram com o contato com esses parasitas, o que eventualmente acabou levando ao colapso da saúde deles e de seus exércitos.

Durante as campanhas germânicas, no começo do século I d.C., os alemães obrigavam repetidamente as legiões romanas, superiores, a combater e acampar em meio a brejos e pântanos, onde a malária e a péssima qualidade da água reduziam drasticamente a eficácia das tropas. Como se acreditava que esse miasma pantanoso fosse o responsável pelas doenças, essa tática alemã apresenta os principais indicativos de uma guerra biológica intencional. (WINEGARD (2022, p. 119).

Durante a tentativa de conquistar a Escócia os mosquitos da malária tiveram um papel importante, pois impediram que o exército de Roma tivesse êxito na batalha. WINEGARD (2022, p. 73) comenta que: “Os esforços romanos para subjugar a Escócia, que eles chamavam de Caledônia, também foram frustrados por uma cepa local de malária que matou metade dos oitenta mil homens que integravam o exército imperial”.

A cidade de Roma fora palco de várias epidemias de malária, em que o mosquito transmissor da malária conseguiu se aproveitar das obras construídas naquela cidade.

Ironicamente, o apreço que os romanos nutriam por jardins, cisternas, chafarizes, saunas e lagos, combinado ao sistema complexo de aquedutos, às enchentes naturais frequentes e a um período de aquecimento global na mesma época, proporcionou condições ideais para a propagação de mosquitos, tornando os cuidados com o embelezamento urbano armadilhas letais. […] epidemia se espalhou por toda a Itália, causou um despovoamento em grande escala e gerou multidões de refugiados nômades e migrantes itinerantes. A doença cobrou a vida dos imperadores Lúcio Vero e Marco Aurélio, cujo sobrenome da família – Antonino – passou a ser associado ao surto. (WINEGARD, 2022, p. 120-123).

II – Trajetória Ocidental e a Época Medievo: primeiros relatos da presença do guerreiro mosquito e suas influências

Neste item propomos relatar a influência do Anófeles na sociedade medieval, em uma época no qual o teocentrismo (doutrina ou crença que considera Deus como o centro de tudo) possuía um domínio social e político (Le Goff, 1981), que aduz: “a história da história não se deve preocupar apenas com a produção histórica profissional, mas com todo um conjunto de fenômenos que constituem a cultura histórica ou, melhor, a mentalidade história de uma época”. Na visão de WINEGARD,

Em meio à revolução cultural da Crise do Século III e às posteriores incursões estrangeiras rechaçadas pelos mosquitos dos pântanos pontinos durante a Era de Migrações, a malária crônica era um dos desafios para o status quo religioso e social. (WINEGARD, 2022, p. 136).

No espaço histórico-cristão primitivo, as enfermidades eram vistas como obrigatoriedade de fé e possibilitou a construção de “hospitais” nos primórdios do medievo.  Estes hospitais eram construídos por grupos religiosos católicos que buscavam oferecer assistência aos doentes, com o objetivo de mostrar o amor de Deus para aqueles que sofriam de enfermidades. Os hospitais eram geralmente construídos próximos aos mosteiros, e os monges se dedicavam ao cuidado dos doentes. Na concepção de Quesada,

Durante el Medievo en Roma los médicos no clericales dejaron de prestar assistência. Se fundaron Monasterios, como el de San Benedicto de Nursia, em Monte Casino, para la cura del enfermo. (QUESADA, 1985, p. 39).

Diferentemente da concepção cristã, os romanos usavam amuletos para a cura da malária, invocando os mais variados deuses daquele panteão sobrenatural. Assim explica o autor do livro “O mosquito”: 

Fuja, espírito odioso! Cristo o persegue; o filho de Deus e o Espírito Santo o dominaram. Ó Deus, do rebanho, proteja do mal sua aia Joannia. […] Ó Senhor Cristo, filho e Palavra do Deus vivo, que cura toda doença e toda enfermidade, cure e zele também por sua aia Joannia […] e expulse e elimine dela toda febre -cotidiana, terçã, quartã – todo calafrio e todos os males. (WINEGARD, 2022, p. 137-138).

Teodósio, durante seu reinado, promulgou uma série de leis que estabeleceram o cristianismo como a religião oficial do Império Romano. A Igreja Católica, cuja doutrina havia sido codificada por Constantino, foi oficialmente reconhecida como a única fé religiosa aceita pelo Estado. As leis de Teodósio proibiram a prática de qualquer religião não cristã e determinaram a destruição de templos pagãos. Com estas medidas, Teodósio consolidou o cristianismo como a força dominante na Europa, criando um marco fundamental para a formação de um império cristão e estabelecendo as bases para a transição do mundo clássico para a Idade Média. As leis e a doutrina estabelecidas por Teodósio foram as principais responsáveis pela disseminação do cristianismo e sua influência na cultura europeia.

Ele rescindiu a tolerância religiosa do Edito de Milão. Fechou templos politeístas, executou quem adorasse Febris ou portasse talismãs encantados com abracadabra e proclamou oficialmente o catolicismo romano como única religião formal do império. Assim, a cidade de Roma se tornaria o coração vivo do cristianismo e abrigaria a sede terrena de Deus no Vaticano. (WINEGARD, 2022, p. 139).

             O Vaticano foi estabelecido no século IV d.C., com a construção da basílica de São Pedro, porém a área que fora escolhida estava sobre um pântano, o ambiente perfeito para o mosquito da malária.

As legiões de mosquitos que habitavam os pântanos pontinhos protegiam a sede da Igreja Católica contra invasões estrangeiras enquanto também matava aqueles que ela acolhia. Durante grande parte desse período, os papas não residiam no Vaticano. O medo de contrair malária fez com que eles morassem por mil anos no Palácio de Latrão, do outro lado de Roma. Não surpreende que, durante o reinado da malária em Roma, os católicos nutrissem pela sede espiritual de sua fé mais terror do que respeito, ou talvez um terror respeitoso. (WINEGARD (2022, p. 140).

O Palácio de Latrão foi a residência dos papas de 1309 a 1377, quando se mudaram para o Vaticano. Durante esse período, o papa e seu cardeal viviam naquele espaço sagrado para evitar a malária, comum na época. Sua localização era ideal para evitar a contaminação, pois estava situado ao lado do rio Tíber, longe dos pântanos que eram uma fonte de mosquito transmissor da doença. Assim relata o autor de “o Mosquito”:

[…] os papas não residiam no Vaticano. O medo de contrair malária fez com que eles morassem por mil anos no Palácio de Latrão, do outro lado de Roma. Não surpreende que, durante o reinado da malária em Roma, os católicos nutrissem pela sede espiritual de sua fé mais terror do que respeito, ou talvez um terror respeitoso. (WINEGARD, 2022, p. 140).

Roma era somente um pequeno espaço de atrocidades causadas pelo mosquito Anófeles. Sua disseminação foi facilitada pela expansão dos sistemas de irrigação, que criaram habitats ideais para o mosquito. Além disso, a resistência do mosquito às temperaturas adversas permitiu que ele se espalhasse por toda a Europa, com a expansão territorial romana.

[…] Escócia e da Alemanha já citados, mas foi apenas no século VII que a malária se tornou endêmica no norte da Europa. Embora a letal malária falciparum não fosse capaz de resistir aos climas mais hostis das regiões frias, as formas malariae e vivax, que também podem matar, conseguiram se estabelecer, reproduzindo-se até na Inglaterra, na Dinamarca e na cidade portuária de Arcangel, no Ártico russo. (WINEGARD, 2022, p. 143).

A humanidade tem desempenhado um papel fundamental na criação de novos hábitats para o mosquito. Estes novos hábitats são muitas vezes mais ricos em recursos do que os habitats naturais, o que permite que o mosquito se desenvolva e se reproduza mais rapidamente “a densidade populacional de humanos e gados aumentou com o surgimento de vilarejos e cidades para sustentar essas colônias agrícolas, gerando uma onda de atividade em rios movimentados e em efervescentes portos comerciais”. (WINEGARD, 2022, p. 143).

III – As Cruzadas e o Guerreiro Anófeles

Na Idade Média, as Cruzadas eram conhecidas como “expedições de libertação” ou “guerras santas”. Estas expedições foram organizadas pelos líderes cristãos da Europa para libertar os lugares sagrados da Terra Santa dos muçulmanos. As Cruzadas foram realizadas entre 1095 e 1291.

A Primeira Cruzada, lançada em 1096, levou a uma série de investidas rumo à Terra Santa ao longo de duzentos anos, com o propósito de saciar uma combinação tentadora de ganância e ideologia, através da metodologia de invadir para lucrar, mal disfarçada de catequização religiosa (WINEGARD, 2022, p. 153).

A Primeira Cruzada foi um movimento de guerra religiosa liderado por reis e nobres europeus, com o objetivo de recuperar Jerusalém e outras regiões da Terra Santa das mãos dos muçulmanos. Os cruzados partiram em 1096, e ao longo da viagem, muitos deles foram mortos ou enfraquecidos por doenças, como a malária, que foi particularmente devastadora, pois muitos dos cruzados não estavam acostumados a lidar com as condições climáticas e ambientais da região. Além disso, a falta de alimentos e água potável também contribuiu para a redução do contingente. Quando os cruzados chegaram a Jerusalém, em 1099, eles eram muito menos numerosos do que quando partiram.

A primavera de 1098 foi acompanhada por chuvas e monções, o que proporcionou um verão carregado de malária e mosquitos implacáveis. No início do outono, milhares de cruzados já haviam morrido por causa do parasita letal, incluindo um reforço inteiro de 1.500 germanos. (WINEGARD (2022, p. 153).

A Segunda Cruzada foi liderada pelo rei Luís VII da França e pelo rei Conrad III da Alemanha. O objetivo era restaurar o controle cristão sobre a região e recuperar a cidade de Edessa. No entanto, a campanha foi um fracasso. Os cruzados foram derrotados em Dorylaeum e em Edessa, e a cidade foi perdida para os muçulmanos.

Recorrendo a uma onda de guerra biológica miasmática, os defensores de Damasco sabotaram deliberadamente todas as fontes de água nos arredores e nas rotas de acesso à cidade, criando um ambiente dominado pela malária para receber a grande entrada dos cruzados. O cerco de cinco dias em Damasco, em julho de 1148, durante o período de malária, foi mal planejado e executado, um desastre salpicado por parasitas. (WINEGARD (2022, p. 154 -155).

A Terceira Cruzada ocorreu no final do século XII, entre 1189 e 1192, e teve como objetivo recuperar Jerusalém dos muçulmanos. O rei Ricardo I da Inglaterra, também conhecido como Ricardo Coração de Leão, desempenhou um papel proeminente nessa cruzada. Essa empreitada teve como coadjuvante, Frederico I da Alemanha, também conhecido como Frederico Barbarossa, que liderou as forças alemãs. Barbarossa acabou morrendo em 1190 de forma acidental ao afogar-se no rio Saleph durante a travessia para a Terra Santa.

Saladino bloqueou a passagem dos cruzados a 150 quilômetros ao norte de Jerusalém, na cidade costeira e fortificada de Acre. […]. Quando a malária começou a sugar as forças dos sitiantes, Saladino, em uma ação brilhante e inesperada, cercou os inimigos e deu bastante oportunidade para que o mosquito se banqueteasse com Os Cruzados Encurralados. (Winegard (2022, P. 155).

IV – Os Novos Caminhos Aquáticos e a Presença do Mosquito

Bartolomé de las Casas nasceu em 1484 na Espanha e, depois de estudar direito, viajou para as Índias Ocidentais (Américas) em 1502. Ele inicialmente participou de expedições colonizadoras e chegou a Hispaniola, onde começou a receber encomendas de terras e escravos indígenas.

Las Casas narra a primeira década de colonização com um destaque intenso, feroz e irrestrito para as várias atrocidades que seus compatriotas cometeram contra os indígenas tainos. Seu relato pessoal é uma extensa denúncia da colonização espanhola e da imediata devastação humana provocada pela malária, pela varíola e por outras doenças. (WINEGARD (2022, p. 179).

Las Casas ao visitar a região de Darién, no Panamá, em 1534, verificou que havia um número grande de covas coletivas abertas com espanhóis vitimados pela malária. WINEGARD (2022, p. 180) “[…] os residentes espanhóis em Darién eram afligidos impiedosamente pelas “grandes quantidades de mosquitos que os atacavam […] então eles começaram a adoecer e morrer”.

A referência à “Costa do Mosquito” está relacionada à região costeira da América Central, que era notória pelos desafios enfrentados pelos exploradores e colonizadores devido à presença abundante de mosquitos e às doenças transmitidas por esses insetos, como a malária.

[..], Colombo e suas tripulações foram tão acossados e devorados pelos mosquitos e pela malária que deram à região o merecido nome de “costa do mosquito”. Fundado em 1510, em decorrência dessa viagem, o assentamento em Darién no istmo panamenho da já infame costa do mosquito foi a primeira colônia europeia dos continentes americanos. (WINEGARD, 2022, p. 180).

Bartolomé de las Casas, em suas obras e escritos, expressou grande preocupação com o impacto das condições adversas, doenças tropicais e conflitos com povos indígenas nas áreas exploradas pelos espanhóis, incluindo a “Costa do Mosquito”. Ele argumentava que muitos colonizadores espanhóis perderam suas vidas nessas regiões devido a uma combinação de fatores, incluindo as más condições climáticas, as doenças transmitidas por mosquitos, como a malária, e os confrontos com os habitantes locais.

Por mais chocante que isso seja, o sofrimento e a morte dos povos indígenas foram piores em um nível desproporcionalmente maior. Quinze anos após a instalação do assentamento em Darién, estima-se que algumas doenças, principalmente a malária, já haviam matado cerca de dois milhões de indígenas no Panamá. (WINEGARD, 2022, p. 181).

Há de se observar de acordo com a literatura, que o mosquito com os vetores da malária tivera sua origem em continentes diferentes da América, sendo aqueles “importados” via navios que atravessavam os oceanos, durante o período das grandes navegações.

[…] seus compatriotas moribundos haviam levado as doenças e os mosquitos vetores diretamente da Espanha e de suas escalas na África, quando estavam indo para o Caribe. Para os mosquitos fugitivos da África e da Europa, a travessia do oceano Atlântico […] (WINEGARD, 2022, p. 182).

Apesar dos impactos negativos, a viagem de Colón foi um marco histórico que mudou o curso da história mundial. A “descoberta” da América abriu um novo capítulo na expansão imperial europeia e no desenvolvimento do comércio global. Além disso, a troca de mercadorias, conhecimentos e culturas entre o Velho Mundo e o Novo Mundo permitiu um intercâmbio intenso e duradouro que moldou a sociedade como a conhecemos hoje.

[…] Europa tentaram reabrir essa via mercantil fundamental por rotas que contornassem o Império Otomano, cada vez maior e mais combativo. Após seis anos atormentando as monarquias europeias em busca de financiamento, o rei Fernando e a rainha Isabel da Espanha enfim cederam e aceitaram bancar a primeira viagem de um maluco místico, chamado Cristóbal Colón (como Colombo era conhecido em 1492), para restabelecer o comércio com o Extremo Oriente. (WINEGARD, 2022, p. 182).

Inicia-se então o processo de interação do continente europeu, com o desconhecido americano, por isso essa primeira viagem de Colombo marcou o início de uma nova ordem mundial, incluindo a introdução e a presença consolidada de mosquitos letais e suas doenças nas Américas, graças ao Intercâmbio Colombiano. (WINEGARD, 2022, p. 183).

O intercâmbio de mosquitos entre a África, Europa e América contribuiu para a propagação dessas doenças nas Américas. A falta de imunidade da população indígena e a presença de mosquitos vetores permitiram que essas doenças se espalhassem rapidamente, resultando em surtos epidêmicos em várias regiões. Ao longo do tempo, medidas de controle e prevenção foram implementadas para combater essas doenças, como a vacinação contra a febre amarela e o uso de repelentes e inseticidas para evitar a picada dos mosquitos.

As espécies até então benignas de Anopheles nativas do continente logo se tornaram um vetor para a malária. Considerando que elas haviam seguido uma linha evolutiva própria nos últimos 95 milhões de anos e que até então não haviam tido contato com o parasita, isso foi um poder de adaptação tremendo, tanto por parte do mosquito quanto da malária. (WINEGARD, 2022, p. 184).

A destruição do assentamento e a morte dos homens deixados por Colombo foram um duro golpe para o navegador e sua missão de estabelecer uma base permanente para a Espanha nas Américas. No entanto, isso não o impediu de continuar explorando e colonizando outras ilhas e terras na região.

Os tripulantes que haviam sido abandonados estavam mortos e os índios tainos estavam consumidos por um duplo surto de malária e gripe. O sangue virgem dos tainos, que Colombo havia descrito casualmente como “incontáveis, pois acredito haver milhões e milhões deles”, foi um tapete vermelho acolhedor para o faminto parasita. (WINEGARD (2022, p. 185).

Esses patógenos foram trazidos pelas tripulações europeias que viajavam para as Américas durante o período das grandes navegações. Como os nativos americanos não tinham imunidade contra essas doenças, elas se espalharam rapidamente e causaram devastação entre as populações indígenas. A falta de exposição prévia a esses patógenos e a falta de resistência genética os tornaram altamente suscetíveis às doenças, resultando em grandes perdas populacionais.

Essas doenças para as quais muitos europeus, mas certamente não todos, eram imunes permitiram que os invasores conquistassem e colonizassem grande parte do mundo, inclusive as Américas. Em diversas ocasiões, triunfos europeus, como o de Cortés, vieram na esteira de infecções, não o contrário. (WINEGARD, 2022, p. 186).

Além disso, é possível que a ausência de contato prévio com muitas doenças tenha deixado os povos indígenas mais vulneráveis a elas quando os colonizadores europeus chegaram, trazendo consigo uma série de doenças zoonóticas, como varíola, sarampo e gripe.

Esses fatores combinados contribuíram para a inexistência de doenças zoonóticas nas Américas pré-colombianas e “Além dessa falta de animais domesticados portadores de zoonoses, os povos indígenas não haviam praticado agricultura em nível industrial a ponto de alterar o equilíbrio ecológico, algo que ocorria em grande parte do Velho Mundo” (WINEGARD, 2022, p. 188).

Durante o período colonial, os colonizadores espanhóis aprenderam sobre as propriedades curativas do quinino através dos nativos e começaram a usar a substância para tratar a malária. Com o tempo, a notícia sobre esse medicamento eficaz se espalhou e o quinino ganhou popularidade entre os exploradores europeus que viajavam para as colônias em regiões tropicais onde a malária era endêmica.

V – Os Navios Negreiros e o Passageiro Anófeles

Os primeiros africanos escravizados nas Américas chegaram a Hispaniola (atualmente Haiti e República Dominicana) em 1502. Eles chegaram junto com o padre espanhol Bartolomé de las Casas, que veio de carona na quarta e última viagem de Cristóvão Colombo. A chegada desses africanos marcou o início do comércio de escravos africanos nas Américas, que se intensificou nos séculos seguintes.

O imperialismo europeu estava ligado à riqueza de recursos que as colônias ofereciam. A força vital da extração desse capital e do mercantilismo como sistema econômico, ao qual Smith se referia, foi o tráfico escravagista africano, que incluiu a introdução dos mosquitos africanos Aedes e Anopheles e suas doenças nas Américas (WINEGARD, 2022, p. 210).

Durante a travessia nos navios negreiros, os mosquitos Aedes aegypti encontraram condições favoráveis para se reproduzirem nos barris e poças d’água acumuladas nas embarcações. Assim, eles conseguiram sobreviver e continuar transmitindo o vírus mesmo após a chegada ao destino. Posteriormente, esses mosquitos proliferaram-se nas Américas, encontrando um ambiente adequado para se reproduzirem e disseminarem a febre amarela. Esse vírus é endêmico em regiões tropicais e subtropicais, onde o mosquito tem maior presença.

O letal vírus da febre amarela desembarcou nas Américas com os africanos escravizados e uma raça importada de mosquitos Aedes, que sobreviveu sem dificuldade à viagem nos navios negreiros, reproduzindo-se nos vários barris e poças d’água (WINEGARD, 2022, p. 212).

Esse primeiro surto definitivo da febre amarela nas Américas evidencia a rápida propagação e o impacto devastador que a doença pode causar em populações não imunizadas. A febre amarela continua sendo um problema de saúde em certas regiões tropicais e subtropicais onde o mosquito transmissor está presente. No entanto, medidas de prevenção, como a vacinação, têm contribuído para controlar a disseminação da doença.

Um Navio Negreiro Holandês Da África Ocidental Que Ficou Ancorado Em Barbados, Em 1647, Introduziu A Febre Amarela Nas Américas. Em Menos De Dois Anos, Esse Primeiro Surto Definitivo Da Doença Matou Mais De Seis Mil Pessoas Em Barbados. No Ano Seguinte, Em Seis Meses Um Surto Matou 35% Das Populações Nas Ilhas De Cuba, São Cristóvão E Guadalupe, Depois Atravessou A Flórida Espanhola. (WINEGARD, 2022, p. 213).

É necessário entender que o comércio de escravos na África pré-colonial não era um sistema estabelecido. Quando os europeus chegaram ao continente, eles se envolveram no comércio de escravos, aproveitando divisões e rivalidades pré-existentes entre as comunidades africanas.

Africanos submetiam outros africanos às garras da subjugação e servidão sob os europeus, algo que graças ao mosquito era impossível que os europeus fizessem sozinhos. O mosquito não permitiria que os europeus arrancassem africanos de suas terras. Sem a escravidão africana, a economia agrícola mercantilista do Novo Mundo teria malogrado. (WINEGARD, 2022, p. 220).

Os africanos costumavam escravizar prisioneiros de guerra e pessoas que cometeram crimes. No entanto, com o aumento da demanda por trabalhadores nas colônias portuguesas, os africanos começaram a se envolver cada vez mais no comércio de escravos. À medida que os europeus intensificaram sua presença na África, principalmente os portugueses, eles começaram a comandar e a influenciar o comércio de escravos. Os africanos passaram a capturar e vender escravos não apenas para atender às suas próprias necessidades, mas também para atender à crescente demanda europeia uma vez que “Ao explorarem esse conflito tradicional entre as nações e sociedades africanas, os europeus conseguiram introduzir uma forma extremamente distinta de escravidão, voltada para a exportação comercial em massa” (WINEGARD, 2022, p. 220).

A resistência dos africanos às doenças transmitidas por mosquitos era de grande valor, uma vez que essas doenças eram comuns nas regiões tropicais em que as colônias estavam localizadas. Isso significava que os africanos tinham menos probabilidade de ficarem doentes e, portanto, mais capacidade de trabalhar e produzir.

Conforme as colônias de “extração” espanholas se revelavam cada vez mais lucrativas, o incremento de mão de obra resultava em mais matérias-primas, o que significava mais dinheiro. Graças às imunidades genéticas e à resistência aclimada contra a malária, a febre amarela, a dengue e outras doenças transmitidas por mosquitos, os africanos eram simplesmente mais produtivos. (WINEGARD, 2022, p. 221).

No contexto colombiano, o Intercâmbio Colombiano, a entrada de africanos trouxe consigo características de ligação do mosquito com o novo território em fase de colonização. Ou seja, a entrada de africanos escravizados durante o período de colonização colombiano trouxe consigo o mosquito transmissor da malária, que se espalhou rapidamente nas áreas de plantações e minas onde os africanos trabalhavam. Isso resultou na disseminação da malária. Desse modo, “Quando o açúcar, o cacau e o café chegaram da África como os principais cultivos de exportação no Novo Mundo, o ciclo desse ecossistema africano importado para as Américas se fechou”. (WINEGARD, 2022, p. 222).

VI – Imperialismo e o Mosquito Far-Eastern

Estima-se que a epidemia tenha causado milhares de mortes nos Estados Unidos durante a era da Reconstrução. As doenças causadas por mosquitos afetaram principalmente os trabalhadores rurais e os pobres, que viviam em condições precárias.

Em Memphis, as multidões de doentes e moribundos […]. a guerra de secessão havia exaurido a vida vibrante do movimentado porto da indústria algodoeira e terminal ferroviário de quatro linhas importantes na primavera de 1878, a cidade contava com uma população diversificada de 45 mil habitantes, incluindo ex-escravizados recém-emancipados, arrendatários rurais, imigrantes alemães recentes, simpatizantes da confederação e proprietários de fazendas de algodão […]. (WINEGARD, 2022, p. 420).

Os mosquitos também são provedores de prejuízos econômicos, constituindo-se um problema de saúde públicas, tanto que o governo americano fora obrigado a tomar as providências de sanar as dificuldades na área médica e laboral:

A carnificina do mosquito em 1878, por exemplo, arrancou perturbadores 200 milhões de dólares da economia dos Estados Unidos. […] A reação do Congresso foi criar, no ano seguinte, o National Board of Health [Conselho Nacional de Saúde] para atender a essas questões de economia e de fragilização da saúde (WINEGARD, 2022, p. 424).

Na concepção de Winegard (2022, p. 425), para o mosquito, e para suas doenças da febre amarela, malária e dengue, houve oportunidade de entrada no sul. Com o afluxo de imigrantes pós-guerra acentuou ainda mais o que já era difícil, considerando a importação de novos tipos de doenças, como por exemplo, a malária endêmica foi reintroduzida na Nova Inglaterra, após décadas de ausência.  

As estradas de ferro romperam a fronteira do oeste incentivando um maior número de pessoas a migrarem para essas regiões em busca de oportunidades e terras férteis. Muitos colonizadores estabeleceram fazendas e pequenas comunidades ao longo das linhas ferroviárias, impulsionando o crescimento e a colonização do oeste dos Estados Unidos.

O “cavalo de ferro” transportou para as grandes planícies e as montanhas rochosas uma quantidade cada vez maior de pioneiros lavradores, mineradores em busca de fortuna e a proteção da cavalaria dos estados unidos, e lá eles se viram diante de povos indígenas orgulhosos e insubmissos que estavam dispostos a lutar em defesa de suas terras[…]seguindo as diligências e as ferrovias, a malária se infiltrou pelo oeste junto com os migrantes e vicejou na nova fronteira. (WINEGARD, 2022, p. 426).

Dessa maneira, com o aumento do fluxo de imigrantes, especialmente vindos de áreas onde essas doenças são endêmicas, o risco de introdução e propagação dessas doenças também aumentou. Além disso, a falta de infraestrutura e recursos disponíveis para o controle desses mosquitos no Sul agravou ainda mais a situação.

Considerações Finais

Considerando a discussão deste estudo, o assunto é muito vasto e por si só não se esgota, as lacunas tendem a permanecer em razão das inúmeras informações que posteriormente possam ser acrescidas. Não deixa de ser inconcluso no sentido de se ter abordado a linha histórica, sem por exemplo citar a área das ciências biológicas, médicas, entre outras. Porém dar-se o norte roteiral do tema proposto no sentido que outros estudos ou profissionais de diversas áreas tenham o dito texto como referências para futuras pesquisas.

Em suma, evidenciou-se que o autor descreve que as alergias causadas pelo anófeles podem ser tão graves quanto a malária, por isso também devem ser evitadas. Outra forma de influência dos mosquitos anófeles e Aedes aegypti  é a destruição de habitats naturais, em razão de eles serem capazes de se reproduzir em grandes quantidades em áreas alagadas, que em larga escala pode levar à redução de diversas espécies de animais e plantas, afetando os ecossistemas locais.  Por fim, os mosquitos também causam desconforto aos humanos devido às suas picadas, que são extremamente desagradáveis, e podem levar a vários problemas de saúde.

Referência 

GORDON, Richard. A Assustadora História da Medicina. Tradução Aulyde Soares Rodrigues – 8ª ed. Rio de Janeiro: Ediouro. 1997.

UJVARI, Stefan Cunha. A História da Humanidade Contada pelos Vírus. Editora Contexto. 2012

QUESADA, Federico Ortiz. La enfermedad y el Hombre. México: Editorial Nueva Imagen, S.A, 1985.

WINEGARD, Timothy C. O mosquito: a incrível história do maior predador da humanidade. Tradução Leonardo Alves. – 1ª ed. Rio de Janeiro: Ed. Intrínseca. 2022.


1Licenciado em História (2002) e Mestre em Letras, pela Universidade Federal de Rondônia (2015). dirsonalves@gmail.com
2Licenciada em Letras Espanhol (2012) e Mestra em Letras, pela Universidade Federal de Rondônia (2014) nafriachianca@hotmail.com
3Licenciada em Letras Inglês (2002) e Mestra em Letras, pela Universidade Federal de Rondônia (2014). spratesmari@gmail.com