ENSINO SOCIAL DA IGREJA DIANTE DOS POSTULADOS NEOFASCISTAS: UMA ABORDAGEM SOBRE 2019 A 2023 NO BRASIL

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.7922672


Joaquim Parron-Maria1


Resumo: Este artigo se destina a debater como o Ensino Social da Igreja Católica pode se contrapor aos postulados fascistas que têm grassado no Brasil, nos quatro anos entre 2019 e 2022, quando vigorou no país o governo de Jair Bolsonaro. Para essa aproximação, optou-se pelo confronto entre as ideias expressas pelo Ensino Oficial da Igreja e as ideias expressas pelo neofascismo contemporâneo. O percurso científico é uma breve exposição referenciada dos princípios constantes no Ensino Social da Igreja, seguida de uma busca das características do neofascismo contemporâneo, visto não ser ele uma teoria coesa e coerente, mas apenas um apanhado de ideias e características próprias para, por fim, confrontar ambas as ideias com vistas a destacar sua incompatibilidade.

Palavras-chave: Ensino Social da Igreja; Doutrina Social; Neofascismo; Fascismo.

Abstract:  This article is intended to discuss how the Social Teaching of the Catholic Church can oppose the fascist postulates that have been raging in Brazil in the four years between 2019 and 2022, when the government of Jair Bolsonaro was ruling in the country. For this approximation, we have chosen the confrontation between the ideas expressed by the Official Teaching of the Church and the ideas expressed by contemporary neo-fascism. The scientific path is a brief referenced exposition of the constant principles in the Social Teaching of the Church, followed by a search for the characteristics of contemporary neo-fascism, since it is not a cohesive and coherent theory, but only a collection of ideas and characteristics to finally confront both ideas in order to highlight their incompatibility.

Keywords: Social Teaching of the Church; Social Doctrine; Neofascism; Fascism.

Introdução

A Igreja Católica apresenta uma sólida doutrina social, da qual constam os princípios e diretrizes basilares para uma sociedade marcada pela fraternidade pregada por Jesus Cristo. Porém, há certo desconhecimento em relação a ela, o que tem favorecido que mesmo pessoas ligadas à Igreja têm abraçado ideologias que são contrárias ao ensino do Evangelho. Por outro lado, algumas ideias fascistas têm seduzido muitos cristãos, pelo fato de utilizarem certos elementos morais e também por proporem uma sociedade afeita à modernidade.

Já na encíclica Non abbiamo bisogno, em 1931, o Papa Pio XI condenou a ideologia fascista que rondava a Itália e que mais tarde chegou a aterrorizar toda a Europa naquele período.

A ideologia fascista tem em sua raiz a concepção que o Estado deve ser absoluto, com forte espírito patriótico e exaltar o civismo. Poulantzas (1978, p. 11) chegou a afirmar que “o fascismo não é mais do que sua forma particular de regime de Estado capitalista de estado de exceção”. Mesmo em estado de exceção, essa ideologia atrai muitas pessoas devido a seu forte apelo patriótico e moralizante.

Neste artigo, certos regimes serão tratados com os termos fascista ou neofascista, como referência a regimes políticos históricos que dominaram contextos sócios políticos na Europa, mas que também de certa maneira apoiaram as ditaduras no Brasil e outros países da América Latina. Por outro lado, será tratado como Ensino Social da Igreja o corpo doutrinário católico que trata da realidade do mundo e da inserção dos católicos nesse mundo, seja no mundo da economia, da política ou da cultura. E é na relação entre esses corpos conceituais, o do fascismo e o do Ensino Social da Igreja, que são constatadas as contradições e os confrontos entre eles.

1. O Ensino Social da Igreja

A mensagem cristã tem grande apelo ético, o qual é permeado por ações e atitudes de muitas pessoas na história. Muitos estudiosos da Bíblia afirmam que o centro da pregação de Jesus de Nazaré era o Reino de Deus – com suas dimensões sócio-históricas (PERRIN, 1984; FUELLENBACH, 2006; SOBRINO, 2002; MEIER, 1991). O Reino de Deus é a realidade que vai além deste mundo; no entanto, a maioria dos pesquisadores bíblicos concordam que a dimensão ética terrestre é fundamental no ensino de Jesus Cristo. A pregação de Jesus de Nazaré é impregnada pelo apelo ético, por exemplo no amor ao próximo, de modo especial ao próximo que se constitui dos pobres e vulneráveis, como demonstra a passagem do Bom Samaritano (Lc 10, 36-37). O ensino de Jesus vai além da referência “Deus é santo”, mas sim encoraja o cristão a ser compassivo e misericordioso com os vulneráveis, como o próprio Jesus era. Por isso, a mensagem cristã tem um forte componente ético e demanda suas implicações na vivência concreta em sociedade.

O Ensino Social da Igreja tem suas raízes na pregação e na prática de Jesus histórico. É importante ressaltar que o Ensino da Igreja sempre foi influenciado pelos aspectos históricos, por exemplo, quando o Papa Leão XIII escreveu a encíclica Rerum Novarum, em 1891, a Revolução Industrial havia produzido milhões de operários que viviam na miséria e, por sua vez, a Igreja levantava sua voz contra a exploração da classe trabalhadora. Essa encíclica marcou o início do Ensino Social da Igreja na modernidade.

A Igreja, no período do Papa Leão XIII (1810-1903), foi fortemente desafiada pela Revolução Industrial e alguns pensadores católicos, como o bispo Wilhelm E. Ketteler, da Alemanha e o cardeal Gibbons, de Nova York, começaram a elaborar as bases do Ensino Social, para fazer frente à exploração dos operários. A situação da vulnerabilidade dos operários exigia uma urgente resposta da Igreja como instituição. Por isso, a encíclica Rerum Novarum de Leão XIII torna-se um grande grito por justiça social, com críticas ao capitalismo liberal (selvagem) e contra a filosofia marxista da época.

A encíclica Rerum Novarum apresenta cinco pontos fundamentais quanto à dimensão social: primeiro, quanto à dimensão do sofrimento dos pobres; segundo, afirma que somente a caridade não é suficiente; terceiro, defende a importância dos direitos dos operários; quarto, critica a função do Estado enquanto garantidor da justiça social; quinto, prega o retorno à moralidade cristã, que exige o respeito às pessoas. Com isso, essa encíclica dá base ao Ensino Social da Igreja, especialmente quanto à solidariedade para com os pobres, aos salários justos e à responsabilidade do Estado para a justiça social. Essa encíclica de Leão XIII tornou-se uma referência ao Ensino Social da Igreja na modernidade.

1.2. O desenvolvimento do Ensino Social da Igreja

O Ensino Social da Igreja, tendo como base o Evangelho de Jesus e as bases lançadas pelo Papa Leão XIII, responde à realidade de cada tempo e, por isso, a cada período histórico novos desdobramentos dessa opção pedagógica são desencadeados. Nesse contexto é que o Papa Pio XI, em 1931, aos quarenta anos da publicação da Rerum Novarum,escreveu a encíclica Quadragesimo Anno. O fascismo e o comunismo soviético estavam crescendo em várias partes da Europa. Muitas colônias na América Latina, Ásia e África tinham conseguido sua independência. A depressão econômica mundial havia arruinado financeiramente muitos países e povos. Por outro lado, a Igreja estava mais organizada e era detentora de mais confiança do que nos séculos anteriores.2 Desse modo, a Igreja tinha credibilidade para fazer uma crítica ao sistema liberal capitalista e o socialismo coletivista.

O Papa Pio XI, pressionado então pela crise social e econômica, publica a encíclica Quadragesimo Anno. Nela, seguiu os princípios básicos da Rerum Novarum, culpando o liberalismo econômico e o comunismo real pelos problemas do mundo moderno; rejeitou o individualismo liberal e o socialismo ateu, enfatizando a dignidade da pessoa humana e os direitos individuais e sociais. A expressão justiça social é mencionada oito vezes nesse documento pontifício. Como afirma Hollenbach (1979, p. 54): “O conceito de justiça social é uma ferramenta conceitual pela qual o raciocínio moral leva em conta o fato de que as relações entre as pessoas têm uma dimensão institucional ou estrutural”.  A dimensão da justiça social passa a fazer parte do discurso católico tanto quanto a realidade sociológica.

O conceito de justiça social introduzido por Quadragesimo Anno ajuda a inspirar políticas públicas em vista do bem comum, esse conceito é retomado pelo Papa Pio XI em sua encíclica Divinis Redemptoris, no n. 51, publicada em 1937:

E é precisamente próprio da justiça social exigir dos indivíduos quanto é necessário ao bem comum. Mas, assim como no organismo vivo não se provê ao todo, se não se dá a cada parte e a cada membro tudo quanto necessitam para exercerem as suas funções; assim também se não pode prover ao organismo social e ao bem de toda a sociedade, se não se dá a cada parte e a cada membro, isto é, aos homens dotados da dignidade de pessoa, tudo quanto necessitam para desempenharem as suas funções sociais. (PIO XI, 1937, p. 19, n. 51)

O conceito de justiça social é articulado pelo Ensino Social do Papa Pio XI no contexto do bem comum. Novos elementos também aparecem nessa abordagem, como a subsidiariedade e a solidariedade. Esses elementos serão assimilados no decorrer da história nas ciências sociais.

Já o papa do Concílio Vaticano II, São João XXIII, fala em atualização da teologia diante do mundo moderno e elabora, na esteira dos papas anteriores, novas abordagens da ética social. As duas encíclicas sociais desse papa, Mater et magistra (1961) e Pacem in terris (1963) dão a tônica do fortalecimento do Ensino Social da Igreja, abrindo-o também para as realidades sociais da América Latina, África e Ásia. O papa fala da dignidade da pessoa humana, da necessidade de estreitar a distância entre pobres e ricos, da urgência da cooperação e solidariedade. Em âmbito internacional, São João XXIII fala do perigo do neocolonialismo, que é a dominação econômica de países ricos sobre os pobres e a necessidade urgente de cooperação entre países e continentes.

A encíclica Pacem in terris, de 1963, responde à necessidade da busca pela paz num mundo dilacerado pelo contexto da Guerra Fria e os conflitos na Coréia (1950-1953) e Vietnã (1955-1975). Esse documento papal fala do perigo da guerra nuclear, dos direitos de todos os indivíduos, do papel das autoridades públicas e da urgência do desarmamento para uma paz efetiva.

Essas duas encíclicas do Papa São João XXIII desenvolvem novas perspectivas nas questões sociais, preparando a Igreja e a sociedade com vistas a um mundo mais harmonioso, fraterno e justo.

1.3. Ensino Social com o Concílio Vaticano II

O Concílio Vaticano II, evento convocado pelo Papa São João XXIII [EW1] e realizado entre 1962 e 1965, foi decisivo para que a Igreja se engajasse numa opção concreta pela justiça social e contra todo tipo de prática neofascista. Uma nova abordagem e uma nova metodologia são lançadas na área do Ensino Social. Podemos dizer que era como uma nova primavera com o aggiornamento, isto é, com  a atualização das práticas teológicas e sociais da Igreja. Entende-se a Igreja não como uma “entidade fora do mundo”, mas sim “inserida no mundo”, para ser fermento na sociedade por justiça social, democracia e solidariedade.

Papa São João XXIII iniciou o Concílio Vaticano II, em 1962, e o Papa São Paulo VI o encerrou, em 1965. Durante a segunda sessão do Concílio, afirmou São Paulo VI:

Da janela do Concílio, aberta para o mundo, a Igreja olha para algumas categorias de pessoas com particular solicitude. Disse o Papa São Paulo VI, em um dos discursos no evento:

[…] olha para os pobres, os necessitados, os aflitos, os famintos, os que sofrem e sofrem… A Igreja se torna preocupada com os trabalhadores, com suas pessoas, com a dignidade de seu trabalho e com suas reivindicações legítimas. Ela se preocupa com suas grandes e aflitivas necessidades atuais de melhoria social e uma vida espiritual melhor. (KÛNG, 1963, p. 234-235)[EW2] 

Nesse contexto, os bispos católicos no Concílio Vaticano II decidiram escrever um documento que tratasse a ética social da Igreja numa perspectiva da dignidade da pessoa humana e justiça social.  Esse documento eclesial e social produzido pelo concílio chama-se Constituição Pastoral da Igreja no Mundo Moderno, de 1965, denominado Gaudium et spes (alegria e esperança).

Gaudium et spes redefine a identidade social da Igreja Católica e seu relacionamento com o mundo contemporâneo. O relacionamento social externo da Igreja com a sociedade contemporânea é descrito em Gaudium et spes não em tom de condenação, porém na linha da esperança e da transformação social de um mundo mais justo e fraterno.

Esse documento eclesial desenvolve uma nova metodologia e uma nova compreensão antropológica no ensino social da Igreja. A metodologia é voltada para a análise da sociedade, baseado nos olhos da pregação de Jesus de Nazaré, interpretando os sinais dos tempos. Na dimensão antropológica, é a centralidade da dignidade da pessoa humana diante das pressões neofascistas das injustiças sociais. Assim, a Gaudium et spes apresenta cinco temas centrais na área social: a dignidade e o valor da pessoa humana, o relacionamento entre sociedade e pessoa, a Igreja e sociedade, a Igreja e as ciências e a dimensão da justiça na linha da solidariedade.

Embora a dignidade da pessoa humana seja um aspecto fundamental na mensagem cristã, a sua concepção é alargada nos tempos modernos. O documento eclesial Gaudium et spes completa essa abordagem na Igreja, a qual já era ensinada no documento Rerum novarum (1891) do Papa Leão XIII. A pessoa humana é sagrada e tem dignidade fundamental em si mesma. O documento Gaudium et spes, do Concílio Vaticano II, é claro ao afirmar a dignidade da pessoa diante de qualquer ameaça ou insulto neofascista. Essas ameaças são baseadas nas dimensões da raça, do sexo, da religião, de condição social e de condição econômica. Esse documento eclesial pede a erradicação dessas ameaças fascistas que são contra o plano de Deus.

O relacionamento entre pessoa e sociedade é outro importante aspecto da Gaudium et spes. A pessoa humana é social e por natureza, requer um relacionamento com outras pessoas. Essa interação é realizada com liberdade, responsabilidade e solidariedade. Tais elementos fazem parte do ensino social da Igreja desde a publicação da Gaudium et spes, ao fim do Concílio Vaticano II. Essa concepção da Igreja é como uma atualização de seu ensino no mundo moderno, isto é, valoriza a liberdade no contexto da responsabilidade e solidariedade.

A abertura da Igreja à sociedade moderna é uma conquista que muda a face eclesial, a qual assume, desde então, uma perspectiva mais inserida socialmente e atual para a prática pastoral. Como dizia o Papa São João XXIII: “uma Igreja atenta aos sinais dos tempos” (SUESS, 2015, p. 895). Além do mais, a comunidade cristã não está situada fora da sociedade e da história: a Igreja é inserida no mundo para trazer esperança às pessoas, como era o desejo de Jesus Cristo. Essa abertura leva a Igreja ao diálogo com os diversos interlocutores do mundo contemporâneo.

1.4. Ensino social dos papas recentes

Com o Concílio Vaticano II (1962-1965), a Igreja Católica aprofundou o seu ensino social e os papas, na sequência de seus pontificados, ofereceram novas abordagens diante dos desafios que a humanidade enfrentava. Nisso, destacamos o ensino social do Papa São Paulo VI, de São João Paulo II, Papa Bento XVI e o atual Papa Francisco.

1.4.1. Ensino Social de São Paulo VI

Na esteira do Concílio Vaticano II e de outras tantas reformas importantes na Igreja, o Papa São Paulo VI escreveu, em 1967, uma encíclica sobre o desenvolvimento dos povos, denominada Populorum progressio. Essa carta papal tratou da questão social – justiça social e desenvolvimento socioeconômico – dentro do contexto mundial. Tal encíclica não refletiu apenas sobre o conhecido Primeiro Mundo, porém sobre a situação de pobreza e marginalização em que dois terços do mundo estavam vivendo. O tema principal desse documento eclesial é o desenvolvimento. Afirma São Paulo VI: “O novo nome da paz é desenvolvimento” (PAULO VI, 1967, p. ,n. 85). No entanto, esse desenvolvimento e progresso não são apenas para as pessoas que têm capital, mas para todas pessoas; e o desenvolvimento não apenas econômico e social, mas da pessoa toda, isto é, desenvolvimento intelectual, emocional, espiritual e biológico. Na busca da paz, o desenvolvimento deve ser integral.

No contexto em que foi publicada a Populorum progressio, o desenvolvimento era entendido como o progresso alcançado pela aplicação direcionada da tecnologia para alcançar o crescimento econômico autossustentado, que acabaria por erradicar a pobreza. Entretanto, para Paulo VI o desenvolvimento deveria também ser social, material, espiritual e cultural. A humanidade busca um desenvolvimento humano mais pleno, porque o desenvolvimento humano não pode ser apenas material. A Revolução Industrial provocou uma ideia errada sobre o desenvolvimento. Desenvolvimento se havia tornado sinônimo de produção de bens materiais para poucos, enquanto a grande maioria vivia na pobreza e era excluída do desenvolvimento industrial.

O Papa Paulo VI denunciou o fosso cada vez maior entre ricos e pobres: ” 66. O mundo está doente. O seu mal reside menos na dilapidação dos recursos ou no seu açambarcamento, por parte de poucos, do que na falta de fraternidade entre os homens e entre os povos” (PAULO VI, 1967, p. 20, n. 66). Tal desequilíbrio econômico foi pior no terceiro mundo.

Nesse contexto, Papa Paulo VI desafiou a ideologia liberal, e mesmo a visão neofascista, quanto à propriedade privada. A hipoteca social da propriedade particular vai além da perspectiva do Papa São João XXIII. A teologia de Santo Ambrósio, do período dos Padres da Igreja (entre os séculos II e VII), estava presente no ensino da Populorum Progressio. O que o rico dá aos pobres não é um presente, mas sim está doando o que pertence aos necessitados porque os bens que Deus deixou a humanidade pertence a todas pessoas e não apenas a um grupo de pessoas ricas. Papa Paulo afirma no n. 23 da Populorum Progressio:

Sabe-se com que insistência os Padres da Igreja determinaram qual deve ser a atitude daqueles que possuem em relação aos que estão em necessidade: “não dás da tua fortuna, assim afirma santo Ambrósio, ao seres generoso para com o pobre, tu dás daquilo que lhe pertence. Porque aquilo que te atribuis a ti, foi dado em comum para uso de todos. A terra foi dada a todos e não apenas aos ricos”.  Quer dizer que a propriedade privada não constitui para ninguém um direito incondicional e absoluto. Ninguém tem direito de reservar para seu uso exclusivo aquilo que é supérfluo, quando a outros falta o necessário.(PAULO VI, 1967,p.8, n. 23)

O Papa Paulo VI desafia o sistema capitalista, baseado apenas no lucro, pois a industrialização trouxe grandes benefícios à humanidade, mas ao mesmo tempo o sistema baseado apenas no ganho e na concentração de renda e de poder edificou uma sociedade injusta. O lucro e a renda também devem estar a serviço do bem comum.

O Ensino Social do Papa Paulo VI influenciou profundamente o Documento do Encontro Latino Americano dos Bispos, realizado em 1968, em Medellín, na Colômbia. Esse documento, conhecido eclesialmente por Medellín, fortalece a perspectiva contra todo tipo de totalitarismo e concentração de renda nas mãos de poucos proprietários. Temos, assim, a voz da Igreja em defesa dos pobres que não tinham voz diante do sistema ditatorial, política e economicamente. Essa abordagem desafia a Igreja a sair de sua zona de conforto espiritual para o enfrentamento do sistema excludente, que marginalizava milhões pessoas na América Latina.

O Ensino Social do Papa Paulo VI, além de enfrentar o sistema totalitário e também excludente socialmente dos marginalizados, trata da dimensão da questão do gênero. Assim ele afirma, em 1971, na Carta Apostólica Octogesima Adveniens:

De modo semelhante, em diversos países está sendo objeto de constante procura e, por vezes, mesmo de reivindicações enérgicas, um estatuto da mulher, o qual faça cessar a efetiva discriminação existente e estabeleça relações de igualdade nos direitos e de respeito pela sua dignidade. (PAULO VI, 1971, p. , n. 13)

Assim, o Ensino Social da Igreja abre novas realidades acerca da dignidade da pessoa humana no mundo contemporâneo.

1.4.2. Ensino Social de São João Paulo II

Embora o Papa João Paulo II (cf. GUTIERREZ, 1995; DULLES, 1999; WEIGEL, 1999; CURREN e McCORMICK, 1998;  CONLEY e KOTERSKI, 1999) tenha seguido e enfatizado repetidamente o ensinamento do Concílio Vaticano II, ele tem um estilo diferente dos seus três predecessores. São João XXIII mostrou abertura ao mundo moderno, São Paulo VI iniciou o diálogo com a sociedade moderna, e João Paulo I deu sinais de que manteria esse diálogo com o mundo moderno. Por outro lado, São João Paulo II exortou à grande necessidade de evangelizar o mundo contemporâneo e pediu uma nova cultura cristã, chamando algumas versões da atual de cultura da morte.

Seus temas foram a justiça, a dignidade humana e os direitos humanos, defendendo a solidariedade entre os povos e as nações. Durante suas viagens, ele geralmente falou em nome dos pobres. João Paulo escreveu abundantemente durante seu pontificado, seguindo o exemplo de Pio XII, de fazer ao menos um discurso por dia. “João Paulo II foi um dos papas mais ativos e enérgicos do século XX” (CURREN e McCORMICK, 1998, p. 1). Ele publicou três grandes encíclicas sociais: Laborem Exercens, Sollicitudo rei socialis e Centesimus annus.

A carta encíclica Laborem Exercens: Sobre o Trabalho Humano, publicada na celebração dos 90 anos da Rerum Novarum, em 1981, prioriza o trabalho sobre o capital. A dignidade do trabalhador e do trabalho é tratada com uma refinada teologia social, ressaltando vários aspectos da moral social do labor humano. O papa afirmou, na encíclica Laborem exercens:

A Igreja acha-se vivamente empenhada nesta causa, porque a considera como sua missão, seu serviço e como uma comprovação da sua fidelidade a Cristo, para assim ser verdadeiramente a “Igreja dos pobres”. E os “pobres” aparecem sob variados aspectos; aparecem em diversos lugares e em diferentes momentos; aparecem, em muitos casos, como um resultado da violação da dignidade do trabalho humano: e isso, quer porque as possibilidades do trabalho humano são limitadas – e há a chaga do desemprego – quer porque são depreciados o valor do mesmo trabalho e os direitos que dele derivam, especialmente o direito ao justo salário e à segurança da pessoa do trabalhador e da sua família. (JOÃO PAULO II, 1981, p. 14 , n. 8)

O Papa João Paulo II produz um dos principais documentos da Igreja, acerca da dignidade do operário e do valor do trabalho humano.  Ele traduz a teologia da Igreja Católica e seu Ensino Social em elementos fundantes, pela defesa dos direitos fundamentais dos trabalhadores, especialmente aqueles mais vulneráveis. Esse documento trata de várias realidades, inclusive sobre o direito à greve em casos extremos, mas também sobre o trabalho das pessoas com deficiência. Além de fazer crítica à prática do comunismo real quanto ao trabalho, o papa não deixa de fazer uma severa crítica ao economicismo do capitalismo vigente, que marginaliza e explora os operários.

Para celebrar os 25 anos da encíclica Populorum progressio, do Papa São Paulo VI, Papa São João Paulo II publica, em 1987, a encíclica Sollicitudo Rei Socialis, tratando de elementos da realidade social e a necessidade urgente de justiça social, além de questionar fortemente os dois blocos globais: o capitalismo liberal e comunismo real do Leste europeu.

Assim afirma o Papa João Paulo II, na encíclica Sollicitudo rei socialis:

As relações internacionais, por sua vez, não podiam deixar de sentir os efeitos desta “lógica dos blocos” e das respectivas “esferas de influência”. Nascida logo após a conclusão da segunda guerra mundial, a tensão entre os dois blocos dominou os quarenta anos que se seguiram, assumindo quer carácter de “guerra fria”, quer o de “guerra por procuração”, mediante a instrumentalização de conflitos locais, quer mantendo os espíritos na incerteza e na ansiedade, com a ameaça de uma guerra aberta e total.
Se no presente esse perigo parece ter-se tornado mais remoto, ainda que não desaparecido completamente, e se já se chegou a um primeiro acordo sobre a destruição de certo tipo de armamentos nucleares, a existência e a contraposição dos blocos nem por isso deixam de ser ainda um facto real e preocupante, que continua a condicionar o cenário mundial. (JOÃO PAULO II, 1987, p. 14-15, n.20)

O papa afirma que esse conflito entre oeste e leste do globo tem gerado muita marginalização no sul dos continentes, especialmente na América Latina, África e parte da Ásia. Enquanto João Paulo II condena a interferência do Norte sobre o Sul, o sistema capitalista apoiava vários ditadores no Sul. Por exemplo, governos norte-americanos deram apoio ao governo ditatorial dos militares no Brasil por mais de 20 anos (1964-1985) e várias vezes se usou a dimensão religiosa para dividir as bases. “Os principais objetivos dessas novas seitas religiosas, além de arrecadar dinheiro, é manter os cristãos divididos, implantar valores conservadores de ética de trabalho e, provavelmente o mais importante, manter o status quo” (BARRY; PREUSCH, 1988, p. 135). Além do proselitismo religioso de extrema-direita, esses movimentos religiosos acusavam os movimentos de base de comunistas. A encíclica Sollicitudo Rei Socialis aponta a urgência em superar o impasse entre as ideologias para revitalizar uma prática social baseada na fraternidade e solidariedade.

Já a encíclica Centesimus annus, publicada em 1991 por ocasião do Centenário da Rerum novarum, foi uma releitura da grande carta social de Leão XII e uma reflexão do Papa João Paulo II sobre o colapso do socialismo na Europa. Esta encíclica refletiu o pensamento social atual da Igreja Católica, permeado pela experiência de um papa polonês que viveu por muitos anos sob o regime comunista. “Usando a Rerum novarum como quadro de referência, João Paulo nos oferece uma visão abrangente dos pontos-chaves da doutrina social católica, bem como uma aplicação deles a questões específicas” (BRIEN; SHANNON, 1992, p. 437). O papa olhou para trás (relendo a Rerum novarum), olhou em volta (a situação atual) e olhou para frente (as novidades do terceiro milênio). Essa encíclica tem sido discutida como tendo ido além dos limites do debate católico sobre economia, política e cultura. A Centesimus annus abordou algumas questões fundamentais da sociedade humana, desenvolvendo um conjunto coerente de questões para a ética social cristã, como dignidade humana, direitos humanos, justiça, desenvolvimento, paz e sistemas econômicos.

Antes de tudo, João Paulo II dedicou várias páginas a um extenso exame da Rerum novarum, enfatizando sua validade pastoral ainda atual. A encíclica de Leão XIII desenvolveu um corpus de ensino social que forma uma parte fundamental da doutrina cristã, como a dignidade do trabalho e do trabalhador, os direitos humanos fundamentais, a importância da propriedade privada, direito às associações profissionais, um salário justo, e liberdade de religião, para mencionar apenas alguns. A releitura por João Paulo II da Rerum novarum na Centesimus annus também enfatizou a crítica de Leão XIII ao socialismo, ao fascismo e ao liberalismo, a ideia de amizade (solidariedade), a defesa dos pobres e o papel do Estado. Embora a Rerum novarum tivesse sido escrita havia cem anos, de acordo com João Paulo II, seu ensinamento social ainda é válido em muitos aspectos.

Podemos apontar quatro grandes temas de ética social na Centesimus annus: a dignidade da pessoa humana, o bem comum, a solidariedade e a opção pelos pobres. Esses temas estão fortemente presentes na doutrina social de João Paulo II. O papa trouxe para o Ensino Social da Igreja Católica sua experiência de viver em um país comunista e sua profunda visão bíblica e antropológica da humanidade. Seu ensino era permeado pela teologia da criação. “Que Deus criou os humanos à própria imagem de Deus é singularmente significativo para a teologia pública de João Paulo II, uma vez que é a razão essencial para a dignidade humana e a base para os direitos humanos inalienáveis” (LYNCH, 1999, p. 27). Esses temas, que são caros para o Papa João Paulo II, vão contra toda abordagem totalitária e fascista.

Embora a Centesimus annus não proponha uma doutrina de Estado, fortalece a perspectiva democrática, na visão da participação do povo nos rumos de uma nação. Recordando o ensino anterior sobre democracia, inclusive do Papa Pio XII, João Paulo II ressalta que a democracia ajuda a substituir pacificamente, quando necessário, os dirigentes de um estado. Ou seja, a participação dos cidadãos possibilita a escolha livre e o controle dos governantes.

Uma autêntica democracia só é possível num Estado de direito e sobre a base de uma reta concepção da pessoa humana. Aquela exige que se verifiquem as condições necessárias à promoção quer dos indivíduos através da educação e da formação nos verdadeiros ideais, quer da ‘subjetividade’ da sociedade, mediante a criação de estrutura de participação e corresponsabilidade. (JOÃO PAULO II, 1991, p. 37, n. 46)

Ainda nessa encíclica, o papa condena o fundamentalismo e o fanatismo, típicos de governos totalitários de caráter fascista:

A igreja também não fecha os olhos diante do perigo do fanatismo, ou fundamentalismo, daqueles que, em nome de uma ideologia que se pretende científica ou religiosa, defendem poder impor aos outros homens a sua concepção da verdade e do bem. (JOÃO PAULO II, 1991, p. 37, n. 46)

Nesse sentido, fica bem claro que no Ensino Social da Igreja não há espaço para sistema sociais que são fechados em si mesmos.  

1.4.3 Ensino Social do Papa Bento XVI

Embora os comentadores sociais e teológicos tenham destacado mais os elementos litúrgicos e dogmáticos do Papa Bento XVI, esse papa publicou, em 2009, a encíclica Caritas in veritate, com uma forte abordagem social. É uma teologia social num contexto de secularização, em que a religião é relegada ao plano privado, ressaltando a importância da caridade, da liberdade e do desenvolvimento integral da pessoa humana. Bento XVI faz referência à encíclica Populorum progressio, de Paulo VI, acerca de que o desenvolvimento e o progresso técnico devem estar sintonizados com o desenvolvimento da pessoa toda e de todas as pessoas. Não existe verdadeiro desenvolvimento e progresso, se é apenas para os que detêm o poder econômico.

Para Bento XVI, a responsabilidade social e a solidariedade estão no coração da missão da Igreja, e essa abordagem tem sua origem já no início da Igreja. “A doutrina social está construída sobre o fundamento que foi transmitido pelos Apóstolos aos Padres da Igreja e, depois acolhido e aprofundado pelos grandes Doutores cristãos.” (BENTO XVI, 2009, p. 7, n. 12). Nisso, o papa faz uma ácida crítica social: “Cresce a riqueza mundial em termos absolutos, mas aumentam as desigualdades. Nos países ricos, novas categorias sociais empobrecem e nascem novas pobrezas.” (BENTO XVI, 2009, p. 13, n. 22). O ensino social da Igreja, na perspectiva de Bento XVI, é profético no anúncio de um mundo justo e na denúncia das injustiças sociais.

1.4.4. O ensino social do Papa Francisco

O ensino social do Papa Francisco caminha na linha da tradição católica, em ressaltar a dimensão da justiça e da fraternidade. Com a consciência de que a Igreja não é uma instituição de julgamento, mas sim da aplicação da misericórdia e unção para os feridos, o Papa Francisco ressalta a misericórdia e a solidariedade para com os sofredores desse mundo. Nisso, o profeta Oséias já clamava em Israel: “Pois eu quero misericórdia e não sacrifícios, amor de Deus mais do que holocaustos” (BÍBLIA, Oseias, 6, 6); e o próprio Jesus ressalta: “Quero misericórdia e não sacrifício. Porque eu não vim chamar justos, e sim pecadores” (BÍBLIA, Mateus, 9, 13). 

Nessa perspectiva, a misericórdia é um elemento fundamental na linha moral de Francisco:

Misericórdia: é a lei fundamental que mora no coração de cada pessoa, quando vê com olhos sinceros o irmão que encontra no caminho da vida. Misericórdia: é o caminho que une Deus e o homem, porque nos abre o coração à esperança de sermos amados para sempre, apesar da limitação do nosso pecado. (FRANCISCO, 2015, p. 1, n. 2)

A linha moral do papa passa ser moldada pela compreensão adequada da misericórdia de Deus para com as pessoas humanas. A misericórdia vem antes de qualquer julgamento e a lei deve ser advinda da bondade de Deus. “Para Francisco, o fato de a misericórdia de Deus ser ‘radicalmente inclusiva’ implica que a pastoral social da Igreja se caracterize também por uma ‘proximidade inclusiva’” (ZACHARIAS, 2020, p. 308). A moral pastoral vai na linha da inclusão e não da marginalização: “Duas lógicas percorrem toda a história da Igreja: marginalizar e reintegrar […] o caminho desde o Concílio de Jerusalém em diante, é sempre o de Jesus: o caminho da misericórdia e da integração.” (FRANCISCO, 2016, p. 92).

Para o ensino social, no Papa Francisco, a vida deve vir em primeiro lugar e a doutrina moral deve considerar a bondade de Deus com o humano.

“Para Francisco, a Igreja não cumprirá sua missão se a doutrina continuar separada da vida. A autocrítica proposta por ele à Igreja e à sua teologia moral passa, sim, pela investigação, intepretação e resposta aos sinais dos tempos, mas deve considerar também a proposição de outros sinais, a fim de que a própria Igreja, pondo-se ‘em saída’… a teologia de Francisco ‘é anúncio de misericórdia e discernimento das concretas condições de vida que a implementam ou a contrastam.” (ZACHARIAS, 2020, p. 296)

A misericórdia não é apenas um porém, mas a referência da teologia moral no magistério do Papa Francisco. A vida deve estar interligada com a misericórdia para uma correta compreensão moral. Lendo os sinais dos tempos, a moral católica deve propor novos horizontes para que a pessoa possa melhor viver a vida socialmente, num espírito de fraternidade e solidariedade.

A dimensão existencial é pertinente na abordagem de Francisco quando se trata do ensino social:

Francisco faz uma opção muito clara para repensar tanto a identidade da Igreja quanto a identidade ética cristã: dar voz à realidade, à prática, à experiência. Para ele, a teoria, o ideal abstrato e a dimensão objetiva da moralidade têm sua devida importância, mas não podem, de modo algum, ter prioridade na reflexão teológico-moral. (ZACHARIAS, 2020, p. 285, cf. FRANCISCO, 2016, p. 11, n. 36; p. 96, n. 305; FRANCISCO, 2013, p. 175-177, n. 231)

Nisso o ensino social tem uma forte inserção na realidade dos empobrecidos e descartados da sociedade, ouvindo os gritos dos marginalizados desse mundo. “Às vezes trata-se de ouvir o clamor de povos inteiros, dos povos mais pobres da terra, porque a paz funda-se não só no respeito pelos direitos do homem, mas também no respeito pelo direito dos povos” (FRANCISCO, 2013, p. 150, n. 190). O clamor dos descartados é fundamental na reflexão social de Francisco.

As encíclicas sociais do Papa Francisco, Laudato Si’ e Fratelli tutti, são eloquentes ao tratar da urgência da mudança de paradigma social, em que os empobrecidos sejam considerados como sujeitos e interlocutores no planejamento econômico.

Na Laudato Si’, Francisco ressalta a necessidade de uma ecologia integral, em que se proteja não apenas o meio ambiente, mas também os pobres inseridos nesse contexto. “Essas situações provocam os gemidos da irmã terra, que se unem aos gemidos dos abandonados do mundo, com um lamento que reclama de nós outro rumo”(FRANCISCO, 2015b, p. 17, n. 53). Nos desastres naturais, os mais afetados são os marginalizados, por isso urge trabalhar-se por uma ecologia integral.

Já na Fratelli tutti, o papa destaca a importância de um projeto comum para a sociedade mundial, num espírito de resgate da dignidade da pessoa humana no contexto de exploração: “A promoção da amizade social implica não só a aproximação entre grupos sociais distantes devido a algum período conflituoso da história, mas também a busca de um renovado encontro com os setores mais pobres e vulneráveis” (FRANCISCO, 2016, p. 62, n. 233). Impossível edificar um projeto humanizador se não considerarmos os frágeis e os descartados das sociedades econômicas.

O Ensino Social do Papa Francisco é permeado da perspectiva da misericórdia e da urgente necessidade de recuperar o mais profundo da pessoa humana, que é sua dignidade. Para isso, faz-se necessário mudar as estruturas sociais e econômicas vigentes nas sociedades capitalistas, que marginalizam e descartam milhões de pessoas. Não se pode viver tranquilo num mundo em que multidões passam fome e sofrem as injustiças sociais.

2. As faces do neofascismo na contemporaneidade

O Ensino Social da Igreja contrapõe os sistemas totalitários que se fecham em si mesmos e assim anulam a pessoa humana em sua integralidade, sejam eles comunistas, fascistas ou capitalistas selvagens. Por seu lado, o fascismo é uma das ideologias que leva à prática totalitária, nele o estado passa a ser uma força repressora, de modo especial contra os mais frágeis e pobres. Nesse sentido, é importante compreender as faces do neofascismo presente na sociedade contemporânea e na prática de alguns governantes.

Importante também é perceber que o fascismo não é um fenômeno ideológico e político restrito a um determinado período histórico, por exemplo à Itália de Benito Mussolini (1883-1945), mas está ligado à perspectiva capitalista da sociedade, isto é, ao neoliberalismo econômico. As suas faces são mutantes e se apresentam em diversas realidades e em diversos períodos históricos.

2.1. Faces do fascismo

O fascismo, fundamentalmente, combina elementos nacionalistas com a ideologia de perseguição a grupos que pensam diferente dos detentores do poder. Ele produz uma prática autoritária, ressaltando os fascistas que aqueles que pensam diferente deles são inimigos da nação. Em seu bojo, a ideologia traz também um discurso permeado de aspectos religiosos e messiânicos, que buscam justificar na sociedade que tal prática seria aprovada até por Deus. Ressalta os valores patrióticos da nação, com a perseguição dos grupos sociais que se opõem a essa ideologia.

Para cumprir essa meta, a ideologia fascista produz um discurso de criminalização de todos os partidos políticos que se opõem a sua prática, favorecendo a ideia de que somente os fascistas são amigos da nação. Os partidos e políticos que ousam questionar essa ideologia são tratados como comunistas ou esquerdistas e automaticamente tachados de inimigos do povo. O discurso neofascista, inclusive, desperta o ódio aos empobrecidos. “Os fascistas promovem preconceitos contra minorias que padrões hegemônicos da sociedade chutam para o andar de baixo.” (RADDE, 2022,p. 22). Os que se opõem a essa ideologia são tratados como inimigos.

Com base nos preconceitos, se constrói a ideologia da pessoa de bem contra as pessoas que são diferentes ou pensam distintamente. “Desta maneira, estas violências são legitimadas por ‘cidadão de bem’, por ‘pessoa de família’” (CABRAL, 2022, p. 185). De certa maneira, a violência é naturalizada e se instaura uma perseguição aos adversários políticos.

Outro elemento presente na ideologia fascista é a eleição e culto de um líder, a exemplo que foi Mussolini na Itália. Esse líder é como um salvador da pátria e visto como único capaz de guiar a nação a seu bom destino. É como como um mito e tudo o que ele fala, mesmo que seja bobagem, é aplaudido e acatado. “Uma característica marcante é a construção de um mito, líder idolatrado, celebrado, considerado herói e que revele a verdade… Trata-se de um predestinado para salvar a pátria” (RADDE, 2022, p. 19).

A democracia, para os neofascistas, apenas tem importância se levar esse líder e o seu projeto ao poder civil e militar (cf. LEVITSKY; ZIBLATT, 2018; PRZEWORSKI, 2020). O modelo fascista tem em seu bojo um desprezo pela democracia (cf. PRZEWORSKI, 2020) e as suas instituições representativas, pois essas entidades podem frear essa prática totalitária, que não respeita as liberdades individuais e a democracia representativa. O projeto de poder é totalitário, não respeitando valores como direitos humanos e liberdades individuais.

Na outra ponta, o modelo neofascista criminaliza tudo o que tem perspectiva social, progressista e comunitária, chamando de maneira pejorativa essas práticas sociais, por vezes de comunistas, socialistas e inimigas do povo. A ideologia neofascista tem um horror com tudo que leva à socialização e partilha dos bens, inclusive criminalizando a prática da cidadania. Desprezando as práticas coletivas e denominando-as comunistas, inicia um processo de perseguição contras pessoas e grupos que defendem a prática social mais cidadã.

O fascismo, em geral, exalta os valores tradicionais da sociedade, com lemas como “Deus, pátria e família”, contrapondo os valores modernos da partilha e da solidariedade. O uso do nome de Deus é uma constante nesses grupos nacionalistas. Uso retórico dos valores tradicionais mobiliza as pessoas para um enfrentamento à realidade presente, como se o presente fosse inimigo do bem. Para isso, a prática neofascista recorre à fake news como ferramenta aceitável. “Na lógica fascista, inexiste apreço pela verdade ou pela verificação dos fatos. O que importa é forjar o discurso para combater inimigos ou corroborar o ideário do líder”(RADDE, 2022, p. 23).

Pregando a necessidade urgente de salvar a pátria das mãos dos inimigos do povo, a ideologia fascista manipula as emoções e produz violência, como afirma Jessé Souza:

Todo fascismo é, portanto, reflexo de uma luta de classes truncada, percebida de modo distorcido e, por conta disso, violento e irracional no seu cerne. Na sua base está a manipulação de emoções que geram agressividade, como medo, raiva, ressentimento e ansiedade sem direção, sempre com fins de manipulação política. (SOUZA, 2019, p. 252)

O fascismo tem várias faces, como vimos acima, no processo histórico, e tende a manipular a opinião pública em favor de seus objetivos, manipulando emoções e criando instabilidade social. Essa instabilidade social é própria para o crescimento e fortalecimento dessa ideologia totalitária.

2.2. Neofascismo como suporte ao capitalismo

A ideologia fascista tende a ser frontalmente contra as práticas coletivas, acusando-as de ser comunistas e socialistas e, por sua vez, nocivas à sociedade. Historicamente, o fascismo tem dado suporte ao capitalismo, que explora o suor e o sangue dos trabalhadores. Nisso, podemos dizer que o fascismo historicamente tem sido um suporte para o capitalismo selvagem, retirando direitos das classes trabalhadoras e ampliando o poder do capital com apoio do Estado (cf. CABRAL, 2022; DULCE; D’AMBROSO, 2020; GOUVÊA, 2022).

Ao se contrapor às práticas coletivistas e até às solidárias, a ideologia fascista torna-se um substrato para o poder capitalista, exaltando a livre iniciativa econômica, sem controles sociais. Todas as leis que protegem os trabalhadores são tidas como travas para o desenvolvimento, por isso tal ideologia tende a pregar contra as leis trabalhistas e a previdência social.

Historicamente, percebe-se que o poder do capital se valeu muitas vezes da ideologia fascista. “É por isso que, tal como na década de 1930, a extrema-direita é acarinhada, protegida e financiada por setores do capital, sobretudo pelo financeiro, o mais antissocial de todos os setores do capital” (SANTOS et al., 2022,p. 32). Isso demonstra a íntima ligação entre as duas ideologias, isto é, o capitalismo, para se manter com o seu viés selvagem, de exploração dos operários, necessita do aparato ideológico fascista.

A sanha do mundo capitalista é sempre a mesma, maximalizar o lucro em detrimento ao trabalho:

Ampliar o lucro a qualquer custo – esse é o mantra dos capitalistas, que ao longo das décadas aperfeiçoam as técnicas de multiplicação de suas riquezas, tais como incorporações, terceirizações… Não importa quantos vão caindo pelo caminho, demitidos, adoecidos ou mortos. (MARQUES; JORDÃO, 2015, p. 9)

Com o advento do mundo tecnológico, essa exploração tem aumentado e empobrecido milhões de pessoas no mundo todo:

O mais profundo é o aperfeiçoamento do capitalismo de vigilância que, com a quarta revolução industrial (inteligência artificial), torna possível desenvolver controles eficazes da população…. A linguagem do passado é, neste caso, mais eficaz que a do presente e, por isso, a retórica de extrema-direita fala do novo perigo comunista, que tanto vê nos governos democráticos, como no Vaticano do Papa Francisco. (SANTOS et al., 2022, p. 33)

Se, por um lado, o capitalismo quer aumentar o lucro explorando a força dos trabalhadores, causando um conflito entre capital e trabalho, a ideologia fascista ataca os que se opõem ao sistema capitalista. Para isso, é necessário inclusive enfraquecer e até destruir a democracia no seio de um país, como foi discutido anteriormente neste artigo.

A propaganda neofascista seduz as massas com sua manipulação dos conceitos sociológicos, afirmando que essa ideologia vai salvar a nação, apelando para o nacionalismo e a dimensão do capital:

[…] o fascismo, como último recurso desesperado dos capitalistas para manutenção do poder, opera sobre a psique coletiva do povo, cooptando pessoas com a ilusão de que as coisas vão melhorar, mas que, na realidade, atua em sentido exatamente oposto, para que nada melhore.” (DULCE;  D’AMBROSO, 2020, p. 68)

Percebe-se, assim, a tentativa exaustiva de uma ideologia política, a fascista, em se justificar e salvar o capitalismo que marginaliza milhões de pessoas no mundo.

2.3. Faces do neofascismo nos anos 2019-2022 no Brasil

A ideologia neofascista tem penetrado em nossa sociedade não apenas pelos discursos políticos, mas muitas vezes velada, pela necessidade urgente de fazer justiça contra os ditos inimigos da nação, demonizando posturas mais progressistas que falam da participação do povo nas diversas áreas sociais e econômicas. Inclusive a insegurança diante da violência urbana tem sido um dos pilares a justificar a violência e a repressão policial.

Às vezes, não temos noção de certas afirmações que são introjetadas na consciência social, por exemplo “Bandido bom é bandido morto. Tá com pena, leva para casa. Essas frases comuns partem de pressupostos tão equivocados que o contra-argumento se torna inócuo. Um deles diz respeito à definição de bandido, e se todos eles de fato só são bons mortos” (GOUVÊA , 2022, p. 210). Essa citação exemplifica como a ideologia pouco a pouco vai permeando a consciência social. Àquilo que o pensador Paulo Freire, em seu Pedagogia do Oprimido, afirmava que a ideologia do dominador contamina a consciência do dominado3 (cf. FREIRE, 2015, p. 46).  Por sua vez, as pessoas passam a agir como deseja a ideologia dominante.

O neofascismo contemporâneo justamente vem num processo destruidor da consciência social e política. Jessé Souza afirma que:

O contexto geral do neofascismo contemporâneo parece resultar do processo de desenraizamento político e social dos indivíduos provocado, na esfera política, pelas mudanças do capitalismo financeiro, hoje dominante. Por meio de uma política consciente que destruiu ou enfraqueceu sindicatos, partidos e a capacidade associativa em geral – muito especialmente das classes populares -, o capitalismo financeiro cria o isolamento individual como marca da sociedade contemporânea. (SOUZA, 2019, p. 253)

Percebe-se essa abordagem sócio-política nos quatro anos entre 2019 e 2022 no âmbito da política nacional. A chamada extrema-direita nacional incorporou esses elementos e também ressalta a violência política e o discurso de desprezo pelos oponentes.  “… a extrema-direita de hoje tem dois dos componentes do nazifascismo: a glorificação da violência política e o discurso do ódio racial contra as minorias. Falta apenas a ditadura, mas alguns elogiam a tortura (Jair Bolsonaro no Brasil)” (SANTOS, 2022, p. 34-35). Ou seja, o que se realizou nos últimos quatro anos, o governo de 2019 a 2022, foi uma constante ameaça aos direitos fundamentais da pessoa humana, da dignidade e a democracia.

O pesquisador social Caldera Neto, em entrevista à Deutsche Welle relatada na Folha de S. Paulo por Laís Modelli, detecta elementos fundamentais dessa abordagem gerada pela política de Jair Bolsonaro:        

Por um lado, o bolsonarismo faz uso do fascismo clássico em lemas e simbologias –por exemplo, o lema “Deus, Pátria, Família”, que vem do integralismo e ao qual recentemente Bolsonaro adicionou o termo “liberdade”; nos discursos políticos, como aquele caso em que Ricardo Alvim citou Goebbels; e no que se entende sobre fazer política, entendido como o mesmo que neutralizar os inimigos políticos. Em outra perspectiva, o bolsonarismo vê a política como um campo de purificação e de regeneração de uma sociedade que eles consideram em decadência. O bolsonarismo pode ser entendido como uma forma de transformação absoluta da sociedade por meio de um processo de perseguição de inimigos e dos considerados diferentes e da destruição de uma ideia de nacionalidade. (MODELLI, 2023)

Concretamente, a política bolsonarista despertou na sociedade ímpetos neofascistas que estavam escondidos nos armários de pessoas que se consideram de bem. As denominadas pessoas de bem passam apoiar o discurso do ódio e do preconceito, acreditando que estavam apoiando um tipo de sociedade do bem; mas realmente essas pessoas de bem fortaleciam o discurso neofascista e autoritário.

Nos quatro anos do governo Bolsonaro (2019-2022), diariamente se ouviam do ex-presidente agressões contra jornalistas e contra as mais diversas autoridades e grupos sociais. Por exemplo, em 2019, ele afirmou: “daqueles governadores de paraíba, o pior é do Maranhão. Tem que ter nada com esse cara”(BOLSONARO in BARRETTO JÚNIOR, 2021, p. 41). Ele se referia ao então governador Flávio Dino, manifestando preconceito e desprezo aos governadores e ao povo nordestino. Paraíba, numa linguagem preconceituosa, refere-se às pessoas pobres do nordeste brasileiro.

Além do preconceito contra as minorias e os pobres, o governo Bolsonaro praticou uma deseducação política e social com seus ataques às instituições democráticas, “a maneira como o presidente popularizou discussões sobre instituições e democracia foi baseada em distorções e mentiras, afirmam especialistas” (TAVARES, 2022). Despertou na sociedade o preconceito e o ódio contra as instituições, classes sociais e minorias.

O ex-presidente era um entusiasta admirador do então presidente norte-americano Donald Trump: “Trump também atacou magistrados que tomaram decisões contra ele” (LEVITSKY; ZIBLATT, 2018, p.171). A retórica de Bolsonaro era contra aqueles que não o apoiavam em suas investidas fascistas contra os adversários.

Essa prática se enquadra na ideologia fascista que está a serviço do capitalismo, como afirmam Dulce e D’Ambroso (2020, p. 45-46):

Assim, o ataque neofascista do capitalismo corporativo se baseia no tripé de manipulação mediática do povo com a construção de falsidades como verdades alternativas (fake news), controle de pensamento pela religião como a imposição arrogante de uma verdade absoluta (fundamentalismos religiosos), militarização do Estado (repressão), lawfare (manipulação política do Judiciário para reprimir a oposição e/ou ao inimigo) e pós-verdade (mentiras emotivas de construção de “fatos alternativos”. (DULCE; D’AMBROSO, 2020, p. 45-46)

O discurso da pós-verdade (cf. GUARESCHI; AMON; GUERRA, 2017), seduz as pessoas com base em algo polêmico e emocional, é uma das ferramentas do neofascismo na contemporaneidade. Essa arma comunicativa, que se mescla com as fake news, tem sido altamente utilizada pelas redes neofascistas para disseminar ódio contra a oposição e minorias. Por um lado, ressalta o líder como mito e por outro destrói a reputação de lideranças que se opõem democraticamente a um sistema autoritário. 

Percebe-se que o neofascismo, entranhado no governo Bolsonaro, produziu um desmonte das políticas públicas que beneficiavam as classes mais pobres da população e afirmou um projeto de ideologia conservadora.  “O bolsonarismo […] não se trata apenas de fenômenos explicáveis ligados à extrema direita e ao fascismo, mas de um projeto de sociedade com força de projeção de futuro […]  Criando uma ideia de que seria um governo contra o Estado, antissistema, catalisa ideologias conservadoras.” (SURUÍ , 2023). Essa abordagem faz um marketing antissistema, mas na realidade é o inverso, pois o bolsonarismo apoia a prática autoritária nas políticas sociais e econômicas.

3. Incompatibilidade do Ensino Social da Igreja com a ideologia neofascista

A Igreja, com o seu Ensino Social, ressalta a dignidade da pessoa humana e seus direitos fundamentais nas relações sociais, políticas e econômicas, e na promoção da paz e da justiça social. Por outro lado, há a ideologia neofascista, que justifica e naturaliza o extremismo, demoniza os adversários e de certa maneira naturaliza a violência contra os que pensam diferente. Nesse contexto, o neofascismo cria um estado paralelo de pensamento por meio da manipulação da opinião pública e justifica os atos antidemocráticos por meio da violência. Enquanto a Igreja prega a paz e a tolerância das opiniões contrárias, o neofascismo legitima a perseguição aos adversários.

3.1. A cultura da paz e amor para vencer a violência

Um dos elementos fundamentais do ensino social da Igreja é o próprio ensinamento de Jesus Cristo: “Ame ao seu próximo como a si mesmo.“ (BÍBLIA, Mateus, 22, 39), isto é: o amor ao próximo supera toda a divisão e diferença entre as pessoas. Diferente, o neofascismo prega a intolerância e o medo aos que pensam distinto.  “O neofascismo, portanto, consegue perverter todos os elementos do Estado, da nação e da sociedade, começando da perversão da alteridade (medo do próximo e insegurança, como mecanismo de controle social)” (DULCE; D’AMBROSO, 2020, p. 70). A alteridade, isto é, a pessoa do outro, é pervertida e mostrada como um perigo na tentativa de controlar socialmente as pessoas.

De um lado, os direitos humanos são fundamentais no ensino da Igreja, conforme afirma o Compêndio da Doutrina Social da Igreja: “A comunidade política persegue o bem comum atuando com vista à criação de um ambiente humano em que aos cidadãos seja oferecida a possibilidade de um real exercício dos direitos humanos e de um pleno cumprimento dos respectivos deveres” (JOÃO PAULO II, 2005, p. 221). Já para a ideologia neofascista, os direitos humanos manifestam uma defesa do bandido: “Lá vêm os direitos humanos (sic)… Esse pessoal dos direitos humanos só defende bandido. Essa gente dos direitos humanos só atrapalha, não deixa o policial trabalhar” (GOUVÊA, 2022, p. 216). A pessoa humana, “como imagem e semelhança de Deus” (BÍBLIA, Gênesis, 1, 26), tem dignidade e sacralidade, por isso merece respeito e autonomia.

Os direitos humanos, tão valorizados pelo Ensino Social da Igreja, não são uma peça para defender algo qualquer, mas sim para defender a própria pessoa humana diante das ameaças que o mundo impõe. A pessoa não pode ficar vulnerável a um sistema social ou político que a ameace.

O então candidato a presidência da república, em 2018, diante de uma multidão de apoiadores, sem escrúpulo nenhum afirmou, referindo-se aos adversários políticos: “Vamos fuzilar a petralhada aqui no Acre.” (BOLSONARO, Jair in BARRETTO JÚNIOR, 2021, p. 27). Esse discurso e outras ações dessa corrente política têm uma força odiosa tremenda, que leva seus ouvintes e apoiadores a partirem para a violência, naturalizando a violência política e ao mesmo tempo fragilizando a própria democracia.

O discurso neofascista não tem nenhum escrúpulo em promover a violência. “Ódio, intolerância e mentira alimentam perseguições promovidas por fascistas” (RADDE, 2022, p. 24). Por outro lado, o Ensino Social da Igreja promove a cultura da paz e da concórdia. “A promoção da paz no mundo é parte integrante da missão com que a Igreja continua a obra redentora de Cristo sobre a terra” (JOÃO PAULO II, 2005, p. 516). Nisso, percebemos a diferença entre um discurso de paz e o outro de violência.

3.2. Participação democrática para superar o autoritarismo

Fazendo eco aos ensinamentos bíblicos da Carta de Tiago (BÍBLIA, Tiago, 1, 26; 2, 14), que pede ação social em favor dos vulneráveis, o Papa Franciso insiste que a religião não pode permanecer apenas na dimensão espiritualista, mas ter uma conexão com a vida. “Já não se pode afirmar que a religião deve limitar-se ao âmbito privado e servir apenas para preparar as almas para o céu. Por isso, a conversão cristã exige especialmente tudo o que diz respeito à ordem social e consecução do bem comum” (FRANCISCO , 2016, p. 61, n. 182). A ligação de fé e vida leva a Igreja a favorecer um ensino social que motiva os cristãos na edificação de uma sociedade solidária e uma civilização do amor.

A participação dos cristãos na sociedade também é fundamental para a Igreja, em vista de um mundo mais justo e fraterno. O Papa João Paulo II afirma a importância da democracia: “A Igreja encara com simpatia o sistema da democracia, enquanto assegura a participação dos cidadãos nas opções políticas e garantes aos governados a possibilidade quer de escolher e controlar os próprios governantes” (JOÃO PAULO II, 1991, p. 37, n. 46). A participação democrática é um importante valor moral para a Igreja:

A participação na vida comunitária não é somente uma das maiores aspirações do cidadão, chamado a exercitar livre e responsavelmente o próprio papel cívico com e pelos outros, mas também uma das pilastras de todos os ordenamentos democráticos, além de ser uma das maiores garantias de permanência da democracia. (JOÃO PAULO II, 2005, p. 190)

O neofascismo tem a tendência, por sua própria ideologia, em reprimir a democracia. Às vezes, as democracias morrem nas mãos de militares autoritários, mas outras vezes morrem nas mãos daqueles que foram eleitos pelo processo democrático. “Alguns desses líderes desmantelam a democracia rapidamente, como fez Hitler na sequência do incêndio de Reichstag em 1933 na Alemanha. Com mais frequência, porém, as democracias decaem aos poucos, em etapas que mal chegam a ser visíveis” (LEVITSKY; ZIBLATT, 2018, p. 15). Os discursos em favor de um estado totalitário vêm disfarçados em oferta de proteção à população contra algum perigo imaginável, como o comunismo ou ameaças externas.

Percebe-se, na atualidade, uma onda para fragilizar a democracia em muitos países no ocidente, o que é evidente no Brasil. Como afirma o cientista político Przeworski (2020, p. 231): “O perigo é que a democracia se deteriore gradual e sub-repticiamente”. Com o avanço das pautas neofascistas, com discurso anti-stablishment, antissistema, demonizando a política e ressaltando o nacionalismo, a democracia entra em crise.

3.3. Solidariedade como resposta à exclusão social

O Ensino Social da Igreja prega a edificação de uma civilização do amor, em que as relações sociais, políticas e econômicas sejam pautadas com base na fraternidade, solidariedade e justiça social. Se por um lado temos a exclusão social, por outro a Igreja, baseada no Evangelho, ensina a inclusão e a solidariedade.

A economia liberal, baseada apenas no mercado, tem tendência a excluir os mais frágeis financeiramente. Por isso, o Papa Francisco tem ressaltado que economia não pode dar todos os ditames nas relações sociais.  “Gostaria de insistir que a política não deve submeter-se à economia, esta não deve submeter-se aos ditames e ao paradigma eficientista da tecnocracia” (FRANCISCO, 2016, p. 47, n. 177). Já no século XIX, o Papa Leão XIII ensinava a importância que o Estado deve dar a uma política de proteção dos excluídos pelo mercado.

Os direitos, que lhes são devidos, devem ser religiosamente respeitados e o Estado deve assegurá-los a todos os cidadãos, prevenindo ou punindo a sua violação. Todavia, quanto à proteção dos direitos particulares, deve preocupar-se, de maneira especial, dos fracos e dos indigentes. (LEÃO XIII, 1891, p. 17, n. 22)

Nisso, percebe-se que, no Ensino Social da Igreja, a defesa do marginalizado e do pobre é uma constante. As leis e o Estado devem proteger os marginalizados da exploração de uma economia sem coração. “Não podemos mais confiar nas forças cegas e na mão invisível do mercado” (FRANCISCO, 2016, p. 161, n. 204).  A proteção dos marginalizados pelo sistema econômico é uma obrigação do Estado, pois é necessário que as leis deem suporte aos excluídos da sociedade. O neofascismo, por sua vez, favorece a uma economia que mata.

‘Espremer até a última gota’ talvez seja a máxima eficientista que rege a racionalidade empresarial em tempos de neoliberalismo. Quando não há mais sumo, do outro lado desfalece um corpo, que não seria ao empregador mais que uma carcaça. (UCHIMURA, 2015, p. 39)

A vida humana e sua dignidade devem estar acima das leis do mercado:

O mercado, por si só, não resolve tudo, embora às vezes nos queiram fazer crer neste dogma de fé neoliberal. Trata-se dum pensamento pobre, repetitivo, que propõe sempre as mesmas receitas perante qualquer desafio que surja. O neoliberalismo reproduz-se sempre igual a si mesmo, recorrendo à mágica teoria do «derrame» ou do «gotejamento» – sem a nomear – como única via para resolver os problemas sociais. (FRANCISCO, 2020, p. 44, n. 168)

Se, por um lado, tem-se o discurso e a prática do mercado que marginaliza, necessita-se, por sua vez, de uma política social que tenha a ética como referência. “Precisamos de uma regeneração ética da política (o dever ser) frente ao triunfo da razão cínica (mentem e sabem que mentem, e apesar de tudo, mentem)” (DULCE; D’AMBROSO, 2020, p. 77). Na compreensão ética das relações sociais e econômicas, é possível edificar uma sociedade mais próxima do Evangelho de Jesus Cristo, como ensina a Igreja.

A sociedade neoliberal, muitas vezes sustentada pela ideologia neofascista, exprime um ódio aos empobrecidos, termo conhecido como aporofobia. “A aporofobia é um tipo de rejeição peculiar, diferente de outros tipos de ódio ou rejeição, entre outras razões porque a pobreza involuntária não é um traço da identidade das pessoas.” (CORTINA, 2022, p. 48). Os pobres, economicamente sendo descartáveis, são considerados um pesopara a sociedade neoliberal.

Papa Francisco ressalta que as mulheres em condições de pobreza sofrem discriminação dupla: “Duplamente pobres são as mulheres que padecem situações de exclusão, maus-tratos e violência, porque frequentemente têm menores possibilidades de defender os seus direitos” (FRANCISCO, 2013, p.165, n. 212). Por isso, faz-se necessário globalizar a solidariedade em todos os níveis para superar as exclusões sociais e os mais diversos tipos de marginalização dos vulneráveis. Nisso, a Igreja realça a importância da solidariedade:

A mensagem da doutrina social acerca da solidariedade põe em realce a existência de estreitos vínculos entre solidariedade e bem comum, solidariedade e destinação universal dos bens, solidariedade e igualdade entre os homens e os povos, solidariedade e paz no mundo. (JOÃO PAULO II, 2005, p. 63, n. 194)

Assim, a solidariedade, junto com a urgente necessidade de mudança das estruturas socioeconômicas, é uma resposta para transcender a ideologia da exclusão social, tão forte nas práticas neofascistas. Na solidariedade, todos sentem-se responsáveis por todos e ninguém é excluído dos bens econômicos e sociais.

Considerações finais

O Ensino Social da Igreja, que é um corpo doutrinário da Igreja católica, constituído de elementos fundamentalmente bíblicos, sociológicos e teológicos que dão sustentação tanto à ética católica quanto à organização social, política e econômica da sociedade humana. São como orientações e diretrizes éticas da Igreja à sociedade, na busca de edificar uma civilização do amor. De fato, o ensino do magistério da Igreja é mais do que uma simples ideologia política. “Entender o magistério social em seu sentido ético profundo e não como receitas, palavras de ordem ou slogans de uma ideologia partidária, supõe viver o autêntico sentido cristão da norma, da lei, da orientação” (ANTONCICH; SANS, 1986, p.53). Nisso, a Igreja contribui com o seu ensino para que a sociedade seja mais humana e fraterna.

A Igreja, como uma instituição de dois milênios, tem em seu bojo uma contribuição importante a dar à história e à sociedade. Como diz o Papa São Paulo VI: A Igreja “propõe-lhes o que possui como própria, uma visão global do homem e da humanidade” (PAULO VI, 1967, p. 5, n. 13). Ou seja, a proposta social da Igreja é integral, ultrapassando as ideologias que apresentam, em geral, apenas uma face da realidade. Nisso, quando fala do desenvolvimento e do progresso, não fala apenas na área tecnológica e para os que detêm poder econômico. O desenvolvimento e o progresso devem ser, para a Igreja, para todas as pessoas e da pessoa toda. Essa contribuição é muito valiosa para os nossos tempos atuais.

Por outro lado, ideologias como o neofascismo, pregam a violência e a conquista do poder e semeiam uma cultura do ódio. Tudo isso vai contra a dignidade da pessoa humana, que exige respeito por ser imagem e semelhança de Deus.

Fica evidente que as práticas neofascistas, presentes inclusive nas chamadas pessoas do bem, não coadunam com a proposta social proposta pela Igreja Católica, porque vão contra o fundamento ético social, que é a dignidade da pessoa do outro. Mesmo em situações dramáticas, a pessoa do outro nunca pode ser um meioou ser um objeto que possa ser descartado.

Portanto, ideologia neofascista é incompatível com o Ensino Social da Igreja Católica, porque contrapõe frontalmente os valores éticos de uma sociedade civilizada. Se, por um lado Jesus, pregou o amor ao próximo ( BÍBLIA, Lucas, 10, 37), do outro lado a ideologia neofascista fortalece o ódio aos adversários.

REFERÊNCIAS

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2A perda dos Estados Pontifícios, em 1871, livrou a Igreja Católica do peso de administrar reinos terrenos e, por sua vez, ela ganhou expressão moral para tratar de assuntos como justiça social e fraternidade entre os povos.

3Diz Paulo Freire (2015, p. 46), literalmente: “Os oprimidos, que introjetam a ‘sombra’ dos opressores e seguem suas pautas, temem a liberdade, na medida em que esta, implicando a expulsão desta sobra, exigiria deles que ‘preenchessem’ o ‘vazio’ deixado pela expulsão com outro ‘conteúdo’ – o de sua autonomia.”


1Joaquim Parron-Maria é doutor em Ética Social pela the Catholic University of America, Washigton, DC, USA, mestre em Pedagogia Universitária pela PUCPR e atualmente é professor de Bioética no Centro Universitário Claretiano, Curitiba, PR.