EMPRESAS JUNIORES: A PONTE ESTRATÉGICA ENTRE O SABER ACADÊMICO E O MUNDO DOS NEGÓCIOS

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ma10202504081036


Mariane Rosineide Estefano1
Ana Bárbara Silveira Mendonça Santos Dias2
Deise Cléa Leonel3


Resumo:

Este artigo aborda o papel estratégico das Empresas Juniores (EJs) como elo entre o meio acadêmico e o setor empresarial, destacando sua origem, evolução e impacto na formação profissional de estudantes. Criadas na França em 1967, as EJs expandiram-se globalmente e, no Brasil, ganharam força ao se integrarem a mais de 360 universidades. Essas organizações, geridas por estudantes e sem fins lucrativos, permitem a aplicação prática dos conhecimentos adquiridos em sala de aula ao mesmo tempo em que oferecem soluções inovadoras a empresas de pequeno e médio porte. Apesar de seus inúmeros benefícios, as EJs enfrentam desafios relacionados à governança, burocracia institucional, escalabilidade de projetos e sustentabilidade financeira. O estudo conclui que, com uma gestão eficaz e apoio institucional, as EJs têm grande potencial para fortalecer o ecossistema de inovação e formar líderes empreendedores capazes de transformar a realidade socioeconômica da região atendida.

Palavras-chave: Empresas Juniores; inovação; empreendedorismo.

1. Introdução

A interação entre universidades e empresas tem se mostrado um pilar importante para o desenvolvimento de ecossistemas de inovação em diversas regiões do mundo (Schugurensky; Naidorf, 2004). A colaboração entre essas duas esferas do conhecimento pode gerar sinergias que impulsionam tanto o desenvolvimento econômico quanto o crescimento individual dos envolvidos (Ahmed et al., 2022; Garcia; Rapini; Cário, 2018). 

Dentro desse contexto, as Empresas Juniores (EJs) desempenham um papel fundamental ao servir como intermediárias entre o mundo acadêmico e o empresarial (Moretto Neto et al., 2004; Lucena; Silva, 2021). Surgidas na França em 1967, as EJs permitiram aos estudantes de graduação vivenciarem situações empresariais reais, colocando em prática os conhecimentos adquiridos nas salas de aula (Schugurensky; Naidorf, 2004). Este modelo, inicialmente nascido no contexto europeu, expandiu-se para diversos outros países, incluindo o Brasil, onde ganhou proporções significativas nas últimas décadas (Garcia; Rapini; Cário, 2018; Brasil Júnior, 2025).

2. Origens e Evolução das Empresas Juniores

As Empresas Juniores têm suas raízes na França, mais especificamente na École Supérieure des Sciences Économiques et Commerciales, em Paris, onde, em 1967, o estudante Bernard Caioso fundou a primeira EJ (Moretto Neto et al., 2004). A proposta inicial era criar um espaço em que os estudantes pudessem aplicar seus conhecimentos acadêmicos em um ambiente empresarial real, o que rapidamente atraiu outros estudantes e instituições de ensino superior (Schugurensky; Naidorf, 2004). 

A estrutura das EJs foi concebida para ser sem fins lucrativos, com a participação ativa dos estudantes em sua gestão, sendo supervisionados por professores orientadores (Garcia; Rapini; Cário, 2018; Lucena; Silva, 2021). Este modelo de aprendizado prático gerou um impacto significativo nas primeiras décadas, levando ao surgimento de associações regionais e internacionais, como a Junior Enterprises Europe (JEE) e a Brasil Júnior (Moretto Neto et al., 2004; Garcia; Rapini; Cário, 2018).

Quadro 1: Linha do tempo do desenvolvimento das Empresas Juniores

AnoAcontecimento
1967Fundação da primeira Empresa Júnior na França (ESSEC)
1987Primeira Empresa Júnior no Brasil (EJFGV)
1992Criação da Junior Enterprises Europe (JEE)
2004I Junior Enterprise World Conference (JEWC)

Fonte: elaborado pela autora (2025)

O movimento de Empresas Juniores teve início em 1967 na França e visava proporcionar experiência prática em gestão para os alunos, ao mesmo tempo em que atendia às necessidades do mercado (Oliveira Junior; Silva, 2023). Em 1987, o movimento chegou ao Brasil, com a fundação da primeira empresa júnior no país, a EJFGV, vinculada à Fundação Getulio Vargas. Desde então, o Brasil se tornou um dos maiores polos de Empresas Juniores no mundo, com diversas universidades adotando esse modelo de ensino-aprendizagem (Brasil Junior). 

Em 1992, foi criada a Junior Enterprises Europe (JEE), uma organização que reúne empresas juniores de toda a Europa, com o objetivo de promover a troca de experiências e fortalecer o movimento no continente (JE Europe, 2025). A realização de conferências internacionais tem sido um marco importante no fortalecimento desse movimento. Em 2004, aconteceu a primeira Conferência Mundial de Empresas Juniores – I Junior Enterprise World Conference (JEWC) –  em Fortaleza, Brasil, reunindo empresas juniores de diferentes países para compartilhar conhecimentos e impulsionar o desenvolvimento do setor. Esse evento foi o precursor de um encontro bienal que ocorre alternadamente entre o Brasil e a Europa. 

A JEWC, além de ser um evento de integração, é um espaço fundamental para a atualização de práticas de gestão, inovação e desenvolvimento profissional dos participantes. A realização contínua desse encontro tem sido fundamental para o crescimento e fortalecimento das empresas juniores em todo o mundo.

3. Empresas Juniores no Brasil e no mundo

Globalmente, estima-se que existam mais de 2.000 empresas juniores distribuídas por mais de 45 países (Junior Entreprise Global). Na Europa, há cerca de 326 empresas em 15 países. Na África, países como Camarões e Marrocos participam do movimento. Nas Américas, o movimento cresce a cada ano, com destaque para o Brasil, que possui 1.612 empresas juniores.

Quadro 2 – Exemplos de Empresas Juniores

PaísNome da Empresa JúniorAno de Fundação
FrançaJunior ESSEC1967
BrasilAção Júnior UFSC1990
AlemanhaJunior Uni Mannheim1992
ItáliaJunior Enterprise Politecnico1990
EspanhaLegalis Uniovi2021

Fonte:  elaborado pela autora (2025).

No Brasil, o movimento das EJs é especialmente forte. De acordo com a Confederação Brasileira de Empresas Juniores (Brasil Júnior), existem empresas juniores distribuídas por mais de 360 universidades em todos os estados do país. Essa expansão reflete o ambiente propício que o Brasil oferece para o desenvolvimento desse modelo, com inúmeras empresas, principalmente de menor porte, sendo beneficiadas por projetos inovadores realizados por estudantes capacitados e motivados.

A presença de empresas juniores em diversos países evidencia a eficácia desse modelo na formação prática de estudantes e no apoio ao desenvolvimento de pequenas e médias empresas. A interação universidade-empresa tem sido amplamente discutida como um fator-chave para o fomento à inovação e ao empreendedorismo (Ahmed et al., 2022; Schumpeter, 1982). A teoria de Schumpeter (1982) sobre inovação se baseia na ideia de que o papel do empreendedor e das empresas na introdução de inovações rompem com o equilíbrio econômico existente, sendo a colaboração entre a academia e a indústria um exemplo prático dessa dinâmica (Freitas; Genna; Rossi, 2013; Villani; Rasmussen; Grimaldi, 2017). 

As EJs funcionam como “laboratórios de prática empresarial”, em que os estudantes podem aplicar conceitos acadêmicos em projetos reais ao mesmo tempo que desenvolvem habilidades de gestão, comunicação e resolução de problemas (Ahmed et al., 2022; Garcia; Rapini; Cário, 2018).

4. Desafio das EJs 

A análise das EJs ao redor do mundo revela que, embora os modelos de atuação possam variar, a essência da interação universidade-empresa se mantém (Schugurensky; Naidorf, 2004; Garcia; Rapini; Cário, 2018). Em muitos países, as EJs são vistas como uma ponte para o mercado de trabalho, uma vez que proporcionam aos estudantes a oportunidade de trabalhar em projetos reais com empresas, promovendo não só a formação técnica, mas também o desenvolvimento de competências empreendedoras (Ahmed et al., 2022; Lucena; Silva, 2021). Além disso, as EJs contribuem significativamente para o desenvolvimento de inovações tecnológicas e soluções empresariais, funcionando como um motor para a competitividade de pequenos e médios negócios (Moretto Neto et al., 2004; Freitas; Genna; Rossi, 2013).

Apesar dos benefícios das EJs, a governança dessas organizações pode ser um desafio significativo para sua sustentabilidade e sucesso a longo prazo (Hoffmann et al., 2024). De acordo com a análise de Hoffmann et al. (2024), a boa governança dentro das EJs é fundamental para garantir a transparência e a coordenação das atividades, especialmente quando essas interações envolvem múltiplos atores com interesses diversos (Hoffmann et al., 2024). O quadro 2 traz alguns dos desafios identificados na literatura sobre a governança das EJs.

Quadro 3: Desafios da Governança nas Empresas Juniores

DesafioDescrição
Falta de Confiança entre AtoresA confiança mútua entre os estudantes, professores e empresas é essencial para a eficácia das EJs. A falta dela pode prejudicar o processo de inovação. 
Burocracia InstitucionalA interação entre as universidades e as empresas pode ser dificultada por processos burocráticos que tornam a colaboração mais lenta e menos eficiente. 
Escalabilidade de ProjetosEmbora as EJs sejam eficazes em projetos de menor escala, há desafios em expandir seus projetos para iniciativas de maior impacto ou para novos mercados. 
Sustentabilidade FinanceiraAs EJs enfrentam dificuldades financeiras devido à sua natureza sem fins lucrativos e à dependência de parcerias com empresas e recursos limitados.

Fonte: elaborado pela autora (2026)

A gestão das EJs exige um equilíbrio entre a autonomia dos estudantes e a supervisão dos professores, além de uma clara definição das responsabilidades e das metas a serem alcançadas (Lucena; Silva, 2021; Valle; Cândido; Andrade, 2017). Além dos desafios operacionais e organizacionais, as EJs também enfrentam dificuldades financeiras, uma vez que funcionam em grande parte com recursos limitados e precisam buscar parcerias com empresas para garantir a execução de seus projetos (Lucena; Silva, 2021). A governança eficaz, que envolve tanto a liderança estudantil quanto o acompanhamento acadêmico, é um fator determinante para superar esses desafios e garantir a sustentabilidade das EJs (Freitas; Genna; Rossi, 2013).

Quando bem geridas, as EJs têm o potencial de criar um ambiente fértil para inovação, desenvolvimento de novas ideias e formação de líderes empreendedores (Ahmed et al., 2022; Schumpeter, 1982). Entretanto, a superação dos desafios relacionados à governança e à gestão do conhecimento é fundamental para que as EJs possam continuar a cumprir seu papel no ecossistema global de inovação (Villani; Rasmussen; Grimaldi, 2017).

5. Conclusão

As empresas juniores consolidaram-se como uma ponte estratégica entre o conhecimento acadêmico e as demandas do mercado, oferecendo aos estudantes um ambiente prático de aprendizado e inovação. Sua trajetória, desde a fundação na França até sua consolidação global — com destaque para o Brasil como um dos maiores polos do movimento — demonstra a eficácia desse modelo na formação de profissionais mais preparados, críticos e empreendedores.

Ao atuar diretamente com empresas reais, os estudantes têm a oportunidade de aplicar seus conhecimentos teóricos em contextos desafiadores, desenvolvendo competências essenciais para o mercado de trabalho. Além disso, as EJs contribuem significativamente para o ecossistema de inovação, especialmente ao atender pequenas e médias empresas com soluções criativas e acessíveis.

No entanto, para que o impacto das Empresas Juniores continue crescendo de forma sustentável, é necessário enfrentar desafios estruturais, como a burocracia institucional, a sustentabilidade financeira e a necessidade de governança eficiente. Superar essas barreiras requer o fortalecimento da confiança entre os diferentes atores envolvidos — estudantes, universidades e empresas — e a construção de um ambiente institucional mais favorável à inovação colaborativa. As EJs, portanto, representam mais do que uma ferramenta educacional: elas são espaços de transformação, tanto para os estudantes quanto para a sociedade, promovendo uma cultura empreendedora e impulsionando o ecossistema de inovação da região atendida.

Referências

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1Mestra em Métodos e Gestão em Avaliação pela UFSC. Docente de cursos técnicos, de graduação e pós-graduação em Administração e Coordenadora da Consultoria Empresa Júnior FMP. Contato: professoraestefano@gmail.com.
2Mestre em Administração pela Universidade do Sul de SC (2017), com certificação em Neuromarketing pela Escola Superior de Propaganda e Marketing (2018), graduada em Administração (2021) e em Comunicação Social com Habilitação em Jornalismo (2007) ambas pela Faculdade Estácio de Sá de Santa Catarina. Pós-graduada em Assessoria Parlamentar, pelo Complexo de Ensino Superior de Santa Catarina (2010), MBA em Marketing na Faculdade Estácio de Sá de SC (2013). Proprietária da Bellas Estúdio Criativo uma empresa de marketing que atende clientes nacionais e internacionais, é também Coordenadora do Curso de Marketing do Centro Universitário Cesusc, e professora de marketing no Centro Universitário Cesusc, na Faculdade Municipal de Palhoça, na FAGH e na SPMV, que também é coordenadora do 1 e único MBA em Gestão e Marketing para o mercado Veterinário do País. Atuo também como coordenadora de TCC na Faculdade Municipal de Palhoça e nas disciplinas de Metodologia. Nas universidades atuo principalmente ministrando aulas nas áreas de comunicação, marketing, eventos, consultoria, metodologia e inovação. Contato: anabarbara.mendonca@fmpsc.edu.br.
3Mestranda em Estudos da Tradução pela UFSC. Especialista em Logística pela Uniasselvi. Docente de cursos técnicos e graduação em Administração e Coordenadora de Estágio Obrigatório I em ADM.  pela FMP. Contato: deiseclea.leonel@gmail.com.