EFEITOS DA DESESTATIZAÇÃO NA GOVERNANÇA E GESTÃO DAS INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR NO BRASIL

REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/ma10202407301519


Ailton Ferreira Cavalcante
Soraia Sorice da Silva
Coordenador: Gilvandro Araújo


RESUMO

A Governança e Gestão das instituições de ensino superior (IES) são temas centrais no debate sobre a qualidade e a eficácia da educação superior. Esses conceitos englobam uma variedade de práticas e estruturas administrativas que determinam como as instituições são dirigidas, financiadas e de que forma se adequam aos processos regulatórios do poder público, especialmente no que concerne à Avaliação, Supervisão e Regulação, objeto do SINAES – Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior. Entre esses desafios estão a necessidade de responder às demandas crescentes por acesso à educação superior, a pressão por melhorias na qualidade do ensino e da pesquisa, e a exigência de maior transparência e accountability provocadas pelo crescimento da concorrência. Adicionalmente, as mudanças no financiamento público e as tendências de desestatização introduzem novos paradigmas, em um cenário onde a participação do setor privado torna-se cada vez mais preponderante no ensino superior que possui 2.595 instituições, sendo 89% privadas e 11% públicas, ofertando 44.951 cursos de graduação distribuídos entre 9.443.597 alunos matriculados nas modalidades presencial que possui 54% do sistema e 46% no EaD, segundo dados do Censo divulgados em 2024 pelo INEP. Neste contexto, a transição de um modelo predominantemente público para um misto ou privatizado traz implicações significativas para as práticas de governança e gestão. Instituições privatizadas tendem a adotar estruturas mais flexíveis e orientadas para o mercado, o que pode aumentar a eficiência operacional, mas também pode comprometer valores acadêmicos tradicionais, como a autonomia e a equidade. A privatização pode, portanto, resultar em uma reconfiguração profunda do sistema educacional, afetando desde a formulação de políticas institucionais até a experiência educacional dos alunos, justificando o seu estudo, principalmente em um cenário de avanço da educação a distância no país. Nesta linha, este artigo busca explorar os efeitos da desestatização na governança e gestão das instituições de ensino superior no Brasil, com foco na democratização e eficiência operacional. O objetivo central é oferecer uma compreensão abrangente das implicações da desestatização e contribuir para o desenvolvimento de práticas de governança e gestão que possam sustentar a excelência acadêmica e a inclusão social no cenário educacional brasileiro. Como metodologia observou-se a pesquisa documental, bibliográfica, telematizada, além de raciocínio dedutivo e qualitativo. Em termos de conclusão espera-se verificar até que ponto a regulação facilita a identificação de pontos críticos e oportunidades de melhoria do sistema, contribuindo para a democratização do acesso no ensino superior no Brasil.

Palavras-chave: ensino superior, regulação, governança, gestão, democratização.

ABSTRACT

The Governance and Management of higher education institutions (HEIs) are central themes in the debate on the quality and effectiveness of higher education. These concepts encompass a variety of practices and administrative structures that determine how institutions are directed, financed and how they adapt to the regulatory processes of public authorities, especially with regard to Assessment, Supervision and Regulation, object of SINAES – National System of Assessment of Higher Education. Among these challenges are the need to respond to growing demands for access to higher education, the pressure for improvements in the quality of teaching and research, and the demand for greater transparency and accountability caused by growing competition. Additionally, changes in public financing and privatization trends introduce new paradigms, in a scenario where the participation of the private sector becomes increasingly preponderant in higher education, which has 2,595 institutions, 89% private and 11% public, offering 44,951 undergraduate courses distributed among 9,443,597 students enrolled in face-to-face modalities, which account for 54% in the system and 46% in distance learning, according to Census data released in 2024 by INEP. In this context, the transition from a predominantly public model to a mixed or privatized model has significant implications for governance and management practices. Privatized institutions tend to adopt more flexible and market-oriented structures, which can increase operational efficiency but can also compromise traditional academic values ​​such as autonomy and equity. Privatization can, therefore, result in a profound reconfiguration of the educational system, affecting everything from the formulation of institutional policies to the educational experience of students, justifying its study, especially in a scenario of advances in distance education in the country. Along these lines, this article seeks to explore the effects of privatization on the governance and management of higher education institutions in Brazil, focusing on democratization and operational efficiency. The central objective is to offer a comprehensive understanding of the implications of privatization and contribute to the development of governance and management practices that can sustain academic excellence and social inclusion in the Brazilian educational scenario. As a methodology, documentary, bibliographical, telematics research was observed, in addition to deductive and qualitative reasoning. In terms of conclusion, we hope to verify the extent to which regulation or lack thereof facilitates the democratization of access to higher education, the efficiency of the system and the quality of teaching, seeking to identify critical points and opportunities for improvement in the current educational context. 

Keywords: higher education, regulation, governance, management, democratization.

INTRODUÇÃO

A governança corporativa pode ser definida como o conjunto de processos, políticas, regulamentos, leis e instituições que influenciam a maneira como uma empresa é administrada, dirigida e controlada. Esse conceito abrange as relações entre os diversos stakeholders envolvidos com a empresa, incluindo acionistas, gestores, conselhos de administração, funcionários, clientes, fornecedores, financiadores, governo e a comunidade em geral. 

O principal objetivo da governança corporativa é garantir que a empresa seja gerida de forma a maximizar o valor para os acionistas a longo prazo, enquanto se mantém o equilíbrio com os interesses de outros stakeholders1. Para isso, pressupõe a adoção de princípios como transparência, responsabilidade, equidade, Compliance, responsabilidade sócio e ambiental. Em termos de estrutura a implementação da Governança implica na definição clara das funções e responsabilidades do Conselho de Administração e Comitês, tais como Auditoria, Remuneração, Qualidade, dentre outros.  

A governança corporativa é um pilar fundamental para qualquer organização que busca crescer de forma sustentável, ética e responsável. Ao adotar práticas de governança robustas, as empresas não apenas melhoram seu desempenho e mitigam riscos, mas também contribuem para o desenvolvimento econômico e social das comunidades onde operam. A implementação eficaz da governança requer um compromisso contínuo de todos os níveis da organização, desde o conselho de administração até os funcionários, garantindo assim a criação de valor para todos os stakeholders envolvidos, sendo imprescindível para o sucesso e a sustentabilidade das empresas no mercado globalizado. Ela envolve práticas e políticas que garantem a transparência, a equidade, a prestação de contas e a responsabilidade corporativa. A eficácia na gestão e controle de uma empresa contribui diretamente para a sua reputação e para a confiança dos investidores, clientes e demais stakeholders. Assim, a governança corporativa não apenas orienta a administração empresarial, mas também fortalece sua posição no mercado, conforme preceitua Ribeiro (2007). 

O IBGC define “Governança corporativa é um sistema formado por princípios, regras, estruturas e processos pelo qual as organizações são dirigidas e monitoradas, com vistas à geração de valor sustentável para a organização, para seus sócios e para a sociedade em geral. Esse sistema baliza a atuação dos agentes de governança e demais indivíduos de uma organização na busca pelo equilíbrio entre os interesses de todas as partes, contribuindo positivamente para a sociedade e para o meio ambiente”.

Segundo o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa – IBGC (2009, p.19), “a governança corporativa é fundamental para o sucesso e a sustentabilidade das organizações. Ela envolve a criação de um conjunto de regras e práticas que garantem que a empresa seja gerida de maneira eficiente, transparente e ética. Isso não apenas melhora a confiança dos investidores, mas também contribui para a estabilidade financeira e o crescimento a longo prazo da organização, assegurando que ela possa se adaptar e prosperar em um ambiente de negócios em constante mudança”.

Para o IBGC (2023), a evolução da Governança Corporativa reflete uma mudança paradigmática importante, onde a sustentabilidade e a responsabilidade social empresarial ganham destaque. A inclusão de múltiplas partes interessadas no processo de tomada de decisão das empresas demonstra um compromisso com práticas éticas e transparentes. Isso não apenas fortalece a confiança dos investidores, mas também contribui para o desenvolvimento sustentável da sociedade como um todo, alinhando os interesses empresariais com os desafios globais do nosso tempo. Esta abordagem se verifica em inúmeras organizações, notadamente no setor educacional, que nos últimos anos tem se profissionalizado. 

A figura 1 retrata a interdependência da organização com suas partes interessadas, com a sociedade e com o meio ambiente. Já a figura 2 transcreve os princípios da Governança Corporativa. 

Fonte: Código das Melhores Práticas de Governança    Fonte: IBGC (adaptado pelo autor)

Governança corporativa e gestão são conceitos frequentemente utilizados no contexto empresarial, mas possuem significados distintos e desempenham papéis complementares na organização. Governança corporativa refere-se ao sistema pelo qual as empresas são dirigidas e controladas. Envolve um conjunto de regras, práticas e processos pelos quais uma empresa é governada, com o objetivo de garantir a transparência, a responsabilidade e a equidade na relação entre os acionistas, a administração e outras partes interessadas. 

Gestão, por outro lado, refere-se às atividades diárias de administração e operação de uma empresa. Envolve a implementação de estratégias, a coordenação de recursos humanos e materiais, e a tomada de decisões para alcançar os objetivos organizacionais.

Neste artigo Governança refere-se aos processos e mecanismos através dos quais decisões estratégicas são tomadas e supervisionadas, enquanto a Gestão se concentra na implementação dessas decisões e na operação diária das instituições de ensino.

Embora governança corporativa e gestão sejam interdependentes, elas desempenham funções distintas dentro de uma organização. A governança corporativa fornece a estrutura e a supervisão necessárias para garantir que a empresa seja dirigida de maneira ética e alinhada aos interesses dos acionistas. A gestão, por outro lado, está focada na implementação prática dessas diretrizes e na operação eficiente da empresa. Juntas, governança e gestão garantem que a empresa possa alcançar seus objetivos de forma sustentável e responsável.

Cabe ressaltar que as práticas de governança e gestão, especificamente em instituições de ensino superior são cruciais para a criação de valor público e eficiência operacional. Estudos recentes no Brasil mostram uma relação positiva entre o nível de governança e a eficiência nas instituições, destacando a importância de fortalecer os mecanismos de governança para melhorar a qualidade e o impacto social das ações educacionais. 

Além disso, a pandemia da Covid-19 trouxe desafios adicionais, acelerando a adoção de práticas de gestão digital, evidenciando a necessidade de adaptação, inovação contínua e de novas tecnologias, bem como correta aplicação dos princípios da governança corporativa por todos os componentes da estrutura empresarial.

Neste sentido, as tecnologias emergentes têm a capacidade de transformar paradigmas, criar oportunidades e, muitas vezes, desafiar estruturas econômicas e sociais existentes. Joseph Schumpeter, tratando das ondas de inovação, sugere que a economia evolui através de ciclos de inovação, em que novas tecnologias substituem antigas e criam mercados e oportunidades. Schumpeter introduziu o conceito de “destruição criativa” para descrever como inovações radicais podem transformar indústrias e estruturas econômicas (Schumpeter, 1984).

Everett Rogers, na teoria da difusão da inovação, identifica fatores que influenciam a adoção de novas tecnologias, como a vantagem relativa, compatibilidade, complexidade, testabilidade e observabilidade das inovações (Rogers, 2003). Trata-se de um referencial importante para entender como e por que novas tecnologias se espalham pela sociedade. Rogers descreve diferentes categorias de adotantes (inovadores, adotantes iniciais, maioria inicial, maioria tardia e retardatários).

GOVERNANÇA CORPORATIVA E GESTÃO EM INSTITUIÇÕES DE ENSINO SUPERIOR

A educação superior no Brasil experimentou um crescimento significativo de aproximadamente 30% no acesso entre 2010 e 2022, alcançando mais de 9 milhões de estudantes em cursos de graduação. 

O aumento do acesso ao ensino superior no Brasil pode ser atribuído a várias políticas públicas implementadas ao longo dos anos, incluindo a ampliação de vagas em universidades públicas e privadas e a criação de programas como o Fundo de Financiamento ao Estudante Superior (FIES) e o Programa Universidade para Todos (PROUNI). Esses programas foram fundamentais para democratizar o acesso, permitindo que estudantes de baixa renda ingressassem em instituições de ensino superior. 

No entanto, nos últimos anos, houve uma redução significativa no número de bolsas oferecidas por esses programas, o que afetou diretamente a capacidade de muitos alunos de ingressar ou permanecer no ensino superior.

Figura 3 – Ingressantes de Graduação por Categoria Administrativa – Brasil – 2022

A figura 3 informa um total de 4.756.728 ingressantes de graduação em 2022, dos quais 89,0% encontram-se em instituições privadas e os demais 11,0%, em instituições públicas. O aumento de 20,6% no total de ingressantes, em 2022, supera o incremento da edição anterior e dá sequência à ascendência verificada nos anos recentes (Brasil. Inep, 2023e). Observa-se que o relatório do Inep de 2023 destaca um crescimento significativo no número de estudantes que ingressaram em cursos de graduação no Brasil em 2022. Com quase 90% dos novos alunos matriculados em instituições privadas, esse aumento reflete uma tendência de expansão do ensino superior no setor privado. A continuidade dessa tendência ascendente sugere uma mudança no panorama educacional, com implicações importantes para políticas públicas e planejamento no setor de educação superior.

Figura 4 – Ingressantes no Ensino Superior, por modalidade – Brasil – 2022

Outro fator crucial na expansão do acesso ao ensino superior foi o crescimento do ensino a distância (EaD). A EaD tem se mostrado uma alternativa viável para muitos estudantes, especialmente aqueles que vivem em áreas remotas ou que possuem compromissos que dificultam a participação em cursos presenciais. As matrículas em cursos a distância aumentaram significativamente, refletindo uma mudança no perfil dos estudantes e nas suas necessidades. No entanto, essa modalidade de ensino também apresenta desafios, principalmente no que diz respeito à garantia de qualidade e à adaptação das instituições às novas tecnologias e metodologias de ensino.

O crescimento do acesso ao ensino superior e a diversificação das modalidades de ensino exigem uma atenção redobrada das políticas regulatórias. A crise recente, exacerbada pela pandemia de COVID-19, evidenciou ainda mais a necessidade de políticas robustas que assegurem a qualidade da educação e a sustentabilidade das instituições. A pandemia forçou muitas instituições a migrar para o ensino remoto de forma abrupta, revelando desigualdades de acesso à tecnologia e infraestrutura entre os estudantes e instituições. Além disso, a competição acirrada entre instituições levou à redução das mensalidades, o que pode impactar negativamente a qualidade do ensino oferecido.

Figura 5 – Total de alunos matriculados na graduação– Brasil – 2022

Ao se comparar ingressantes e concluintes no ensino superior observa-se aumento líquido de 3.469.272 matrículas, o que demonstra um crescimento do sistema, notadamente na rede privada e no ensino à distância. 

Figura 6 – Concluintes de graduação, segundo a organização academia – Brasil – 2022

A sustentabilidade financeira das instituições de ensino superior, tanto públicas quanto privadas, é outro aspecto crítico a ser considerado. A redução das mensalidades, embora beneficie os estudantes a curto prazo, pode comprometer a capacidade das instituições de manterem-se operacionais e de investirem na melhoria de suas infraestruturas e corpo docente. Políticas regulatórias mais rígidas, um maior apoio governamental, além de uma Governança Corporativa eficiente, são essenciais para garantir que essas instituições possam continuar a oferecer educação de qualidade sem comprometer sua viabilidade financeira.

REGULAÇÃO, SUPERVISÃO E AVALIAÇÃO DO ENSINO SUPERIOR NO BRASIL

A regulação constitui um conceito abrangente, aplicável em múltiplos contextos, tais como a economia, o direito, a administração pública e as ciências sociais. De modo geral, regulação refere-se ao conjunto de normas, regras e procedimentos instituídos por uma autoridade ou entidade governamental, com o propósito de controlar e orientar o comportamento de indivíduos, organizações ou mercados.

Segundo Michel Foucault, em suas palestras no Collège de France, particularmente em “Segurança, Território, População” (1977-1978) e “Nascimento da Biopolítica” (1978-1979), o poder do Estado se manifesta por meio de técnicas e práticas regulatórias que visam governar a população e o comportamento individual (Foucault, 2004).

Douglass C. North, em sua obra “Institutions, Institutional Change, and Economic Performance” (1990), oferece uma análise profunda sobre a dinâmica das instituições e seu impacto no desenvolvimento econômico. North argumenta que as instituições, entendidas como as regras formais e informais que estruturam a interação humana, desempenham um papel crucial na determinação do desempenho econômico ao longo do tempo. Explora, também, como as mudanças institucionais, incluindo as regulamentações, não são apenas respostas a problemas econômicos imediatos, mas são influenciadas por fatores históricos, culturais e políticos. North destaca que a evolução das instituições é um processo complexo e contínuo, que pode tanto facilitar quanto restringir o crescimento econômico, dependendo de como essas instituições são desenvolvidas e implementadas (North, 1990). 

Márcio Iório Aranha, em seu “Manual de Direito Regulatório” (2018), aborda a necessidade de uma regulação equilibrada que proteja os interesses soberanos dos Estados e promova a diversidade cultural em face da globalização e das tecnologias emergentes. Aranha argumenta que a regulação deve considerar não apenas os aspectos econômicos, mas também os sociais e culturais, garantindo que as políticas regulatórias sejam sensíveis às particularidades de cada sociedade (Aranha, 2018). 

No caso do ensino superior no Brasil, a regulação, a avaliação e a supervisão são fundamentais para garantir a qualidade e a integridade das instituições de ensino e dos cursos oferecidos. Essas funções são desempenhadas pelo Ministério da Educação (MEC), através de órgãos como o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) e a Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior (SERES). Cabe ressaltar que esses processos são essenciais para assegurar a qualidade da educação superior no Brasil, protegendo os direitos dos estudantes e garantindo que as instituições cumpram suas funções sociais e educacionais, promovendo a transparência, a melhoria contínua e a responsabilidade das instituições, contribuindo para um sistema educacional mais justo e eficaz.

Especificamente, a regulação envolve o estabelecimento de normas e diretrizes que orientam o funcionamento das instituições de ensino superior, públicas e privadas. Esse processo inclui a autorização, reconhecimento e renovação de reconhecimento de cursos, além do credenciamento e recredenciamento das instituições. A regulação visa assegurar que as instituições cumpram requisitos mínimos de infraestrutura, corpo docente qualificado e projetos pedagógicos adequados. A avaliação é realizada periodicamente e abrange diversas dimensões do ensino superior. 

O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES) é o principal instrumento de avaliação, composto pelo Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE), a Avaliação Institucional e a Avaliação de Cursos. A sua implantação em 2004 por meio da Lei n° 10.861, pelo Ministério da Educação (MEC), trouxe significativas mudanças para a gestão corporativa das instituições de ensino superior (IES) no Brasil. O SINAES é composto por três principais instrumentos de avaliação: a Avaliação Institucional, a Avaliação de Cursos e o Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE).

A Avaliação Institucional subdivide-se em autoavaliação e avaliação externa, a Avaliação Institucional tem como objetivo analisar a qualidade das instituições de ensino superior em suas múltiplas dimensões. A autoavaliação é conduzida pela própria instituição, com a participação de toda a comunidade acadêmica, e visa identificar pontos fortes e áreas de melhoria. A avaliação externa é realizada por comissões designadas pelo INEP, que visitam a instituição para verificar in loco as condições de ensino, pesquisa e extensão, infraestrutura, gestão e organização institucional, entre outros aspectos.

A Avaliação de Cursos foca-se em aspectos específicos de cada curso de graduação examina o projeto pedagógico, a qualificação do corpo docente, a infraestrutura disponível (laboratórios, bibliotecas, etc.), e os resultados de ensino-aprendizagem. A Avaliação de Cursos é fundamental para o reconhecimento e renovação de reconhecimento dos cursos.

O Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (ENADE) avalia o rendimento dos alunos concluintes em relação aos conteúdos programáticos previstos nas diretrizes curriculares, suas habilidades e competências. É aplicado periodicamente aos estudantes de diferentes cursos e áreas do conhecimento, servindo como um indicador de qualidade do ensino oferecido pelas instituições.

Cabe ressaltar que o ENADE mede o rendimento dos alunos concluintes em relação aos conteúdos programáticos, suas habilidades e competências. A Avaliação Institucional é subdividida em autoavaliação, conduzida pela própria instituição, e avaliação externa, realizada por comissões designadas pelo INEP. A Avaliação de Cursos examina aspectos específicos de cada curso, como currículo, infraestrutura e corpo docente.

A supervisão consiste no acompanhamento contínuo das instituições e cursos para garantir o cumprimento das normas estabelecidas. A SERES é responsável por essa função, realizando ações de monitoramento e fiscalização. Quando irregularidades são identificadas, a SERES pode instaurar processos administrativos que podem resultar em sanções como advertências, suspensões ou descredenciamento da instituição ou curso.

CONCLUSÕES

Este artigo teve como propósito verificar até que ponto a regulação verificar até que ponto a regulação facilita a identificação de pontos críticos e oportunidades de melhoria do sistema, contribuindo para a democratização do acesso no ensino superior no Brasil.

A partir de dados extraídos do Censo do Ensino Superior no Brasil foi possível observar que a governança corporativa é um tema de crescente relevância no setor educacional brasileiro, especialmente em um contexto onde a transparência, a prestação de contas e a eficiência administrativa são fundamentais para a sustentabilidade e qualidade das instituições de ensino. 

A adoção de boas práticas de governança corporativa nas instituições de ensino trouxe inúmeros benefícios, entre os quais a transparência, a prestação de contas (accountability), a equidade e a responsabilidade corporativa, contribuindo efetivamente para identificação de pontos de melhoria do sistema, tais como gestão de riscos e sustentabilidade financeira.

No entanto, também foram observados inúmeros desafios a serem enfrentados pelas instituições de ensino, tais como a mudança de uma cultura organizacional arraigada para uma cultura de transparência e responsabilidade pode ser lenta e encontrar resistência interna, a necessidade de capacitar gestores e funcionários em práticas de governança corporativa, o que significa investimentos em treinamento e desenvolvimento, que nem sempre são priorizados. Soma-se a isso a crescente complexidade regulatória do setor, aliado aos limitados recursos para investimentos.

Cabe salientar que o  futuro da governança corporativa nas instituições de ensino no Brasil aponta para uma crescente profissionalização e adoção de práticas mais rigorosas, com tendência de utilização de tecnologias avançadas para a gestão e transparência das informações pode facilitar a implementação de boas práticas de governança, um maior envolvimento dos Stakeholders nos processos decisórios, o fortalecimento das regulamentações e uma maior exigência dos órgãos reguladores com restrições de entrada cada vez maior, exigindo dos administradores uma gestão mais holística e responsável. 

Finalmente, cabe ponderar que o SINAES, embora muito tenha contribuído para melhoria da qualidade das instituições nos últimos 20 anos, fazendo com que a busca da qualidade se tornasse um objetivo central das instituições de ensino tenha resultado em investimentos em infraestrutura, capacitação docente e desenvolvimento de novos programas acadêmicos que atendam às demandas de mercado e aos padrões de excelência, ainda apresenta pontos obscuros. 

A complexidade dos processos de avaliação do SINAES trouxe desafios burocráticos significativos para as IES. A preparação para as avaliações exige uma quantidade considerável de recursos administrativos, desviando o foco da gestão de atividades pedagógicas e acadêmicas. Instituições menores e com menos recursos podem enfrentar dificuldades para cumprir todas as exigências do sistema. Por sua vez, a ênfase nos resultados quantitativos das avaliações pode levar as IES a priorizar práticas que melhorem indicadores de desempenho em detrimento de abordagens pedagógicas inovadoras. Há um risco de que as instituições concentrem seus esforços em “ensinar para o exame” ou em atividades que melhoram as notas dos indicadores de avaliação, em vez de focarem no desenvolvimento integral dos estudantes.

Além disso, a aplicação uniforme dos critérios de avaliação em um país com grandes disparidades regionais pode não captar todas as nuances e contextos específicos de cada instituição. Isso pode gerar injustiças e desvantagens para instituições localizadas em áreas menos desenvolvidas, que enfrentam desafios únicos.

Os impactos do SINAES na gestão corporativa das instituições de ensino superior no Brasil são profundos e multifacetados. Embora tenha promovido uma cultura de transparência, planejamento estratégico e busca pela qualidade, o sistema também impôs desafios significativos relacionados à burocratização e à pressão por resultados. Para maximizar os benefícios do SINAES, é crucial que o MEC e as IES trabalhem juntos para ajustar e melhorar continuamente os processos de avaliação, garantindo que eles atendam às necessidades diversas e dinâmicas do sistema educacional brasileiro.

Gilvandro Vasconcelos Coelho de Araújo

Doutor em Direito pela Universidade Panthéon Assas – Paris II. Diplôme d´Etudes Approfondies (DEA Droit Public Général) pela Faculdade de Direito da Université de Montpellier I. Pós-graduação em Direito da Concorrência pela FGV São Paulo. Graduação em Ciências Jurídicas pela Universidade Católica de Pernambuco. Foi Diretor de Soluções Jurídicas e Administrativas da Infraero (2019-2022); Conselheiro de Administração dos aeroportos de Viracopos e Galeão (2019-2022). Presidente Interino do CADE entre janeiro e julho de 2017; Conselheiro do CADE (2014 a 2018) e Procurador Geral do CADE (de 2010 a 2014). Ingressou como Procurador Federal por concurso da Advocacia Geral da União em 2004. Atualmente é sócio do escritório Carneiros e Dipp advogados e professor no Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP). Atua na área de direito econômico, nos temas envolvendo concorrência e regulação setorial, no consultivo e contencioso.

Ailton Ferreira Cavalcante 

Administrador, Contador, Advogado, Licenciado em Matemática e Pedagogia, Mestre em Educação, concentração em Políticas Públicas e Economia da Educação, doutor em Ciências Jurídicas pela Absolute Christian University – Flórida – USA, professor, aposentado do Banco do Brasil, área de Educação Corporativa, Avaliador do MEC/INEP, Diretor Pedagógico da Faculdade UNIABA, aluno de doutorado do IDP em Administração Pública.

Soraia Sorice da Silva

Graduada em Pedagogia, Pós-graduada em Licitações e Contratos Públicos, Mestre em Gestão Pública pela Universidade de Brasília – UnB. Em 2014 realizou capacitação internacional em Liderança em Gestão Pública para Cidades Competitivas e Inovadoras na University of Applied Sciences (IMC), Krems Áustria. Gestora em Políticas Públicas e Gestão Governamental do Governo de Brasília cedida para a Defensoria Pública do DF, aluna de doutorado do IDP em Administração Pública.

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