EDUCAÇÃO NO AMBIENTE PRISIONAL: UMA ALTERNATIVA PARA A RESSOCIALIZAÇÃO

REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10467353


Marília Valvassori Rodrigues
Fabrício Engel Correa
Elias Thomas
Silvana Andres Della Flora
Leonardo de Oliveira Torquato
Bruno Gonçalves Meirelles
Lucas Gorski
Cristiano Rafael Lunkes
Eduardo Carvalho Guedes
Saul Frohlich
Marlise Della Flora Sabadi
Valéria Oliveira Domingues
Douglas Vargas dos Santos
Ewerton Mumbach


RESUMO

 Este trabalho trata sobre o direito à educação no Sistema Prisional Brasileiro e a importância dela na ressocialização e reinserção do indivíduo privado de liberdade em sociedade. Para isso foi realizada uma revisão bibliográfica de caráter qualitativo. Nesse sentido, o uso punições como método de repreensão de crimes é uma prática que remonta a civilizações antigas. No entanto, essas punições antes da utilização do estabelecimento prisional como forma de pena eram punições físicas e não de privação de liberdade, tais como: açoitamento, mutilação exílio, trabalho escravo e até mesmo execução. A privação de liberdade surgiu em 1791, com a intenção de permitir ao indivíduo privado de liberdade refletir a respeito de seus atos e assim mudar seu comportamento. Junto com a privação de liberdade surgiram os conceitos de ressocialização e reinserção do indivíduo em sociedade. Uma das alternativas mais importantes para a ressocialização é a educação escolar, que alguns anos depois foi garantida como direito da pessoa privada de liberdade, inclusive em nosso país, através da Lei de Execução Penal (LEP) em 1984 e através da Constituição Federal de 1988. Dessa forma, a educação no ambiente prisional foi tida como uma alternativa eficaz para a pessoa privada de liberdade, já que através dela esses indivíduos podem adquirir novas habilidades e conhecimentos que lhes permitam mudar seu comportamento e abandonar a criminalidade, podendo assim se reinserir em sociedade.

Palavras-chave: Educação. Sistema Prisional. Ressocialização. Pessoas privadas de liberdade.

ABSTRACT

This study delas with the right ti education in the Brazilian Prision System and this importance in the resocialization and reitegration os the individual deprived of liberty in society. For this, a qualitative bibliographical review was carried out. In this sense, the use of punishment as a methos of reprimanding crimes is a practice that dates back to ancient civilizations. However, these punishments before the use of the prision as a form os punishment were physical punishments and not deprivation os liberty, such as: floggin, mutilation, exile, alvelabor and even execution. The deprivation os liberty appeared in the 1971, with the intention os allowins the individual deprived os liberty to reflect on his actions and thus change his behavior. Aleng with the deprivation of liberty, the concepts os resocialization and reintegration of the individual into society emerged. One the most imortant alternatives for resocialization is school education, wich a few years later was guaranteed as a rigth of teh person deprived of liberty, even in our country, thriugh the Penal Exection Law (LEP) in 1984 and though the Federal Constituition of 1988. In this way, education in the prison environment was seen as na effective fot the person deprived of liberty, since though it the individuals can acquire new skills and knoeledge that aloow them to change thier behavior and abandon criminality thus being able to reinsert them seklves into society.

Keywords: Education. Prision System. Resocialization. People tried of freedom.

INTRODUÇÃO

Este estudo trata-se de uma revisão histórica sobre o direito à educação no sistema prisional, baseando-se na justificativa de que este direito contribua para a reabilitação da pessoa privada de liberdade, trazendo dessa forma novas perspectivas para essa população, tanto profissionalmente, quanto no âmbito social. Considerando que o direito de acesso à educação é tido como direito fundamental, estabelecido em normas internacionais como a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, e na Declaração Mundial Sobre Educação para todos de 1990, assim como em âmbito nacional, que está estabelecida na Constituição de 1988 como um direito social. Já no contexto prisional, a educação passou a ser considerada como um direito à remição de pena em nosso país, no ano de 2011, através Lei de Execução Penal (LEP) 12.433/2011.

O interesse pelo tema surgiu pelo fato de que o Brasil vem vivenciado nos últimos anos um crescente aumento da população carcerária, sendo grande parte desta população formada por pessoas com baixa ou nenhuma escolaridade.

Por isso, acredita-se ser de grande relevância promover uma reflexão teórica sobre o direito à educação no âmbito prisional, correlacionando os avanços e desafios referentes à efetivação deste direito para com a população provada de liberdade.

O SISTEMA PRISIONAL E SUA ESTRUTURAÇÃO

O estabelecimento prisional como instrumento da pena, surgiu em 1791, através do Código Penal Francês e generalizou-se no mundo (NOVO, 2017). FOUCAULT (1987) diz que a prisão se fundamenta na “privação de liberdade”, salientando que esta liberdade é um bem pertencente a todos da mesma maneira, perdê-la tem, o mesmo preço para todos, “melhor que a multa, ela é o castigo”, permitindo a quantificação da pena segundo a variável do tempo: “Retirando tempo do condenado, a prisão parece traduzir concretamente a ideia de que a infração lesou, mais além da vítima a sociedade inteira” (FOUCAULT, 1987).

Classificada por Goffman (1978) como “instituição total”, a prisão se configura, na sociedade moderna, após o século XIX, como o principal mecanismo de punição do sistema penal, cuja privação dos direitos e da liberdade caracteriza o grau de punibilidade da nova forma de administrar juridicamente as penas e seu grau de efetividade junto aos que cometem crimes.

Foucault (2007), descreve a prisão como um espaço fechado, recortado, vigiado em todos os seus pontos, onde os indivíduos estão inseridos num lugar fixo, com movimentos controlados, onde todos os acontecimentos são registrados. Para CUNHA (2010), as prisões, sob a ótica da ressocialização, se configuram em espaço físico onde o Estado consolida sua política pública de controle e repressão. Além disso, elas estão legitimadas como espaço pedagógico necessário de punição e de proteção a sua própria segurança e sobrevivência.

Para a sociedade, a prisão passou a ser um local de divisão entre o mundo do crime e o restante da sociedade, possuindo como principal função modificar os condenados em seu foro mais íntimo, fazendo com que estes retornem ao convívio social teoricamente ressocializados e reeducados. Para Adorno (2006) a prisão é uma máquina de produzir ‘corpos dóceis’, economicamente produtivos e politicamente neutralizados em sua capacidade de revolta e resistência.

Já no Brasil, o modelo penal foi estabelecido a partir da adaptação do que ocorria nos Estados Unidos e na Europa do final do século VIII até o início do século XIX (VASQUEZ, 2008). Antes do século XVIII, o Direito Penal era caracterizado por duras penas, cruéis e desumanas, não havendo nesse período a privação de liberdade como forma de pena. Existia somente a custódia para impedir a fuga do acusado e para produzir provas mediante a tortura. Somente depois do advento do século XVIII que a pena privativa de liberdade passou a fazer parte do rol de punições do Direito Penal, banindo gradualmente as penalidades físicas (ENGBRUCH e SANTIS, 2012). De acordo com Araújo e Leite (2013), antes desse período vigoravam as penalidades corpóreas aplicadas de modo proporcional aos delitos cometidos.

Segundo Foucault (1987), as agressões foram gradativamente sendo substituídos pelas condições de cerceamento de direitos, sobretudo à liberdade, ao controle dos corpos e mentes, passando o castigo à alma no interior das celas. Segundo essa penalidade, o corpo é colocado num sistema de coação e de privação, de obrigações e de interdições. O sofrimento físico e a dor do corpo não são mais o elemento da pena. O castigo passou de sensações insuportáveis a direitos suspensos. Se a justiça ainda tiver que manipular e tocar o corpo dos justiçáveis, tal se fará à distância, propriamente, segundo regras rígidas e visando a um objetivo bem mais ‘elevado’. Assim, com o surgimento dessa nova penalidade, um exército inteiro de técnicos veio substituir o carrasco: os guardas, os médicos, os capelães, os psiquiatras, os psicólogos, os educadores.

Com essa nova forma de punição, surgiram então em nosso país as primeiras discussões sobre a criação da primeira casa de correção brasileira, que ocorreram através da Carta Régia de oito de julho de 1769. Essa fundação acabou ocorrendo somente a partir de 1834 na cidade do Rio de Janeiro. A construção foi considerada um marco histórico pelos membros da Sociedade Defensora da Liberdade e da Independência Nacional, já que para eles esse foi um passo fundamental para tornar o novo império um “mundo civilizado”. Apesar do Brasil ter recebido fortes influências europeias sobre a forma de punir, infelizmente também houveram fortes influências do período escravista, o que culminou por associar nos regimentos penais prisão os suplícios e trabalho forçado até o final do século XIX (ARAÚJO, 2009; SANT’ANNA 2010).

Dessa forma, a partir desse momento houveram muitas transformações no conceito de pena, primeiro para a equação “pena-suplício físico”, “pena-privação de liberdade” culminando com o paradigma “pena-educação”, que vem, até os dias atuais introduzindo a educação como forma de tratamento e restauração social das pessoas em privação de liberdade.

O DIREITO À EDUCAÇÃO E O SISTEMA PRISIONAL

Dados históricos nos revelam que a assistência educacional em estabelecimentos prisionais foi novamente resinificada pela perspectiva de educação como direito de todos, consolidada com a promulgação da Constituição Federal de 1988: “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” (Brasil, 1988).

No âmbito internacional, destaca-se a Declaração Universal dos Direitos Humanos que, no artigo 26 estabelece a educação como um direito de todas as pessoas independente de qualquer condição; o ensino básico deve ser gratuito e o acesso aos estudos superiores deve estar aberto a todos em plena igualdade. O mesmo direito está previsto também em outros documentos internacionais, tais como: Declaração Mundial sobre Educação para Todos, Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, Convenção contra a Discriminação no Ensino, Declaração e Plano de Ação de Viena, Agenda 21, Declaração de Copenhague, Plataforma de Ação de Beijing, Afirmação de Aman e Plano de Ação para o Decênio das Nações Unidas para a Educação na Esfera dos Direitos Humanos (OLIVEIRA, 2013).

Já no Brasil, em 1996, a Lei n° 9.394, que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), ressalta que: “A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I – igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; II – liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber; VI – gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais” (Brasil, 1996).

O Estado tem a responsabilidade de promover práticas de políticas públicas no sentido de que os direitos humanos básicos sejam garantidos, com igualdade para todos os indivíduos, incluindo os privados de liberdade. Tais políticas devem estar evidenciadas no cotidiano prisional e a educação é um dos eixos fundamentais desse processo (ONOFRE E JULIÃO, 2013).

Desde então, a educação escolar nos estabelecimentos prisionais passou a compor a modalidade de ensino intitulada Educação de Jovens e Adultos (EJA). A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), nº 9.394 de 1996, define, em seu artigo 37, essa modalidade como aquela destinada “àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio na idade própria” (BRASIL, 1996; OLIVERA, 2013).

Nesse aspecto, a Lei 12.433/2011, que alterou a Lei de Execução Penal 7.210/1984, foi normatizou a remição da pena por estudos, assegurando que “o condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou estudo, parte do tempo de execução da pena” (BRASIL, 2011, p. 1), sendo o quantitativo de tempo pedagógico, a contar para efeito da remição,

de 1 (um) dia de pena a cada 12 (doze) horas de frequência escolar ─ atividade de ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante ou superior, ou ainda de requalificação profissional ─ divididas, no mínimo, em 3 (três) dias. (BRASIL, 2011 p. 1).

A LEP 7.210/84, que ainda é anterior a Constituição de 1988, garante a assistência educativa à pessoa privada de liberdade, no Art. 17, que “a assistência educacional compreenderá a instrução escolar e a formação profissional do preso e do internado”; sendo que o trabalho do preso também atende a aspectos educativos, como expressa o Art. 28: “o trabalho do condenado, como dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva”. (BRASIL, 1984)

Segundo a LEP, somente o ensino fundamental é obrigatório para as pessoas provadas de liberdade, não sendo garantidos o acesso ao ensino médio e superior. O ensino profissional será ministrado em nível de iniciação ou de aperfeiçoamento técnico. Cada estabelecimento penal deverá possuir salas de aulas e uma biblioteca dotada de livros instrutivos, recreativos e didáticos.

Art. 17. A assistência educacional compreenderá a instrução escolar e a formação profissional do preso e do internado. Art. 18. O ensino de 1º grau será obrigatório, integrando-se no sistema escolar da Unidade Federativa.

Essa legislação fortalece a assistência educativa no interior das prisões, embora, ideologicamente, a remição da pena pela educação, e também pelo trabalho, e seja visto como salvador do sistema prisional, no que diz respeito à redução da população carcerária. Mesmo diante desse caráter, defendemos a educação prisional como um direito da pessoa privada de liberdade. Além disso, contamos com a conscientização crítica de educadores que atuam nesse ambiente, realizando práticas educativas libertadoras (PEREIRA, 2018).

É importante ressaltar que em 2015 a LEP foi modificada pela Lei 13.163/2015, que inseriu o Ensino Médio, regular ou supletivo, com formação geral ou educação profissional de nível médio, regular ou supletivo, com formação geral ou educação profissional nos estabelecimentos penais, em obediência ao preceito constitucional de sua universalização (LOBATO et al, 2020).

Todavia, no Plano Nacional de Educação de 2001/2010 (PNE), no capítulo 5, a meta 17 trata especificamente sobre a educação de jovens e adultos em privação de liberdade. Esse meta, tem por objetivo implantar em todas as unidades prisionais, assim como nos estabelecimentos que atendam adolescentes e jovens infratores, programas de educação de jovens e adultos de nível fundamental e médio, assim como de formação profissional, contemplando para essa faixa as metas n° 5 e nº 14. No atual PNE (2014/2024), a meta 10 traça como objetivo ampliar as matrículas no EJA no ensino fundamental (EF) e no ensino médio (EM) na forma integrada à educação profissional. Para alcançar esse objetivo uma de suas estratégias é orientar a expansão da oferta de EJA vinculada à educação profissional, de modo a atender as pessoas privadas de liberdade (CORDEIRO, 2019).

As Diretrizes Nacionais para a Oferta da Educação nos estabelecimentos penais servem de orientação a diversos órgãos sobre como deve ser o procedimento educacional no interior dos presídios.

Art. 3º – A oferta de educação no contexto prisional deve: II – resultar do processo de mobilização, articulação e gestão dos Ministérios da Educação e Justiça, dos gestores estaduais e distritais da Educação e da Administração Penitenciária, dos Municípios e da sociedade civil; III – ser contemplada com as devidas oportunidades de financiamento junto aos órgãos estaduais e federais; IV – estar associada às ações de fomento à leitura e a implementação ou recuperação de bibliotecas para atender à população carcerária e aos profissionais que trabalham nos estabelecimentos penais; e V – promover, sempre que possível, o envolvimento da comunidade e dos familiares do (a)s preso(a)s e internado(a)s e prever atendimento diferenciado para contemplar as especificidades de cada regime, atentando-se para as questões de inclusão, acessibilidade, gênero, etnia, credo, idade e outras correlatas.

A IMPORTÂNCIA DA EDUCAÇÃO NA RESSOCIALIZAÇÃO

A preocupação com a humanização da pena, tem sua origem no fato de que, após a Revolução Francesa, a discussão sobre os direitos humanos foi impulsionada por diversos setores da sociedade, que passaram a cobrar das autoridades a redução da arbitrariedade e a humanização das penas (CUNHA, 2010).

Para CUNHA (2010), o processo de ressocialização deve abranger, os aspectos que envolvem a construção da imagem do ser humano, concreto e subjetivo, o papel da educação, da qualificação e do trabalho no cárcere

O nível educacional geralmente baixo das pessoas que entram no sistema carcerário reduz seus atrativos para o mercado de trabalho. Isso sugere que programas educacionais podem ser um caminho importante para preparar os detentos para um retorno bem-sucedido à sociedade (NOVO, 2017).

Nesse sentido, repensar a conduta das instituições penais é de fundamental importância, já que somente com oportunidades concretas de reinserção social, enquanto sujeitos de direitos, é que será possível a cada um dos egressos possa construir novos caminhos da CUNHA, 2010).

Em nosso país, entre 70% e 80% dos presos que saem sob o regime de liberdade condicional retornam ao chamado “mundo do crime” e regressam ao sistema penal. Esses egressos, quando ainda estão em liberdade, sofrem todos os tipos de estigmas. Esse alto índice de retorno ao cárcere, se deve principalmente à pouca efetividade do papel ressocializador e educador pretendido por estas instituições (CARVALHO FILHO, 2005).

A baixa escolaridade, mesmo com o aumento do acesso à educação, ainda se constitui como uma realidade entre a maioria da população brasileira e possui forte ligação com o aumento da criminalidade (CUNHA, 2010). Mesmo que os dados estatísticos sobre educação penitenciária sejam insuficientes para estabelecermos um paralelo dessa situação em nosso país, de acordo com a Fundação de Amparo ao Trabalhador Preso (FUNAP), no ano de 2010 cerca de 78% da população masculina e 69% da população feminina encarcerada eram analfabetas ou possuíam ensino fundamental incompleto.

Com relação ao número de detentos inseridos em atividades educativas, em 2020 pouco mais de 10% de uma superpopulação de mais de 726 mil presos, possuíam acesso à educação no ambiente prisional (LOBATO et al, 2020).

A educação prisional tem um papel decisivo na elevação da escolarização e na consciência crítica da pessoa privada de liberdade, possibilitando-lhe modificar seu comportamento ainda na prisão, e quando fora dela, lutar por uma condição de vida melhor, visto ser um processo capaz de transformar o potencial das pessoas em competências, capacidades e habilidades (JULIÃO, 2013). Pereira (2011) corrobora com essa afirmação, articulando ainda, que a educação nesse espaço deve também cumprir o papel de humanizar as relações conflituosas. Para isso, é preciso investir na formação dos profissionais do sistema prisional, mudar a estrutura física e organizacional do ambiente, além de estimular as práticas de convivência menos discriminatórias e mais tolerantes.

A escola em estabelecimentos é uma ponte, através da qual o aluno tem a possibilidade de manter contato com o mundo exterior. Nessa perspectiva, Pereira (2016) defende que a educação proposta para os estabelecimentos prisionais tenha, de fato, um cunho de integração social.

Ainda, Scarfó, et al., (2011) sustentam que a educação em prisões não é um dispositivo de tratamento ou uma ação terapêutica, mas sim um direito que tem impacto favorável sobre a melhoria da qualidade de vida dos privados de liberdade não somente enquanto dura seu aprisionamento, mas também na sua volta à sociedade.

A educação deve se integrar a uma política séria de qualificação profissional e trabalho no cárcere. As atividades de trabalho e educação na prisão não podem apenas ser encaradas como uma ocupação para os reeducandos, mas sim fazer parte de um projeto consistente de resgate da dignidade humana e possibilidade de novos sonhos. A ação educativa como meio para a ressocialização deve resgatar a dignidade humana dos detentos, permitindo a atividade criadora e a construção da autonomia (CUNHA, 2010).

A esse respeito, Silva e Moreira (2011) são enfáticos em afirmar que o papel da educação dentro da prisão deve ser única e exclusivamente o de ajudar o ser humano privado da liberdade a desenvolver habilidades e capacidades para estar em melhores condições de disputar as oportunidades socialmente criadas, assim que retornarem à vida em sociedade. Dessa forma, cabe a educação formal, auxiliar para que o egresso do sistema prisional possa se reinserir em sociedade, assim como no mercado de trabalho.

Leme (2007) afirma que a realidade da escola dentro do ambiente profissional é diferenciada de qualquer outra escola. Segundo o autor, os alunos (privados de liberdade) “esperam que, ao avançarem em seus estudos, poderão conseguir um ‘serviço’, um ‘emprego’ e que, assim, possam mudar de vida, abandonar o outro mundo, ‘o mundo de lá’, o mundo do ‘raio’, o mundo do crime”.

“… a educação surge como uma mediação no interior das prisões não só em relação ao processo de ensino e aprendizagem, mas também para outras necessidades subjetivas dos prisioneiros. Será por meio dela, não como o único viés, mas como parte integrante de um processo maior, que ocorrerá a “transformação dos indivíduos”. (p. 152, 2007).

Entretanto, Silva (2011) chama a atenção para o fato de que não basta elevar a escolaridade e a profissionalidade dos privados de liberdade, eles também precisam adquirir habilidades individuais e desenvolver competências sociais que lhes habilitem explorar as próprias potencialidades e usufruir as oportunidades que a sociedade lhes oferece.

Onofre (2016) enfatiza que a educação acontece ao longo da vida e em todo lugar, sinalizando que os muros da prisão não se constituem apenas uma barreira de segurança, mas também ao conhecimento pois, se colocam como um sistema de segurança impenetrável.

CONCLUSÕES

Apesar da evolução ocorrida com o passar dos anos no Sistema Penal em nosso país, ainda estamos longe de garantir condições mínimas de sobrevivência, menos ainda de ressocialização.

A superlotação nas casas prisionais é um problema grave que causa consequências brutais, tais como tortura, escassez de água e alimentos, rebeliões violentas e péssimas condições de higiene e até mesma de saúde.

Falar de educação em um ambiente tão degradante como o do cárcere pode soar como um paradoxo. Entretanto, sem o papel transformador do ensino, a proposta de ressocialização se transforma em uma realidade ainda distante. A importância da escola para a evolução, crescimento e transformação da pessoa privada de liberdade, se dá principalmente pelo fato de que sem meios pedagógicos e ferramentas concretas que garantam o acesso à educação nas unidades prisionais, qualquer tentativa de reinserção dos presos na sociedade se tornará ainda mais difícil.

Além disso, a educação possui grande importância na reabilitação das pessoas privadas de liberdade, já que ela pode ajudar esse indivíduo a desenvolver habilidades profissionais e melhorar as oportunidades de emprego, o que pode reduzir a probabilidade de reincidência. A educação também pode ajudar os indivíduos a entender o impacto de suas ações na sociedade e a desenvolver um senso de responsabilidade pessoal. Dessa forma auxiliando para que ocorra efetivamente a ressocialização do indivíduo. 

Dessa forma, a educação é um componente essencial do sistema penal, tanto com relação a prevenção do crime, quanto com relação ao tratamento dos indivíduos encarcerados. Ao fornecer habilidades e conhecimentos valiosos, ela pode auxiliar a criar comunidades mais seguras, assim como reabilitar indivíduos, para que assim possam se reinserir na sociedade.

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