REGISTRO DOI: 10.69849/revistaft/th102411222137
Hemily Pastanas Marinho1
Zila Silva de Castro 2
Suzana da Silva Barbosa3
Elizabeth Lopes Faustino4
Emily Cristine da Rocha de Carvalho5
Luiz de Oliveira Auleriano6
Rita de Cássia Fraga Machado7
Resumo
Este artigo apresenta uma pesquisa de abordagem qualitativa, com tipo de pesquisa-ação participante, com o objetivo de fornecer resultados parciais das atividades do Projeto de Extensão Clube das Manas Tefé como práxis feminista em Tefé/Amazonas. O projeto está implementado no Centro de Estudos Superiores de Tefé (CEST/UEA) e no município de Coari, no Centro de Estudos Superiores NESCOA/UEA. Ambos os projetos são componentes integrantes do Programa Mulheres na Universidade, idealizado e supervisionado pela Professora Associada Rita de Cássia Fraga Machado na UEA. Atualmente em sua quinta edição, o Clube das Manas tem como objetivo fomentar o protagonismo de meninas e mulheres por meio do estímulo à leitura, debates, feiras e encontros. Além disso, procura suscitar reflexões sobre questões contemporâneas, desmantelando um paradigma social que perpetra violência e opressão contra as mulheres no meio universitário. Ao longo desta quinta edição, foram concebidas atividades para abordar o assédio na universidade, estender o apoio às mulheres vítimas de assédio no âmbito universitário, facilitar círculos de conversa interculturais, proporcionar sessões de formação e gerar leituras reflexivas. O Tefé Clube das Manas reúne diversas disciplinas, como leitura, literatura, cinema, filosofia, educação e reflexão. Utilizando uma metodologia dinâmica e participativa, são realizadas reuniões mensais, nas quais os participantes recebem cópias em PDF dos livros designados. Após a leitura mensal, os participantes participam em rodas de discussão, permitindo a exploração de diversas perspectivas e a aquisição de conhecimentos relativos aos temas abordados.
Palavras-chave: Práxis Feminista. Educação. Formação de Professoras. Clube das Manas.
Introdução
O presente artigo8 trata-se de uma pesquisa de abordagem qualitativa, do tipo pesquisa ação que objetiva apresentar resultados parciais das atividades do projetos de extensão Clube das Manas, desenvolvido pelo Programa Mulheres na Universidade. Para a referente pesquisa, utilizamos a abordagem qualitativa, do tipo pesquisa ação participante. Esse tipo de pesquisa se caracteriza pela interação das pesquisadoras com a comunidade.
O Programa Mulheres na Universidade teve início em agosto de 2023 na Universidade do Estado do Amazonas (UEA) no Centro de Estudos Superiores de Tefé (CEST), com dois projetos, sendo eles o Clube das Manas e a Feira de Conhecimentos Ancestrais. Ambos são financiados pelo Programa Institucional de Extensão (PROGEX/UEA), idealizados e coordenados pela professora Dra. Rita de Cássia Fraga Machado. Os projetos contam com bolsistas e voluntárias que se reúnem semanalmente e mensalmente para organização dos estudos e ações no âmbito da universidade e também fora dela.
O CEST/UEA é um centro de estudos que está localizado no Médio Rio Solimões, município de Tefé, que está localizado a cerca de 523 quilômetros de Manaus, capital do Amazonas, o município de Tefé tem acesso por via aérea ou fluvial. Neste centro, a maioria dos cursos ofertados são destinados à formação de professoras e professores, com objetivo de ampliar a formação de docentes no interior do Amazonas. As mulheres ribeirinhas, indígenas, da floresta9 e das cidades, com suas especificidades, chegaram a esse espaço
O histórico limitador das mulheres nos espaços públicos está atrelado e, sobretudo, ancorado na cultura hegemônica androcêntrica e nas desigualdades de gênero, restringindo as mulheres sempre aos espaços privados, à “natureza”, ao cuidar e procriar. Na produção científico-acadêmica, essas restrições se ancoram ainda nos valores e modelo de racionalidade das ciências ocidentais modernas hegemônicas, num saber-poder que tem historicamente excluído às mulheres (Souza; Sardenberg, 2013).
As autoras supracitadas comentam que essa tal ciência hegemônica, cujo paradigma é definido pelo homem branco burguês, principalmente de países desenvolvidos, ou mesmo em desenvolvimento (para enfatizar a particularidade acadêmica em nosso país e as disparidades de gênero existentes), têm perpetuado uma historiografia que negligencia a presença e contribuição das mulheres. Esta abordagem histórica invisibiliza as experiências das mulheres e sua influência na construção do conhecimento.
8 Parte desse artigo foi apresentado no XIV Fórum Internacional de Pedagogia – XIV FIPED. https://www.even3.com.br/anais/xiv-forum-internacional-de-pedagogia-xiv-fiped-408898/824042-clube-das-ma nas-como-praxis-de-educacao-feminista-na-formacao-de-professoras-em-tefeamazonas
9 Barbosa (2023) disserta sobre as múltiplas identidades das mulheres da Floresta Nacional de Tefé (FLONA)
Segundo Perrot (2007), em diversas sociedades, a invisibilidade e o silêncio das mulheres são elementos integrantes da ordem estabelecida, porém, elas têm desafiado esses padrões. De fato, as mulheres têm buscado ativamente sua participação nos espaços públicos e, além disso, “têm exigido cada vez mais o reconhecimento de seus direitos de cidadania e têm aberto novas formas e espaços de luta” (Rago, 2003, p. 07).
Conforme Silva (2010), é com o advento da revolução industrial que as mulheres começam a romper com os muros que as prendiam em casa, ingressando no mercado de trabalho. O surgimento de inúmeras fábricas durante esse período proporcionou às mulheres a oportunidade de deixarem suas residências e iniciarem um processo de emancipação.
A mesma autora comenta que apesar de exercer a mesma função de um homem na fábrica, a mulher ganhava bem menos e isso não lhes oferecia uma melhora de vida. Conforme citado por Alves e Pitangui (1985), na obra O que é feminismo. “Entretanto, o trabalho feminino sempre recebeu remuneração inferior ao do homem. Esta desvalorização, por outro lado, provocou a hostilidade dos trabalhadores homens contra o trabalho da mulher”. No Brasil, o ensino superior feminino teve seu início no final do século XIX. A primeira mulher a ingressar na universidade brasileira foi no estado da Bahia, em 1887, quando se formou pela faculdade de medicina. As mulheres foram autorizadas a frequentar cursos superiores em 1879, quando Dom Pedro II, Imperador do Brasil na época, concedeu-lhes o direito de frequentar o ensino universitário (Silva, 2010).
[..]os homens iniciaram a vida acadêmica quase 800 anos antes das mulheres. A partir desses dados, verificamos que a chegada das mulheres à educação formal foi difícil, lenta e resultado da luta de mulheres que ousaram desafiar a lógica patriarcal que, durante a história, as deixou em desvantagem (Machado e Castro, 2016, p.164).
Com a grande expansão que ocorreu na universidade no ano de 1970 é que as mulheres realmente começam a fazer parte de uma forma bem expressiva no ensino universitário no Brasil. É a partir do ingresso da mulher nas universidades que o ensino superior consegue se expandir no Brasil. (Silva, 2010). O longo e árduo caminho das mulheres à educação formal foi percorrido por mulheres, que a seu tempo, lutaram para que nós tivéssemos o direito de estar escrevendo este texto. Na história da educação das mulheres no Brasil, nomes como o de Nísia Floresta, Maria Lacerda de Moura e Maria Firmina dos Reis não podem jamais cair no esquecimento.
As mulheres na educação brasileira
Nísia Floresta
Mulher brasileira, conhecida por seus conhecida por seus multiplospseudônimos, Dionísia Gonçalves Pinto, conhecida como a pioneira da educação feminista no Brasil. Nísia Floresta, lança em 1832, uma tradução livre da obra Vindication, de Mary Wollstonecraft, cujo título em português é Direito das mulheres e injustiça dos homens.
Por que [os homens] se interessam em nos separar das ciências a que temos tanto direito como eles, senão pelo temor de que partilhemos com eles, ou mesmo os excedamos na administração dos cargos públicos, que quase sempre tão vergonhosamente desempenham? (FLORESTA, 1832 apud CAMPO, 2011).
Nísia Floresta apresenta uma importante reflexão sobre a educação ofertada às mulheres no período da monarquia: o distanciamento proposital da mulher do estudo das ciências e o seu aprisionamento às questões da vida privada. Para ela, esse distanciamento era intencional. Afinal, privar as mulheres do direito da aprendizagem era evidentemente “baixo e indigno”.
Essa escritora foi uma mulher revolucionária, com ações que vão muito além de seus escritos. No ano de 1838 ela funda o Colégio Augusto, no Rio de Janeiro, e entra mais uma vez para a história da educação das mulheres brasileiras ao inaugurar o primeiro colégio no Brasil voltado para meninas. Nesse colégio foi introduzido às meninas o ensino de disciplinas até então exclusivas para os homens, são elas: matemática, ciências naturais e sociais.
Esses feitos foram consolidados no período da monarquia no Brasil, em que a concepção de “mulher” para a sociedade era simplesmente de um ser com capacidade reduzida de compreensão, e que por isso deveriam se restringir aos trabalhos manuais domésticos.
Nísia Floresta lança o livro “Opúsculo humanitário” em 1853, neste livro a escritora tece reflexões sobre o modo como é tratada a educação das mulheres. Evidenciando este tratamento como parâmetro de progresso civilizatório, o qual contribuiria para amenizar a miséria. Assim: ‘Se se instituísse uma classe pública de operárias em toda a sorte de trabalhos, oferecer-se-ia a uma parte das famílias desvalidas do Brasil não somente um meio seguro de as livrar da miséria, mas ainda de habilitá-las para um futuro que não está longe. (FLORESTA, 1989, p. 132)”.
Nesse sentido, ela direciona sua escrita em favor de todas as mulheres brasileiras, e ressalta que a prosperidade das mulheres em todos os aspectos de suas vidas é o seu principal objetivo de Nísia. Sobre a educação como aspecto de prosperidade da nação, muito tempo se passou até a conquista desse direito para toda a população. “Somente na Emenda Constitucional de 1969, Título IV, artigo 176, é que foi reconhecida pela primeira vez a educação como direito de todos e dever do Estado, em nível constitucional” (ZICHIA, 2005, p. 15).
É fato que as contribuições de Nísia Floresta para educação das mulheres é ímpar. No entanto, vale lembrar que as realidades das mulheres brasileiras eram e ainda são plurais, e depende do recorte de raça e classe para traçarmos uma linha reflexiva. Pois, enquanto Nísia lutava pelo direito a estudar e trabalhar fora de casa, abrindo caminho para outras escritoras brasileiras, as mulheres negras e indígenas lutavam para sobreviver e serem consideradas “gente com alma”.
Maria Firmina dos Reis
Mulher negra, escritora, pensadora e abolicionista, assim podemos descrever Maria Firmina dos Reis. Escritora pioneira na literatura abolicionista, lançou em 1859 um romance de sua autoria intitulado “Úrsula”, que se tornou um clássico da literatura brasileira ao retratar o sujeito negro como primeira pessoa do discurso ficcional.
A pensadora maranhense trabalhou com a escrita, o ensino e a construção do pensamento crítico. Tornou-se professora primária aos 22 anos, aprovada em primeiro lugar no concurso público estadual para mestra régia em 1847, tornando-se a primeira professora efetiva a integrar oficialmente os quadros do magistério do Maranhão, função que ocuparia até o início de 1881 (Miranda, 2022, p.54).
Maria Firmina continuou a se destacar no ensino brasileiro, quando aposentada, ela fundou a primeira escola para meninos e meninas, também conhecida como escola mista gratuita do Brasil, que ficou em funcionamento até o ano de 1890.
Em sua pesquisa Miranda (2022, p.54) faz uma análise sobre a atuação de Maria Firmina, “a condição de mestra régia foi um elemento central em sua posição social e intelectual no contexto do Segundo Reinado.” Pois foi com a docência que a escritora conseguiu articular sua prática docente com a escrita e a construção do pensamento crítico, buscando conhecimento e transformações no ensino.
Maria Lacerda de Moura
Feminista, anarquista e educadora brasileira, apresenta em seu livro “A mulher é uma degenerada” publicado em 1932, reflexões que nos fazem olhar para a educação como o único meio para a equidade de gêneros nas relações sociais:
A obra da educação cientifica racional para ambos os sexos, é o mais perfeito instrumento de liberdade. É a extinção da miséria universal, é o acúmulo de riquezas, é a contribuição para a solidariedade – a moral do futuro. […] Faz desaparecer o preconceito de classes, elevando o respeito a verdade, o benefício coletivo. […] Desde a escola primária, o objetivo da educação, como dizia Diderot – é a utilidade. (Moura, 1932, p.72).
A autora aponta que a vida social exige características bem distintas entre homem e mulher, e essas características são constantemente ressaltadas por aqueles que se privilegiam delas. Os atributos femininos são usados para assegurar que as mulheres contribuam para um “bem-estar coletivo”, que no caso, seria a continuidade da nossa espécie.
Maria questiona o modo como é colocado as mulheres o papel esposa e mãe, como a única função social que se pode exercer:
É sábio ou generoso, filósofo ou operário, político ou guerreiro, inventor ou andarilho, independente das funções de pai. E por que razão nos dizem com arrogância axiomática: a mulher nasceu para esposa e mãe, para o lar? Se homem, socialmente falando, tem fins de preencher independente do sexo, a mulher não menos, é claro. A enfermeira, a operária, a cientista, a escritora, a professora, a médica, a farmacêutica, a diplomata, a filantropa, a diretora de hospitais e creches, etc., entregar-se-á mais bem aos deveres se não tiver filhos (Moura, 1932, p.70)
Nesse sentido, analisando o pensamento pedagógico da autora, está explícito o seu incômodo não com a função social de “esposa e mãe”, mas que essa seja a única função que as mulheres possam exercer em sociedade. Uma vez que o homem, independentemente se é pai ou não, tem sua função como membro social respeitada.
A escritora continua suas reflexões sobre as funções sociais, “Não poderá existir nunca a igualdade natural – é lógico, e ninguém tem a pretensão de ir contra as leis naturais: é a harmonia em uma aparente desarmonia (Moura, 1932, p.72).” E conclui destacando seu desejo: […] o que se quer, com a energia indomável, é a igualdade de deveres e direitos. Esse um dia virá (Moura, 1932, p.72)”.
Em suma, o pensamento pedagógico de Maria Lacerda de Moura, enfatiza que a mulher é fisiologicamente diferente do homem, mas não é a fisiologia que a faz um ser inferior, afirma que inferioridade existe, mas não é intelectual, e sim social e econômica, alimentada pelo preconceito da deseducação proposital.
Assim, um modo de modificar essa situação seria uma educação libertária que formasse seres humanos com autonomia, para serem defensores da liberdade e principalmente da igualdade, livres dos valores culturais impostos pela Igreja, Estado e Capitalismo.
Metodologia
Para a referente pesquisa, utilizamos a abordagem qualitativa, do tipo pesquisa ação participante. Esse tipo de pesquisa se caracteriza pela interação das pesquisadoras com a comunidade em estudo, que neste caso, é a comunidade acadêmica de mulheres do CEST/UEA. As ações desenvolvidas foram pautadas nos objetivos do programa, que é: Promover protagonismo das meninas e mulheres estimulando a leitura, debate, feiras e encontros, bem como reflexão acerca de temas contemporâneos desconstruindo um modelo de sociedade que violenta e oprime mulheres a partir do ambiente universitário.
Como objetivos específicos: Disseminar o conhecimento sobre os feminismos; fortalecer as relações entre mulheres e suas identidades através das feiras de conhecimento ancestral; sensibilizar os jovens meninos e homens das comunidades para as problemáticas vivenciadas pelas mulheres e a compreensão sobre os direitos das mulheres; Incentivar e fomentar a discussão sobre Mulheres na Universidade como sujeitos de direitos como projeto de leitura e feiras permanentes.
Resultados e discussões
Programa Mulheres na Universidade
O programa Mulheres na universidade tem como proposta reunir ações com mulheres dos municípios de Tefé e Coari, Médio Solimões, na busca por uma educação libertadora intrinsecamente ligada ao contexto local. Este programa foi idealizado pela professora adjunta da UEA Rita de Cássia Fraga Machado, criado no ano de 2015 a partir das suas práticas em educação popular com as mulheres da Floresta Nacional de Tefé – FLONA e Entorno, bem como as universitárias do CEST/UEA.
Todas as ações desenvolvidas nos respectivos municípios partem do princípio do objetivo geral, que é: promover a formação humana e contextualizada de mulheres, articuladas com o aumento e a qualidade de escolaridade destas em situação de vulnerabilidade social e violências no Médio Solimões.
Os projetos que compõem o programa são ofertados de forma articulada com o ensino da graduação e pós-graduação lato e stricto sensu do CEST/UEA e no NESCOA/UEA. São eles: as Feiras de Conhecimento Ancestral, que em Tefé articulam ações com as mulheres das comunidades que compõem a Floresta Nacional de Tefé e Entorno, e o Clube das Manas, que atende universitárias e mulheres em escolarização.
Este programa tem uma política de extensão vinculada ao currículo de formação inicial dos cursos de graduação, uma vez que Educação e Gênero são questões estratégicas na formação das professoras, principalmente quando propomos discussão com mulheres em situação de pobreza dentro e fora do contexto universitário. Por isso, o potencial que se delineia a partir dessas ações estratégicas impactam a vida das participantes a partir de uma educação que combata a desigualdade de gênero.
Projeto de Extensão Clube das Manas Tefé
O Projeto de Extensão Clube das Manas Tefé é desenvolvido por acadêmicas extensionistas da UEA. A principal atividade do clube de leitura é o encontro mensal, no último sábado de cada mês, para a socialização das reflexões acerca do livro escolhido. Antes de cada encontro, é feita uma ampla divulgação nas redes sociais, com folder explicativo e cartazes. (Machado; Marinho, 2023).
Corroborando com Machado e Marinho (2023), um encontro regular de um clube de leitura feminista envolve a discussão e análise de obras selecionadas previamente pelas participantes, abrangendo uma variedade de escritoras latino-americanas, norte-americanas e africanas, com o objetivo de promover diálogo e reflexão sobre temas feministas.
No que se refere ao modo como os encontros são realizados, é utilizado uma roda de conversa em um ambiente agradável, mas comumente uma sala de aula climatizada, onde por vezes é também servido uma merenda que as próprias participantes do encontro trazem.
Imagem 1 – Programa Mulheres na Universidade – Clube das Manas, 2024.
Marcela Barbosa, 2024.
Conforme destacado por Méllo et al. (2007), as rodas de conversa enfatizam discussões centradas em um tema específico, selecionado de acordo com os objetivos da pesquisa. Durante esse processo dialógico, os participantes têm a oportunidade de expressar suas próprias interpretações, mesmo que contraditórias, enquanto cada indivíduo estimula os outros a se manifestarem, permitindo assim uma troca de posicionamentos e a escuta ativa.
Nesse contexto, à medida que compartilham suas narrativas pessoais, as participantes se empenham em compreendê-las por meio de um exercício de pensamento coletivo, o qual facilita a atribuição de significado aos eventos discutidos. Diante disso, temos esse espaço de partilha de vivências e também um espaço formativo, cujos pensamentos e reflexões são tecidas e amadurecidas.
Quando perguntadas sobre o lugar do Programa Mulheres na Universidade em sua formação acadêmica, As Manas, como são conhecidas na UEA, respondem:
“Bom mana, o programa Mulheres na Universidade e o Clube das Manas está desempenhando um papel essencial na minha formação como professora, pois não apenas abordaram questões de gênero, mas também promoveram um espaço de acolhimento e troca de experiências que fortalecem o papel da mulher no ambiente acadêmico e na educação. O Mulheres na Universidade provavelmente me ajudou a refletir sobre as dificuldades e desigualdades enfrentadas pelas mulheres no ensino superior. Esse tipo de programa também favoreceu o desenvolvimento de habilidades para lidar com as especificidades da experiência feminina, tanto dentro da sala de aula quanto na vida acadêmica mais ampla(Mana 1, 2024)”.
Como você compreende o Clube das Manas?
O Clube das Manas é um espaço de apoio mútuo, de construção de uma rede solidária entre mulheres, e também um meio de compartilhar desafios e vitórias dentro do campo da educação. Em conjunto, esses dois me fortaleceram muito como professora, promoveu uma visão mais inclusiva, crítica e sensível às questões de gênero e aos desafios enfrentados pelas mulheres. (Mana 1, 2024)”
Somos o Programa Mulheres na Universidade, somos o Clube das Manas – um clube de leitura crítica e feminista no centro da floresta do estado do Amazonas. Neste espaço também somos atravessadas por variadas violências, e o conhecimento junto ao acolhimento uma com as outras nos fortalece para continuar a combater o machismo, a misoginia, a homofobia, o racismo, com teoria e prática. Desse modo, desenvolvemos nossa práxis na perspectiva da participação comunitária das mulheres da floresta (Machado, 2018, p. 220), “num fazer-se e viver-se coletivo”.
Imagem 2 – Roda de Conversa Intercultural, 2024.
Marcela Barbosa, 2024.
Na imagem 2 temos, uma ação especial do Programa Mulheres na Universidade por meio do projeto Clube das Manas, a ação foi nomeada como Roda de Conversa Intercultural e se realizou nas dependências do CEST/UEA. A roda de conversa contou com a participação e mediação especial da Professora Doutora Alva Rosa Tukano, que é a primeira mulher indígena ter a titulação de doutorado pela Universidade Federal do Amazonas (UFAM). Ao longo da atividade, a Dra. Alva Rosa relatou sua trajetória de vida acadêmica, inspirando outras mulheres, indígenas e não indígenas a prosseguirem com a carreira acadêmica, mesmo com os desafios cotidianamente enfrentados.
Dentre os desafios enfrentados pelas mulheres no âmbito da universidade, os assédios sempre se fazem presentes. E nesse contexto, o Clube das Manas assume uma função importantíssima, o acolhimento dessas mulheres acadêmicas. Atualmente, o Clube das Manas tem sido referência entre as mulheres do CEST/UEA sobre o acolhimento das mulheres acadêmicas vítimas de algum tipo de assédio. O que inicialmente seria apenas um clube do
livro se tornou um símbolo de resistência feminista dentro da universidade, nesse espaço de teorias npssa práxis feminista se constituiu humana, teórica e insurgente. Nossa prática do acolhimento às mulheres universitárias vítimas de violências , atrelada ao conhecimento feminista, no fez entender que teoria e prática não se separam.
Imagem 2 – Ato dos Coletivos Estudantis Contra o Assédio, 2023.
Marcela Barbosa, 2024.
A ação representada na imagem 3 é o “Ato dos coletivos estudantis Contra o assédio às mulheres no CEST/UEA”. Este ato foi organizado pelo Clube das Manas e as representações estudantis, como Diretório Central dos Estudantes (DCE) e Diretório Regional dos Estudantes (DRE), com o objetivo de fomentar a criação de uma comissão de combate ao assédio contra as mulheres no CEST/UEA. A ação se deu pela grande quantidade de denúncias recebidas pelo Clube das Manas de assédios sofrido por mulheres no CEST/UEA, e que por medo de represálias por parte dos assediadores, as mulheres que apresentaram as denúncias para o clube, não prosseguiram para algum procedimento interno no CEST.
Conclusão
O presente artigo buscou explorar a relevância do Programa Mulheres na Universidade, especificamente por meio das ações do projeto Clube das Manas, com um espaço de empoderamento e reflexão para mulheres na comunidade acadêmica do Centro de Estudos Superiores de Tefé (CEST) da Universidade do Estado do Amazonas (UEA). Ao longo do texto, examinamos o contexto histórico e cultural que limitou o acesso das mulheres aos espaços públicos e à educação formal, destacando figuras emblemáticas como Nísia Floresta, Maria Firmina dos Reis e Maria Lacerda de Moura, que desafiaram essas normas e contribuíram para a emancipação feminina.
Por meio de uma abordagem qualitativa de pesquisa-ação participante, o projeto Clube das Manas visa promover a formação de professores e professoras de modo interseccional, estimulando o debate, a reflexão e o fortalecimento de identidades femininas, além de sensibilizar a comunidade acadêmica sobre questões de gênero e direito das mulheres que perpassam a vida acadêmica e a sua própria prática docente. Os resultados apresentados evidenciam a importância dessas iniciativas na promoção da igualdade de gênero e no combate à violência e ao assédio dentro do ambiente universitário.
É fundamental reconhecer o papel central das mulheres na construção do conhecimento e na transformação social, bem como a necessidade contínua de promover espaços seguros e inclusivos para que possam prosperar. O Programa Mulheres na Universidade e o projeto Clube das Manas representam passos importantes nessa direção, contribuindo para a formação de uma comunidade acadêmica mais igualitária e diversificada. No entanto, é importante ressaltar que ainda há desafios a serem enfrentados, como a superação de estereótipos de gênero, a ampliação do acesso das mulheres a cargos de liderança e a promoção de políticas institucionais que garantam a equidade de gênero no ambiente universitário. Espera-se que este estudo possa inspirar novas práticas voltadas para a promoção da igualdade de gênero e o empoderamento das mulheres na academia e na sociedade em geral.
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1 Graduada em Pedagogia (UEA), Mestranda em Educação PPGED/UEA; Bolsista FAPEAM. Hemilypmt@gmail.com https://orcid.org/0009-0007-4118-9013
2 Graduada em História (UEA), mestranda em Educação PPGED/UEA, zsc.86.26@gmail.com Bolsista FAPEAM.
3 Graduanda em Licenciatura em Biologia, bolsista do Projeto de Extensão Clube das Manas, PADEX/UEA sdsb.bio19@gmail.com
4 Mestranda em Educação PPGED/UEA, elizabethlopesfaustino@gmail.com
5 Graduanda em Ciências Biológicas, bolsista do Projeto de Extensão Clube das Manas, PADEX/UEA, emelycristinerochacarvalho@gmail.com
6 Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Educação-PPGED luizeltonauleriano@gmail.com Bolsista FAPEAM
7 Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil; estágio pós-doutoral em Educação pela Universidade Vale do Rio dos Sinos, Rio Grande do Sul, Brasil; professora adjunta na Universidade do Estado do Amazonas, Brasil; líder do Grupo de Pesquisa Feminismo, Trabalho e Participação Popular e Comunitária (CNPq/UEA). E-mail: rmachado@uea.edu.br. https://orcid.org/0000-0002-7385-3771