REGISTRO DOI: 10.5281/zenodo.10901397
Celiane Rodrigues Dias[1]
Marcelo Gaudêncio Brito Pureza[2]
A Educação Especial Indígena no Brasil é um campo de estudo que visa compreender e atender às necessidades educacionais de estudantes indígenas com deficiência. As origens desses estudos remontam à época colonial, quando os povos indígenas estavam sujeitos a políticas de assimilação e dominação cultural. Durante esse período, os missionários católicos desempenharam um papel significativo na escolarização indígena, estabelecendo escolas nas aldeias jesuítas. No entanto, o objetivo principal dessas iniciativas era catequizar os povos indígenas e impor padrões ocidentais (Silva Júnior, 2010; Instituto Unibanco, 2020).
Desde a década de 1970, a educação escolar indígena no Brasil passou por mudanças significativas. Com a promulgação da Constituição Federal em 1988, o reconhecimento dos direitos das diferenças e da diversidade cultural indígena criou um novo paradigma na educação escolar. Esse paradigma propõe uma educação bilíngue diferenciada que respeita as tradições e os saberes dos povos indígenas. Desde então, políticas e programas foram desenvolvidos para incluir e atender às necessidades educacionais especiais dos estudantes indígenas com deficiência. É importante enfatizar que a história da educação especial indígena no Brasil é um campo de estudo em constante evolução. Os pesquisadores trabalham para investigar as diferentes etapas dessa educação, relacionando-a às políticas indigenistas em todos os períodos da história brasileira. No entanto, ainda há muito a ser explorado nessa área pelos historiadores. Neste resumo, abordaremos alguns pontos relevantes sobre essa temática (Silva Júnior, 2010; Instituto Unibanco, 2020).
A metodologia utilizada para a elaboração deste artigo baseia-se na revisão de artigos científicos e materiais similares. Analisamos publicações acadêmicas sobre o tema da educação especial indígena no Brasil, com o objetivo de compreender sua evolução histórica e os desafios atuais nesse campo de pesquisa. A análise crítica desses materiais permitiu identificar pontos-chave da educação especial indígena e relacioná-la com as políticas indigenistas adotadas em diferentes momentos da história brasileira.
A Educação Especial, como um serviço educacional destinado a estudantes com deficiência, nas escolas indígenas, concentra-se na cultura, nas crianças e na cidadania ativa, abrangendo aspectos políticos, culturais, pedagógicos e jurídicos. Desde a década de 1970, o Brasil iniciou experiências de educação local diferenciada. Essas experiências foram reconhecidas legal e nacionalmente pela Constituição de 1988 e pela legislação específica subsequente. A escolaridade indígena foi reconhecida como uma educação diferenciada, bilíngue e intercultural, representando uma conquista da política indígena e indigenista e a realização dos direitos de cidadania. No entanto, ainda persistem desafios e barreiras para garantir esse direito aos povos indígenas no Brasil, especialmente para estudantes indígenas com deficiência, transtornos do espectro do autismo ou altas habilidades/superdotação (Silva Júnior, 2010).
A educação especial nas escolas indígenas é um tema relevante e complexo que tem sido discutido por diversos autores. O professor e pesquisador Gerson Alves da Silva Júnior, do Instituto de Psicologia da Universidade Federal de Alagoas, propõe um novo programa educacional que inclui a educação diferenciada para os povos indígenas (2010). Já Nozu, Sá e Damasceno (2019) desenvolveram um estudo acerca da educação nas populações indígenas, que investigou diferentes formas de oferta de serviços de educação especial em escolas rurais e indígenas por meio de revisão bibliográfica de pesquisas empíricas que destacam as nuances, semelhanças, avanços, adaptações e flexibilidade desses serviços em específico. áreas situações em associações dos estados do Amapá, Mato Grosso do Sul, Pará e São Paulo. Os pesquisadores, citados, mostram que essas escolas apresentam diversas configurações e práticas de educação especial, dependendo das condições locais, das necessidades das comunidades envolvidas e dos recursos disponíveis. Enfatiza também a importância do diálogo intercultural e da participação ativa dos povos indígenas no desenvolvimento e implementação de políticas relacionadas com a educação especial.
A pesquisa conduzida por Sá (2014) investigou a relação entre a educação especial e a escolarização indígena no contexto brasileiro, utilizando dados do censo escolar referentes ao período de 2007 a 2010. O autor identificou um aumento significativo no número de estudantes indígenas com deficiência matriculados em escolas indígenas no Brasil. Paralelamente, observou-se também um crescimento no número de alunos com deficiência em escolas indígenas que não ofereciam serviços de educação especial. Sá(op cit) sugere que é imperativo expandir tanto a disponibilidade quanto a qualidade dos serviços de educação especial nas escolas indígenas, respeitando as particularidades culturais e linguísticas desses povos. O Atendimento Educacional Especializado (AEE) na educação especial indígena emerge como um tema relevante e complexo. A formação de professores especializados em AEE, especialmente em contextos indígenas, desempenha um papel crucial nesse processo. Essa formação deve ser adaptada às especificidades das escolas indígenas. Além disso, é essencial reavaliar as políticas de formação de professores de educação especial, considerando os diversos contextos socioculturais. Surge, portanto, uma perspectiva transcultural que demanda uma (re)significação do AEE no âmbito da educação especial indígena (Baptista, 2013).
A atribuição do Atendimento Educacional Especializado (AEE) consiste em identificar, desenvolver e organizar recursos pedagógicos e acessíveis que eliminem barreiras à plena participação dos estudantes, levando em consideração as características específicas de suas necessidades pedagógicas. Nesse contexto, o objetivo das atividades pedagógicas realizadas no âmbito do AEE é promover o desenvolvimento de competências cognitivas, socioafetivas, psicomotoras, de comunicação, linguísticas, identitárias e culturais, sempre atentando para as particularidades dos alunos. O papel do professor de AEE é apoiar as atividades desenvolvidas pelo docente da turma regular. No Estado do Pará, que abriga uma rica diversidade cultural e étnica, encontram-se diversas comunidades indígenas que têm lutado pelo reconhecimento de seus direitos à terra e à cultura.
Embora a Constituição Federal de 1988 reconheça esses direitos fundamentais para os povos indígenas, ainda ocorrem violações frequentes no Brasil. A implementação da educação escolar para os povos indígenas no Brasil apresenta desigualdades significativas em diferentes regiões do país. Os Xikrin, um povo de língua interna residente no sudoeste do Pará, têm vivenciado um modelos de educação que une vários modelos e portanto tem se mostrado bastante inclusivo . Nesse contexto, é possível observar um alinhamento tanto com o paradigma moderno e constitucionalquanto com a riqueza de sua diversidade cultural. O comprometimento e a valorização dos Xikrin em relação à escolasão notáveis, refletindo suas expectativas positivas em relação à educação formal. A pesquisadora Cohn (2005), com base em observações de campo e experiências de projetos pedagógicos junto aos Xikrin, propôs uma análise das razões subjacentes que explicam a correspondência entre o envolvimento das crianças nas disciplinas escolares, as condições do trabalho pedagógico e as possibilidades de comunicação intercultural nesse contextoespecífico.
Com base nas informações contidas nos artigos mencionados, podemos inferir que a educação especial nas escolas indígenas é um tema multifacetado e desafiador, exigindo uma abordagem diferenciada. A complexidade desse campo de estudo reside na interseção entre as necessidades educacionais específicas dos alunos indígenas e suas ricas e diversas tradições culturais. No processo de atualização e elaboração de políticas educacionais para as populações indígenas, é crucial considerar as necessidades específicas de estudantes indígenas com deficiência, contextualizando aspectos de culturalidade, acesso e equidade. Além disso, a formação de professores para a oferta do Serviço de Atendimento Educacional Especializado é fundamental. A educação especial nas escolas indígenasé um campo que exige sensibilidade cultural, políticas públicas eficazes e um compromisso genuíno com a inclusão e a equidade. Esperamos que essa análise contribua para a reflexão e o aprimoramento das práticas educacionais voltadas aos povos indígenas no Brasil
REFERÊNCIAS
BAPTISTA, C. R. (2013). Ação Pedagógica e Educação especial: para além do AEE. In: JESUS, D. M., BAPTISTA, C. R., & CAIADO, K. R. M. (Org.). Prática Pedagógica na Educação especial: multiplicidade no atendimento educacional. Araraquara, SP: Junqueira & Marin, 43-62
BHABHA, H. K. (1998). O local da cultura. Belo Horizonte: UFMG.
BRASIL. Lei 13.005, de 25 de junho de 2014. Aprova o Plano Nacional de Educação – PNE e dá outras providências. Brasília, DF: Senado Federal
COHN, C. Educação escolar indígena: para uma discussão de cultura, criança e cidadania ativa. Perspectiva, Florianopolis , v. 23, n. 02, p. 485-515, dez. 2005 . Disponível em <http://educa.fcc.org.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-54732005000200012&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 29 set. 2023.
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NOZU, S.; SÁ, E. D.; DAMASCENO, M. Educação especial em escolas rurais e indígenas: desafios e possibilidades. In: SÁ, E. D.; DAMASCENO, M. (Org.). Educação especial no contexto da educação do campo: políticas, práticas e formação docente. São Carlos: EdUFSCar, 2019. p. 17-36.
SÁ, E. D.; CIA, F. Educação especial e educação escolar indígena no Brasil: dados do censo escolar 2007-2010. Revista Brasileira de Educação Especial, Marília, v. 20, n. 1, p. 15-32, jan./mar. 2014.
SILVA JÚNIOR, Gerson Alves da (2010). Educação inclusiva e diferenciada indígena: ampliando compreensões sobre a educação inclusiva. Psicologia: Ciência e Profissão, vol. 30, nº 2 (2010), pp. 292-305.
SILVA, J. H., e BRUNO, M. M. G. (2016). Formação dos professores para o atendimento educacional especializado em contexto indígena. Linhas Críticas, 22(48), 1-20
[1] Mestranda em Educação Inclusiva do Programa de Mestrado Profissional em Educação Inclusiva da Universidade Federal do Sul e Sudeste Paraense (UNIFESSPA), Especialista em Neuropsicopedagogia e Educação Especial Inclusiva pelo Centro de Ciências, Educação, Saúde, Pesquisa e Gestão, CENSUPEG, Rio de Janeiro (2019) celiane_dias@hotmail.com http://lattes.cnpq.br/2169327021073964
[2] Doutor em Geografia Humana (linha de Educação, Ensino e Geografia) pelo PPGH/USP; Mestre em Educação (linha de Currículo e Formação de Professores) pelo PPGED/UFPA; Graduado em Geografia pela UFPA; Professor adjunto pela Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará (UNIFESSPA) e pelo Programa de Mestrado Profissional em Educação Inclusiva pelo PROFEI. Desenvolve pesquisa em Educação Inclusiva, Educação Escolar Indígena e Formação de Professores.
marcelogbpureza@gmail.com http://lattes.cnpq.br/5341851203257482